ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necessária nº 1041632-92.2021.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é recorrente JUÍZO EX OFFICIO e Apelante ESTADO DE SÃO PAULO, são apelados CLÁUDIA DE FARIA CARVALHO, FLÁVIA FARIA VASCONCELLOS, JUNIA DE CAMPOS FARIA ZIEGELMEYER, LÚCIA DE CAMPOS FARIA ORTIZ NASCIMENTO e ELIANA DE CAMPOS FARIA.
ACORDAM, em 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao apelo e ao reexame necessário. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ALIENDE RIBEIRO (Presidente) E VICENTE DE ABREU AMADEI.
São Paulo, 30 de novembro de 2021.
LUÍS FRANCISCO AGUILAR CORTEZ
RELATOR
Assinatura Eletrônica
Apelação / Remessa Necessária nº 1041632-92.2021.8.26.0053
Apelante: Estado de São Paulo
Recorrente: Juízo Ex Officio
Apelados: Cláudia de Faria Carvalho, Flávia Faria Vasconcellos, Junia de Campos Faria Ziegelmeyer, Lúcia de Campos Faria Ortiz Nascimento e Eliana de Campos Faria
Interessado: Chefe do 10º Posto Fiscal da Delegacia Regional Tributária da Capital – DRTC III
Comarca: São Paulo
Juiz: Marcos de Lima Porta
Voto nº: 27564
MANDADO DE SEGURANÇA – ITCMD – Pleiteada a manutenção do desconto de 5% previsto no artigo 31, § 1º, do decreto nº 46.655/2002 que regulamentou o artigo 17, § 2º, da Lei nº 10.705/2002 – Tributo recolhido dentro do prazo estabelecido pela legislação para a obtenção do benefício – Atribuição de valor diverso a alguns bens pela autoridade fiscal – Necessidade de retificação da declaração e pagamento da diferença do imposto que não são causas legais de revogação do benefício – Sentença que concedeu a segurança mantida – Reexame necessário e recurso de apelação não providos.
Reexame necessário e recurso de apelação contra a r. sentença de fls. 192/197 que concedeu a segurança pleiteada por Cláudia de Faria Carvalho e outros contra ato do Chefe do 10º Posto Fiscal da Delegacia Regional Tributária da Capital – DRTC III para determinar que a autoridade impetrada “se abstenha de reverter/estornar o desconto de 5% (cinco por cento) do ITCMD anteriormente concedido às impetrantes na partilha inicial, nos termos do art. 31, §2º, item 2, do Decreto Estadual n° 46.655/02, devendo proceder a emissão de Guia DARE retificada, sem a aplicação do desconto exclusivamente em relação às diferenças de valores dos bens/direitos declarados após os 90 dias da abertura da sucessão (ou seja, sobre a diferença entre o valor inicialmente declarado e o valor da declaração retificadora, como arbitrado pelo Fisco)”.
Apela a FESP sustentando que a legislação concede o desconto, todavia condicionando-o ao recolhimento integral do tributo e dentro do prazo por ela estabelecido. Alega que as próprias impetrantes afirmam que não recolheram a integralidade do imposto devido dentro do prazo de 90 (noventa) dias por conta da necessidade de retificação na declaração de arrolamento que apresentaram e que o art. 1.791, do Código Civil estabelece, por princípio, a indivisibilidade da herança, logo não pode ser aceita a pretensão de que parte da transmissão da herança goze de desconto e oura parte não se beneficie em razão da inobservância do prazo. Pede provimento ao recurso para que seja denegada a segurança (fls. 200/205).
Recurso tempestivo, com dispensa de preparo, contrarrazões apresentadas às fls. 211/218.
Manifestação do representante do Ministério Público local às fls. 189/191 pela desnecessidade de intervenção do órgão ministerial no feito.
Petição apresentada pelas impetrantes a fls. 229, opondo-se à realização do julgamento virtual.
É o relatório.
As impetrantes apontaram que, em razão do falecimento de seu pai Aloysio de Andrade Faria em 15/09/2020 foi aberta a sucessão hereditária de seus bens, sendo elas as únicas herdeiras do de cujus.
