TJ|SP: Agravo de Instrumento – Inventário – Provimento que determinou a juntada das matrículas dos bens a inventariar, consignando que somente seriam partilháveis aqueles sobre os quais a falecida exercesse o domínio – Irresignação – Acolhida imperativa – Exegese do artigo 620, inciso IV, alínea ‘g’, do Código de Processo Civil – Possibilidade de partilha de direitos pessoais e possessórios incidentes sobre o bem, sobretudo daqueles derivados de compromisso de compra e venda – Precedentes – Decisão Reformada – Agravo Provido.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2018.0000718121

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2174676-63.2018.8.26.0000, da Comarca de Taubaté, em que são agravantes JÉSSICA DOS SANTOS MESSIAS (ESPÓLIO) e LAION HENRIQUE DA SILVA MESSIAS (INVENTARIANTE), é agravado O JUÍZO.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores DONEGÁ MORANDINI(Presidente), BERETTA DA SILVEIRA E EGIDIO GIACOIA.

São Paulo, 17 de setembro de 2018.

Donegá Morandini

Relator
Assinatura Eletrônica

3ª Câmara de Direito Privado

Agravo de Instrumento n. 2174676-63.2018.8.26.0000

Comarca: Taubaté

Agravantes: Laion Henrique da Silva Messias e outros

Agravado: O Juízo

Voto n. 41.942

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. Provimento que determinou a juntada das matrículas dos bens a inventariar, consignando que somente seriam partilháveis aqueles sobre os quais a falecida exercesse o domínio. Irresignação. Acolhida imperativa. Exegese do artigo 620, inciso IV, alínea ‘g’, do Código de Processo Civil. Possibilidade de partilha de direitos pessoais e possessórios incidentes sobre o bem, sobretudo daqueles derivados de compromisso de compra e venda. Precedentes. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO.

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a r. decisão reproduzida em fl. 10, da lavra do MM. Juiz de Direito Jorge Alberto Passos Rodrigues, que nos autos da ação de inventário, decidiu que “a sucessão só ocorre sobre os bens dos quais o finado era o titular, [de modo que] deverá a parte inventariante juntar cópias atualizadas das matrículas dos imóveis, com comprovação da propriedade pelo falecido. Anoto, ainda, que em caso de impossibilidade de se efetuar o registro, o bem imóvel deverá ser excluído da partilha no presente inventário para eventual ajuizamento de ação de usucapião” (fl. 10).

Buscam os recorrentes, pelas razões de fls. 01/05, a reforma da r. decisão, afastando-se a exigência do i. Juízo a quo no que toca à juntada das matrículas de imóveis, aduzindo ser possível a partilha de direitos possessórios sobre os bens imóveis, independentemente de prévio registro.

O recurso foi processado, com atribuição de efeito suspensivo, dispensadas as informações e a apresentação de contraminuta, diante da natureza do feito (fl. 46).

É O RELATÓRIO.

2. Respeitado o entendimento adotado pela r. decisão recorrida, assiste razão aos recorrentes.

Anote-se, de saída, que, na forma do disposto no artigo 620, inciso IV, do Código de Processo Civil, o inventariante fará as primeiras declarações exarando: “IV – a relação completa e individualizada de todos os bens do espólio, inclusive aqueles que devem ser conferidos à colação, e dos bens alheios que nele forem encontrados, descrevendo-se: (…) g) direitos e ações”.

Entende-se, pois, que o inventário, enquanto procedimento que visa a formalizar a sucessão causa mortis dos bens e direitos da falecida, transmissão dada a partir da saisine (artigo 1.784, CC), abrange todas as posições jurídicas que compunham a esfera patrimonial da de cujus, inclusive aqueles direitos subjetivos de natureza não real incidentes sobre bens imóveis, que ostentam cabal expressão econômica.

Com efeito, nada impede que o viúvo-meeiro e os herdeiros sucedam nos direitos de natureza pessoal e/ou possessória ostentados pela falecida sobre bens imóveis, notadamente os derivados de compromisso de compra e venda, sem prejuízo de posterior adjudicação ou busca do provimento declaratório de usucapião, pela via própria.

Em casos parelhos, já decidiu este E. Tribunal:

“Ementa: Agravo de Instrumento – Ação de Inventário Insurgência contra decisão que decidiu pela impossibilidade de inventariar bem imóvel que não é de propriedade da de cujus – Bem adquirido por meio de escritura de compra e venda não registrado – Direitos sobre o imóvel que podem ser partilhados Art. 993, IV, alínea g, do CPC Precedente do C. STJ – Recurso provido” (Agravo de Instrumento nº 2167933-42.2015.8.26.0000, Rel. Luiz Antonio Costa, j. 07.12.2015).

