1ªVRP/SP: A duplicidade no registro faz desaparecer a presunção de que o direito pertence àquele em cujo nome está registrado. Inexistente tal presunção, como corolário deverá haver o bloqueio das correntes filiatórias.


  
 

Processo 1112495-73.2014.8.26.0100 – Pedido de Providências – Bloqueio de Matrícula – VILMA ALVES PEREIRA – Vistos. Trata-se de pedido de providências com pedido liminar formulado por Vilma Alves Pereira em face da negativa do Oficial do 9º Registro de Imóveis da Capital em proceder ao desbloqueio do imóvel matriculado sob nº 3.092, bem como de retificar suas metragens imóvel e a proceder a abertura de nova matrícula. Relata a requerente que adquiriu o bem em questão juntamente com sua irmã, falecida em 28.04.2014. Informa que em 1996 foi proposta ação de usucapião por Marina Carvalho Endo (processo nº 0908580-74.1996.8.26.0100), sendo que no curso do processo foi realizado de ofício o bloqueio da matrícula. A usucapião transitou em julgado, porém a matrícula continua bloqueada, sendo que a requerente somente tomou ciência do referido bloqueio ao instruir o processo de inventário (nº 1006391-42.2014.8.26.008) que tramita perante o MMº Juízo da 3ª Vara da Família e Sucessões do Foro Regional – Tatuapé/SP, o que foi suspenso devido ao bloqueio. Salienta que nos termos da ação de usucapião, tendo em vista a divergência de área, há necessidade da matrícula ser retificada, bem como aberta nova matrícula, findando o elo com a transcrição nº 54.485. Juntou documentos às fls.12/112. A liminar foi indeferida (fls.113/114). O Oficial informou que o bloqueio que se pretende cancelar resultou da ocorrência de duplicidade antinômica registrária, tendo em vista que a área maior descrita na transcrição nº 54.485 se sobrepõe a diversos outros registros, dentre os quais a matrícula nº 3.092. Esclarece que permanece a mencionada sobreposição, já que não houve o cancelamento da transcrição 54.485 na parte que afeta o registro da requerente, bem como ocorreu o agravamento das imperfeições registrárias, pois a parte do imóvel descrita na referida matrícula foi usucapida por Marina Carvalho Endo (matrícula nº 231.341), tornando-se necessária a apuração da área remanescente (fls. 118/119). Aduz que Maria Carvalho Endo (proprietária da matrícula 231.341) regularizou sua propriedade via usucapião, depois de romper o elo registrário que o imóvel possuía com a matrícula 3.092 e transcrição 54.485. O Ministério Público opinou pelo indeferimento de pedido (fls. 270/272). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Com razão o Oficial Registrador e o Douto Promotor de Justiça. De acordo com a decisão que determinou o bloqueio da matrícula nº 3.092, objeto deste procedimento, proferida pelo MMº Juiz Drº Asdrubal Nascimberi (fls.120/121), o motivo para realização do ato foi a “duplicidade de linha filiatórias, com o mesmo berço tabular”, sendo imperativo em caráter acautelatório o bloqueio dos registros, diante da impossibilidade do cancelamento com fulcro no artigo 214 da Lei 6.015/73, por não se tratar de nulidade de pleno direito. Neste contexto, apesar da argumentação e documentos trazidos pela requerente, não foram carreados aos autos fatos e documentos novos que permitam a autorização de desbloqueio da matrícula, em preservação a segurança jurídica que os atos registrários devam assegurar a terceiros. No mais, não há como se cancelar os registros em duplicidade e consequentemente proceder a abertura de nova matrícula, como bem observou o Douto Promotor de Justiça: “a presença de proprietários distintos na matrícula nº 3.092 e na transcrição nº 54.485 denota a existência de conflitos de interesse…” Consoante a lição de Narciso Orlandi Neto, citada na decisão proferida em 27 de setembro de 2010, nos autos do processo 100.10.028627-4, desta 1ª Vara de Registros Públicos, que deliberou sobre questão similar (fls. 37 – 42), não se pode determinar de plano, a partir da existência da duplicidade, que uma das inscrições antinômicas seja necessariamente nula. Inscrições que não sejam nulas pleno iure somente podem ser canceladas em decorrência de sentença proferida em devido processo contencioso que assegure a ampla defesa de ambos os titulares, pois todos estes possuem legitimidade para tentar fazer prevalecer o seu direito. A via administrativa mostra-se inadequada para dirimir o conflito, competente para cancelamento de um registro somente em casos de vício extrínseco, detectável de plano sem a necessidade de análise de outros fatos e circunstâncias (artigo 214, Lei 6.015/73). Cancelar um registro em duplicidade, fora das vias ordinárias, é medida perigosa, pois priva o titular de defender o seu direito, que, como dito, não se deve presumir nulo. Como já decidiu este Juízo: “A existência do duplo registro faz desaparecer a presunção relativa de verdade de seu conteúdo, de sorte que sua restauração depende da eliminação da duplicidade pelo titular, por meio do cancelamento do registro contraditório nas vias ordinárias, sendo viável o cancelamento administrativo apenas quando a duplicidade decorre de inofensivo erro interno, hipótese diversa da presente, em que há interesses de terceiros envolvidos” (Processo 100.10.016232-0- 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo) O Conselho Superior da Magistratura de São Paulo já deliberou sobre questão similar e ensinou que a duplicidade no registro faz desaparecer a presunção de que o direito pertence àquele em cujo nome está registrado. Inexistente tal presunção, como corolário deverá haver o bloqueio das correntes filiatórias. “A regra do art. 859 do Código Civil, autorizadora do princípio da presunção, não pode ser chamada por nenhum daqueles titulares dos registros duplos. A presunção de que o direito pertence àquele em cujo nome está registrado não pode conviver com o duplo registro. Seria ilógico raciocinar com a presunção favorecendo, ao mesmo tempo, duas pessoas cujos direitos não podem coexistir. Em outras palavras, a presunção de veracidade do registro desaparece quando há duplicidade. A conseqüência é a impossibilidade de prática de qualquer ato em qualquer das correntes filiatórias, até que, na via adequada, se decida pela prevalência de uma ou de outra. Releva observar que não se está afirmado a possibilidade de “bloqueio” das correntes filiatórias. Surge ele como conseqüência inevitável da perda da presunção.” (Apelação Cível N.º 4.094-0-São Vicente) O pedido de retificação de área resta prejudicado pela manutenção do bloqueio, que impede a realização de novos atos na matrícula do imóvel, visando a segurança jurídica perante terceiros de boa fé. Assim, deve ser mantido o bloqueio, devendo a requerente buscar as vias judiciais apropriadas, onde incidirá os princípios do contraditório e da ampla defesa, devendo haver nesta hipótese ampla dilação probatória. Diante do exposto, indefiro o pedido de providências formulado por Vilma Alves Pereira em face do Oficial do 9º Registro de Imóveis da Capital e mantenho o bloqueio da matrícula nº 3.092. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivemse os autos. P.R.I.C São Paulo, 11 de fevereiro de 2015. Tania Mara Ahualli Juíza de Direito – ADV: ONASSIS LEME DA MATA (OAB 342338/SP)

Fonte: DJE – SP | 20.02.2015.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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