CGJ/SP: Registro de imóveis – Cancelamento de duas matrículas em decorrência de fusão – Encerramento daquelas com abertura de uma nova (artigos 233, III, e 234 da Lei nº 6.015/1973) – Identidade de proprietário inexistente – Pressuposto legal para os atos registrais – Ausência – Desqualificação registral confirmada – Recurso desprovido.


  
 

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2013/125028
(289/2013-E)

Registro de imóveis – Cancelamento de duas matrículas em decorrência de fusão – Encerramento daquelas com abertura de uma nova (artigos 233, III, e 234 da Lei nº 6.015/1973) – Identidade de proprietário inexistente – Pressuposto legal para os atos registrais – Ausência – Desqualificação registral confirmada – Recurso desprovido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Fábio Rodrigo Vieira, inconformado com a r. sentença que julgou improcedente seu pedido e reconheceu o acerto da desqualificação registral questionada[1], interpôs apelação, admitida como recurso administrativo[2], porque, sustenta, a fusão das matrículas nº 18.467 e nº 11.372, encerrando-as e abrindo uma nova, respaldada pelo ente municipal, restou injustificadamente recusada pelo Oficial do 4° Registro de Imóveis de Campinas.[3]

Recebido o recurso[4], os autos foram enviados ao Conselho Superior da Magistratura[5] e a Procuradoria Geral de Justiça, depois de ressaltar a competência da Corregedoria Geral da Justiça para analisá-lo, propôs o desprovimento do recurso.[6]

A incompetência do Conselho Superior da Magistratura foi declarada e os autos encaminhados à Corregedoria Geral da Justiça, órgão competente para apreciar o recurso interposto.[7]

É o relatório. OPINO.

De acordo com a matrícula nº 18.467 do 4° Registro de Imóveis de Campinas, o bem imóvel nela descrito pertence, com exclusividade, ao recorrente Fábio Rodrigo Vieira.[8]

Já o bem imóvel identificado na matrícula nº 11.372, também do 4° Registro de Imóveis de Campinas, pertence a Fábio Rodrigo Vieira e a Luciana Concheta Messana, com quem aquele, o recorrente, é casado sob o regime da comunhão parcial de bens.[9]

Quanto à propriedade deste, convém realçar a regra do inciso I do artigo 1.660 do Código Civil, afeta ao regime decomunhão parcial, segundo a qual os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que apenas em nome de um dos cônjuges, entram na comunhão.

Paulo Lobo, a respeito do tema, esclarece:

Todos os bens móveis e imóveis adquiridos após o casamento, por ambos ou por apenas um dos cônjuges, mediante negócios jurídicos onerosos, são comunicáveis. A onerosidade diz respeito ao desembolso de recursos pecuniários e desde que não seja em sub-rogação aos bens particulares de cada cônjuge; em outras palavras, quando a aquisição não derivou de ato de liberalidade de terceiro (doação ou sucessão hereditária). [10] (grifei)

A luz da realidade tabular, portanto, enquanto o primeiro imóvel integra a massa de bens particulares do recorrente, o outro, comunicável, compõe a massa patrimonial comum, pertencente ao casal, a Fábio Rodrigo Vieira e a Luciana Concheta Messana.

Aquele se insere no patrimônio geral de Fábio Rodrigo Vieira; este entra na composição do patrimônio coletivo doscônjuges, da universalidade de direito por ele integrada e sobre a qual, indistintamente, recai o direito de propriedade sob a titularidade do casal.

O patrimônio do casal forma um todo, uma unidade econômica, e cada um, enquanto mantida a sociedade conjugal, tem direito à metade ideal da universalidade de direito, e não de cada bem em si considerado; apenas com a dissolução da sociedade conjugal, e a futura partilha, especificar-se-á a porção do patrimônio comum composta pela meação de cada um. Até lá, contudo, subsistirá o estado de indivisão.

