CGJ- COMUNICADO CG Nº 116/2022: Manual de Integração disponível no endereço eletrônico

COMUNICADO CG Nº 116/2022

Espécie: COMUNICADO

Número: 116/2022

Comarca: CAPITAL

COMUNICADO CG Nº 116/2022

PROCESSO CG Nº 2020/22062 – CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

A Corregedoria Geral da Justiça divulga para conhecimento e providências por parte dos Senhores Oficiais de Registro de Imóveis do Estado de São Paulo o r. despacho proferido nos autos do Processo CG nº 2020/22062, a r. decisão exarada por Sua Excelência a Corregedora Nacional de Justiça acerca do Provimento CNJ nº 124/2021, bem como o Ofício ONR PR nº 025/2022/FAS, referente ao Manual de Integração disponível no endereço eletrônico: https://registradores.onr.org.br/Downloads/Manualintegracaocartorios.pdf.

Nota da redação INR: Clique aqui para visualizar a íntegra do ato. (DJe de 07.03.2022 – SP)

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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Tributário – Recurso especial representativo de controvérsia – Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) – Base de cálculo – Vinculação com Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) – Inexistência – Valor venal declarado pelo contribuinte – Presunção de veracidade – Revisão pelo Fisco – Instauração de processo administrativo – Possibilidade – Prévio valor de referência – Adoção – Inviabilidade – 1. A jurisprudência pacífica desta Corte Superior é no sentido de que, embora o Código Tributário Nacional estabeleça como base de cálculo do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) o “valor venal”, a apuração desse elemento quantitativo faz-se de formas diversas, notadamente em razão da distinção existente entre os fatos geradores e a modalidade de lançamento desses impostos – 2. Os arts. 35 e 38 do CTN dispõem, respectivamente, que o fato gerador do ITBI é a transmissão da propriedade ou de direitos reais imobiliários ou a cessão de direitos relativos a tais transmissões e que a base de cálculo do tributo é o “valor venal dos bens ou direitos transmitidos”, que corresponde ao valor considerado para as negociações de imóveis em condições normais de mercado – 3. A possibilidade de dimensionar o valor dos imóveis no mercado, segundo critérios, por exemplo, de localização e tamanho (metragem), não impede que a avaliação de mercado específica de cada imóvel transacionado oscile dentro do parâmetro médio, a depender, por exemplo, da existência de outras circunstâncias igualmente relevantes e legítimas para a determinação do real valor da coisa, como a existência de benfeitorias, o estado de conservação e os interesses pessoais do vendedor e do comprador no ajuste do preço – 4. O ITBI comporta apenas duas modalidades de lançamento originário: por declaração, se a norma local exigir prévio exame das informações do contribuinte pela Administração para a constituição do crédito tributário, ou por homologação, se a legislação municipal disciplinar que caberá ao contribuinte apurar o valor do imposto e efetuar o seu pagamento antecipado sem prévio exame do ente tributante – 5. Os lançamentos por declaração ou por homologação se justificam pelas várias circunstâncias que podem interferir no específico valor de mercado de cada imóvel transacionado, circunstâncias cujo conhecimento integral somente os negociantes têm ou deveriam ter para melhor avaliar o real valor do bem quando da realização do negócio, sendo essa a principal razão da impossibilidade prática da realização do lançamento originário de ofício, ainda que autorizado pelo legislador local, pois o fisco não tem como possuir, previamente, o conhecimento de todas as variáveis determinantes para a composição do valor do imóvel transmitido – 6. Em face do princípio da boa-fé objetiva, o valor da transação declarado pelo contribuinte presume-se condizente com o valor médio de mercado do bem imóvel transacionado, presunção que somente pode ser afastada pelo fisco se esse valor se mostrar, de pronto, incompatível com a realidade, estando, nessa hipótese, justificada a instauração do procedimento próprio para o arbitramento da base de cálculo, em que deve ser assegurado ao contribuinte o contraditório necessário para apresentação das peculiaridades que amparariam o quantum informado (art. 148 do CTN) – 7. A prévia adoção de um valor de referência pela Administração configura indevido lançamento de ofício do ITBI por mera estimativa e subverte o procedimento instituído no art. 148 do CTN, pois representa arbitramento da base de cálculo sem prévio juízo quanto à fidedignidade da declaração do sujeito passivo – 8. Para o fim preconizado no art. 1.039 do CPC/2015, firmam-se as seguintes teses: a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação; b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN); c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente – 9. Recurso especial parcialmente provido.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.937.821 – SP (2020/0012079-1)

RELATOR : MINISTRO GURGEL DE FARIA

RECORRENTE : MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

PROCURADORES: LUCAS MELO NÓBREGA E OUTRO(S) – SP272529

FELIPE GRANADO GONZALES – SP239869

RECORRIDO : FORTRESS NEGOCIOS IMOBILIARIOS LTDA

ADVOGADOS : ANGELICA PIM AUGUSTO – SP338362

FILIPE MARTIENA TEIXEIRA – SP356925

EMENTA

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS (ITBI). BASE DE CÁLCULO. VINCULAÇÃO COM IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO (IPTU). INEXISTÊNCIA. VALOR VENAL DECLARADO PELO CONTRIBUINTE. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. REVISÃO PELO FISCO. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE. PRÉVIO VALOR DE REFERÊNCIA. ADOÇÃO. INVIABILIDADE.

1. A jurisprudência pacífica desta Corte Superior é no sentido de que, embora o Código Tributário Nacional estabeleça como base de cálculo do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) o “valor venal”, a apuração desse elemento quantitativo faz-se de formas diversas, notadamente em razão da distinção existente entre os fatos geradores e a modalidade de lançamento desses impostos.

2. Os arts. 35 e 38 do CTN dispõem, respectivamente, que o fato gerador do ITBI é a transmissão da propriedade ou de direitos reais imobiliários ou a cessão de direitos relativos a tais transmissões e que a base de cálculo do tributo é o “valor venal dos bens ou direitos transmitidos”, que corresponde ao valor considerado para as negociações de imóveis em condições normais de mercado.

3. A possibilidade de dimensionar o valor dos imóveis no mercado, segundo critérios, por exemplo, de localização e tamanho (metragem), não impede que a avaliação de mercado específica de cada imóvel transacionado oscile dentro do parâmetro médio, a depender, por exemplo, da existência de outras circunstâncias igualmente relevantes e legítimas para a determinação do real valor da coisa, como a existência de benfeitorias, o estado de conservação e os interesses pessoais do vendedor e do comprador no ajuste do preço.

4. O ITBI comporta apenas duas modalidades de lançamento originário: por declaração, se a norma local exigir prévio exame das informações do contribuinte pela Administração para a constituição do crédito tributário, ou por homologação, se a legislação municipal disciplinar que caberá ao contribuinte apurar o valor do imposto e efetuar o seu pagamento antecipado sem prévio exame do ente tributante.

5. Os lançamentos por declaração ou por homologação se justificam pelas várias circunstâncias que podem interferir no específico valor de mercado de cada imóvel transacionado, circunstâncias cujo conhecimento integral somente os negociantes têm ou deveriam ter para melhor avaliar o real valor do bem quando da realização do negócio, sendo essa a principal razão da impossibilidade prática da realização do lançamento originário de ofício, ainda que autorizado pelo legislador local, pois o fisco não tem como possuir, previamente, o conhecimento de todas as variáveis determinantes para a composição do valor do imóvel transmitido.

