Processo 1060602-91.2024.8.26.0100
Pedido de Providências – Registro civil de Pessoas Jurídicas – 7º Oficial de Registro de Titulos e Documentos e Civil de Pessoa Juridica da Comarca da Capital – Barros Pimentel, Alcantara Gil e Rodriguez Advogados e outro – Diante do exposto, respondo à consulta concluindo que, neste caso, correta a cobrança do valor dos emolumentos para registro do contrato apresentado pela parte com base no disposto no item 1 das Notas Explicativas da Tabela III, com enquadramento dos serviços de registro conforme os parâmetros estabelecidos na Lei Estadual n. 11.331/2002. Não havendo recurso, remeta-se à E. CGJ cópia integral dos autos para reexame e uniformização do entendimento administrativo a ser adotado no Estado de São Paulo, conforme determinam o artigo 29, § 2º, da Lei n. 11.331/2002, e o item 72.1, Cap. XIII, das NSCGJ. A presente decisão serve como ofício. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: SILVIA HACHIYA (OAB 183756/SP), WILLIAM AKIRA MINAMI (OAB 246841/SP), FLÁVIO TAMBELLINI RÍMOLI (OAB 444463/SP)
Íntegra da decisão:
SENTENÇA
Processo Digital nº: 1060602-91.2024.8.26.0100
Classe – Assunto Pedido de Providências – Registro civil de Pessoas Jurídicas
Requerente: 7º Oficial de Registro de Titulos e Documentos e Civil de Pessoa Juridica da Comarca da Capital
Juíza de Direito: Dra. Renata Pinto Lima Zanetta
Vistos.
Trata-se de consulta formulada pelo Oficial do 7º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital acerca da cobrança de emolumentos para registro de título denominado “instrumento particular de contrato de alienação fiduciária de cotas de fundo de investimento em direitos creditórios e outras avenças” (prenotação n. 2.154.485, talão n. 22.341.699).
O Oficial informa que o título foi apresentado para registro, com requerimento expresso para cobrança de emolumentos com base nos valores previstos no item 5, “d”, da Tabela III, da Lei Estadual n. 11.331/2002; que a parte interessada alega que, por se tratar de um contrato de alienação fiduciária, os emolumentos para registro devem ser cobrados nos moldes do item 5 da tabela anexa, conforme Parecer n. 157/2008E, do Processo CG 2007/29231 da E. Corregedoria Geral da Justiça; que emitiu nota devolutiva, esclarecendo que nos autos n. 0040191-83.2020.8.26.0100, que tratava de cobrança de emolumentos para registro de contrato de alienação fiduciária sobre quotas de sociedade, o Juízo da 1ª Vara de Registros Públicos decidiu que, se as partes formalizam no mesmo documento o negócio principal somado a outros negócios como garantia de alienação fiduciária, o registro será feito com base na totalidade do documento, assim como a cobrança dos emolumentos, com enquadramento no item 1 da tabela anexa da Lei de Emolumentos; que, com respaldo no referido precedente, afastou a aplicação do item 5 da tabela anexa ao caso e manteve a aplicação do item 1 da mesma tabela; que, em resposta à nota devolutiva, a interessada argumentou que a Corregedoria Geral da Justiça não conferiu força normativa ao citado precedente e que não há similitude fática entre aquele caso e o presente pedido de registro de contrato que consubstancia apenas alienação fiduciária de cotas de fundo de investimento (bem infungível), bem como requereu, alternativamente, a aplicação do item 2, notas explicativas 1.4 da tabela anexa.
O Oficial aduz que a intenção do legislador, ao instituir a regra de cobrança prevista no item 5 da tabela anexa da Lei de Emolumentos, sempre foi atender exclusivamente as hipóteses de registros de contratos acessórios de garantia sobre veículos automotores, para abranger exclusivamente contratos de garantia que envolvam financiamento da coisa móvel, corpórea, objeto da garantia, já que a base de cálculo desses emolumentos especialmente reduzidos é o valor financiado; que ficam excluídas do restrito âmbito de aplicação do desconto especial do item 5 quaisquer contratos em que as garantias se refiram a outras obrigações que não estejam relacionadas ao financiamento do próprio bem; que a interpretação do item 5 da tabela anexa, por tratar de regra tributária que confere redução especial da taxa pública, deve ser sempre restritiva, nos termos do Código Tributário Nacional; que, por razões de política econômica, o legislador estadual criou outra regra de exceção (além da prevista no item 1.4 das notas explicativas), estabelecendo, no item 5, um desconto específico para o registro do contrato acessório de garantia por alienação fiduciária, leasing ou reserva de domínio, ainda que não esteja registrado o contrato principal.
