1ªVRP/SP: Vaga de Garagem


  
 

Processo 1018452-08.2018.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1018452-08.2018.8.26.0100

Processo 1018452-08.2018.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – Noéli Ferreira Terres – Vistos.Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Noéli Ferreira Terres, após negativa de registro de escritura de doação, cujo objeto é 1/3 (um terço) da vaga de garagem de matrícula nº 25.401.O óbice se deu em razão de não possuir a donatária, suscitada no presente procedimento, propriedade de unidade autônoma no condomínio edilício onde está localizada a vaga de garagem, consoante o disposto no art. 1.331, § 1º, do Código Civil. O Oficial juntou documentos a fls. 08/59.A parte apresentou impugnação a fls. 66/72. Alegou, em síntese, que as vagas de garagem do Condomínio Metropolitano constituem unidades autônomas em edifício garagem, não sendo aplicável a regra do diploma civil evocada pelo Oficial Registrador. Juntou documentos a fls. 70/73.O Ministério Público opinou a fls. 81/83 pela procedência da dúvida.É o relatório. Decido.Com razão o Oficial e a D. Promotora de Justiça.Preliminarmente, é mister esclarecer a espécie de vaga de garagem compatível com o caso em discussão, se estão presentes os requisitos de autonomia da unidade. Mais do que apresentar elementos de uso exclusivo, como a numeração, área e fração ideal; outros fatores vinculados à vaga de garagem podem se integrar à definição do tipo jurídico adotado, como os termos da instituição de condomínio e sua convenção. Conforme lições do ilustre jurista e Registrador, Flauzilino Araújo dos Santos: “Igualmente, as restrições convencionais recebem tratamento jurídico como obrigações convencionais e gerais, complementares às legais e administrativas e quando são regularmente fixadas nos documentos arquivados nos Registros de Imóveis, se tornam restritivas porque estipuladas em proveito de toda a comunidade. Por isso tem cunho obrigatório e cogente”. (Condomínios e Incorporações no Registro de Imóveis – p. 122, ed. Mirante)Ademais, em sua obra “Condomínios e Incorporações” (11ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2014 – p. 46), Caio Mário da Silva expõe seu entendimento, do qual coaduno:”Se à garagem se atribui fração ideal de terreno, pode ser considerada como direito autônomo, desaparecendo a dependência à unidade habitacional, mas nem por isto cessa a inalienabilidade a estranho, porque o § 2.º, quando veda tal transferência, alude genericamente ao § 1.º, e este, compreendendo as duas hipóteses, não tolera distinção para efeito alienatório. Haverá maior mobilidade, mais nítida flexibilidade, mas não ocorre liberdade de transferir, o que é razoável à vista da natureza do complexo condominial.”Como bem pontuado pelo Ministério Público em seu parecer, o prédio intitulado “edifício garagem” faz parte de condomínio edilício maior, devendo obedecer às regras estabelecidas na respectiva convenção. Destarte, a norma específica que regula a alienação de vaga de garagem a não-condômino é aplicável ao caso. Tem-se que o legislador, em 2012, alterou o §1º do art. 1.331 do Código Civil, determinando:”§1º As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que não poderão ser alienados ou alugados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio.” (grifei)Portanto, a regra é expressa no sentido da impossibilidade de terceiro não condômino adquirir vaga de garagem. A finalidade da lei é clara: preservar a segurança da vida condominial, uma vez que permitir que pessoa estranha ao condomínio adquira propriedade de espaço da garagem acarretaria riscos aos moradores. Para tanto, houve a limitação da disposição de vaga de garagem à pessoas não-condôminas. Apenas uma exceção é aberta, quando a convenção de condomínio expressamente tratar do tema e permitir que as vagas possam ser transmitidas a terceiros, como anteriormente exposto, pois a responsabilidade é compartilhada entre todos os condôminos. Contudo, conforme item X, 3, da convenção juntada aos autos a fls. 31/54, há regramento específico sobre a aquisição de vagas de garagem a não-condôminos, no sentido da proibição, com exceção da locação ou empréstimo. Nesse sentido, fica naquele condomínio impossibilitada a existência de proprietário de vaga que não seja proprietário também de unidade autônoma residencial. Por fim, quanto à argumentação acerca da natureza jurídica da doação, constante na impugnação da suscitada, a compreensão da Lei nº 12.607/12 não pode ser restrita à análise literal, sendo imprescindível interpretação que assegure seu suporte teleológico. Nesse sentido, conforme os pareceres de aprovação do Projeto de Lei nº 7.803-B/2010, “o autor justifica sua proposição sustentando que mediante a escalada crescente de violência e a insegurança que grassa na população, não é recomendável criar mais um ponto de vulnerabilidade nos condomínios edilícios, sobretudo, nos residenciais” (Parecer da Comissão de Desenvolvimento Urbano, Relator Deputado Genecias Noronha, maio de 2011, PL nº 7.803-B/2010). Isto é, no caso em análise, a aquisição de vaga de garagem por donatário estranho ao condomínio é ato revestido de ilegalidade, por oferecer aos condôminos risco que a lei pretendeu evitar, independentemente da onerosidade do instrumento utilizado para a transferência da propriedade.Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 5º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Noéli Ferreira Terres, mantendo o óbice registrário.Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento.Oportunamente, arquivem-se os autos.P.R.I.C. – ADV: MARINA CHAVES OLIVEIRA (OAB 323232/SP), FLAVIA PEREIRA RIBEIRO (OAB 166870/SP) (DJe de 09.05.2018 – SP)

Fonte: DJE/SP | 09/05/2018.

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Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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