CSM/SP: Registro de imóveis – Registro de convenção de condomínio edilício – Hipóteses em que necessários quóruns especiais de votação que estão especificados na Convenção do Condomínio conforme deliberado pela Assembleia dos Condôminos – Necessidade, porém, de autorização da totalidade dos condôminos para a alteração do projeto, da estrutura e da fachada do edifício, por acarretar modificação que atinge o direito de propriedade e repercute sobre a especificação do condomínio edilício – Recurso não provido, com manutenção da recusa do registro do título.


Apelação nº 1044178-18.2017.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1044178-18.2017.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1044178-18.2017.8.26.0100

Registro: 2018.0000296539

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1044178-18.2017.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes é apelante CONDOMÍNIO EDIFÍCIO SETE QUEDAS, é apelado 5º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso para manter a recusa do registro do título, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 23 de abril de 2018.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1044178-18.2017.8.26.0100

Apelante: Condomínio Edifício Sete Quedas

Apelado: 5º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

VOTO Nº 37.341

Registro de imóveis – Registro de convenção de condomínio edilício – Hipóteses em que necessários quóruns especiais de votação que estão especificados na Convenção do Condomínio conforme deliberado pela Assembleia dos Condôminos – Necessidade, porém, de autorização da totalidade dos condôminos para a alteração do projeto, da estrutura e da fachada do edifício, por acarretar modificação que atinge o direito de propriedade e repercute sobre a especificação do condomínio edilício – Recurso não provido, com manutenção da recusa do registro do título.

Trata-se de recurso interposto pelo “Condomínio Edifício Sete Quedas” contra r. decisão da MMª. Juíza Corregedora Permanente do Sr. 5º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo que manteve a recusa do registro da Convenção do Condomínio Edilício que, por sua vez, já foi instituído mediante escritura pública objeto das transcrições nºs 25.816 e 27.309, porque previsto quórum inferior à totalidade dos condôminos para a aprovação de obras que importem em alteração do projeto, da estrutura e da fachada do prédio e porque não especificados os quóruns para os diversos tipos de votações a que se referem o art. 9º, § 1º, da Lei nº 4.591/64 e o art. 1.334, III, do Código Civil.

Sustenta o recorrente, em suma, que o condomínio edilício foi instituído em 27 de dezembro de 1954. Afirma que foram originalmente formuladas nove exigências para o registro da convenção do condomínio, todas com fundamento na primeira parte da Lei nº 4.591/64 que, porém, teve seus arts. 1º a 27 revogados pelo Código Civil vigente. Diz que a r. sentença foi omissa na análise da legislação invocada. Assevera que o art. 10, e seus parágrafos, da Lei nº 4.591/64 foram revogados pelos arts. 1.341 e 1.342 do Código Civil, não mais sendo exigível a unanimidade dos condôminos para a alteração do projeto, da estrutura e da fachada do prédio. Por sua vez, o art. 67 da Convenção do Condomínio especifica o quórum especial de votação para o caso de sinistro parcial ou total, ou desapropriação, e esclarece que os condôminos não pretendem promover a construção de novos pavimentos, para conter outras unidades autônomas, a que se refere o art. 1.343 do Código Civil. Requer a reforma da r. sentença.

A douta Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 205/206).

É o relatório.

O primeiro ponto a ser apreciado diz respeito à previsão de quórum inferior à totalidade dos condôminos e, em consequência, das frações ideais para as obras que impliquem em alteração na estrutura, no projeto ou na fachada do edifício (cláusula 43, fls. 39).

Em que pese a alegação de modificação legislativa, permanece a necessidade de anuência unânime dos condôminos com as referidas alterações porque repercutem em aspectos inerentes ao direito de propriedade sobre as partes comuns e privativas e, portanto, sobre a instituição e especificação do condomínio.

Conforme Nisske Gondo e J. Nascimento Franco:

Uma vez registrado o instrumento de instituição do condomínio, exige-se a unanimidade dos co-proprietários, com anuência dos compromissários compradores ou promitentes cessionários de direitos à compra de unidades autônomas, para as alterações que importem em desdobramentos ou unificação de unidades, mudança na destinação das áreas privativas ou comuns, bem como na participação proporcional no terreno e coisas comuns; enfim, para as inovações que possam direta ou indiretamente repercutir sobre os direitos subjetivos dos condôminos com a finalidade a que inicialmente se destinou o edifício ou suas unidades autônomas, tal como a transformação da casa do zelador, ou de qualquer área comum, em unidade privativa” (Condomínio em edifícios, 5ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, pág. 15).