6. Em face do princípio da boa-fé objetiva, o valor da transação declarado pelo contribuinte presume-se condizente com o valor médio de mercado do bem imóvel transacionado, presunção que somente pode ser afastada pelo fisco se esse valor se mostrar, de pronto, incompatível com a realidade, estando, nessa hipótese, justificada a instauração do procedimento próprio para o arbitramento da base de cálculo, em que deve ser assegurado ao contribuinte o contraditório necessário para apresentação das peculiaridades que amparariam o quantum informado (art. 148 do CTN).

7. A prévia adoção de um valor de referência pela Administração configura indevido lançamento de ofício do ITBI por mera estimativa e subverte o procedimento instituído no art. 148 do CTN, pois representa arbitramento da base de cálculo sem prévio juízo quanto à fidedignidade da declaração do sujeito passivo.

8. Para o fim preconizado no art. 1.039 do CPC/2015, firmam-se as seguintes teses: a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação; b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN); c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

9. Recurso especial parcialmente provido.

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, e indeferir o pedido de reconsideração, formulado às fls. 448/454, da decisão que não admitiu o ingresso de ABRAINC, SINDUSCON-SP E SECOVI-SP como amicus curiae. Os Srs. Ministros Manoel Erhardt (Desembargador convocado do TRF-5ª Região), Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães e Regina Helena Costa votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Francisco Falcão e Og Fernandes.

Brasília, 24 de fevereiro de 2022 (Data do julgamento).

MINISTRO GURGEL DE FARIA

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de recurso especial interposto pelo MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, amparado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas, assim ementado (e-STJ fl. 32):

EMENTA: INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS – ITBI – BASE DE CÁLCULO – Deve ser calculado sobre o valor do negócio jurídico realizado ou sobre o valor venal do imóvel para fins de IPTU, aquele que for maior, afastando o “valor de referência” – Ilegalidade da apuração do valor venal previsto em desacordo com o CTN – Ofensa ao princípio da legalidade tributária, artigo 150, inciso I da CF. Precedentes IRDR PROVIDO PARA FIXAR A TESE JURÍDICA DA BASE DE CÁLCULO DO ITBI, DEVENDO CORRESPONDER AO VALOR VENAL DO IMÓVEL OU AO VALOR DA TRANSAÇÃO, PREVALECENDO O QUE FOR MAIOR.

O recorrente, apontando divergência jurisprudencial e violação dos arts. 38 e 148 da Lei n. 5.172/1966 (Código Tributário Nacional – CTN), sustenta que: (i) a base de cálculo do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) não está vinculada à do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), pois, enquanto o valor venal para fins de determinação do cálculo do ITBI deve refletir o valor real de mercado, o valor venal utilizado no lançamento do IPTU é “atribuído por estimativa”; (ii) a Administração, com base em levantamento de valores de mercado dos imóveis, pode, desde logo, desconsiderar o valor da transação declarado, porquanto supostamente “não digno de fé”, e arbitrar a base de cálculo do ITBI, cabendo ao contribuinte impugnar tal fixação mediante apresentação de prova em contrário.

É o que se retira das seguintes razões recursais, in verbis (e-STJ fls. 136/141):

É evidente que a interpretação adequada do artigo 38 do Código Tributário Nacional, apesar de o texto se utilizar da expressão valor venal para delinear a base de cálculo, assim como o artigo 33 faz para o IPTU, não é a de que se exige identidade entre o valor venal para fins de IPTU e para fins de ITBI.

Isso porque o valor venal para fins de ITBI deve refletir o valor real de mercado pelo qual se deu a transação imobiliária.

Na mesma toada, é possível à administração, que realize levantamento de valores de mercado dos imóveis, presumindo-se, salvo prova em contrário, mediante devida impugnação, que a transação se deu por tal montante.

Tal raciocínio encontra abrigo no artigo 148 do CTN, afinal se o contribuinte em sede de autolançamento atribui à transação um valor que não é digno de fé deve o fisco arbitrá-lo.

O fato de, ao arbitrar o valor devido, a administração se utilizar de critérios previamente conhecidos, ainda que trazidos por ato infralegal, não impede, aos olhos do citado dispositivo de lei complementar, que se considere válido tal proceder.

Ora, se o agente fiscal, ao arbitrar um valor de mercado pode se utilizar até mesmo de pesquisas em sites de venda, porque não poderia se valer de estudos prévios de valor de mercado elaborados pela administração?

Pensar em sentido contrário nos levaria ao cúmulo do contrasenso, afinal, imaginem Excelências, se o critério utilizado para o arbitramento nos termos do artigo 148 tivesse de estar detalhado em lei como faria o Auditor de Fronteira para arbitrar o preço de uma novidade tecnológica lançada há dias pela qual o viajante declara ter pago centavos ao ingressar no país?

Com efeito, a previsão de critérios objetivos de arbitramento ou de valores de mercado em ato infra legal é conduta que observa o disposto no artigo 38 do Código Tributário Nacional, que estabelece a base de cálculo do imposto como o valor venal dos bens ou direitos onerosamente transmitidos.

Portanto, esse é o valor venal: perceba-se, a base de cálculo do ITBI não é o valor da operação nem o valor arbitrado para o IPTU, que pode representar valor diverso, conforme já decidido por esse C. Superior Tribunal de Justiça:

[…]

De fato, embora a base de cálculo do IPTU e a base de cálculo do ITBI sejam a mesma, isto é, o valor venal do imóvel, não se pode perder de vista que, ao contrário do decidido no v. acórdão recorrido, cada qual possui um regime jurídico próprio.

Assim é que somente o ITBI é sujeito ao autolançamento, ficando sujeito ao lançamento por homologação ou de ofício, enquanto que o lançamento do IPTU é efetuado, desde o início, de ofício pelo FISCO.

Afigura-se inviável, por óbvio, ao FISCO, efetuar uma perícia para cada imóvel da cidade. Então, para o IPTU, o valor é atribuído POR ESTIMATIVA. Em regra, quase que absoluta, a estimativa fica abaixo do verdadeiro valor venal. Isso se dá até por um princípio de justiça: estima-se para baixo, não para cima. Esse valor atribuído por estimativa deveria ser o valor venal.

Se o contribuinte impugna a estimativa, e a legislação municipal estabelece um prazo para que ele o faça, efetua-se regular avaliação e apura-se se o valor estimado é ou não o correto, ou seja, corresponde ou não ao valor de mercado. Em relação ao ITBI, diferente do que ocorre com o IPTU, há autolançamento do tributo pelo contribuinte tanto que caso constatado que a base de cálculo utilizada não corresponda ao efetivo valor de mercado por ocasião da transação, o FISCO deve proceder ao lançamento complementar de ofício.

Como se vê, valor venal é sinônimo de “valor de mercado”, é o valor que o bem possui no mercado, se posto à venda, em condições normais.

[…]

E, em assim sendo, a Administração disponibiliza ao contribuinte, desde logo, com base em elementos objetivos e concretos existentes em seus cadastros acerca de pesquisas no local, levando em consideração imóveis com as mesmas características do imóvel em discussão, qual o valor venal corretamente estimado no momento, isto tudo respeitado o devido processo legal, mediante possibilidade de avaliação especial, caso discorde o interessado do referido valor apontado, tudo como previsto na citada legislação em comento.