Alegaram ter apresentado, em 16/11/2020, a Declaração de Arrolamento nº 67991658 perante a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo (“SEFAZ”), por meio da qual declararam todos os bens tributáveis no Estado de São Paulo referentes à herança deixada por seu pai e que em 25/11/2020 foram pagas as guias para quitação do valor integral devido a título de ITCMD, valendo-se do desconto de 5%, concedido nos termos do art. 31, §1º, do Decreto 46.655/02 e do art. 17, §2º, da Lei n. 10.705/02.
Informaram que, ao analisar os dados constantes da declaração de arrolamento, o Agente Fiscal de Rendas do Posto Fiscal do Butantã em São Paulo/SP entendeu por bem atribuir valores diversos a alguns bens, requerendo a retificação da Declaração Arrolamento n. 67991658, esclarecendo que, quando se retifica uma declaração de arrolamento de ITCMD, o sistema da SEFAZ cancela automaticamente os 5% de desconto sobre o valor total do imposto a ser recolhido em razão da transmissão causa mortis, inclusive sobre a parte que não foi objeto de questionamento fazendário.
Por entender como irregular o cancelamento do desconto concedido com base legal, ingressaram em juízo pleiteando fosse determinado à autoridade impetrada que se abstenha de exigir o ITCMD relativamente ao montante decorrente da perda retroativa do desconto de 5% previsto no art. 31, §1º, item 2 do Decreto Estadual nº 46.655/02 e no art. 17, §2º, da Lei n. 10.705/02 sobre todos os bens/direitos constantes da declaração de ITCMD retificadora, ou, subsidiariamente, que o desconto não seja aplicável apenas no tocante às diferenças de valores dos bens/direitos declarados após os 90 dias da abertura da sucessão.
Acolhido o pedido subsidiário pelo juízo de 1º grau, a FESP interpôs o recurso ora em análise.
O pedido inicial tem fundamento no artigo 17, § 2º, da Lei 10.705/2000, que assim dispõe:
“Artigo 17 – Na transmissão “causa mortis”, o imposto será pago até o prazo de 30 (trinta) dias após a decisão homologatória do cálculo ou do despacho que determinar seu pagamento, observado o disposto no artigo 15 desta lei.”
(…)
“§ 2º – Sobre o valor do imposto devido, desde que recolhido no prazo de 90 (noventa) dias, a contar da abertura da sucessão, o Poder Executivo poderá conceder desconto, a ser fixado por decreto.”
Tal dispositivo foi regulamentado pelo art. 31, § 1º, “2”, do Decreto Estadual nº 46.655/02, estabelece:
“Artigo 31 – O imposto será recolhido (Lei 10.705/00, art. 17, com alteração da Lei 10.992/01, e 18):
I – na transmissão ‘causa mortis’, no prazo de 30 (trinta) dias após a decisão homologatória do cálculo ou do despacho que determinar seu pagamento;”
(…)
§ 1.º – Na hipótese prevista no inciso I:
(…)
2 – será concedido desconto de 5% (cinco por cento) sobre o valor do imposto devido, desde que recolhido no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data de abertura da sucessão.”
A autoridade impetrada sustenta que apenas o recolhimento integral do tributo no prazo de 90 (noventa) dias assegura o direito ao benefício pretendido pelas autoras, não havendo previsão para a concessão de desconto proporcional na hipótese de recolhimento parcial do débito e que “caso parte do imposto seja recolhida após o decurso do prazo previsto na legislação, ainda que em relação a bens sobrepartilhados, o contribuinte perderá o benefício do desconto” (fls. 180/184).
No entanto, conforme acertadamente decidido pela r. sentença, não há previsão legal expressa “quanto à revogação do benefício caso haja necessidade de retificadora, já que a concessão do desconto sobre o recolhimento do ITCMD exige, tão somente, o respeito ao prazo de 90 dias para recolhimento do respectivo tributo”.
Na hipótese, somente foi necessária a declaração retificadora porque o Fisco discordou do valor de alguns dos bens, exigindo o recolhimento de diferenças referentes ao imposto recolhido, o que não pode ser fundamento para a revogação integral do benefício, notadamente porque cumprido, pelas impetrantes, o prazo legal para o recolhimento do ITCMD.