Carlos Alberto da Mota Pinto, ao abordar o patrimônio coletivo, vislumbrado por ele, exemplificativamente, nos casos de comunhão conjugal, acentua:

O patrimônio colectivo não se confunde, porém, com a compropriedade ou propriedade em comum. Na propriedade em comum ou compropriedade, figura de procedência romanística, estamos perante uma comunhão por quotas ideais, isto é, cada comproprietário ou consorte tem direito a uma quota ideal ou fracção do objecto comum. Daí que o comproprietário possa dispor de toda a sua quota na comunhão ou de parte dela (art. 1.408º); daí que o comproprietário não seja obrigado a permanecer na indivisão, podendo exigir a divisão da coisa comum (artigo 1.412º).

O patrimônio colectivo pertence em bloco, globalmente, ao conjunto de pessoas correspondente. Individualmente nenhum dos sujeitos tem direito a qualquer quota ou fracção; o direito sobre a massa patrimonial em causa cabe ao grupo no seu conjunto. Daí que nenhum dos membros da colectividade titular do patrimônio colectivo possa alienar uma quota desse patrimônio ou possa requerer a divisão, enquanto não terminar a causa geradora do surgimento do patrimônio colectivo. (…).

Um caso em que parece divisar-se a figura do patrimônio colectivo no nosso direito é a comunhão conjugal.[11] (grifei).

Na mesma linha, Orlando Gomes:

Em relação ao patrimônio comum, a posição jurídica dos cônjuges é peculiar. Não são proprietários das coisas individualizadas que o integram, mas do conjunto desses bens. Não se trata de condomínio propriamente dito, porquanto nenhum dos cônjuges pode dispor de sua parte nem exigir a divisão dos bens comuns. Tais bens são objeto de propriedade coletiva, a propriedade de mão comum dos alemães, cujos titulares são ambos os cônjuges.[12]

Dentro desse contexto, considerada, insisto, a realidade registral dando conta que os imóveis envolvidos na fusãopretendida integram massas patrimoniais diversas então sob titularidade distinta, o Oficial de Registro, malgrado a irresignação do interessado, procedeu com acerto.

Ora, a fusão perseguida pressupõe, nos termos do artigo 234 da Lei nº 6.015/1973, a concentração da propriedade imobiliária na mesma pessoa, enfim, que os imóveis identificados nas matrículas a serem encerradas em razão da fusão estejam incorporados, rigorosamente, ao patrimônio das mesmas pessoas.[13]

Porém, insista-se, um dos bens imóveis integra o patrimônio particular do recorrente e outro constitui o patrimônio coletivo do casal, de sorte a impossibilitar os atos registrais pleiteados, o agrupamento direcionado à formação de um novo imóvel, por faltar a perfeita identidade na titularidade dominial.

No mais, a chancela do ente municipal, presa à tutela dos interesses urbanísticos, não condiciona a qualificação do Oficial, orientada pelos princípios e regras próprios do direito registral, determinantes para confirmação da r. sentença impugnada.

Pelo exposto, o parecer que respeitosamente submeto à apreciação de Vossa Excelência propõe o desprovimento do recurso.

Sub censura.

São Paulo, 16 de agosto de 2013.

Luciano Gonçalves Paes Leme

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. Publique-se. São Paulo, 23.08.2013. – (a) – JOSÉ RENATO NALINI – Corregedor Geral da Justiça.

_____

Notas:

[1] Fls. 125/127.

[2] Fls. 145/146.

[3] Fls. 131/138.

[4] Fls. 139.

[5] Fls. 140.

[6] Fls. 143/144.

[7] Fls. 145/146.

[8] Fls. 75.

[9] Fls. 76.

[10] Direito Civil: famílias. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 342

[11] Teoria geral do Direito Civil. 3ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1999. p. 349-351.

[12] Direito de Família. Atualizada por Humberto Theodoro Júnior. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 196.

[13] Artigo 234. Quando dois ou mais imóveis contíguos pertencentes ao mesmo proprietário, constarem de matrículas autônomas, pode ele requerer a fusão destas em uma só, de novo número, encerrando-se as primitivas. (grifei)

Fonte: DJE – Grupo Serac – PARECERES DOS JUÍZES AUXILIARES DA CGJ nº 009 – 3/2/2015.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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