Os referidos autores, sobre as modificações que demandam a aprovação unânime dos condôminos, incluem, de forma exemplificativa, a abertura de vão em parede divisória que também seja de sustentação do edifício, porque é de propriedade comum (obra citada, pág. 235), e a abertura de vão, porta ou janela para área de uso comum, porque “a parede que separa as partes comunsdos apartamentos pertence à comunidade condominial” (obra citada, pág. 236).

As obras que importam em alteração da estrutura, do projeto e da fachada do edifício não se confundem com aquelas a que se refere o art. 1.342 do Código Civil, destinadas a aumentar a utilização das áreas comuns, nem com as benfeitorias voluptuárias e úteis previstas no art. 1.341, I e II, do mesmo Código, que dependem de aprovação por quóruns de dois terços dos condôminos no primeiro caso e maioria dos condôminos na segunda hipótese.

Assim porque benfeitorias úteis e voluptuárias são as previstas no art. 96 do Código Civil e, em regra, não importam em obras de modificação da estrutura, do projeto e da fachada do edifício que tem partes de propriedade comum e partes de propriedade privativa dos condôminos.

O Código Civil não contém previsão de quórum para essas obras inferior à totalidade dos condôminos, mas contém regras que impõem a anuência dessa totalidade quando as obras alteram a estrutura e o projeto do edifício, como ocorre com a construção de outros pavimentos destinados a conter novas unidades autônomas (art. 1.343) e a mudança da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária (art. 1.351, parte final).

Bem por isso, o item 84 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça dispõe que:

A alteração da especificação exige a anuência da totalidade dos condôminos. Cuida-se de norma que mantém consonância com a natureza do condomínio edilício e, mais, com o Código Civil porque a alteração da estrutura do edifício, do projeto ou de sua fachada implica em modificação das partes comuns que pode repercutir na segurança estrutural do prédio e na harmonia arquitetônica da fachada, repercutindo no valor do edifício e das unidades que o compõem, sendo, portanto, mudanças que afetam a propriedade exercida por todos os condôminos, sobre as áreas comuns, nas proporções das frações ideais de suas respectivas unidades (art. 1.331 do Código Civil).

Cabe lembrar que a necessidade de autorização da unanimidade dos titulares de direitos reais de aquisição de unidades autônomas para a alteração do projeto do condomínio, de suas especificações e do plano de construção está presente desde a fase da incorporação imobiliária, dispondo o inciso IV do art. 43 da Lei nº 4.591/64:

IV – é vedado ao incorporador alterar o projeto, especialmente no que se refere à unidade do adquirente e às partes comuns, modificar as especificações, ou desviar-se do plano da construção, salvo autorização unânime dos interessados ou exigência legal;

A jurisprudência, de igual modo, não afasta a obrigatoriedade da autorização da unanimidade dos condôminos para a alteração da fachada do edifício, mesmo na vigência do atual Código Civil, como se verifica no v. acórdão prolatado pelo Eg. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1483733/RJ, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 25/08/2015, DJe 01/09/2015, que teve a seguinte ementa:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. ALTERAÇÃO DE FACHADA. ESQUADRIAS EXTERNAS. COR DIVERSA DA ORIGINAL. ART. 1.336, III, DO CÓDIGO CIVIL. ART. 10 DA LEI Nº 4.591/1964. VIOLAÇÃO CARACTERIZADA. ANUÊNCIA DA INTEGRALIDADE DOS CONDÔMINOS. REQUISITO NÃO CUMPRIDO. DESFAZIMENTO DA OBRA.

1. Cuida-se de ação ajuizada contra condômino para desfazimento de obra que alterou a fachada de edifício residencial, modificando as cores originais das esquadrias (de preto para branco).

2. A instância ordinária admitiu a modificação da fachada pelo fato de ser pouco perceptível a partir da vista da rua e por não acarretar prejuízo direto no valor dos demais imóveis do condomínio.

