Lei seca e o reconhecimento de firmas


  
 

A MDDI (Mesa de Debates de Direito Imobiliário) é um grupo de excelentes advogados paulistas que tem por objetivo debater temas de interesse comum desses profissionais. Tenho orgulho de fazer parte do grupo, convidado pelos colegas juristas e apresentando, vez por outra, alguma contribuição para as discussões.

No próximo dia 30/10 realizar-se-á a reunião ordinária do grupo e, dentre outros temas, foi sugerido o seguinte: análise dos efeitos práticos da Lei 13.726, de 8/10/2018, que criou o selo de desburocratização, buscando racionalizar atos e procedimentos administrativos dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Abalei-me a dar de antemão minha opinião. Não sou notário, de modo que é possível considerar esta manifestação isenta de interesses imediatos, embora, deva reconhecer, o reconhecimento de firma nos dá, aos registradores imobiliários, uma extraordinária segurança adicional, já que evita, em parte, a avulsão de escrituras falsas, fenômeno que recrudesce nos últimos anos. Soa paradoxal que devamos nos apoiar numa atividade tipicamente notarial (reconhecimento de firmas) para enfrentar o fenômeno da falsidade de… títulos notariais!

Vamos lá. A pergunta é: por qual razão as sucessivas leis de “desburocratização” não pegam? (assim é percebido pela maioria dos profanos). Há várias dessas leis e decretos no âmbito federal ou estadual. Essa é, portanto, uma questão central.

Tive ocasião de escrever ao longo dos últimos anos pequenos artigos que buscam dar respostas a essa pergunta. Se tiverem curiosidade, aqui vão:

1) https://cartorios.org/2000/01/01/2029/

2) https://cartorios.org/2009/04/28/junta-comercial-em-risco-fraudes-e-identidades-falsas-compometem-servico/

3) https://cartorios.org/2009/04/30/dormi-motoboy-acordei-empresario-parte-2/

4) https://cartorios.org/2009/04/06/no-brasil-fraude-e-destino/

5) https://cartorios.org/2008/01/25/notarios-na-mira/

6) https://cartorios.org/2009/02/12/cnj-recomenda-cautela/

Há dezenas de outros pequenos textos que não indico para não aborrecê-los com digressões.

Ainda ontem (23/10) o DETRAN-AL, baseado em regulamentos do CONTRAN, reafirmou a necessidade de reconhecimento de firma por autenticidade. Baseado em qual motivo? Di-lo-á o ato normativo: considerando “o potencial extremamente elevado de fraudes envolvendo transferência de veículos automotores, a inexistência de expertise e qualificação dos servidores desta autarquia quanto à atribuição de autenticidade a assinaturas constantes do Documento Único de Transferências Veicular – DUT e o temerário cenário de responsabilização do Estado, gerando conseqüências patrimoniais descabidas ao erário ou, quando não, ao próprio servidor”, é, portanto, “necessário o reconhecimento de firma, modalidade por AUTENTICIDADE”, nas transferências de veículos. Segue cópia do ato normativo (Portaria 1.717/2018 – GABDP – DETRAN-AL, Diário Oficial de Alagoas de 24/10/2018).

Insisto na pergunta: por qual razão essas leis “não pegam”?

A resposta deixo aos meus leitores.

Todavia é possível adivinhar o que penso. O reconhecimento de firma somente será abolido definitivamente quando a sociedade adotar meios seguros de identificação dos cidadãos e procedimentos de segurança na recolha da manifestação de vontade.

Sabemos que, mesmo quando sejam adotados todos os meios tecnológicos eficazes e seguros (identidade digital, certificados, biometria, etc.) ainda assim remanesce a necessidade de verificar se ocorreu a livre, espontânea e desimpedida manifestação de vontade. Sabemos que em certas circunstâncias o germe do vício de consentimento é inoculado no ato ou negócio jurídico, gerando insegurança jurídica nos intercâmbios econômicos e custosas demandas judiciais.

Não somos populistas, nem aderimos às ideias fáceis que levam sempre a resultados funestos. Devemos nos perguntar honestamente: por que essas leis “não pegam”?

Fonte: Observatório do Registro | 24/10/2018.

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Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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