Artigo – Registrador Imobiliário: O mais novo amigo da posse – Pré-requisito à pretensão usucapienda – Por Franklin Maia


  
 

“Os Registradores devem ter profundo conhecimento da posse.” (Des. Francisco Loureiro).

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo fomentar o debate em razão da principal inovação do Novo Código de Processo Civil no campo do direito notarial e registral, o reconhecimento da usucapião extrajudicial no registro imobiliário. Para tanto, é fundamental, diante da inovação, que o registrador imobiliário deva conhecer todos os elementos da posse, seus efeitos, classificação e requisitos da usucapião etc., uma vez que a usucapião não se trata de um título, mas, sim, de um processo administrativo.

  1. INTRODUÇÃO

Considerando as disposições contidas no art. 1.071, da Lei n°. 13.105/2015 (Novo Código de Processo Civil), que introduziu o art. 216-A na Lei de Registros Públicos, para admitir o reconhecimento extrajudicial da usucapião; uma vez que trouxe grande inovação para classe notarial e registral, inicialmente, tal procedimento vem gerando inúmeras dúvidas de ordem prática e de aplicação do instituto. Por esta razão a necessidade de regulamentação por meios de provimentos oriundos de diversas corregedorias gerais dos Estados, como exemplo do Acre (Provimento n° 05/2016), São Paulo (Provimento n° 58/2015), Rio Grande do Norte (Provimento n° 145/2016).
O art. 216-A do novo CPC constata que sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial da usucapião, que será processada diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que se situa o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representada por advogado.
Como se verifica, o legislador não extinguiu a usucapião judicial, a novidade, na verdade, está na extensão da aplicação do instituto. Acontece que o referido dispositivo instituiu-se um processo registrário, que até merece profunda aprovação na “medida em que relações consensuais não são próprias para a função judiciária”.[1]
Para tanto, os registradores devem ter profundo conhecimento de posse. Devem conhecer todos os elementos da usucapião extrajudicial, devendo observar as causas de suspensão e interrupção do prazo prescricional aquisitivo, requisitos e espécies de usucapião.
Assim, questões técnicas e elementos essenciais precisam ser compreendidos e estudados pelos registradores, na medida em que vão trabalhar com fatos e condutas e não com títulos (adstrito à posse).

  1. POSSE – CARACTERIZAÇÃO – CONCEITO

A compreensão do fenômeno da posse tem sempre como pressuposto uma situação de fato que vincula uma pessoa a uma coisa, em razão de sua utilização econômica, independente de essa pessoa ser ou não ser proprietária da coisa.
Na linha desses princípios, define-se a posse como “a relação de fato estabelecida entre a pessoa e a coisa pelo fim de sua utilização econômica”.[2]
A posse costuma ser definida como a exteriorização da propriedade. O Código Civil Brasileiro, no seu art. 1.196, nos fornece o conceito de possuidor, esclarecendo: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.” Constitui, pois a posse uma situação de fato, na qual alguém mantém determinada coisa sob a sua guarda e para o seu uso e gozo, tendo ou não a intenção de considera-la como sendo de sua propriedade.
O direito das coisas regula as relações jurídicas oriundas do poder que o indivíduo exerce sobre as coisas, podendo a utilização dos bens decorrer de uma situação jurídica ou de uma situação de fato. Há situação jurídica quando o titular tem algum direito real, seja o de propriedade, seja qualquer direito real sobre coisa alheia. A situação de fato, ao contrário, caracteriza-se por independer de título e fundamentação jurídica. Tal situação poderá ter ou não consequências jurídicas, de acordo com certos elementos específicos que existem em determinadas hipóteses e inexistem em outras.
A situações de fato que tem consequências jurídicas é denominada posse. Aquela que é juridicamente irrelevante, limitando-se a constituir simples fato material, sem repercussão no mundo do direito, é adetenção.[3]
Os efeitos da posse abrangem uma proteção especial (interditos possessórios), e a expectativa mais ou menos remota de transformar a posse em propriedade, pelo simples decurso do tempo, em virtude da usucapião. Pode ocorrer que a posse só tenha o primeiro desses efeitos (posse ad interdicta) ou que tenha ambos, sendo então, simultaneamente, posse ad interdicta e posse ad usucapionem.