3. Os arts. 1.336, III, do Código Civil e 10 da Lei nº 4.591/1964 traçam critérios objetivos bastante claros a respeito de alterações na fachada de condomínios edilícios, os quais devem ser observados por todos os condôminos indistintamente.

4. É possível a modificação de fachada desde que autorizada pela unanimidade dos condôminos (art. 10, § 2º, da Lei nº 4.591/1946).  Requisito não cumprido na hipótese.

5. Fachada não é somente aquilo que pode ser visualizado do térreo, mas compreende todas as faces de um imóvel: frontal ou principal (voltada para rua), laterais e posterior.

6. Admitir que apenas as alterações visíveis do térreo possam caracterizar alteração da fachada, passível de desfazimento, poderia firmar o entendimento de que, em arranha-céus, os moradores dos andares superiores, quase que invísiveis da rua, não estariam sujeitos ao regramento em análise.

7. A mudança na cor original das esquadrias externas, fora do padrão arquitetônico do edifício e não autorizada pela unanimidade dos condôminos, caracteriza alteração de fachada, passível de desfazimento, por ofensa aos arts. 1.336, III, do Código Civil e 10 da Lei nº 4.591/1964.

8. Recurso especial provido. (Grifei).

A conclusão adotada não se altera pela alegação, feita pelo apelante, de revogação dos arts. 1º a 27 da Lei nº 4.591/64, pois a exigência da unanimidade dos condôminos, ou das frações ideais, para a alteração da estrutura, do projeto e da fachada do edifício é exigência compatível tanto com a Lei nº 4.591/64 como com o Código Civil vigente porque, como visto, afeta o direito de propriedade sobre as partes comuns e as privativas que compõem o condomínio edilício e, portanto, repercute sobre a especificação do condomínio.

Ademais, sobre a vigência da Lei nº 4.591/64, Francisco Eduardo Loureiro esclarece, ao comentar o art. 1.331 do Código Civil, que:

Resta apenas saber, no tocante aos arts. 2º a 27, se houve derrogação ou ab-rogação da lei especial pelo atual Código. Embora haja entendimento divergente a respeito, a melhor posição é no sentido de que houve simples derrogação, podendo as regras da lei especial ser aplicadas de modo supletivo às lacunas do CC/2002, desde que não conflitem com os princípios ou as regras posteriores. Prova disso é que o próprio art. 1.332, adiante comentado, dispõe que em relação à instituição do condomínio edilício se aplicam não apenas as regras do próprio CC, como também o disposto em lei especial (“Código Civil Comentado”, 9º ed.,Coord. Min. Cezar Peluso, Manole, Barueri, 2015, p. 1.258/1259).

A confirmar esse entendimento encontrasse o art. 8º, alínea “a”, da Lei nº 4.591/64 que regulamenta o condomínio edilício formado por casas térreas ou assobradadas, hipótese não prevista no art. 1.331, § 1º, do Código Civil, razão pela qual, nessa espécie de condomínio, continua vigente a lei especial.

Tanto assim que a Lei nº 10.931/2004, que é posterior ao Código Civil de 2002 e que instituiu o art. 31-A da Lei nº 4.591/64, faz expressa referência ao art. 8º da referida Lei nº 4.591/64 ao dispor sobre a constituição do patrimônio de afetação nas incorporações imobiliárias que tenham por objeto os subconjuntos de casas.

Portanto, a melhor interpretação é no sentido de que a primeira parte da Lei nº 4.591/64, que trata do condomínio edilício, continua aplicável nas hipóteses não expressamente previstas no Código Civil, servindo como norte para o preenchimento de lacunas neste contidas.

No que tange ao segundo obstáculo apresentado, a convenção prevê quóruns especiais para matérias que foram consideradas como não sujeitas ao quórum legal (cláusulas 16, § 2º, 35, 38, § 2º, 39, 43, 45, 47, 48, § 2º, 49, alínea”e” e 50, § único).

Diante disso, não há como exigir previsão de quóruns distintos para deliberações sobre matérias não previstas expressamente na convenção, devendo incidir o quórum legal nas eventuais omissões, ficando ressalvada, sempre, a possibilidade de recurso dos interessados às vias ordinárias para solução de lítigios que as deliberações em assembleia possam originar.