Como se vê, a correta compreensão do regime jurídico do ITBI deixa claro que a sistemática eleita não violou o princípio da legalidade, não criou nova base de cálculo para o tributo, não transformou o autolançamento em lançamento de ofício, simplesmente possibilitou ao contribuinte requerer, em seu benefício, a prévia avaliação do imóvel.

A lei determina que a base de cálculo é o valor venal. A apuração dá-se pela avaliação de engenharia. A lei não indica, à exaustão, os critérios a serem adotados pelos engenheiros e fiscais para a apuração desse valor. Nem pode: por óbvio, a apuração do valor venal depende de várias circunstâncias, localização do bem, existência de imóveis paradigmas para comparação, existência ou não de serviços públicos no local, etc.

Cumpre notar, que o banco de dados da Administração Municipal conta com mais de 300 mil amostras, com a coleta de informações junto a mais de 100 Imobiliárias, sendo a apuração do valor, consolidada em normas técnicas (ABNT, IBAPE/SP, Comissão de Peritos Judiciais) e se opera com extremo conservadorismo, ou seja, de plano, aplica-se um abatimento da ordem de 10%, sendo certo, ainda, que os levantamentos são acompanhados pela CMVI.

A bem da verdade, essa sistemática evita que o contribuinte inadvertidamente recolha, como vinha ocorrendo na imensa maioria dos casos, não o valor venal, mas simplesmente o valor tido como mínimo legal (que era o valor venal adotado para fins de IPTU) ou mesmo o valor da operação, tornando, assim, remota a hipótese de vir a ser surpreendido com o lançamento complementar de ofício, com os acréscimos decorrentes em razão de eventual insuficiência do primeiro recolhimento quando do exame do FISCO para fins de homologação do auto lançamento levado a efeito.

Registre-se que esse novo procedimento não altera a natureza do lançamento, pois o tributo continua sendo recolhido antecipadamente pelo contribuinte, ficando sujeito à posterior homologação pelo Fisco. Ou seja, tal regulamentação apenas indica ao contribuinte um procedimento para se apurar o valor venal do bem a fim de calcular o ITBI.

Enfim, não se altera ou majora a base de cálculo que continua sendo o valor venal do bem, previamente estimado com vistas a tornar mais eficiente e benéfico o procedimento para ambas as partes. (Grifos acrescidos).

Depois de apresentadas as contrarrazões (e-STJ fls. 160/171), o Tribunal de origem inadmitiu o apelo raro, o que motivou o manejo do correspondente agravo pela municipalidade (e-STJ fls. 176/188).

Já nesta Corte Superior, num primeiro momento, a Presidência decidiu conhecer do agravo para não conhecer do recurso especial (e-STJ fls. 197/198).

Na sequência, a Presidência acolheu embargos de declaração para tornar sem efeito a decisão impugnada, determinando a distribuição dos autos (e-STJ fls. 210/211).

Como relator, determinei a conversão do agravo em recurso especial (e-STJ fls. 225/226).

A Primeira Seção, em sessão virtual findada em 05/10/2021, decidiu por afetar o julgamento desse recurso especial à sistemática dos repetitivos, em conformidade com os arts. 987 do CPC/2015, c/c o art. 256-H do RISTJ, para “definir: a) se a base de cálculo do ITBI está vinculada à do IPTU; b) se é legítima a adoção de valor venal de referência previamente fixado pelo fisco municipal como parâmetro para a fixação da base de cálculo do ITBI”.

O digno representante do Ministério Público Federal opina pelo provimento do recurso para a “fixação da tese favorável à dissociação entre o valor venal do imóvel para fins de cálculo do ITBI e do IPTU, bem como pela ilegitimidade da adoção do valor venal de referência previamente fixado pelo fisco como parâmetro”.

Por meio de decisão proferida em 15/02/2022, indeferi o pedido da Associação Brasileira de Advocacia Tributária – ABAT para ingressar no feito como amicus curiae (e-STJ fls. 293/294).

É o relatório.

VOTO

Cuidam os autos de incidente de resolução de demandas repetitivas suscitado pela empresa recorrida, FORTRESS NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS LTDA., originário da Apelação Cível n. 1008270-75.2016.8.26.0053.

Na decisão em que admitiu o incidente, em 23/04/2018, o órgão julgador, Turma Especial de Direito Público do TJ/SP, assumiu o julgamento da causa, determinando a suspensão do andamento da apelação (e-STJ fls. 58/52).

Essa determinação de suspensão, todavia, não foi observada, tendo a 14ª Câmara de Direito Público do TJ/SP realizado o julgamento da apelação em 28/06/2018, aliás, antes mesmo de o 7º Grupo de Direito Público do TJ/SP ter resolvido o IRDR (23/05/2019). Esse acórdão da apelação ensejou a interposição de recurso especial, já decidido por esta Corte Superior nos autos do AREsp 1.493.616/SP, com trânsito em julgado em 28/02/2020.

Nada obstante o prosseguimento do processo piloto, o IRDR veio a ser julgado, estando assim grafada a tese jurídica na conclusão do acórdão recorrido: “FIXARAM A TESE JURÍDICA DA BASE DE CÁLCULO DO ITBI, DEVENDO SER CALCULADO SOBRE O VALOR DO NEGÓCIO JURÍDICO REALIZADO E, SE ADQUIRIDO EM HASTAS PÚBLICAS, SOBRE O VALOR DA ARREMATAÇÃO OU SOBRE O VALOR VENAL DO IMÓVEL PARA FINS DE IPTU, AQUELE QUE FOR MAIOR, AFASTANDO O VALOR DE REFERÊNCIA”.

Essa conclusão foi assim fundamentada pela Corte a quo (e-STJ fls. 117/122):

O caso sub judice visa discutir e determinar a correta base de cálculo a ser utilizada pelos Municípios do Estado de São Paulo, quando do lançamento tributário do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).

Em relação à base de cálculo do ITBI, cumpre observar que é ilegal a instituição de um valor venal distinto daquele utilizado para o IPTU, uma vez que implica em afronta ao princípio da segurança jurídica.

É que valor venal “É o valor de venda, ou o valor mercantil, isto é, o preço por que as coisas foram, são ou possam ser vendidas” (De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, 27ª ed., p. 1.461, Rio de Janeiro, Forense, 2008).

Nesse sentido, não obstante o IPTU e o ITBI possuam regimes jurídicos próprios, tendo ambos a mesma base de cálculo definida em lei complementar (arts. 33 e 38 do CTN), não pode o legislador ordinário diferenciar a expressão monetária do valor venal conforme se refira à propriedade ou à transmissão do bem ou do direito.

Assim, configura afronta ao princípio da segurança jurídica (art. 5º, caput, da CF) e ao da legalidade estrita (arts. 37, caput e 150, I, da CF), caso, no mesmo exercício, a Prefeitura Municipal adote um valor venal para o cálculo do IPTU e outro, valor venal, mais elevado, para o cálculo do ITBI.

Ademais, caso a Administração Pública pretenda majorar o valor venal dos imóveis, inclusive para corrigir eventual defasagem, deve proceder à revisão da planta genérica de valores, sendo que o valor alcançado deve valer para todo o exercício fiscal.

Nesse sentido leciona Hugo de Brito Machado: “A base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos (CTN, artigo 38)”.

Não é o preço de venda, mas o valor venal. A diferença entre preço e valor é relevante. O preço é fixado pelas partes, que em princípio são livres para contratar. O valor dos bens é determinado pelas condições do mercado. Em princípio, pela lei da oferta e da procura” (‘Curso de Direito Tributário’, 7ª ed., Malheiros, 1993, na pág. 291).