  1. POSSE AD USUCAPIONEM

A posse ad usucapionem é aquela revestida das características necessárias a que o possuidor adquira a propriedade por usucapião. Para tal, se faz necessário que, além da presença dos elementos essenciais da posse – o corpus e o animus – (teoria da posse), estejam também presentes os demais elementos que assegurem ao possuidor a obtenção do direito de propriedade sobre a coisa, entre eles o decurso de certo tempo, a boa-fé, que a posse seja mansa e pacífica; além disso, em outra hipótese necessário comprovação da posse em justo título.

  • [4] conceitua usucapião dizendo:
  • A posse prolongada da coisa pode conduzir à aquisição da propriedade, se presentes determinados requisitos estabelecidos em lei. Em termos mais concretos, denomina-se usucapião o modo de aquisição da propriedade mediante a posse suficientemente prologada sob determinadas condições.”
  1. CONCLUSÃO

Não mais existem dúvidas de que o registrador deve atuar em cumprimento de todas as formalidades requeridas por lei, pois sua inobservância implicam consequências jurídicas serias em razão do ato praticado, tendo em vista o carácter público que tem a função registradora.
Como abordado, o presente artigo buscou como maior objetivo fomentar o debate em razão do reconhecimento da usucapião administrativa. Para tanto, é de fundamental importância, que o registrador imobiliário busque conhecer todos os elementos da posse, seus efeitos, classificação e requisitos, etc., uma vez que a usucapião não se trata de um título, mas, sim, de um processo administrativo.
A principal característica que o Registrador deve ter é o bom senso. O professor Luiz Egon Richter traduz bem a que se destina a função do registrador:
“A contingencialidade é própria do objeto da atividade registral, razão pela qual, não trabalha com um saber científico que apresenta regras de valor universal. Opera com base num saber prudencial, que tem por fim viabilizar e materializar a certeza jurídica aos atos que praticar em razão de sua competência”. (RICHTER, Egon Luiz in Função Qualificadora no Registro de Imóveis, Considerações, Reflexão e Pensamento. p. 1-2. Extraído do site: http://www.regimo.com.br/funcao.pdf).
Diante desse cenário, a atividade registral atravessa grandes transformações, assim verifica-se que antigos titulares de Serventias percebem que só a prática e o tempo não resolvem problemas sem uma base de conhecimento sólida e prepostos qualificados que os auxiliem. Denota que a atividade se aperfeiçoa com a prática e com uma visão ampla do Direito e suas diversas áreas em conexão com o Direito Notarial e Registral.
Portanto, os Registradores Imobiliários tem que aprimorar seus conhecimentos a fim de buscar o registro sem colocar em cheque a segurança jurídica de seus atos, eis o grande desafio do profissional (a usucapião administrativa), e a grande esperança e anseio da sociedade.

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Dr. AUGUSTO FRANKLIN DE PAIVA MAIA
Ex-auxiliar de Cartório – Advogado – Consultor e Assessor Jurídico do 2º Ofício de Notas de Parnamirim/RN – Especialista em Direito Notarial e Registral (IBEST/Londrina/PR) – Pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil (UFRN) – Membro Individual da União Internacional do Notariado Latino (UINL-Roma) – Membro da Comissão de Direito Notarial e Registros Públicos da Ordem dos Advogados do Brasil da Seccional do Estado do Rio Grande do Norte (OAB/RN) – Integrante da Comissão do Notariado Jovem (CNB-CF) – Autor de Artigos.

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[1] DIP, Ricardo Henry Marques. Entrevistas sobre Usucapião Extrajudicial. Primeira Parte. Academia Notarial Brasileira (ANB). Disponível em: http://www.notariado.org.br/index.php?pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw==&in=NzE0MA. Acesso aos 22/03/2016.

[2] BEVILACQUA, Clóvis. Direito das Coisas. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1955. Vol. I, p. 30. Citado por CHALHUB, Melhim Namem. Direitos Reais, 2. ed. rev., atual. E ampl. São Paulo: Editora RT, 2014.

[3] WALD, Arnoldo, Direito das Coisas. Curso de Direito Civil Brasileiro. 8. ed. rev., atual. e ampl. Vol. III. São Paulo: Editora RT, 1991.

[4] VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Direitos Reais. 6. Ed. – São Paulo: Atlas, 2006. (coleção Direito Civil: V).

Fonte: Notariado | 23/03/2016.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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