Como bem pontuado pela magistrada sentenciante, “não há comprovação de que as impetrantes agiram com má-fé em relação aos valores diversos atribuídos aos bens, não tendo o Fisco Estadual apresentado qualquer elemento nesse sentido, sendo caso de prevalecer a presunção de boa-fé.”
Assim sendo, presente o direito líquido e certo à obtenção do desconto referente ao tributo recolhido dentro do prazo legal, o caso era mesmo de concessão da segurança nos termos definidos pelo juízo de 1º grau.
No mesmo sentido é o entendimento desta Corte no julgamento de casos análogos:
“EMENTAS – MANDADO DE SEGURANÇA – ITCMD RECOLHIMENTO COMPLEMENTAR DO TRIBUTO – Necessidade de retificação ulterior dos valores declarados com complementação do recolhimento do tributo – Manutenção do desconto legal de 5% (cinco por cento) – Possibilidade – Necessidade de complementação que não desconstitui o direito ao desconto concedido ao contribuinte que observa o prazo legal para o pagamento previsto no Decreto Estadual nº 31.655/2002, art. 31, inc. I, §1º, it.2 – Boa-fé comprovada na hipótese. Valor complementar que não caracteriza má-fé na retificação e recolhimento posterior da diferença apurada pelo Fisco. (…)” (Apelação Cível nº 1041363-24.2019.8.26.0053, rel. Reinaldo Miluzzi, 6ª Câmara de Direito Público, j. 19/04/2021).
“APELAÇÃO – ITCMD – Base de cálculo do valor do ITCMD deverá corresponder ao valor venal do bem ou direito individualmente transmitido, conforme disposto no art. 9º da Lei nº 10.705/2000 – Revogação do desconto, anteriormente, concedido aos autores, nos termos do art. 31, § 1º, item 2, do Decreto nº 46.655/2002, em decorrência da apresentação, após ultrapassado o prazo estabelecido para a concessão da benesse, de declaração retificadora do ITCMD – Inadmissibilidade – Houve apenas a retificação do equívoco relativo à declaração anteriormente apresentada, concernente a um dos bens transmitidos do espólio, a saber, quotas sociais da empresa e, portanto, não se mostra razoável a revogação da integralidade da benesse fiscal relativa ao recolhimento correto e tempestivo do ITCMD incidente sobre os outros bens transmitidos – Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO.” (Apelação Cível nº 1021527-17.2019.8.26.0554, rel. Vicente de Abreu Amadei, 1ª Câmara de Direito Público, j. 01/04/2020).
“APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. ITCMD. COBRANÇA DE MULTA E JUROS. Pretensão da impetrante de manutenção do desconto de 5% concedido para recolhimento do imposto e afastamento da cobrança de juros e multa sobre o ITCMD, em razão de suposto atraso no pagamento. Imposto recolhido dentro do prazo legal, com direito ao desconto. Complementação de valores retificados que não impede a concessão do desconto previsto no art. 31 item 2, do Decreto nº 46.655/2002. Observância do art. 21, inciso I, da Lei Paulista nº 10.705/2000. Precedentes deste Eg. TJSP. Sentença mantida. Recursos oficial e de apelação não providos.” (Apelação / Remessa Necessária nº 1048967-36.2019.8.26.0053, rel. Djalma Lofrano Filho, 13ª Câmara de Direito Público, j. 11/11/2020, com indicação de outros julgados no mesmo sentido).
Para efeito de prequestionamento anoto que não houve violação ou negativa de vigência a qualquer dispositivo de Lei ou da Constituição Federal, especialmente às normas invocadas pela recorrente em suas razões recursais, destacada a desnecessidade de indicação explícita aos artigos mencionados (nesse sentido: RSTJ 15/233, 30/341, 64/183).
Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao reexame necessário e ao recurso de apelação da FESP, sem condenação a honorários (conforme disposto pelo enunciado das Súmulas de número 105 do Superior Tribunal de Justiça – STJ e 512 do Supremo Tribunal Federal – STF, com interpretação consolidada no art. 25 da Lei nº 12.016/09).
Luís Francisco Aguilar Cortez
Relator – – /
Dados do processo:
TJSP – Apelação / Remessa Necessária nº 1041632-92.2021.8.26.0053 – São Paulo – 1ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Luís Francisco Aguilar Cortez – DJ 04.02.2022
Fonte: INR – Publicações
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