Dúvida registral – 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São José dos Campos, que suscita dúvida envolvendo recolhimento de ITBI, decorrente da transmissão de imóvel por meio de dação em pagamento – Recolhimento do tributo que se deu em janeiro de 2015, quando o imóvel se localizava em zona rural e a base de cálculo do imposto correspondia ao valor da transação – Lavratura da escritura de dação que se deu somente em julho de 2015, quando o bem passou a ser enquadrado na zona urbana, sendo a base de cálculo do tributo o valor venal do bem – Questão já solucionada pelo Conselho Superior da Magistratura deste Tribunal – Inexistência de vedação legal a que o recolhimento do tributo ocorra antes da lavratura da escritura de transmissão da propriedade – Eventual irregularidade do recolhimento que deve ser apurada pelo órgão fazendário, e não pelo oficial de registro, salvo se a divergência for expressiva e inequívoca – Recolhimento feito menos de um mês depois da assinatura de instrumento particular – Apresentação de certidão negativa emitida pela própria Prefeitura, que afasta a tese de flagrante irregularidade do recolhimento – Sentença de improcedência mantida – Recurso desprovido.


  
 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 1024220-41.2015.8.26.0577, da Comarca de São José dos Campos, em que é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado PROGRESSO EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA..

ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores MAIA DA CUNHA (Presidente sem voto), FÁBIO QUADROS E HAMID BDINE.

São Paulo, 9 de novembro de 2017.

Teixeira Leite

RELATOR

Assinatura Eletrônica

Voto nº 27620

DÚVIDA REGISTRAL. 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São José dos Campos, que suscita dúvida envolvendo recolhimento de ITBI, decorrente da transmissão de imóvel por meio de dação em pagamento. Recolhimento do tributo que se deu em janeiro de 2015, quando o imóvel se localizava em zona rural e a base de cálculo do imposto correspondia ao valor da transação. Lavratura da escritura de dação que se deu somente em julho de 2015, quando o bem passou a ser enquadrado na zona urbana, sendo a base de cálculo do tributo o valor venal do bem. Questão já solucionada pelo Conselho Superior da Magistratura deste Tribunal. Inexistência de vedação legal a que o recolhimento do tributo ocorra antes da lavratura da escritura de transmissão da propriedade. Eventual irregularidade do recolhimento que deve ser apurada pelo órgão fazendário, e não pelo Oficial de Registro, salvo se a divergência for expressiva e inequívoca. Recolhimento feito menos de um mês depois da assinatura de instrumento particular. Apresentação de certidão negativa emitida pela própria Prefeitura, que afasta a tese de flagrante irregularidade do recolhimento. Sentença de improcedência mantida. Recurso desprovido.

Trata-se de apelação tirada da r. sentença de fls. 145/146, que julgou improcedente a dúvida suscitada pelo 1º OFICIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS contra PROGRESSO EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., por entender o d. Juízo, que a atividade de registro se limita à verificação sobre se houve o recolhimento do ITBI e não a respeito do quantum pago.

O Ministério Público do Estado de São Paulo, inconformado, aduz em suas razões (fls. 152/153) que a dúvida suscitada pelo Registro de Imóveis é pertinente e deve ser acolhida, na medida em que “a diferença de imposto a recolher é gritante, na casa dos milhões, se considerado o que fora por ele arrecadado”. Defende o Parquet que se o registrador pode ser chamado a responder solidariamente pelo pagamento de tributos relativos à transmissão de imóveis, sua função fiscalizatória não pode ficar adstrita ao simples recolhimento, mas também, em caso de divergência, à aferição sobre a correção de valores. Argumenta que a recusa de registro, em concreto, foi legítima e que seria necessário ao interessado obter manifestação favorável prévia do órgão fazendário, para somente então reapresentar o título.

Contrarrazões às fls. 157/171.