E também:

“Agravo de instrumento. Arrolamento. Decisão que indeferiu o pedido de partilha de direito possessório. Inadmissibilidade. Exegese do artigo 993, IV, letra ‘g’, do CPC. Possibilidade da partilha de direitos. Precedentes jurisprudenciais. Decisão reformada. Recurso provido” (Agravo de Instrumento nº 2182282-50.2015.8.26.0000, Rel. Fábio Quadros, j. 08.10.2015).

No mesmo sentido, é o seguinte precedente do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. DIREITO REAL QUANDO REGISTRADO. ART. 1.225 DO CÓDIGO CIVIL. ARROLAMENTO DE DIREITOS. INVENTÁRIO. ART. 993, INCISO IV, ALÍNEA G, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. (…) 4. Portanto, no caso concreto, parece lógico admitir a inclusão dos direitos oriundos do contrato de promessa de compra e venda de lote em inventário, ainda que sem registro imobiliário. Na verdade, é facultado ao promitente comprador adjudicar compulsoriamente imóvel objeto de contrato de promessa de compra e venda não registrado, e a Lei n. 6.766/1979 admite a transmissão de propriedade de lote tão somente em decorrência de averbação da quitação do contrato preliminar, independentemente de celebração de contrato definitivo, por isso que deve ser inventariado o direito daí decorrente. 5. O compromisso de compra e venda de imóvel é suscetível de apreciação econômica e transmissível a título inter vivos ou causa mortis, independentemente de registro, porquanto o escopo deste é primordialmente resguardar o contratante em face de terceiros que almejem sobre o imóvel em questão direito incompatível com a sua pretensão aquisitiva, o que não é o caso dos autos. 6. Recurso especial provido” (REsp 1.185.383, Rel. Luís Felipe Salomão, j. 05.05.2014).

Em suma, em que pese a ausência de título de propriedade, não há óbice para a transferência de direitos pessoais e possessórios titularizados pela falecida sobre o imóvel, sem prejuízo dos direitos ostentados por terceiros, cabendo sua inclusão no procedimento de inventário e partilha.

3. Diante de todo exposto, impõe-se a reforma da r. decisão recorrida, admitindo a inventariança e partilha de direitos pessoais e possessórios ostentados sobre o bem, independentemente do reconhecimento de usucapião.

DÁ-SE PROVIMENTO AO RECURSO.

Donegá Morandini

Relator

Fonte: 26º Tabelionato de Notas | 24/10/2018.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


STJ: Direito real de habitação na união estável não admite aluguel ou empréstimo do imóvel

Assim como no casamento, não é permitido ao companheiro sobrevivente de união estável, titular do direito real de habitação, celebrar contrato de comodato ou locação do imóvel com terceiro.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de uma pessoa que, alegando não dispor de meios para manter um imóvel de luxo localizado em área nobre, havia celebrado contrato de comodato com terceiro após o falecimento de seu companheiro.

Segundo a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, não há nenhuma singularidade na união estável que justifique eventual tratamento diferenciado em relação ao casamento, especificamente quanto às condições de exercício do direito real de habitação.

A ministra destacou que a regra do artigo 7º da Lei 9.278/96 deve ser interpretada em conjunto com o artigo 746 do Código Civil de 1916, vigente à época, no sentido da impossibilidade de alugar ou emprestar o imóvel objeto do direito real de habitação.

“Interpretação em sentido diverso estabeleceria uma paradoxal situação em que, tendo como base o mesmo instituto jurídico – direito real de habitação – e que tem a mesma finalidade – proteção à moradia e à dignidade da pessoa humana –, ao cônjuge supérstite seria vedado alugar ou emprestar o imóvel, mas ao companheiro sobrevivente seria possível praticar as mesmas condutas, não havendo, repise-se, nenhuma justificativa teórica para que se realizasse distinção dessa índole”, afirmou a ministra.

Dificuldades financeiras

No recurso, a recorrente alegou ter sido vítima de esbulho possessório praticado pela filha do seu falecido companheiro – e reconhecido em sentença transitada em julgado. Disse que, ao retomar a posse do imóvel, encontrou-o danificado, e não tinha condições financeiras para os reparos necessários, nem para a manutenção de rotina. Por isso, optou por assinar contrato de comodato com uma pessoa que teria se comprometido a reformar e conservar o imóvel.