E, ainda, para Kiyoshi Harada: “O valor venal de imóvel urbano é aquele encontrado segundo a legislação pertinente ao imposto predial e territorial urbano e é revisto ou atualizado anualmente”.

“De fato, a legislação do IPTU dispõe de critério objetivo para apuração do valor venal, bem como de mecanismo para manter atualizado esse valor apurado em 1º de janeiro de cada exercício. Nada justifica apuração de outro valor venal para o mesmo imóvel, só para o efeito de ITBI. A própria legislação estadual para cobrança do imposto sobre transmissão causa mortis determina a utilização da base de cálculo do IPTU ou do ITR, conforme se trate, respectivamente, de imóvel urbano ou rural, ressalvado aos interessados o direito de requererem avaliação judicial (art. 15 da Lei nº 9.591, de 30-12– 66).” (in “Direito Tributário Municipal”, segunda edição, São Paulo, Editora Atlas, páginas 94 e 96).

A respeito do tema escreveu Aires Fernandino Barreto:

A base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos ou cedidos. O valor venal é necessariamente o valor do negócio realizado. A Constituição e o Código Tributário Nacional não exigem que o valor venal coincida com o valor da efetiva transação imobiliária, onde até os fatores subjetivos poderiam interferir na sua fixação. “…” Não se olvide que valor venal é o preço provável que o imóvel alcançará para compra e venda à vista, diante de mercado estável e quando comprador e vendedor têm plena consciência do potencial de uso e ocupação que ao imóvel pode ser dado. Não se esqueça que o valor venal é mensuração extremamente difícil, porque influenciada por uma série de fatores internos e externos, de natureza subjetiva, o que impede seja transformada em número inconteste. Muito cuidado deve ter o aplicador da lei para que não extrapassar o valor dos imóveis” (in “Curso de Direito Tributário Municipal”, Editora Saraiva, 2009, páginas 294 e 295).

Sobre o princípio da legalidade tributária, vale ainda destacar as lições de Luis Eduardo Schoueri:

(…) não se contenta o legislador complementar em exigir que o tributo seja genericamente previsto na lei; tampouco lhe basta a definição da hipótese tributária na lei; também o consequente normativo, isto é o an e o quantum debeatur, representados pela definição do sujeito passivo, da base de cálculo e da alíquota, todos devem ser previstos na própria lei (‘Direito Tributário’. São Paulo: Saraiva, 2011, p.280).

Aliás, já decidiu este Tribunal, especificamente sobre o valor venal para a cobrança do ITBI instituído no Município de São Paulo pelo Decreto nº 46.228/05 e, posteriormente, pela Lei nº 14.256/06, verbis:

Apelação. ITBI. Existência de dois valores venais para um mesmo imóvel, um para cálculo do valor de IPTU, outro para o ITBI. Decreto Municipal 46.228/05 e Lei Municipal 14.256/06. Ilegalidade. Recursos não providos (TJSP 18ª Câmara de Direito Público Apelação com revisão n.º 806.295.5/8– 00 rel. Des. Jair Martins j. 28.11.08).

No mesmo sentido: TJSP 18ª Câmara de Direito Público Ap. n.º 798.358.5/7– 000 rel. Des. Beatriz Braga j. 28.1.09; TJSP 15ª Câmara de Direito Público 570.214.5/8-00 rel. Des. Eutálio Porto j. 29.1.09.

Nesse sentido, é a Jurisprudência:

APELAÇÃO CÍVEL Mandado de Segurança Preventivo ITBI Preliminares de falta de interesse de agir e inadequação da via eleita afastadas Existência de dois valores venais para o mesmo imóvel, diante da edição da Lei Municipal nº 14.256/06Impossibilidade Precedentes A base de cálculo do ITBI encontra-se definida sobre dois parâmetros: ou é o valor venal do qual o contribuinte já tem prévio conhecimento e é definido pela Fazenda Pública, ou então é o valor indicado no instrumento de venda e compra, sendo defeso ao Município surpreender o contribuinte com outro valor que não reflita nenhuma destas realidades Impossibilidade de arbitramento de outro valor por outro parâmetro Sentença mantida Recursos oficial e voluntário da Municipalidade não providos, nos termos do acórdão.”(TJSP. 14ª Câmara de Direito Público. Apelação nº 1000337-22.2014.8.26.0053; rel. Des. Silvana M. Mollo; j. 05/02/2015).

APELAÇÃO Base de cálculo de ITBI Artigo 35 do CTN dispõe que é o valor venal do bem imóvel – Utilização, para fins de tributação, do valor venal utilizado para a cobrança do IPTU ou valor do negócio traduzido no instrumento de transmissão, o que for maior Precedentes RECURSO PROCEDENTE.”(TJSP. 14ª Câmara de Direito Público. Apelação / Reexame Necessário nº 1001992-29.2014.8.26.0053; rel. Des. Mônica Serrano; j. 11/12/2014).

A propósito, o Órgão Especial, no julgamento a Arguição de Inconstitucionalidade n° 0056693-19.2014.8.26.0000, reconheceu a inconstitucionalidade dos artigos 7º-A, 7º-B e 12, da Lei nº 11.154/91, do Município de São Paulo, acrescido pela Lei municipal nº 14.256/2006, permanecendo a validade do artigo 7°, conforme ementa vazada nos seguintes termos:

“INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE – Artigo 7º da Lei nº 11.154, de 30 de dezembro de 1991, com a redação dada pelas Leis nºs 14.125, de 29 de dezembro de 2005, e 14.256, de 29 de dezembro de 2006, todas do Município de São Paulo, que estabelece o valor pelo qual o bem ou direito é negociado à vista, em condições normais de mercado, como a base de cálculo do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) – Acórdão que, a despeito de não manifestar de forma expressa, implicitamente também questionou as disposições dos artigos 7º-A, 7º-B e 12 da mesma legislação municipal Valor venal atribuído ao imóvel para apuração do ITBI que não se confunde necessariamente com aquele utilizado para lançamento do IPTU – Precedentes do STJ Previsão contida no aludido artigo 7º que, nessa linha, não representa afronta ao princípio da legalidade, haja vista que, como regra, a apuração do imposto deve ser feita com base no valor do negócio jurídico realizado, tendo em consideração as declarações prestadas pelo próprio contribuinte, o que, em princípio, espelharia o “real valor de mercado do imóvel” – “Valor venal de referência”, todavia, que deve servir ao Município apenas como parâmetro de verificação da compatibilidade do preço declarado de venda, não podendo se prestar para a prévia fixação da base de cálculo do ITBI Impossibilidade, outrossim, de se impor ao sujeito passivo do imposto, desde logo, a adoção da tabela realizada pelo Município – Imposto municipal em causa que está sujeito ao lançamento por homologação, cabendo ao próprio contribuinte antecipar o recolhimento Arbitramento administrativo que é providência excepcional, da qual o Município somente pode lançar mão na hipótese de ser constatada a incorreção ou falsidade na documentação comprobatória do negócio jurídico tributável – Providência que, de toda sorte, depende sempre da prévia instauração do pertinente procedimento administrativo, na forma do artigo 148 do Código Tributário Nacional, sob pena de restar caracterizado o lançamento de ofício da exação, ao qual o ITBI não se submete Artigos 7º-A e 7º-B que, nesse passo, subvertem o procedimento estabelecido na legislação complementar tributária, em afronta ao princípio da legalidade estrita, inserido no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal – Inadmissibilidade, ainda, de se exigir o recolhimento antecipado do tributo, nos moldes estabelecidos no artigo 12 da Lei Municipal nº 11.154/91, por representar violação ao preceito do artigo 156, inciso II, da Constituição Federal – Registro imobiliário que é constitutivo da propriedade, não tendo efeito meramente regularizador e publicitário, razão pela qual deve ser tomado como fato gerador do ITBI Regime constitucional da substituição tributária, previsto no artigo 150, § 7º, da Constituição Federal, que nem tem lugar na espécie, haja vista que não se cuida de norma que autoriza a antecipação da exigibilidade do imposto de forma irrestrita – Arguição acolhida para o fim de pronunciar a inconstitucionalidade dos artigos 7º-A, 7º– B e 12, da Lei nº 11.154/91, do Município de São Paulo.” (g. n.) (Des. Rel. Paulo Dimas Mascaretti, Órgão Especial, Data do julgamento: 25/03/2015).