O Oficial assevera que, embora a lei não tenha expressamente limitado a aplicação do item 5 a veículos, é irrecusável que essa regra especial somente se aplica a coisas móveis (bens corpóreos), não abrangendo negócios sobre bens imateriais ou direitos, os quais não se enquadram nos conceitos de alienação fiduciária, leasing ou reserva de domínio, sendo todos esses contratos limitados a coisas móveis (bens corpóreos); que, com fulcro no artigo 29 da Lei Estadual n. 11.331/2002 e item 71, Cap. XIII, das NSCGJ, formaliza consulta para esclarecer se o título apresentado deve ser enquadrado no item 1 ou no item 5 da Tabela de Emolumentos de Registro de Títulos e Documentos (fls. 01/11).
Documentos vieram às fls. 12/55.
Nos termos do item 72.2, Cap. XIII, das NSCGJ, a parte interessada foi intimada (fls. 56).
Barros Pimentel, Alcântara Gil e Rodriguez Advogados, na qualidade de representante de Opus Assessoria e Promoções Artísticas Ltda., manifestou-se, alegando que o caso paradigma invocado pelo Oficial não tem efeito vinculante e que não há similitude fática entre o caso paradigma e o título apresentado pela requerente; que o título apresentado não é um instrumento de cessão fiduciária, pois não tem por objeto a cessão de direitos de crédito das cotas do fundo de investimento, mas transfere a propriedade fiduciária das cotas para o credor fiduciário e, portanto, o título corresponde a um instrumento de alienação fiduciária; que a cessão fiduciária é realizada sobre direitos, ao passo que a alienação fiduciária é realizada sobre bens, sejam eles corpóreos ou incorpóreos; que as cotas de um fundo de investimento ou de uma sociedade, sejam elas físicas ou escriturais, correspondem ao patrimônio de uma pessoa; que é possível desdobrar a propriedade fiduciária das cotas e, portanto, há uma alienação fiduciária; que a mesma situação não ocorreria se o negócio fiduciário envolvesse a transferência ao credor fiduciário da titularidade sobre os direitos de crédito das cotas do fundo, o que não é o caso do título, que dispõe sobre a alienação fiduciária da propriedade das cotas do fundo de investimento; que, conforme o Parecer n. 157/2008E, do Processo CG 2007/29231 da E. Corregedoria Geral da Justiça, com efeito vinculante, a cobrança de emolumentos para registro do título deve se dar pelo item 5, “d”, da Tabela III, da Lei Estadual n. 11.331/2002; que, se eventualmente afastada a aplicação do item 5, o fato é que o título é um contrato de garantia e é acessório de um contrato principal que é o “Instrumento Particular de Compromisso de Investimento do XP Opus I Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padronizados”, datado de 12.04.2024, já registrado sob o n. 1.437.623 do Livro B do 9º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital, de modo que a cobrança dos emolumentos para seu registro deve se dar pelo item 2 da Tabela de Emolumentos, dada a redação da nota explicativa 1.4 de referida tabela (fls. 66/71 e 83/84). Juntou documentos (fls. 72/82 e 85/174).
O Oficial pronunciou-se (fls. 175/176 e 177).