Contudo, havendo exigência não suprida pelo apelante, relativa ao quórum para alteração da estrutura, do projeto e da fachada do edifício, prevalece a recusa do registro da Convenção do Condomínio.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso para manter a recusa do registro do título.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 18.05.2018 – SP)

Fonte: INR Publicações | 28/05/2018.

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CSM|SP: Escritura de compra e venda de imóvel – Desqualificação – Imóvel que foi objeto de anterior escritura de compra e venda, já registrada – Alienante que não consta mais no fólio registral como titular de domínio – Ausência de erro no registro, visto que realizado conforme documentos apresentados à época da abertura da matrícula – Eventual ocupação errônea que somente pode ser solucionada mediante lavratura de escritura de permuta – Ata retificatória que não basta para superação do óbice – Dúvida julgada procedente – Recurso não provido, com determinação.


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1056522-31.2017.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes é apelante MARIA HELENA BETTECHER SILVA PINTO, é apelado 18º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, com determinação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 23 de abril de 2018.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1056522-31.2017.8.26.0100

Apelante: Maria Helena Bettecher Silva Pinto

Apelado: 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

VOTO Nº 37.334

Escritura de compra e venda de imóvel – Desqualificação – Imóvel que foi objeto de anterior escritura de compra e venda, já registrada – Alienante que não consta mais no fólio registral como titular de domínio – Ausência de erro no registro, visto que realizado conforme documentos apresentados à época da abertura da matrícula – Eventual ocupação errônea que somente pode ser solucionada mediante lavratura de escritura de permuta – Ata retificatória que não basta para superação do óbice – Dúvida julgada procedente – Recurso não provido, com determinação.

Inconformada com a r. sentença que confirmou o juízo negativo de qualificação registral [1]MARIA HELENA BETTECHER SILVA PINTO interpôs apelação [2] objetivando o registro da escritura pública de compra e venda lavrada em 06.05.2016, em que figura como outorgada compradora juntamente com seu marido, MANOEL JOSÉ PINTO, como outorgante vendedora a COMPANHIA METROPOLITANA DE HABITAÇÃO DE SÃO PAULO COHAB, como anuente a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e como intervenientes APARECIDO DONIZETI BARAM e MARIA JANDIRA BARAM, tendo por objeto o “apartamento nº 22-A, localizado no 2º pavimento do Bloco A, do Condomínio Multipredial Ilha Baleares, situado na Avenida Heitor Antonio Eiras Garcia, 6.705, CEP: 05564-200, 13º Subdistrito Butantã (…)”. Aduz, em síntese, que seria desnecessária a lavratura de escritura de permuta, como exigido pelo Oficial, bastando a lavratura de ata retificativa. Isso porque, entende que o erro foi do registrador, que permitiu a abertura de matrícula de imóvel, qual seja, a matrícula nº 176.142 do 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, em desconformidade com sua real caracterização e descrição imobiliária, pautada no memorial descritivo, plantas e especificação do empreendimento. Acrescenta que não se trata de alteração do objeto da matrícula, mas de descrevê-lo de forma correta e adequada à realidade. Por fim, sustenta que o erro está na matrícula aberta erroneamente e não, na escritura cujo registro foi negado.

A Procuradoria Geral da Justiça, em seu parecer, opinou pelo não provimento da apelação [3].

É o relatório.

A interessada, não se conformando com as exigências formuladas pelo registrador, suscitou dúvida inversa [4], criação pretoriana historicamente admitida por este C. Conselho Superior da Magistratura [5] e regrada pelas NSCGJ [6]. Ou seja, ao invés de requerer a suscitação de dúvida ao Oficial de Registro, dirigiu seu inconformismo diretamente à MM.ª Juíza Corregedora Permanente do 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital.

dúvida inversa foi julgada procedente, ficando mantida a negativa de registro da escritura de compra e venda lavrada em 06.05.2016 [7].