Por essas razões, a base de cálculo do ITBI deve corresponder ao valor venal do bem imóvel transferido e, caso este valor seja inferior ao da negociação, deve prevalecer este último.

Ocorrendo isto, pelo meu voto, no julgamento do incidente, FIXO A TESE JURÍDICA DA BASE DE CÁLCULO DO ITBI, DEVENDO CORRESPONDER AO VALOR VENAL DO IMÓVEL OU AO VALOR DA TRANSAÇÃO, PREVALECENDO O QUE FOR MAIOR.

Por derradeiro, considera-se prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional, observando-se que é pacífico no Superior Tribunal de Justiça que, tratando-se de pré-questionamento, é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido decidida.

E mais, os embargos declaratórios, mesmo para fins de prequestionamento, só são admissíveis se a decisão embargada estiver eivada de algum dos vícios que ensejariam a oposição dessa espécie recursal (EDROMS-18205/SP, Ministro FELIX FISCHER, DJ-08.05.2006 p.240). (Grifos no original).

Feito esse breve histórico processual, passo ao exame do recurso especial propriamente dito.

ADMISSIBILIDADE

Preliminarmente, reitero as razões expostas no juízo de afetação quanto ao preenchimento dos pressupostos de admissibilidade do recurso especial repetitivo referentes ao prequestionamento das teses e dos dispositivos de lei federal suscitados (arts. 38 e 148 do CTN) e da necessária multiplicidade de feitos de mesmo objeto.

Isso porque as questões jurídicas que serão equacionadas pelo Superior Tribunal de Justiça referem-se à possibilidade de a base de cálculo do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI corresponder ao valor venal do imóvel utilizado para a aferição do Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana – IPTU e à inviabilidade de adoção de valor de referência fixado previamente pela Fazenda municipal como parâmetro para o cálculo do ITBI.

Considerando que o acórdão recorrido decidiu pela impossibilidade de utilização de base de cálculo para o ITBI diferente daquela utilizada para o IPTU, verifica-se o prequestionamento expresso da tese relativa à vinculação da base de cálculo desses tributos (art. 38 do CTN) e, por prejudicialidade, o prequestionamento implícito da tese referente à possibilidade de o fisco utilizar de prévio valor de referência para o arbitramento da base de cálculo (art. 148 do CTN), tanto o é que, na definição da tese registrada na parte dispositiva do acórdão, está expressamente afastada a possibilidade de adoção desse valor de referência.

Quanto à multiplicidade de demandas que envolvem a controvérsia, ressalto que o fato de o recurso especial se originar de acórdão proferido em incidente de demandas repetitivas evidencia o volume expressivo de feitos de igual teor, sendo certo, ainda, que o art. 987, § 2º, do CPC/2015 determina que a tese firmada no julgamento do recurso especial manejado contra acórdão de IRDR “será aplicada no território nacional a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito”.

Merece maior atenção, entretanto, a análise do pressuposto constitucional contido no art. 105, inciso III, da Carta Política, relativo à existência de causa decidida em única ou última instância.

Conforme dito acima, o TJ/SP cindiu o julgamento do processo, vindo a proferir um acórdão no IRDR, para firmar a tese, e outro na apelação, para decidir o caso concreto, em desatenção à regra contida no parágrafo único do art. 978 do CPC/2015: “O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente.”

Assim, julgada a causa pelo Tribunal de origem, com exaurimento de instância, preenchido está tal requisito constitucional, sendo desinfluente o fato de órgãos diversos de um mesmo tribunal terem examinado em momentos diferentes a tese jurídica e o caso concreto.

Cumpre ressaltar que o novo Código de Processo Civil prestigia de tal modo a uniformização da jurisprudência, sua estabilidade, integridade e coerência (art. 926, caput), especialmente por meio de precedentes obrigatórios, que permite o julgamento do mérito do IRDR mesmo nos casos de “desistência ou abandono do processo” originário (art. 976, § 1º).

Nesse panorama, eventual equívoco procedimental cometido pela Corte estadual não pode prejudicar o interesse de parte, no caso, da Fazenda Pública municipal, de rever a tese jurídica firmada no julgamento do IRDR, que, como cediço, orienta, com caráter vinculativo, o julgamento de feitos idênticos.

Acrescento, por oportuno, que a situação dos autos é distinta daquela tratada no julgamento do ProAfR no Recurso Especial n. 1.881.272/RS, publicado no DJe de 26/11/2021, em que fiquei como relator para o acórdão. Nessa ocasião, verificou-se que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu tese jurídica sob o rito do IRDR sem que tivesse havido qualquer julgamento acerca do caso concreto, o qual nem sequer era de sua competência, por se tratar de matéria afeta aos Juizados Especiais Federais. Já na hipótese ora em exame, houve enfrentamento do caso concreto pela Corte de origem, não obstante tenha ocorrido em separado, o que demonstra a diferença entre os dois cenários.

Satisfeitos, portanto, todos os requisitos processuais de admissibilidade, conheço do recurso especial, passando, doravante, ao exame de seu mérito.

MÉRITO

Conforme relatado, por ocasião do juízo de afetação desse recurso especial à sistemática dos repetitivos, a Primeira Seção assim identificou as questões de direito a serem dirimidas: “Definir: a) se a base de cálculo do ITBI está vinculada à do IPTU; b) se é legítima a adoção de valor venal de referência previamente fixado pelo fisco municipal como parâmetro para a fixação da base de cálculo do ITBI.

A solução desses dois pontos controvertidos passa, necessariamente, pelo estudo acerca da modalidade de lançamento desse imposto, o qual tem início com a análise de seu fato gerador, previsto no art. 35 do CTN:

Art. 35 do CTN: O imposto, de competência dos Estados, sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos tem como fato gerador:

I – a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil;

II – a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia;

III – a cessão de direitos relativos às transmissões referidas nos incisos I e II

Parágrafo único. Nas transmissões causa mortis, ocorrem tantos fatos geradores distintos quanto sejam os herdeiros quanto ou legatários.

[…] (Grifos acrescidos).

Quanto à base de cálculo do ITBI, o art. 38 do CTN dispõe que ela é “o valor venal dos bens ou direitos transmitidos” (Grifos acrescidos).