O Instituto de Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas do Estado de São Paulo (IRTDPJ-SP) apresentou parecer, aduzindo que a regra geral para cobrança de emolumentos é a aplicação do item 1 da tabela de emolumentos; que, em caráter excepcional, existe norma específica prevendo emolumentos especialmente reduzidos para a hipótese de registro de contrato de alienação fiduciária, leasing ou reserva de domínio, que deve ser interpretada de forma restritiva, e não pode se estendida para os contratos de cessão fiduciária em garantia, cuja natureza é diversa do contrato típico de alienação fiduciária; que o Oficial afirmou, com razão, que o negócio de alienação fiduciária é restrito a bens móveis corpóreos (coisas), de modo que resta configurado o negócio de cessão fiduciária sempre que o bem móvel dado em garantia é incorpóreo (direito); que a parte interessada, por seu turno, sustenta equivocadamente que o documento apresentado possui natureza de alienação fiduciária (e não de cessão fiduciária) porque as cotas da sociedade dadas em garantia não seriam “direitos” e sim bens móveis, e, nesse conceito de bens móveis, estariam abrangidas apenas as coisas móveis infungíveis, sejam corpóreas ou incorpóreas; que, a despeito da redação do artigo 1.361 do Código Civil, não se pode esquecer que o instituto da alienação fiduciária também está normatizado em outros diplomas legais, como é o caso da Lei n. 4.728/1965, cujo artigo 66-B, § 3º, trata expressamente da alienação fiduciária de coisa infungível e da cessão fiduciária de direitos ou títulos de crédito; que o critério fundamental de distinção entre a alienação fiduciária e cessão fiduciária está, justamente, na materialidade do bem objeto da garantia, pois, tratando-se de coisa (bem corpóreo) opera-se a alienação fiduciária e no caso de direito (bem incorpóreo) tem lugar a cessão fiduciária; que as cotas de uma sociedade são “direitos”, ou seja, bens móveis imateriais (incorpóreos); que, bem por isso, nunca se fala em compra e venda de cotas sociais, e sim em cessão de cotas sociais; que, pelo mesmo motivo, não se pode falar em alienação fiduciária de cotas sociais, e sim em cessão fiduciária de cotas sociais; que o documento apresentado a registro tem inegável natureza jurídica de cessão fiduciária, e não de alienação fiduciária, o que atrai o enquadramento no item 1 da tabela de emolumentos, afastando a regra excepcional do item 5 que tem alcance restrito, insuscetível de interpretação extensiva.
O IRTDPJ-SP manifesta que, caso seja a intenção da parte interessada efetuar a averbação desse contrato de garantia à margem do registro anterior do contrato principal, é possível requerer essa averbação ao Oficial que tenha efetuado o registro do contrato principal, caso em que a cobrança dessa averbação poderá ser afetada pela regra especial prevista no item 1.4 das notas explicativas da tabela de emolumentos; que a admissibilidade dessa averbação dependerá de qualificação registral a ser efetivada pelo 9º Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Capital, que foi quem efetuou o registro do contrato principal, sendo o único registrador competente para a proceder tal averbação; que, caso a requerente pretenda somente a averbação, deverá desistir do pedido de registro encaminhado ao 7º RTD e, então, requerer ao 9º RTD que efetue a averbação do contrato de garantia de cessão fiduciária junto ao registro n. 1.437.623, que teve por objeto o contrato principal; que é decisão exclusiva da parte interessada optar por requerer a averbação do contrato de garantia junto ao registro anterior do contrato principal ou, então, requerer um novo registro autônomo e avulso do contrato de garantia, caso em que não haverá nenhuma vinculação entre esse novo registro e o registro anterior; e que, no âmbito do Registro de Títulos e Documentos, em que não há obrigatoriedade legal do registro de documentos e que a competência registral é variável, não se mostra juridicamente possível nem razoável atribuir ao Oficial a obrigação de adivinhar a vontade do apresentante ou realizar buscas por todos os cartórios do país sem o pagamento dos respectivos emolumentos previstos em lei; que cabe exclusivamente ao requerente, sempre que quiser optar pela averbação, indicar expressamente a vontade no ato da apresentação do documento a registro, solicitando expressamente ao cartório que já tenha feito o registro anterior que proceda à averbação do novo documento junto ao registro anterior, cujo número de registro deverá ser indicado no requerimento (fls. 182/186).
O Ministério Público ofertou parecer, opinando pela aplicabilidade do item 1 da Tabela de Emolumentos no caso em apreço (fls. 190/192).
É o relatório.
FUNDAMENTO e DECIDO.
A consulta foi corretamente formulada à vista da dúvida apresentada.
No mérito, verifica-se que a posição assumida pelo Oficial está correta.
Senão vejamos.
De início, no tocante aos fundos de investimento, cumpre mencionar que a Lei n. 13.874/2019, ao acrescentar o Capítulo X à Lei n. 10.406/2002, inseriu os artigos 1368-C e seguintes no Código Civil, para regular fundos de investimento, atribuindo à Comissão de Valores Mobiliários a competência para disciplina do tema.
Tal como definido na norma, o fundo de investimento configura uma comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio de natureza especial, destinado à aplicação em ativos financeiros, bens móveis e imóveis, direitos de qualquer natureza, tais como créditos, títulos públicos e comodities, de acordo com a regra específica aplicável à categoria do fundo.
