Administrativo – Processual civil – Recurso Ordinário em Mandado de Segurança – Enunciado Administrativo 3/STJ – Concurso público – Outorga de delegações de serventias cartorárias extrajudiciais notariais e registrais – Prova de títulos – Documentação apresentada – Comprovação de atividade advocatícia – Determinação do CNJ – Falta de observância de regramento da OAB – Ilegalidade flagrante – Possibilidade de intervenção do Poder Judiciário

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 58.895 – PI (2018/0262547-5)

RELATOR : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES

RECORRENTE : DANIELLE BUENO FERNANDES NAVARINI

ADVOGADOS : DALINE BUENO FERNANDES – MT015847

SIRLENE DE JESUS BUENO – MT006697

RAFAEL EDUARDO BABINSKI – MT018584

RECORRIDO : ESTADO DO PIAUÍ

PROCURADOR : DANILO MENDES DE SANTANA E OUTRO(S) – PI016149

EMENTA

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. CONCURSO PÚBLICO. OUTORGA DE DELEGAÇÕES DE SERVENTIAS CARTORÁRIAS EXTRAJUDICIAIS NOTARIAIS E REGISTRAIS. PROVA DE TÍTULOS. DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA. COMPROVAÇÃO DE ATIVIDADE ADVOCATÍCIA. DETERMINAÇÃO DO CNJ. FALTA DE OBSERVÂNCIA DE REGRAMENTO DA OAB. ILEGALIDADE FLAGRANTE. POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. RE 632.853/CE.

1. O edital do concurso público constitui lei entre as partes, gerando direitos e obrigações tanto para a Administração Pública quanto para o candidato, compelidos ambos à sua fiel observância.

2. “Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas. (…) Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame” (RE 632.853/CE, Relator: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/2015).

3. Na hipótese da regulação de prova de títulos estabelecida como etapa de certame para a outorga de delegação de serventia cartorária extrajudicial, tanto o candidato quanto a Administração Pública obrigam-se ao que estipulado em tempo e modo oportunos para efeito de cômputo no exame.

4. Ao atuar o Conselho Nacional de Justiça para que ademais das regras editalícias a avaliação de títulos observasse singularmente o teor do art. 5.º do Regulamento Geral da Advocacia e da OAB, como critério outro além dos previstos inicialmente, revela-se ilegal o ato administrativo da comissão examinadora que condiciona o exame da documentação a outros elementos extrínsecos à regulação da Ordem.

5. Recurso ordinário em mandado de segurança provido.

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: “A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).” A Sra. Ministra Assusete Magalhães, os Srs. Ministros Francisco Falcão (Presidente), Herman Benjamin e Og Fernandes votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 06 de dezembro de 2018

MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator):  Danielle Bueno Fernandes interpõe recurso ordinário em mandado de segurança com fundamento no art. 105, inciso II, alínea “b”, da Constituição da República, contra o acórdão prolatado pelo Eg. Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, assim ementado:

CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE LIMINAR QUE ESGOTE, NO TODO OU EM PARTE, O OBJETO DA AÇÃO. PREJUDICADA. INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA PROCESSAR E JULGAR O PRESENTE MANDAMUS. REJEITADA. CONCURSO PARA OUTORGA DE DELEGAÇÃO DE SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS DE NOTAS E SERVENTIAS DO ESTADO DO PIAUÍ. PONTUAÇÃO REFERENTE À PRATICA DE ADVOCACIA. DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA.

1. Prejudicada a preliminar de vedação à concessão de liminar contra Fazenda Pública, uma vez que, não fora concedida liminar nestes autos.

2. A competência para julgar mandado de segurança define-se pela categoria da autoridade coatora e pela sua sede funcional, razão pela qual, merece ser rechaçada a preliminar de incompetência deste Tribunal de Justiça.

3. As certidões acostadas aos autos não demonstram o período de início e fim em que a impetrante fora habilitada em cada processo, informação necessária para que se possa aferir se, efetivamente, atuara como advogada, por um mínimo de três anos até a data da primeira publicação do edital de abertura do concursos.

4.Denegação da segurança.

(TJPI | Mandado de Segurança Nº 2017.0001.003940-8 | Relator: Des. Fernando Lopes e Silva Neto | 4ª Câmara de Direito Público | Data de Julgamento: 20/06/2018)

Trata-se de ação mandamental impetrada com o objetivo de reexaminar os critérios de avaliação de prova de títulos aplicada em concurso público de outorga de delegações cartorárias extrajudiciais do Estado do Piauí.