Como visto, o art. 35 do CTN é claro ao identificar o fato gerador como sendo a transmissão da propriedade ou de direitos reais imobiliários ou a cessão de direitos relativos a tais transmissões.

Em sendo a transmissão ou a cessão realizada entre vivos, caso do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), temos que o fato gerador do imposto decorre de um negócio jurídico, porque nasce de um acordo de vontades entre o alienante e o adquirente.

No que tange à base de cálculo, a expressão “valor venal” contida no art. 38 do CTN deve ser entendida como o valor considerado em condições normais de mercado para as transmissões imobiliárias.

Nesse sentido, os seguintes julgados:

ITBI. BASE DE CÁLCULO. VALOR DE MERCADO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 535, II, E 458, II, DO CPC. INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO DO ART. 146 DO CTN. INOCORRÊNCIA. REEXAME DE PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL.

INADMISSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

I – Compulsando os autos, observo que todos os pontos alavancados pela ora agravante nos embargos declaratórios perante o tribunal a quo foram devidamente analisados pelo v. acórdão.

II – A suposta violação ao art. 146 do CTN não foi devidamente prequestionada. O efeito devolutivo integral do reexame necessário não tem o condão de prequestionar toda a matéria, conforme aduz a agravante. Ademais, o Município foi sucumbente apenas no tocante à inconstitucionalidade das alíquotas progressivas. No ponto, completamente descabida a argumentação da agravante. Esta, em suas razões de apelação, ao não apresentar a referida matéria ao Tribunal a quo, impossibilitou sua apreciação. Na via do apelo especial, não se pode apreciar matéria não debatida pelo tribunal a quo, sob pena de se incorrer em supressão de instância.

III – É cediço na doutrina majoritária e na jurisprudência dessa Corte que a base de cálculo do ITBI é o valor real da venda do imóvel ou de mercado, sendo que até nos casos em que não houve recolhimento, pode-se arbitrar o valor do imposto, por meio de procedimento administrativo fiscal, com posterior lançamento de ofício. Segundo HUGO DE BRITO MACHADO: em se tratando de imposto que incide sobre a transmissão por ato oneroso, tem-se como ponto de partida para a determinação de sua base de cálculo na hipótese mais geral, que é a compra e venda, o preço. Este funciona no caso, como uma declaração de valor feita pelo contribuinte, que pode ser aceita, ou não, pelo fisco, aplicando-se, na hipótese de divergência, a disposição do art. 148 do CTN. ( “CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO”, Machado, Hugo de Brito, Ed. Malheiros, 29ª Edição, p. 398)

IV – Conforme consignado no v. acórdão, houve a devida intimação da complementação do lançamento, fato que a agravante alega não ter ocorrido. Entretanto, a análise da alegada irregularidade do procedimento administrativo fiscal demanda reexame de provas, o que é inadmissível pela via eleita do especial, a teor da Súmula 07/STJ.

V – Agravo regimental improvido.

(AgRg no REsp 1057493/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/08/2008, DJe 04/09/2008) (Grifos acrescidos).

ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROVIMENTO N.° 05/2002 DA CORREGEDORIAGERAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA. AUSÊNCIA DE ATRIBUIÇÕES PARA INTERFERIR NA FIXAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO ITBI. ILEGALIDADE.

(…)

2. O “valor venal”, base de cálculo do ITBI, é o valor de mercado do imóvel transacionado, que pode, ou não, coincidir com o valor real da operação.

(…)

(RMS 36.966/PB, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 06/12/2012)

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ITBI. BASE DE CÁLCULO. APURAÇÃO POR ARBITRAMENTO AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZATIVOS DA MEDIDA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. O preço efetivamente pago pelo adquirente do imóvel tende a refletir, com grande proximidade, seu valor venal, considerado como o valor de uma venda regular, em condições normais de mercado.

Todavia, se o valor apresentado pelo contribuinte no lançamento do ITBI (por declaração ou por homologação) não merece fé, o Fisco igualmente pode questioná-lo e arbitrá-lo, no curso de regular procedimento administrativo, na forma do art. 148 do CTN.

Precedentes.

Agravo regimental improvido.

(AgRg no AREsp 847.280/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 17/03/2016) (Grifos acrescidos).

Importa ressaltar que, embora seja possível dimensionar o valor médio dos imóveis no mercado, segundo critérios, por exemplo, de localização e tamanho (metragem), a avaliação de mercado específica de cada imóvel transacionado pode sofrer oscilações para cima ou para baixo desse valor médio, a depender, por exemplo, da existência de outras circunstâncias igualmente relevantes e legítimas para a determinação do real valor da coisa, como a existência de benfeitorias, o estado de conservação os interesses pessoais do vendedor (necessidade da venda para despesas urgentes, mudança de investimentos, etc.) e do comprador (escassez do imóvel na região, proximidade com o trabalho e/ou com familiares, etc.) no ajuste do preço.

Especificamente no caso de alienação por hasta pública, salvo hipóteses de preço vil, o valor da arrematação corresponde ao valor de mercado, pois presume-se que esses mesmos fatores foram ponderados pelo arrematante para a realização de seu lance.

Aqui não se está afirmando que o preço de venda necessariamente reflete o valor de mercado, pois eventual alienação por preço nitidamente incompatível com este (valor de mercado), independentemente de sua motivação, não permite a adoção dele (o preço de venda) como parâmetro para definição da base de cálculo.

Dito isso, agora é possível passar para o exame da modalidade de lançamento do ITBI, temática largamente discutida na doutrina e na jurisprudência.

Após cuidadosa reflexão, cheguei à conclusão de que o ITBI, em razão de seu fato gerador, somente comporta duas das modalidades de lançamento originário: por declaração ou por homologação, a depender da legislação municipal de cada ente tributante, sendo inviável ao fisco proceder, de antemão, ao seu lançamento de ofício.

Se a norma local exigir prévio exame das declarações do contribuinte pela Administração para a constituição do crédito tributário, estaremos diante de um lançamento por declaração.

Nessa modalidade de lançamento, em face do princípio da boa-fé objetiva, presume-se que o valor da transação declarado pelo contribuinte está condizente com o valor venal de mercado daquele específico imóvel, presunção que somente pode ser afastada pelo fisco se esse valor se mostrar, de pronto, incompatível com a realidade, a justificar a instauração do procedimento próprio para o arbitramento da base de cálculo, em que assegurado ao contribuinte o contraditório necessário para apresentação das peculiaridades que justificariam o quantum informado.

Essa é a inteligência dos arts. 147 e 148 do CTN:

Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.

§ 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.

§ 2º Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela.

Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.

Entretanto, se a legislação municipal disciplinar que caberá ao contribuinte apurar o valor do imposto e efetuar o seu pagamento antecipado sem prévio exame do ente tributante, estaremos diante de um lançamento por homologação. Nessa hipótese, a Administração terá o prazo decadencial de cinco anos para proceder à revisão do pagamento realizado (que também engloba o exame acerca da correção da base de cálculo adotada), sem a qual o lançamento estará tacitamente homologado e, portanto, terá caráter definitivo.

Tanto o lançamento por declaração quanto o (lançamento) por homologação estão justificados pelas inúmeras circunstâncias já referidas que podem interferir no específico valor de mercado de cada imóvel transacionado, circunstâncias cujo conhecimento integral somente os negociantes têm ou deveriam ter para melhor avaliar o real valor do bem quando da realização do negócio.