A Resolução n. 175, de 23 de dezembro de 2022, editada pela Comissão de Valores Mobiliários, dispõe sobre a constituição, o funcionamento e a divulgação de informações dos fundos de investimento, bem como sobre a prestação de serviços para os fundos. Em seu artigo 16, assim prevê: “A cota de classe aberta não pode ser objeto de cessão ou transferência de titularidade, exceto nos casos de: II – operações de cessão fiduciária”.
No caso concreto, verifica-se que o título apresentado para registro consiste em instrumento particular de contrato de alienação fiduciária de cotas de fundo de investimento em direitos creditórios e outras avenças celebrado em 12 de abril de 2024, entre Opus Assessoria e Promoções Artísticas Ltda., Laz Fundo de Investimento Multimercado, na condição de fiduciantes, e XP Opus I Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padronizados, na condição de Fundo credor, com interveniência e anuência de XP Vista Asset Management Ltda. e Airton Alberto Zaffari, por meio do qual ajustaram a propriedade fiduciária das cotas de emissão do Fundo detidas pelos fiduciantes, transferindo a propriedade resolúvel dessas cotas ao Fundo credor, em garantia do adimplemento das obrigações anteriormente assumidas pela Opus e coobrigados no âmbito do contrato nomeado “Instrumento Particular de Compromisso de Investimento do XP Opus I Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padronizados”, e referentes à obrigação de “subscrever e integralizar Cotas Mezanino C sempre que assim seja necessário para garantir o integral cronograma de Amortização e Resgate das Cotas Seniores e Cotas Mezanino A” (fls. 13/40).
Consta do título prenotado que, com o intuito de garantir o cumprimento das obrigações assumidas pela Opus e coobrigados no compromisso de investimento do Fundo XP Opus, nos termos dos artigos 1.361 e seguintes do Código Civil, do artigo 66-B da Lei n. 4.728, de 14 de julho de 1965, e do Decreto-Lei n. 911, de 1º de outubro de 1969, as partes pactuaram o contrato de alienação fiduciária.
Pelas disposições constantes do instrumento, as partes ajustaram a alienação fiduciária das cotas de emissão do Fundo atualmente detidas pelos fiduciantes, designadas no ato como “cotas alienadas” (item 1.1 – fls. 17), com a finalidade de garantia do adimplemento das obrigações assumidas pelos devedores no compromisso de investimento do Fundo XP Opus, transferindo a propriedade resolúvel de coisa móvel fungível (cotas do fundo de investimento) dos devedores, bem como pactuaram cessão fiduciária dos créditos recebíveis provenientes das cotas transferidas (cf. Item 1.1.1 – fls. 17), ao Fundo credor, até a efetiva liquidação integral das obrigações garantidas (fls. 17/18).
Note-se que, embora o contrato tenha denominado as cotas de emissão do Fundo atualmente detidas pelos fiduciantes como “cotas alienadas”, pelos termos do ajustado, somente a propriedade resolúvel dessas cotas foram transferidas ao Fundo credor, em garantia do adimplemento das obrigações assumidas pelos devedores no compromisso de investimento do Fundo XP Opus.
De acordo com o regime jurídico do Código Civil, podem ser objeto da propriedade fiduciária apenas as coisas (bens) móveis infungíveis.
A alienação fiduciária consubstancia o negócio jurídico, enquanto a propriedade fiduciária configura o direito real com escopo de garantia.
O art. 1.361 do Código Civil define a propriedade fiduciária como a propriedade resolúvel que o devedor, com a finalidade de garantir o adimplemento da obrigação assumida, transfere ao credor. Uma vez efetivado o pagamento da dívida garantida, a coisa retorna ao devedor automaticamente.
No âmbito do Mercado Financeiro de Capitais, a Lei n. 10.931/2004 acrescentou o artigo 66-B à Lei n. 4.728/1965, para admitir de modo expresso propriedade fiduciária sobre coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis e sobre direitos creditórios, nos seguintes termos (nossos destaques):
“Art. 66-B. O contrato de alienação fiduciária celebrado no âmbito do mercado financeiro e de capitais, bem como em garantia de créditos fiscais e previdenciários, deverá conter, além dos requisitos definidos na Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, a taxa de juros, a cláusula penal, o índice de atualização monetária, se houver, e as demais comissões e encargos. (Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 1° Se a coisa objeto de propriedade fiduciária não se identifica por números, marcas e sinais no contrato de alienação fiduciária, cabe ao proprietário fiduciário o ônus da prova, contra terceiros, da identificação dos bens do seu domínio que se encontram em poder do devedor.