Parecer da d. Procuradoria de Justiça (fls. 176/178), opinando pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Em breve suma, apresentou a interessada Progresso Empreendimentos Imobiliários Ltda., escritura de dação em pagamento (prenotada sob o nº 559.720) a registro, perante o 1º CRI de São José dos Campos, em relação ao imóvel matriculado sob o nº 230.372.

A Oficial responsável, sob a alegação de que sua responsabilidade é solidária em relação ao pagamento de tributos, apresentou nota de devolução em que apontada a insuficiência do recolhimento do ITBI.

Do que se constata, a divergência está relacionada à base de cálculo do tributo, tendo em vista que no momento em que realizado o lançamento do imposto (23/01/2015), o imóvel se encontrava cadastrado perante o INCRA, de modo que a base de cálculo coincidiria com o valor da transação (R$ 196.000,00).

Todavia, em 05/02/2015, o imóvel passou a ser enquadrado na zona urbana do Município, o que significa que a base de cálculo do ITBI passaria a ser o valor venal do bem (R$ 20.456.061,39).

Embora o recolhimento do ITBI tenha ocorrido em janeiro de 2015, a escritura de dação somente foi lavrada em 08/07/2015, quando o imóvel já se qualificava como urbano, razão pela qual entende a Oficial que a base de cálculo deveria ser o valor venal do bem.

Considerando a expressiva divergência entre o valor recolhido e o que entende o suscitante como devido, foi apresentada esta dúvida registral.

Pois bem.

De início, fica rejeitada a preliminar de não conhecimento do recurso, suscitada nas contrarrazões, uma vez que seus fundamentos se confundem com o mérito, a seguir analisado.

Respeitada a convicção do apelante, a insurgência não merece prosperar.

Com efeito, é entendimento reiterado deste Tribunal não caber ao Oficial de Registro de Imóveis apurar o quantum do tributo devido nas operações de transmissão de imóveis, mas apenas aferir se o imposto foi efetivamente recolhido e se eventual incorreção do pagamento representa quantia expressiva, em flagrante desacordo com a legislação aplicável, único caso em que o registro pode ser negado até regularização.

Isso porque, a conferência do valor do tributo é atividade típica dos órgãos fazendários, não sendo lícito ao Registro de Imóveis se sub-rogar nesta função.

Nesse sentido, são as ementas que seguem:

“Registro de Imóveis – Registro de escritura pública de dação em pagamento – Desqualificação – Suposta incorreção da base de cálculo utilizada para o recolhimento do ITBI – Dúvida julgada improcedente – Apelação interposta pelo Ministério Público – Atuação que extrapola as atribuições do Oficial – Dever de fiscalização que se limita ao recolhimento do tributo e à razoabilidade da base de cálculo – Recolhimento antecipado do ITBI que não afronta as NSCGJ nem a legislação municipal – Recurso a que se nega provimento.” (Ap. 1024158-98.2015.8.26.0577, Rel. Pereira Calças, j. 25/08/2017)

“Registro de Imóveis – Escritura pública de conferência de bens – Desqualificação – Suposta incorreção da base de cálculo utilizada para o recolhimento do ITBI – Atuação que extrapola as atribuições do Oficial – Dever de fiscalização que se limita ao recolhimento do tributo – Lançamento, ademais, feito pelo próprio sujeito ativo da obrigação tributária, na forma da legislação municipal – Recurso a que se dá provimento.” (Ap. 1009023-43.2016.8.26.0405, Rel. Pereira Calças, j. 20/07/2017)

“Registro de Imóveis – Dúvida inversa – Escritura de Doação – Desqualificação – Manutenção da exigência pelo MM. Juiz Corregedor Permanente – Discussão a respeito da base de cálculo a ser utilizada no cálculo do ITCMD – Atuação que extrapola as atribuições do registrador – Dever de fiscalização que se limita ao recolhimento do tributo – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro do título.” (Ap. 0031287-16.2015.8.26.0564, Rel. Pereira Calças, j. 24/05/2017)

A circunstância de a escritura de dação em pagamento ter sido lavrada em data posterior ao recolhimento do tributo, igualmente já se posicionou esta Corte no sentido de inexistir irregularidade.

