Senado amplia pena para crimes relacionados à “vingança pornográfica”


  
 

Em tempos em que a tecnologia media as interações interpessoais, tem sido recorrente a divulgação, não autorizada, de fotos íntimas, sobretudo nas redes sociais. Acontece que, agora, registrar ou divulgar cenas da intimidade sexual de uma pessoa poderá ser crime, com pena de reclusão de dois a quatro anos. O Projeto de Lei da Câmara (PLC) 18/2017, que prevê a chamada “vingança pornográfica”, foi aprovado na quarta-feira (22), pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. A matéria segue para o Plenário, em regime de urgência.

A proposta altera tanto a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) quanto o Código Penal (Decreto-Lei 2.848/1940) e, originalmente, estabelecia pena de reclusão de três meses a um ano, além de multa. O aumento da pena para de dois a quatro anos foi apresentado em texto substitutivo pela Senadora Gleisi Hoffman (PT-PR).

“A legislação brasileira ressente-se de instrumentos adequados e eficientes para prevenir e punir atos de ‘vingança pornográfica’, que consistem na divulgação de cenas privadas de nudez, violência ou sexo nos meios de comunicação, em especial nas mídias sociais, para causar constrangimento, humilhar, chantagear ou provocar o isolamento social da vítima”, aponta a senadora.

Gleisi Hoffman sugeriu ainda que, neste tipo de crime, a ação penal seja pública e condicionada à representação. A senadora fez ajustes na redação de um dos dispositivos da Lei Maria da Penha, estipulando que a violação da intimidade é uma das formas de violência doméstica e familiar contra a mulher. Conforme Gleisi, a principal vítima da “vingança pornográfica” é a mulher. “Os responsáveis por esse tipo de conduta, na maioria das vezes, são os ex-cônjuges, ex-parceiros e até ex-namorados das vítimas. Assim, não há dúvidas de que se trata de mais uma forma de violência praticada contra a mulher”, afirma.

Para o advogado criminal Estevão Melo, a facilidade de registro e transmissão de dados fez surgir a necessidade de criação de normas de proteção à intimidade sexual das pessoas. Ainda segundo ele, a opção pela criação de crimes específicos é viável e encontra respaldo constitucional, “pois o Estado possui a obrigação de proteger direitos fundamentais elencados na nossa Constituição”. Todavia, ele não concorda com a expressão “vingança pornográfica”. “Ela não resume adequadamente os tipos penais criados. Na verdade, as hipóteses de crimes previstas são mais abrangentes e não se resumem a simples ato de ‘vingança’, acredita.

Melo aponta que, na redação do projeto, identifica-se como ato de vingança apenas a prática do crime de “divulgação não autorizada da intimidade sexual”, com a causa de aumento do motivo torpe. “As demais formas previstas no projeto de lei não correspondem, necessariamente, a qualquer ato de vingança”, esclarece. “É certo que o Direito Civil já disciplina o tema, com a possibilidade de propositura de ações de tutela inibitórias e de reparação dos danos, mas a prática nos tem demonstrado que há uma insuficiência deste ramo do Direito, porque é crescente o número de casos envolvendo a exposição indevida da intimidade sexual”.

Ele prossegue: “Deste modo, não vejo como desarrazoada a opção dos nossos congressistas em tipificar tais condutas, sobretudo porque, em muitos casos, é necessária uma investigação aprofundada para a apuração da autoria dos delitos, sendo o inquérito policial o instrumento necessário para a solução dos casos”. Melo faz ainda outro apontamento: “O Projeto de Lei em discussão estabelece que somente poderá haver ação penal – e consequentemente, investigação – em caso de manifestação de interesse da vítima, o que evitará a prática de atos investigativos e judiciais desnecessários”, conclui.

Já para a advogada Alessandra Muniz, presidente do IBDFAM Tocantins, é necessário se pensar em educação e reeducação, ao invés de focalizar a punição. Isso, de acordo com ela, se consegue por meio de “ações que conscientizem a todos sobre os males que essas exposições negativas na mídia vêm trazendo à sociedade”. Ela finaliza: “Muitos suicídios têm ocorrido por conta desse tipo de vingança; alto índice de depressão em vítimas que tiveram sua privacidade violada. Temos que educar para a não violência, seja qual for o tipo”.

Súmula 600 do STJ

Foi aprovada nesta quarta-feira (22), pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, a súmula 600, a qual dispõe que, para que se configure a violência doméstica e familiar não se exige coabitação entre autor (da violência) e vítima. De acordo com a advogada Alessandra Muniz, “é bem-vinda a Súmula 600, a qual só confirma o inciso III, do art. 5º da Lei Maria da Penha”. Ela entende que a relação íntima de afeto entre vítima e agressor é o que prepondera. “Se necessitasse de coabitação entre eles, reduziria o número de agressores punidos com essa lei, que foi um avanço e que permitiu melhor proteção e amparo às mulheres. Não podemos restringir, mas sim ampliar as ferramentas que temos para coibir a violência doméstica”, arremata.

Para Ana Florinda Dantas, vice-presidente da Comissão de Gênero e Violência Doméstica do IBDFAM, a Súmula 600 trouxe uma interpretação esclarecedora sobre o art. 5º da Lei Maria da Penha. “Hoje, a lei prevê sua aplicação [da Lei Maria da Penha] em três hipóteses básicas de configuração da violência doméstica. A primeira é que ela tenha ocorrido no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; a segunda, no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; a terceira, em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação”, conta.

A juíza afirma que, de acordo com o que vinha sendo interpretado, as duas primeiras hipóteses exigiam que a vítima vivesse no mesmo espaço de coabitação que o agressor, e só no terceiro caso (inciso III) a coabitação era dispensada, quando se tratava de relações afetivas de intimidade (entre casais). “A Súmula 600 ampliou a aplicação da lei, porque mesmo que o agressor seja um parente ou agregado que não coabite com a vítima, ela pode ser aplicada – desde que a violência tenha ocorrido no espaço doméstico e familiar -, não permitindo que a falta de coabitação seja utilizada como argumento para que a matéria seja encaminhada para as instâncias criminais ordinárias”, conclui.

Fonte: IBDFAM | 29/11/2017.

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Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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