(…)
§ 3° É admitida a alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito, hipóteses em que, salvo disposição em contrário, a posse direta e indireta do bem objeto da propriedade fiduciária ou do título representativo do direito ou do crédito é atribuída ao credor, que, em caso de inadimplemento ou mora da obrigação garantida, poderá vender a terceiros o bem objeto da propriedade fiduciária independente de leilão, hasta pública ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no pagamento do seu crédito e das despesas decorrentes da realização da garantia, entregando ao devedor o saldo, se houver, acompanhado do demonstrativo da operação realizada. (Incluído pela Lei 10.931, de 2004)
§ 4° No tocante à cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou sobre títulos de crédito aplica-se, também, o disposto nos arts. 18 a 20 da Lei no 9.514, de 20 de novembro de 1997.
§ 5° Aplicam-se à alienação fiduciária e à cessão fiduciária de que trata esta Lei os arts. 1.421, 1.425, 1.426, 1.435 e 1.436 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.”
Como resta evidente, a alienação fiduciária de coisa fungível não se confunde com a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis. Apesar de ambas exercerem a mesma função de garantia do crédito e com transmissão do domínio fiduciário ou da titularidade fiduciária ao credor enquanto perdurar a dívida garantida, os institutos distinguem-se na medida em que na alienação o objeto do contrato é uma coisa móvel fungível, ao passo que na cessão o objeto é um direito creditório.
A Lei n. 9.514/1997 dispõe sobre o contrato de cessão fiduciária em garantia, em seus artigos 18 e 19, aplicando-se à cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis (cf. artigo 66-B, § 4º da Lei n. 4.728/1965) (nossos destaques):
“Art. 18. O contrato de cessão fiduciária em garantia opera a transferência ao credor da titularidade dos créditos cedidos, até a liquidação da dívida garantida, e conterá, além de outros elementos, os seguintes:
(…)
IV – a identificação dos direitos creditórios objeto da cessão fiduciária.
Art. 19. Ao credor fiduciário compete o direito de:
I – conservar e recuperar a posse dos títulos representativos dos créditos cedidos, contra qualquer detentor, inclusive o próprio cedente;
II – promover a intimação dos devedores que não paguem ao cedente, enquanto durar a cessão fiduciária;
III – usar das ações, recursos e execuções, judiciais e extrajudiciais, para receber os créditos cedidos e exercer os demais direitos conferidos ao cedente no contrato de alienação do imóvel;
IV – receber diretamente dos devedores os créditos cedidos fiduciariamente.
§ 1º As importâncias recebidas na forma do inciso IV deste artigo, depois de deduzidas as despesas de cobrança e de administração, serão creditadas ao devedor cedente, na operação objeto da cessão fiduciária, até final liquidação da dívida e encargos, responsabilizando-se o credor fiduciário perante o cedente, como depositário, pelo que receber além do que este lhe devia.
§ 2º Se as importâncias recebidas, a que se refere o parágrafo anterior, não bastarem para o pagamento integral da dívida e seus encargos, bem como das despesas de cobrança e de administração daqueles créditos, o devedor continuará obrigado a resgatar o saldo remanescente nas condições convencionadas no contrato.”
Na hipótese telada, o título apresentado para registro compreende tanto a alienação fiduciária das cotas do fundo discriminadas no item 1.1 do contrato (fls. 17), como também engloba negócio jurídico de cessão fiduciária dos direitos creditórios sobre as cotas alienadas fiduciariamente ao Fundo credor, conforme expressamente pactuado pelas partes no item 1.1.1 do contrato:
“1.1.1 A Alienação Fiduciária compreende qualquer produto decorrente e/ou relacionado às Cotas Alienadas, inclusive todos e quaisquer valores e/ou distribuições que venham a ser pagos e/ou devidos em virtude de amortizações e/ou do resgate de tais Cotas Alienadas.”
Bem se vê, que o instrumento engloba contrato de alienação fiduciária de coisa móvel fungível e negócio jurídico de cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, os quais condicionam-se reciprocamente.
Desta maneira, para o que aqui interessa mais de perto, a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis foi pactuada para garantir o cumprimento das obrigações assumidas pelos devedores no compromisso de investimento do XP Opus I.