No caso concreto, o Oficial apresentou nota devolutiva [8] fazendo referência às exigências formuladas em relação ao título protocolado sob nº 12.515. Por sua vez, na nota devolutiva [9] elaborada por ocasião da apresentação da Ata Retificativa lavrada em 25.04.2016, ficou constando que: “(…) para possibilitar o registro da Escritura objeto do L.R.T. Nº 12.514, os interessados deverão promover a Escritura de PERMUTA entre a atual titular do domínio do aptº 22-A, localizado no 2º pavimento do Bloco B, do referido Condomínio, COMPANHIA METROPOLITANA DE HABITAÇÃO DE SÃO PAULO COHAB/SP, e os titulares dos direitos expectativos de aquisição decorrentes do contrato de alienação fiduciária (R.16/176.142), do aptº 22-A, localizado no 2º pavimento do Bloco A, PAULO CARDOSO DA SILVA e sua mulher, MARIA SONIA DE JESUS DA SILVA. Deverá também, comparecer na Escritura de Permuta, a credora fiduciária CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (Segue cópia do Proc. 0039019-24.2011.8.26.0100, da 1ª Vara de Registros Públicos desta Capital).

Da análise da Matrícula nº 176.142 do 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, é possível constatar que, em 01 de fevereiro de 2005, foi registrada a escritura de compra e venda por intermédio da qual a proprietária, Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo COHAB/SP, transmitiu o Apartamento nº 22-A do Bloco A para SALVADOR GARCIA, casado com NEUZA CONCEIÇÃO GARCIA. Consta, ainda, que a venda foi feita em cumprimento ao compromisso de venda e compra datado de 30 de junho de 1989, não registrado (R.1). Seguiram-se sucessivas alienações, sendo que, atualmente, o imóvel é objeto de contrato de alienação fiduciária, em que figuram como fiduciantes Paulo Cardoso da Silva e sua mulher e como fiduciária, a Caixa Econômica Federal (R. 15 e R. 16) [10].

Ocorre que, na escritura lavrada em 06.05.2016, cujo registro foi indeferido pelo 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, o imóvel descrito é o mesmo daquele objeto da Matrícula nº 176.142, qual seja, o apartamento nº 22-A do Bloco A. Sendo assim, não assiste razão à apelante ao afirmar que a ata retificativa elaborada seria suficiente para efetivação do registro.

Como é sabido, escritura pública é ato notarial que reflete a vontade das partes na realização de negócio jurídico, observados os parâmetros fixados pela Lei e pelas Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, reproduzindo, portanto, exatamente aquilo que outorgantes e outorgados declararam ao Escrivão ou ao Escrevente. Bem por isso, há entendimento sedimentado desta Corregedoria Geral no sentido de que não pode o juiz substituir o notário ou uma das partes, retificando escrituras que encerram tudo quanto se passou e declarou perante aquele oficial [11].

Na hipótese em tela, a escritura foi lavrada em conformidade com os documentos apresentados. É sabido que as escrituras públicas, em regra, não comportam retificação e devem ser corrigidas por meio de lavratura de nova escritura pública e não, por determinação judicial. Não cabe ao juiz retificar escrituras que encerram tudo que se passou e foi declarado perante o Oficial, tanto que os livros de notas sequer apresentam colunas de averbações destinadas a tal fim, justamente por inexistir previsão legal a respeito.  Sobre o tema, ensina Narciso Orlandi Neto que:

“Não há possibilidade de retificação de escritura sem que dela participem as mesmas pessoas que estiveram presentes no ato da celebração do negócio instrumentalizado. É que a escritura nada mais é que o documento, o instrumento escrito de um negócio jurídico; prova preconstituída da manifestação de vontade de pessoas, explicitada de acordo com a lei. Não se retifica manifestação de vontade alheia. Em outras palavras, uma escritura só pode ser retificada por outra escritura, com o comparecimento da mesmas parles que. na primeira, manifestaram sua vontade e participaram do negócio jurídico instrumentalizado” [12].

E arremata com a lição de Pontes de Miranda:

“(…) falta qualquer competência aos Juizes para decretar sanções e, até, para retificar erros das escrituras públicas: escritura pública somente se retifica por outra escritura pública, e não por mandamento judicial” [13].

A despeito disso, nos casos em que a retificação decorre de mero erro material, perceptível pela simples confrontação de documentos ou outras provas com o erro alegado, excepcionalmente se admite a retificação. Não é o que ocorre, porém, no caso concreto.