A ministra explicou que o esbulho não justifica a flexibilização da regra legal que veda o comodato do imóvel sobre o qual recai o direito real de habitação. Segundo ela, não há nexo de causalidade entre o esbulho possessório e a posterior celebração do contrato de comodato.

Nancy Andrighi lembrou que a recorrente poderia ter adotado outras condutas na tentativa de superar as dificuldades que encontrou para conservar o imóvel após o esbulho, inclusive pleitear indenização para recompor a situação anterior.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1654060

Fonte: STJ | 24/10/2018.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


Lei seca e o reconhecimento de firmas

A MDDI (Mesa de Debates de Direito Imobiliário) é um grupo de excelentes advogados paulistas que tem por objetivo debater temas de interesse comum desses profissionais. Tenho orgulho de fazer parte do grupo, convidado pelos colegas juristas e apresentando, vez por outra, alguma contribuição para as discussões.

No próximo dia 30/10 realizar-se-á a reunião ordinária do grupo e, dentre outros temas, foi sugerido o seguinte: análise dos efeitos práticos da Lei 13.726, de 8/10/2018, que criou o selo de desburocratização, buscando racionalizar atos e procedimentos administrativos dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Abalei-me a dar de antemão minha opinião. Não sou notário, de modo que é possível considerar esta manifestação isenta de interesses imediatos, embora, deva reconhecer, o reconhecimento de firma nos dá, aos registradores imobiliários, uma extraordinária segurança adicional, já que evita, em parte, a avulsão de escrituras falsas, fenômeno que recrudesce nos últimos anos. Soa paradoxal que devamos nos apoiar numa atividade tipicamente notarial (reconhecimento de firmas) para enfrentar o fenômeno da falsidade de… títulos notariais!

Vamos lá. A pergunta é: por qual razão as sucessivas leis de “desburocratização” não pegam? (assim é percebido pela maioria dos profanos). Há várias dessas leis e decretos no âmbito federal ou estadual. Essa é, portanto, uma questão central.

Tive ocasião de escrever ao longo dos últimos anos pequenos artigos que buscam dar respostas a essa pergunta. Se tiverem curiosidade, aqui vão:

1) https://cartorios.org/2000/01/01/2029/

2) https://cartorios.org/2009/04/28/junta-comercial-em-risco-fraudes-e-identidades-falsas-compometem-servico/

3) https://cartorios.org/2009/04/30/dormi-motoboy-acordei-empresario-parte-2/

4) https://cartorios.org/2009/04/06/no-brasil-fraude-e-destino/

5) https://cartorios.org/2008/01/25/notarios-na-mira/

6) https://cartorios.org/2009/02/12/cnj-recomenda-cautela/

Há dezenas de outros pequenos textos que não indico para não aborrecê-los com digressões.

Ainda ontem (23/10) o DETRAN-AL, baseado em regulamentos do CONTRAN, reafirmou a necessidade de reconhecimento de firma por autenticidade. Baseado em qual motivo? Di-lo-á o ato normativo: considerando “o potencial extremamente elevado de fraudes envolvendo transferência de veículos automotores, a inexistência de expertise e qualificação dos servidores desta autarquia quanto à atribuição de autenticidade a assinaturas constantes do Documento Único de Transferências Veicular – DUT e o temerário cenário de responsabilização do Estado, gerando conseqüências patrimoniais descabidas ao erário ou, quando não, ao próprio servidor”, é, portanto, “necessário o reconhecimento de firma, modalidade por AUTENTICIDADE”, nas transferências de veículos. Segue cópia do ato normativo (Portaria 1.717/2018 – GABDP – DETRAN-AL, Diário Oficial de Alagoas de 24/10/2018).

Insisto na pergunta: por qual razão essas leis “não pegam”?

A resposta deixo aos meus leitores.

Todavia é possível adivinhar o que penso. O reconhecimento de firma somente será abolido definitivamente quando a sociedade adotar meios seguros de identificação dos cidadãos e procedimentos de segurança na recolha da manifestação de vontade.

Sabemos que, mesmo quando sejam adotados todos os meios tecnológicos eficazes e seguros (identidade digital, certificados, biometria, etc.) ainda assim remanesce a necessidade de verificar se ocorreu a livre, espontânea e desimpedida manifestação de vontade. Sabemos que em certas circunstâncias o germe do vício de consentimento é inoculado no ato ou negócio jurídico, gerando insegurança jurídica nos intercâmbios econômicos e custosas demandas judiciais.

Não somos populistas, nem aderimos às ideias fáceis que levam sempre a resultados funestos. Devemos nos perguntar honestamente: por que essas leis “não pegam”?

Fonte: Observatório do Registro | 24/10/2018.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.