Tal se explica porque, o art. 15, do Capítulo XIV das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, estabelece que as escrituras de compra e venda, para serem lavradas, devem vir acompanhadas da guia de recolhimento do ITBI ou ITCMD.

É dizer, embora o fato gerador dos tributos em comento seja a transmissão da propriedade, a formalização do ato pressupõe o seu prévio recolhimento.

Ademais, inexiste norma que proíba o recolhimento do tributo em momento anterior à lavratura da escritura, tampouco que estabeleça um limite para essa antecipação de pagamento.

A esse respeito, peço vênia para transcrever trecho de voto da lavra do e. Des. Pereira Calças, ao analisar caso semelhante e recente envolvendo recolhimento de ITBI na Comarca de São José dos Campos:

“Dispõe o item 15 do Capítulo XIV das NSCGJ:

15. O Tabelião de Notas manterá arquivos para os seguintes documentos necessários à lavratura dos atos notariais, em papel, microfilme ou documento eletrônico:

(…)

b) comprovante ou cópia autenticada do pagamento do Imposto sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis, de direitos reais sobre imóveis e sobre cessão de direitos a sua aquisição ITBI e do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação ITCMD, quando incidente sobre o ato, ressalvadas as hipóteses em que a lei autorize a efetivação do pagamento após a sua lavratura;

Pelas Normas de Serviço, salvo autorização legal expressa, o comprovante de recolhimento de ITBI deve ser apresentado no momento da lavratura da escritura de compra e venda.

Assim, ainda que o fato gerador do ITBI ocorra somente com a transmissão da propriedade o que ocorre com o registro do título na serventia imobiliária , fato é que as NSCGJ exigem que o tributo seja recolhido, em regra, de forma antecipada, no caso, antes mesmo da lavratura da escritura pública.

E se por um lado o artigo 12 da Lei Complementar no 383/09 do município de São José dos Campos preceitue que ‘o Imposto Sobre a Transmissão ‘Inter Vivos’ de Bens Imóveis será recolhido até a data do ato de transmissão de bens ou direitos reais’ o que autorizaria o recolhimento após a lavratura da escritura ; por outro, não existe dispositivo legal que proíba a antecipação do recolhimento do tributo para momento anterior à lavratura da escritura.” – destacado no original – (Ap. 1024158-98.2015.8.26.0577, j. 25/08/2017)

Vale pontuar que a dação em pagamento objeto deste processo foi firmada em virtude da constituição de sociedade em conta de participação, voltada à implementação de um loteamento imobiliário. A sociedade em conta de participação foi constituída por instrumento particular subscrito em 30/12/2014 (fls. 62/73), sendo razoável o recolhimento do ITBI em 23/01/2015, não se vislumbrando, dessa circunstância, intenção de burla ou má-fé da apelada.

Ademais, observa-se que foram apresentadas certidões expedidas pela Prefeitura de São José dos Campos atestando a inexistência de pendências tributárias envolvendo o imóvel (fls. 15/16), o que denota, ao menos em princípio, a regularidade do recolhimento do ITBI.

Frise-se que embora estivesse o bem enquadrado em zona rural até fevereiro de 2015, o recolhimento do ITBI era feito perante a própria Prefeitura de São José dos Campos que, se acaso apurasse uma divergência, não teria dado quitação (fls. 25/26).

Nesse contexto, não se vislumbrando irregularidade patente no recolhimento do tributo, é de se manter a r. sentença que julgou improcedente a dúvida registral, inclusive no que se refere à determinação de expedição de ofício, com cópia deste processo, à Fazenda Municipal, para conferência.

Ante o exposto, voto pelo desprovimento do recurso.

TEIXEIRA LEITE

Relator

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1024220-41.2015.8.26.0577 – São José dos Campos – 4ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Teixeira Leite – DJ 19.02.2018

Fonte: INR Publicações.

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