Com efeito, em que pese a alegação dos recorrentes no sentido de que o apartamento vendido a SALVADOR GARCIA e sua esposa era outro, qual seja, o apartamento nº 22-A do Bloco B e que, portanto, a Matrícula nº 176.142 do 18º CRI foi aberta equivocadamente, o fato é que o apartamento nela descrito corresponde a uma unidade do Bloco A (área total de 48,18m² [14]), de forma que não há como se afirmar que se trata de mero erro material. A matrícula foi aberta, houve registro da escritura de compra e venda então apresentada ao 18º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, seguindo-se sucessivas alienações. Inexiste o alegado erro de registro, na medida em que a matrícula reflete o teor do título que lhe deu origem.

Nesse cenário, é possível concluir que as duas escrituras lavradas, a primeira em favor de SALVADOR GARCIA, devidamente registrada [15], e aquela versada nos autos referem-se ao mesmo imóvel. Por conseguinte, não estando mais o imóvel registrado em nome da alienante, não há como deferir o ingresso do título agora apresentado pela apelante no fólio real, sendo de rigor a manutenção do óbice imposto pelo Oficial.

Anote-se que, se houve ocupação errônea – na medida em que, ao que consta, PAULO CARDOSO DA SILVA e S/M, titulares de domínio do imóvel objeto da Matrícula nº 176.142 do 18º CRI, cedido em alienação fiduciária à Caixa Econômica Federal, estão na posse no apartamento nº 22-A do Bloco B [16] – somente uma escritura de permuta poderá, de fato, resolver o impasse.

Por fim, conveniente a extração de cópias das principais peças dos autos para remessa à MM.ª Juíza Corregedora Permanente a fim de que seja apurada a atuação do 8º Tabelião de Notas da Capital em razão da retificação de escritura pública de compra e venda de imóvel mediante lavratura de ata notarial, em que alterada a identificação do imóvel vendido e consequente modificação do objeto do contrato, sem notícia de participação, neste último ato, das partes envolvidas no negócio jurídico.

Diante do exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso, com determinação.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Fls. 199/203.

[2] Fls. 223/233.

[3] Fls. 246/249.

[4] Fls. 01/11.

[5] Apelação Cível n.º 23.623-0/1, Rel. Des. Antônio Carlos Alves Braga, j. 20.2.1995; Apelação Cível n.º 76.030-0/8, rel. Des. Luís de Macedo, j. 8.3.2001; e Apelação Cível n.º 990.10.261.081-0, rel. Des. Munhoz Soares, j. 14.9.2010.

[6] Item 41.1. do Cap. XX.

[7] Fls. 14/19.

[8] Fls. 20.

[9] Fls. 21/23.

[10] Fls. 92/107.

[11] Nesse sentido: “TABELIÃO DE NOTAS – Retificação de escritura pública de compra e venda – Impossibilidade – Inexistência de erro – Ato lavrado corretamente, em consonância com os documentos apresentados – Recurso não provido”. (CGJ – Processo n° 2014/155532 Parecer: ANA LUIZA VILLA NOVA Corregedor Geral da Justiça: HAMILTON ELLIOT AKEL j. Em 18.12.2014); RECURSO ADMINISTRATIVO – Pedido de Providências Registro de escritura pública de venda e compra – Alegação de interpretação, pelo registrador, que não teria correspondido à real intenção das partes contratantes Redação em que se menciona a alienação de 1/3 do usufruto e de 2/3 da nua propriedade Registros que correspondem à manifestação de vontade contida no título Atos praticados no ano de 1984, sem qualquer questionamento pelas partes do negócio jurídico, uma delas já falecida – Pedido de providências rejeitado – Recurso desprovido. Parecer: TATIANA MAGOSSO Corregedor Geral da Justiça: PEREIRA CALÇAS j. Em 18.12.2014).

[12] “Retificação do Registro de Imóveis”. Juarez de Oliveira, p. 90.

[13] Cf. R.R. 182/754 – “Tratado de Direito Privado”. Parte Geral. Tomo III. 3ª ed. 1970. Borsoi. § 338. p. 361.

[14] Fls. 29, 90 e 131.

[15] Fls. 92/107.

[16] Fls. 122.

(DJe de 18.05.2018 – SP)

Fonte: 26º Tabelionato de Notas – DJE/SP | 28/05/2018.

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