CGJ/SP: Registro de Imóveis – Loteamento – Impugnação ao registro – Revogação pela Prefeitura Municipal do ato de aprovação do projeto de parcelamento do solo – Fato superveniente ocorrido no interregno entre a prenotação do título e o registro – Inviabilidade do registro (arts. 12 e 18, V, da Lei nº 6.766/1979) – Controle de legalidade passível de ser realizado de ofício, o que afasta a alegação de intempestividade da impugnação, que foi acolhida – Recurso não provido.


  
 

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2014/132547
(379/2014-E)

Registro de Imóveis – Loteamento – Impugnação ao registro – Revogação pela Prefeitura Municipal do ato de aprovação do projeto de parcelamento do solo – Fato superveniente ocorrido no interregno entre a prenotação do título e o registro – Inviabilidade do registro (arts. 12 e 18, V, da Lei nº 6.766/1979) – Controle de legalidade passível de ser realizado de ofício, o que afasta a alegação de intempestividade da impugnação, que foi acolhida – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso administrativo interposto por Empreendimento Imobiliário Jardim Alto da Bela Vista IV Ltda. contra decisão do Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Itápolis, que julgou procedente a impugnação ao registro de loteamento por aquela requerido, devido à revogação da aprovação do parcelamento do solo em questão pela Municipalidade.

Sustenta, preliminarmente, a intempestividade da impugnação. No mérito, afirma que, por força da prenotação do título, as aprovações urbanísticas trazidas à qualificação do Oficial e do Juiz Corregedor Permanente já produziram seus efeitos à época da impugnação, de sorte que a decisão desta ultima não pode levar em consideração dados outros, além daqueles apresentados inicialmente. Por via de consequência, aduz, a revogação do decreto municipal que aprovou o loteamento, além de ilegal, não pode ser apreciada em procedimento administrativo, como o da impugnação prevista nos arts. 19 e seguintes da Lei n° 6.766/1979, e tampouco atingir atos jurídicos perfeitos e acabados, decorrentes das licenças anteriormente expedidas, as quais consolidaram a situação do empreendimento desde a prenotação.

A Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso interposto.

É o relatório.

Passo a opinar.

Existe precedente exatamente equivalente ao caso ora analisado – Processo CGJ 451/2006 –, razão pela qual, nesse voto, repetem-se as mesmas razões.

A preliminar de intempestividade da impugnação não prospera. As irregularidades que levam à impossibilidade do registro do loteamento podem e devem ser conhecidas de ofício pelo Juiz Corregedor Permanente. Irrelevante, dessa forma, que o prazo de impugnação tenha sido ultrapassado.

Ressalte-se que se está diante, aqui, de controle da legalidade administrativa do registro do loteamento em discussão, passível de ser realizado a qualquer tempo, de maneira que sequer seria necessário procedimento específico de impugnação ou correspondência com a matéria ventilada neste.

Confira-se, no ponto, o entendimento de Vicente Celeste Amadei e Vicente de Abreu Amadei:

‘(…) em rigor, para controle de legalidade administrativa, sequer é necessário prever incidente de impugnação de loteamento, com rito especial e prazos legais. É que, estando a Administração Pública e o Registro Imobiliário vinculados à estrita observância legal, diante de ilegalidade que implique nulidade de pleno direito, qualquer um pode apontá-la, a qualquer tempo, quer para evitar a consumação do ato em vias de efetivação, quer para a promoção do cancelamento, caso efetivado.

Assim, por exemplo, caso o oficial registrador entenda estar em ordem os documentos apresentados para o registro especial do art. 18 da Lei nº 6.766/79 (superada, pois, a fase de qualificação, com resultado positivo), quando, em verdade, isso não ocorrer, por falta de observância dos requisitos dessa norma legal (falta de aprovação municipal, falta de anuência prévia de órgão estadual, falta de certidão a que a lei se refere, etc.), o Ministério Público ou qualquer um do povo pode, independentemente de publicação de edital e de incidente de impugnação, apontar a falha ao Juízo Corregedor que, no exercício de seu poder-dever fiscalizador, atuará para, em controle de legalidade de ato administrativo, obstar o registro e determinar a devolução dos títulos com nota de exigência. Aliás, para isso, o Juízo Corregedor até pode agir de ofício.’ (Como lotear uma gleba – o parcelamento do solo urbano em seus aspectos essenciais – loteamento e desmembramento. 2ª ed. Campinas: Millennium, 2003, p. 208, sem grifos no original).