Aduz que fazia jus a dois pontos ante a comprovação do exercício de prática advocatícia, mas a comissão examinadora houve de indeferir-lhe o pleito, daí a causa para a ação mandamental.

Em sua inicial nota-se articular com a existência de determinação do Conselho Nacional de Justiça para a observância de preceito contido no Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia por força do qual a sua documentação estaria em acordo.

Denegada a segurança e reiteradas as razões iniciais (e-STJ fls. 274/284)

Contrarrazões (e-STJ fls. 289/301).

O pedido de tutela provisória foi assim indeferido (e-STJ fls. 308/310):

Indefiro o pleito.

É bastante para tanto observar que as razões que o amparam na petição do ordinário são notadamente evasivas e genéricas, a recorrente utilizando-se meramente de formulações absolutamente desapegadas do caso concreto e que se prestariam, contudo, a justificar o mesmo pleito em qualquer outra sorte de demanda.

Demais, pesa considerar que nada obstante a controvérsia esteja centrada em avaliação de títulos, cuida-se concretamente de pretensão para que os documentos sejam reavaliados em conformidade ao edital e a uma determinação do CNJ, a fim de se saber se a banca examinadora avaliou-os corretamente ou não, o que insere a demanda, em tese, na regra geral proibitiva prescrita no RE 632.853/CE.

Assim, indefiro a tutela provisória.

Parecer do Ministério Público Federal pelo provimento parcial do recurso ordinário, segundo os termos reproduzidos na ementa assim redigida (e-STJ fls. 316/320):

Recurso ordinário em mandado de segurança. Concurso Público. Prova de títulos. Comprovação do exercício da advocacia. Inexis tência de revisão dos critérios da banca examinadora. Violação da legislação de regência. No Tema 485 da RG, o STF firmou orientação de que os critérios adotados por banca examinadora de concursos não podem ser revistos pelo Judiciário: ressalvou-se, contudo, o juízo de adequação do ato impugnado à legislação de regência. O Regulamento Geral da OAB, editado em razão do art. 78 da Lei 8.906/1994, ao prever a comprovação do exercício da advocacia, por meio de certidões expedidas por cartórios ou secretarias judiciais, não exige que delas constem as datas de início e fim da habilitação do advogado: apenas dispõe que deve haver a participação anual mínima, em cinco atos privativos; logo, a exigência contrária à lei gera a nulidade do ato impugnado.

Parecer pelo provimento parcial do recurso.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator): Dou razão ao pleito recursal.

Inicialmente é necessário consignar que o presente recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo n. 3/STJ: “Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015(relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC”.

A controvérsia é restrita à interpretação da cláusula editalícia de regulamentação da prova de títulos, conforme estipulada inicialmente no Edital 01, de 19/07/2013 para a outorga de delegação de serventias cartorárias extrajudiciais do Estado do Piauí, bem como ao exame de conformidade entre os documentos juntados pela recorrente e o referido regramento, isso com o objetivo de ao fim saber se fazia ela, ou não, jus ao direito de pontuar por toda a documentação apresentada.

Pois bem, o regramento em questão dispunha exatamente o seguinte:

13 DA SEXTA ETAPA – AVALIAÇÃO DOS TÍTULOS

13.1 A avaliação de títulos valerá, no máximo, 10,00 (dez) pontos, observado o seguinte:

I – exercício da advocacia ou de delegação, cargo, emprego ou função pública privativa de bacharel em Direito, por um mínimo de três anos até a data da primeira publicação do edital de abertura do concurso: 2,00 (dois) pontos;

II – exercício de serviço notarial ou de registro, por não bacharel em Direito, por um mínimo de 10 (dez) anos até a data da publicação do primeiro edital do concurso (art. 15, § 2º, da Lei n. 8.935/1994): 2,00 (dois) pontos;

III – exercício do magistério superior na área jurídica pelo período mínimo de 5 (cinco) anos:

a) mediante admissão no corpo docente por concurso ou processo seletivo público de provas e/ou títulos: 1,50 ponto (um e meio) ponto;

b) mediante admissão no corpo docente sem concurso ou processo seletivo público de provas e/ou títulos: 1,00 (um) ponto;