Observe-se que, sendo garantia para adimplemento do contrato principal, o contrato de cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, apesar de não o dizer expressamente, só pode ter o valor do montante atribuído no contrato como equivalente ao cumprimento de todas as obrigações assumidas pelos devedores, principais ou acessórias, presentes ou futuras, em R$ 120.341.000,00, a que, por evidente, visa a garantir, já que ambos os ajustes (alienação fiduciária de cotas do fundo e a cessão fiduciária de direitos creditórios), no final das contas, formam uma unidade econômica.
Estabelecidos estes pontos, passo a responder à consulta.
Os emolumentos têm por fato gerador a prestação de serviços públicos notariais e de registro previstos no artigo 236 da Constituição Federal e são regulados pela Lei Estadual n. 11.331/2002, a qual estipula tabela própria para cobrança.
Para fins de enquadramento na referida tabela, a lei determina a apuração do custo efetivo do serviço prestado, estabelecendo os seguintes parâmetros:
“Art. 7º – O valor da base de cálculo a ser considerado para fins de enquadramento nas tabelas de que trata o artigo 4º, relativamente aos atos classificados na alínea “b” do inciso III do artigo 5º, ambos desta lei, será determinado pelos parâmetros a seguir, prevalecendo o que for maior:
I – preço ou valor econômico da transação ou do negócio jurídico declarado pelas partes;”
A Lei de Emolumentos em vigor prevê um item específico, qual seja, o item 5 das Notas Explicativas da Tabela III que se aplica aos registros de quaisquer contratos de alienação fiduciária em garantia, abrangendo a propriedade fiduciária sobre coisas móveis, sem discriminação quanto ao tipo de contrato ao qual estão vinculados.
Todavia, no caso, o contrato apresentado a registro pactuou cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis. Mencione-se que a necessidade de registro de cessões fiduciárias de crédito, para constituir direito real de garantia, decorre da interpretação conjunta dos artigos 1.361, § 1º do Código Civil e artigo 66-B, § 5º da Lei n. 4.728/1965, bem como, para surtir efeitos perante terceiro, do artigo 129, item 10 da Lei de Registros Públicos.
Neste contexto, entendo que não se mostra correto o enquadramento do contrato no disposto no item 5 das Notas Explicativas da Tabela III, vez que o título não se limita ao campo material de incidência da referida norma tributária.
Também não se mostra correta a aplicação do item 1.4 das Notas Explicativas da Tabela III ao caso, pois o título apresentado a registro não tem vinculação a contratos de abertura de crédito, mútuo ou financiamento. Logo, não se amolda ao campo material de incidência da citada norma tributária.
Não se aplica, ainda, o item 1.3 das Notas Explicativas da Tabela III, por ausência de indicação no contrato sobre o valor do crédito objeto da cessão fiduciária.
Daí por que se mostra correto o cálculo dos emolumentos com base no disposto no item 1 das Notas Explicativas da Tabela III da Lei de Emolumentos: “Registro ou averbação integral de contrato, título ou documento com conteúdo financeiro.”
Registre-se que, ausente na convenção celebrada entre as partes limite para o valor da alienação fiduciária em garantia e para a cessão fiduciária de direitos creditórios, com fundamento no artigo 7º, inciso I, da Lei Estadual n. 11.331/2002, deve-se considerar o valor do negócio jurídico declarado pelas partes como equivalente ao montante total para adimplemento das obrigações garantias (R$ 120.341.000,00), ainda que outros ajustes possam ter sido firmados para a mesma finalidade.
Diante do exposto, respondo à consulta concluindo que, neste caso, correta a cobrança do valor dos emolumentos para registro do contrato apresentado pela parte com base no disposto no item 1 das Notas Explicativas da Tabela III, com enquadramento dos serviços de registro conforme os parâmetros estabelecidos na Lei Estadual n. 11.331/2002.
Não havendo recurso, remeta-se à E. CGJ cópia integral dos autos para reexame e uniformização do entendimento administrativo a ser adotado no Estado de São Paulo, conforme determinam o artigo 29, § 2º, da Lei n. 11.331/2002, e o item 72.1, Cap. XIII, das NSCGJ.
A presente decisão serve como ofício.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.
Oportunamente, ao arquivo.
P.R.I.C.
São Paulo, 26 de junho de 2024.
Renata Pinto Lima Zanetta
Juíza de Direito (DJe de 27.06.2024 – SP).
Fonte: DJE/SP.
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
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