E aqui reside a principal razão da impossibilidade prática da realização do lançamento originário de ofício, ainda que autorizado pelo legislador local, pois o fisco não tem como possuir, previamente, o conhecimento de todas as variáveis determinantes para a composição do valor do imóvel transmitido, in concreto.

Assim, repita-se, não dispondo de todos os elementos fáticos necessários ao juízo de certeza quanto ao valor do imóvel transmitido, não há como a Administração dispensar a participação do contribuinte no procedimento regular de constituição do crédito para estabelecer, antecipada e unilateralmente, a base de cálculo.

Constata-se, dessa forma, que, dadas as características próprias do fato gerador desse imposto, a sua base de cálculo deverá partir da declaração prestada pelo contribuinte, ressalvada a prerrogativa da administração tributária de revisá-la, antes ou depois do pagamento, a depender da modalidade do lançamento, desde que instaurado o procedimento administrativo próprio, em que deverá apurar todas as peculiaridades do imóvel (benfeitorias, estado de conservação, etc.) e as condições que impactaram no caráter volitivo do negócio jurídico realizado, assegurados os postulados da ampla defesa e do contraditório que possibilitem ao contribuinte justificar o valor declarado.

Feitas essas considerações acerca da sistemática da tributação do ITBI à luz das disposições da Constituição Federal e do Código Tributário Nacional, passo, doravante, a dirimir as questões controvertidas delimitadas para o julgamento desse recurso especial repetitivo, que podem ser identificadas com as seguintes perguntas:

a) A base de cálculo do ITBI está vinculada à do IPTU?

A resposta é negativa.

Não obstante a lei se refira como base de cálculo do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e do ITBI o “valor venal”, a apuração desse elemento quantitativo difere em relação aos dois impostos, notadamente diante da distinção existente entre os fatos geradores e a modalidade de lançamento de cada um deles.

No IPTU, tributa-se a propriedade, lançando-se de ofício o imposto tendo por base de cálculo a Planta Genérica de Valores aprovada pelo Poder Legislativo local, que considera aspectos mais amplos e objetivos como, por exemplo, a localização e a metragem do imóvel.

Já no ITBI, a base de cálculo deve considerar o valor de mercado do imóvel individualmente considerado, que, como visto, resulta de uma gama maior de fatores, motivo pelo qual o lançamento desse imposto se dá, originalmente e via de regra, por declaração do contribuinte, ressalvado o direito da fiscalização tributária de revisar o quantum declarado, por meio de regular instauração de processo administrativo.

Em face disso, tem-se a impossibilidade de vinculação da base de cálculo do ITBI à estipulada para o IPTU, nem mesmo como piso de tributação, pois, repita-se, o valor adotado para fins de IPTU considera, apenas, os critérios fixados na Planta Genérica de Valores, que “são padrões de avaliação de imóveis em consonância com a metragem e com outros fatores, tais como localização, acabamento e antiguidade, ou seja, consistem em presunções relativas, no contexto da praticabilidade tributária, que auxiliam na fixação da base de cálculo desse imposto” (STF, ARE 1245097 RG, relator: MINISTRO PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 09/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-102 DIVULG 27-04-2020 PUBLIC 28-04-2020).

Tais padrões são gerais e, por isso, embora facilitem a arrecadação, desconsideram a realidade de cada operação de transmissão da propriedade imobiliária efetivamente realizada, não refletindo, portanto, o real valor de mercado da coisa.

A propósito, cumpre salientar que a Planta Genérica de Valores é estabelecida por lei em sentido estrito, para fins exclusivos de apuração da base de cálculo do IPTU, não podendo ser utilizada como critério objetivo para estabelecer a base de cálculo de outro tributo, o qual, pelo princípio da estrita legalidade, depende de lei específica.

Conclui-se, assim, pela impossibilidade de vinculação da base de cálculo desses dois impostos.

Essa é inclusive a mansa jurisprudência desta Corte Superior, conforme se verifica dos seguintes julgados:

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. ITBI. BASE DE CÁLCULO. VALOR VENAL. IPTU. VINCULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

1. “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça” (Enunciado Administrativo n. 2, sessão de 09/03/2016).

2. O entendimento de ambas as Turmas de Direito Público do STJ firmou-se no sentido de que não há ilegalidade na dissociação entre o valor venal do imóvel para fins de cálculo do ITBI e do IPTU, porquanto a apuração da base de cálculo e a modalidade de lançamento deles são diversas, não havendo, pois, vinculação de seus valores.

3. Hipótese em que restou consignado, no acórdão recorrido, a real vinculação entre as bases de cálculo do ITBI e do IPTU – em detrimento dos valores arbitrados pela municipalidade, ante a discrepância entre o valor declarado pelo contribuinte e aquele considerado como de mercado pelo ente tributante.

4. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1559834/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/10/2019, DJe 16/10/2019)

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC/1973. INEXISTÊNCIA. ITBI E IPTU. BASE DE CÁLCULO. VALOR VENAL. INEXISTÊNCIA DE VINCULAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM O ENTENDIMENTO DO STJ. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA 7/STJ.

1. Constata-se que não se configura a ofensa ao art. 535 do CPC/1973, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado.

2. O Tribunal de origem, ao dirimir a controvérsia, concluiu estar correto o valor venal do imóvel atribuído pelo município para cálculo do ITBI, tendo sido observado o disposto no art. 38 do CTN. Além disso, considerou que a base de cálculo do ITBI pode apresentar valor diverso do apurado para cálculo do IPTU.

3. O acórdão recorrido julgou em consonância com o entendimento do STJ de não haver ilegalidade na diferença entre o valor venal do imóvel para fins de cálculo do ITBI e do IPTU, porquanto a apuração da base de cálculo e a modalidade de lançamento deles são diversas, não havendo, pois, vinculação de seus valores.

4. Ademais, o exame da controvérsia, sob a ótica propugnada pela recorrente, no sentido de que o procedimento adotado pela municipalidade subverteria a sistemática prevista no art. 148 do CTN, requer revolvimento do conjunto fático-probatório, inadmissível na via especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ.

5. Recurso Especial não provido.

(REsp 1709052/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/03/2018, DJe 13/11/2018)

b) É legítima a adoção de valor venal de referência previamente estipulado pelo fisco municipal como parâmetro para a fixação da base de cálculo do ITBI?

Essa resposta também é negativa.

De início, cabe refutar a alegação da municipalidade recorrente de que a prévia adoção do valor venal de referência não modifica a modalidade de lançamento do imposto, que, segundo a edilidade, continuaria sendo por homologação.

Consoante dito antes, o lançamento do ITBI se dá por declaração ou por homologação.

No caso, diversamente do afirmado pelo município recorrente, a sua tributação do ITBI não se dá por homologação, visto que não há pagamento antecipado do imposto sem prévio exame do fisco, mas, ao contrário disso, a Administração impõe ao contribuinte o valor do crédito a ser recolhido.

Em verdade, ao fixar a base de cálculo com lastro em valor de referência previamente estabelecido, o fisco busca, de fato, realizar o lançamento de ofício do imposto, o qual, todavia, está indevidamente amparado em critérios que foram por ele escolhidos unilateralmente e que apenas revelariam um valor médio de mercado, de cunho meramente estimativo, visto que despreza as peculiaridades do imóvel e da transação que foram quantificadas na declaração prestada pelo contribuinte, que, como cediço, presume-se de boa-fé.