De todo modo, nada impede que o controle de legalidade do procedimento de registro do loteamento se dê, igualmente, pela via da impugnação prevista no art. 19 da Lei nº 6.766/1979, aproveitando-se esta última, tendo em vista a amplitude que vem sendo admitida no âmbito desta Corregedoria Geral da Justiça no tocante ao objeto, aos limites e à legitimidade para o incidente em questão (Proc. CG 1.258/2000), não obstante respeitáveis entendimentos doutrinários e jurisprudenciais em sentido contrário (cf. Vicente Celeste Amadei e Vicente de Abreu Amadei, ob. cit, p. 203-210).

No mérito, conforme se verifica dos autos, a recorrente requereu ao Oficial do Registro de Imóveis o registro do loteamento residencial denominado ‘Jardim Alto Bela Vista IV’, então aprovado pelo Decreto nº 4.366/12.

O procedimento de registro desenvolveu-se regularmente, com qualificação positiva por parte do oficial registrador e expedição de editais, sobrevindo impugnação.

A impugnação foi contestada pela recorrente e, inicialmente, também pelo Município de Itápolis, que, todavia, na sequência, houve por bem revogar o ato de aprovação do loteamento, por intermédio da edição do Decreto n° 4.458, de 1.4 de junho de 2.013.

Não há como ignorar, no caso, que, com a revogação, pela Prefeitura Municipal, do ato de aprovação do loteamento, ficou sem amparo legal o registro do empreendimento ora em discussão na serventia predial, à luz do disposto no art. 12 e no art. 18, V, da Lei nº 6.766/1979, como decidido pelo Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente em primeira instância.

Saliente-se que a higidez do título apresentado pelo interessado, sob a ótica da legalidade, deve ser aferida no momento do registro, sendo suscetível sua análise até que este se efetive, ainda que superada a fase de qualificação registral realizada pelo oficial registrador, com resultado positivo.

Assim, fato superveniente à qualificação efetivada pelo registrador, capaz de repercutir sobre a legalidade do registro pretendido, como na hipótese a revogação da aprovação do loteamento pela municipalidade, deve ser considerado, enquanto não aperfeiçoado o ato registral, não se podendo falar em situações jurídicas consolidadas e atos jurídicos perfeitos com a simples prenotação.

De acordo com a doutrina de Afrânio de Carvalho:

O protocolo tem, no sistema brasileiro, uma função definida, que é assegurar a prioridade sem prejuízo da legitimação. Graças à prenotação ordenada do título no protocolo, torna-se possível examinar os requisitos de legitimidade do título sem o risco de que outro adverso lhe tome o lugar na inscrição. É o assinalamento da ordem de apresentação de cada título que permite assegurar que só aquele revestido de legitimação e de prioridade chegará à inscrição, transpondo o vestíbulo do Registro de Imóveis, que é o protocolo.

(…)

Terminada a fase liberal da recepção e da prenotação dos títulos com o assinalamento em cada um deles, a carimbo, do número de ordem com que foi protocolado (art. 183), começa a fase da seleção, destinada a separá-los, pelo critério da legalidade, em dois grupos, o dos inscritíveis e o dos não-inscritíveis. A seleção, que dura pouco ou muito tempo, conforme as circunstâncias, coloca os títulos, enquanto se processa, em estado de pendência, o qual somente cessa quando passam para o livro de inscrição ou são devolvidos aos interessados, depois de cancelada a respectiva prenotaçao.’ (Registro de Imóveis. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 373 e 378).

Dessa forma, revogado o ato de aprovação do loteamento pela Prefeitura Municipal de Itápolis no interregno entre a prenotação e o registro, antes que este último se aperfeiçoasse, vale dizer, ainda na fase de ‘seleção’ do título, não se pode ter, pelo critério da legalidade, como inscritível o projeto do empreendimento, ante os expressos termos dos arts. 12 e 18, V, da Lei nº 6.766/1979.

Anote-se que a validade ou invalidade da revogação do ato de aprovação do projeto do loteamento, pela Municipalidade, não comporta, à evidência, discussão nesta esfera administrativa, sendo matéria reservada à esfera jurisdicional, mantendo-se íntegro, ao que consta, até o presente, o decreto revogador.

Nesses termos, o parecer que se submete à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de que seja negado provimento ao recurso interposto.

Sub censura.

São Paulo, 10 de dezembro de 2014.

Swarai Cervone de Oliveira

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. São Paulo, 15.12.2014. – (a) – HAMILTON ELLIOT AKEL – Corregedor Geral da Justiça.

Diário da Justiça Eletrônico de 19.01.2015
Decisão reproduzida na página 08 do Classificador II – 2015

Fonte: INR Publicações | 21/06/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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