Além disso, a adoção desse valor de referência como primeiro parâmetro para a fixação da base de cálculo do ITBI, com a inversão do ônus da prova ao contribuinte para demonstrar o contrário, subverte o procedimento instituído no art. 148 do CTN, pois, a toda evidência, resulta em arbitramento da base de cálculo sem prévio juízo quanto à fidedignidade da declaração do sujeito passivo.

Esse denominado valor venal de referência, ou equivalente, quando muito, poderá justificar a ação fiscal para apurar a veracidade da declaração prestada, mas, em hipótese alguma, pode servir para antecipar tal juízo, porquanto, além de não abranger todas as áleas definidoras do valor de mercado daquele específico imóvel, acaba por subtrair a garantia do contraditório assegurada ao contribuinte, cujo exercício pressupõe a prévia instauração de regular processo administrativo.

Quanto à necessária observância do procedimento de arbitramento da base de cálculo preconizado no art. 148 do CTN, cito os seguintes julgados:

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 1.022 DO CPC/2015. INEXISTÊNCIA. ITBI. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. LANÇAMENTO POR DECLARAÇÃO. DIVERGÊNCIA DO FISCO QUANTO AO VALOR VENAL DECLARADO PELOS COMPRADORES DO IMÓVEL. POSTERIOR LANÇAMENTO DE OFÍCIO (SUBSTITUTIVO). AUSÊNCIA DE PRÉVIO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. ART. 148 DO CTN. NECESSIDADE DE PERÍCIA JUDICIAL.

1. Cuida-se de agravo em recurso especial, que ora se traz a julgamento em conjunto com o próprio apelo raro, como permite o art. 1.042, § 5º, do CPC/2015.

2. Versa a lide sobre pedido de repetição de indébito, em que contribuintes reivindicam do Fisco Distrital a devolução de valor de ITBI alegadamente pago a maior, no âmbito de específica aquisição imobiliária.

3. Não há ofensa aos arts. 489 e 1.022, II, do CPC/2015, quando o Tribunal de origem dirime, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos.

4. A jurisprudência do STJ já se manifestou no sentido de que, “constituindo o valor venal do bem transmitido a base de cálculo do ITBI, caso a importância declarada pelo contribuinte se mostre nitidamente inferior ao valor de mercado, pode o Fisco arbitrar a base de cálculo do referido imposto, desde que atendida a determinação do art. 148, do CTN” (REsp 261.166/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/9/2000, DJ 6/11/2000, p. 192).

5. No caso concreto, nada obstante a considerável discrepância entre o valor declarado pelos contribuintes e aquele considerado como de mercado pela entidade tributante (o Fisco arbitrou valor equivalente a quase o dobro do informado pelos compradores do imóvel), a Corte de origem entendeu dispensável a realização de prévio procedimento administrativo fiscal para fins de lançamento do ITBI, afrontando, com isso, ao art. 148 do CTN.

6. Sob pena de supressão de instância, imperioso que os autos retornem ao primeiro grau de jurisdição, a fim de se implementar a avaliação pericial do imóvel objeto da exação, em modo de prova equidistante e imparcial, capaz de subsidiar o julgador na correta apuração do valor venal do bem, enquanto base de cálculo do incidente ITBI (art. 38 do CTN), ensejando o consequente e adequado deslinde da pretensão repetitória posta na exordial.

7. Agravo em recurso especial conhecido para dar parcial provimento ao recurso especial dos contribuintes.

(AREsp 1452575/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/05/2019, DJe 27/06/2019)

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ITBI. BASE DE CÁLCULO. APURAÇÃO POR ARBITRAMENTO AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZATIVOS DA MEDIDA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. O preço efetivamente pago pelo adquirente do imóvel tende a refletir, com grande proximidade, seu valor venal, considerado como o valor de uma venda regular, em condições normais de mercado.

Todavia, se o valor apresentado pelo contribuinte no lançamento do ITBI (por declaração ou por homologação) não merece fé, o Fisco igualmente pode questioná-lo e arbitrá-lo, no curso de regular procedimento administrativo, na forma do art. 148 do CTN.

Precedentes.

2. No caso concreto, o Tribunal a quo não dissentiu de tais entendimentos, mas apenas concluiu que o impetrante não juntou documentos que infirmassem de plano a presunção de legitimidade do ato administrativo que apurou o ITBI.

3. Portanto, aferir a existência de prova pré-constituída do direito líquido e certo demandaria o reexame dos fatos e provas da causa, vedado segundo os termos da Súmula 7/STJ.

Agravo regimental improvido.

(AgRg no AREsp 847.280/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 17/03/2016)

Nesse panorama, verifica-se que base de cálculo do ITBI é o valor venal em condições normais de mercado e, como esse valor não é absoluto, mas relativo, pode sofrer oscilações diante das peculiaridades de cada imóvel, do momento em que realizada a transação e da motivação dos negociantes.

Em consequência, presume-se que o valor de mercado daquele específico imóvel corresponde ao valor da transação informado na declaração do contribuinte, com base no princípio da boa-fé, sendo que, reitera-se, essa presunção pode vir a ser afastada pelo fisco em regular processo administrativo, desde que observado o procedimento disposto no art. 148 do CTN.

DO CASO CONCRETO

Conforme já exposto quando do exame da admissibilidade do presente recurso especial representativo da controvérsia, o Tribunal de origem não observou o contido no parágrafo único do art. 978, CPC/2015, julgando o recurso relacionado ao IRDR em processo distinto, de modo que, em caráter excepcional, não há como reanalisar, nestes autos, o caso concreto.

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso especial para fixar as seguintes teses:

a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação;

b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN);

c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

É como voto. – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.937.821 – São Paulo – 1ª Seção – Rel. Min. Gurgel de Faria – DJ 03.03.2022

Fonte: INR Publicações.

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Pais que optaram pelo homeschooling devem matricular filhos em instituição de ensino

Sob o entendimento de que no Brasil é vedada a opção dos pais pelo ensino domiciliar, o juízo da Vara da Infância e Juventude Cível de Cavalcante, em Goiás, determinou que um casal matricule os quatro filhos na rede de ensino formal. De acordo com o Ministério Público, que ajuizou a ação, os pais deixaram de cumprir o direito essencial à educação, bem como a convivência social das crianças e adolescentes.

Conforme consta nos autos, os genitores alegam que o sistema educacional vigente não é eficaz, motivo pelo qual deixaram de matricular seus filhos na escola. O juiz de Direito Rodrigo Foureaux destacou que o tema já foi pacificado pelo Supremo Tribunal Federal – STF.

“O STF, no exercício da ponderação dos direitos à vida privada, à família e ao poder familiar frente ao direito à educação e à convivência domiciliar, pacificou o entendimento no sentido de que no Brasil, atualmente, é vedada a opção dos pais pelo ensino domiciliar. A vedação decorre do fato de que não há regulamentação específica acerca da matéria, exercício este que foge da função típica do Poder Judiciário”, lembrou o magistrado.

O juiz pontuou que, mesmo cientes das consequências sociais e psicológicas, os pais optaram por não matricular os filhos na escola. Segundo ele, a justificativa de falha no sistema educacional apresentada não é fundamento suficiente, na atualidade, para que os filhos deixem de frequentar o ensino formal.

Deste modo, determinou que os genitores providenciem, no prazo de 5 dias, a matrícula dos filhos em unidade escolar, sob pena de multa diária no valor de R$ 100. O número do processo não é divulgado pois tramita em segredo de justiça.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM.

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