IV – diplomas em cursos de pós-graduação:

a) doutorado reconhecido ou revalidado: em Direito ou em Ciências Sociais ou Humanas: 1,00 (um) ponto;

b) mestrado reconhecido ou revalidado: em Direito ou em Ciências Sociais ou Humanas: 0,75 (setenta e cinco décimos) ponto;

c) especialização em Direito, na forma da legislação educacional em vigor, com carga horária mínima de trezentos e sessenta horas-aula, cuja avaliação haja considerado monografia de final de curso: 0,50 (meio) ponto;

V – exercício, no mínimo durante 1 (um) ano, por ao menos 16 (dezesseis) horas mensais, das atribuições de conciliador voluntário em unidades judiciárias, ou na prestação de assistência jurídica voluntária: 0,50 (meio) ponto;

VI – período igual a 3 (três) eleições, contado uma só vez, de serviço prestado, em qualquer condição, à Justiça Eleitoral: 0,50 (meio) ponto. Nas eleições com dois turnos, considerar-se-á um único período, ainda que haja prestação de serviços em ambos.

…………………………………………………………………………………………………………………….

13.9 DOS DOCUMENTOS NECESSÁRIOS À COMPROVAÇÃO DOS TÍTULOS

13.9.1 Para atender ao disposto nos incisos I, II e III, o candidato deverá observar as seguintes opções, conforme o caso:

a) para exercício de atividade em empresa/instituição privada: será necessária a entrega de 3 (três) documentos: 1 – diploma do curso de graduação em Direito, a fim de se verificar qual a data de conclusão de graduação, com exceção do inciso II, e atender ao disposto no subitem 13.9.1.3 deste edital; 2 – cópia da carteira de trabalho e previdência Social (CTPS), contendo as páginas: identificação do trabalhador; ou seja, a página que possui a foto e assinatura do candidato e a página que contém as informações pessoais deste; registro do empregador que informe o período (com início e fim, se for o caso) e qualquer outra página que ajude na avaliação, por exemplo, quando há mudança na razão social da empresa; e 3 – declaração do empregador com o período (com início e fim, se for o caso), a espécie do serviço realizado e a descrição das atividades desenvolvidas para o cargo/emprego;

b) para exercício de atividade/instituição pública: será necessária a entrega de 2 (dois) documentos: 1 – diploma do curso de graduação em Direito, com exceção do inciso II, a fim de se verificar qual a data de conclusão de graduação e atender ao disposto no subitem 13.9.1.3 deste edital; e 2 – declaração/certidão de tempo de serviço, emitida pelo setor de recursos humanos da instituição, que informe o período (com início e fim, até a data da expedição da declaração), a espécie do serviço realizado e a descrição das atividades desenvolvidas;

c) para exercício de atividade/serviço prestado por meio de contrato de trabalho: será necessária a entrega de 03 (três) documentos: 1 – diploma de graduação em Direito, com exceção do inciso II, a fim de se verificar qual a data de conclusão de graduação e atender ao disposto no subitem 13.9.1.3 deste edital; 2 – contrato de prestação de serviço/atividade entre as partes, ou seja, o candidato e o contratante; e 3 – declaração do contratante que informe o período (com início e fim, se for o caso), a espécie do serviço realizado e a descrição das atividades;

d) para exercício de atividade/serviço prestado como autônomo: será necessária a entrega de 3 (três) documentos: 1 – diploma de graduação em Direito a fim de se verificar qual a data de conclusão de graduação, com exceção do inciso II, e atender ao disposto no subitem 13.9.1.3 deste edital; 2 – recibo de pagamento autônomo (RPA), sendo pelo menos o primeiro e o último recibos do período trabalhado como autônomo; e 3 – declaração do contratante/beneficiário que informe o período (com início e fim, se for o caso), a espécie do serviço realizado e a descrição das atividades.

…………………………………………………………………………………………………………………….

13.9.1.2 Para efeito de pontuação referente à experiência profissional, não serão consideradas fração de ano nem sobreposição de tempo.

13.9.1.3 Para efeito de pontuação de experiência profissional, somente será considerada a experiência após a conclusão do curso de bacharelado em Direito, com exceção do inciso II do subitem 13.1 deste edital.

Durante o transcurso do certame houve a ingerência do Conselho Nacional de Justiça para aferir a lisura especificamente da etapa referida, de prova de títulos, em razão da instauração dos Procedimentos de Controle Administrativo n. 0005199-082015.2.00.0000 n. 0002012-26.2014.2.00.0000, disso resultando a publicação do Edital n. 32, de 30/09/2016, cujo teor, no que importa ao caso concreto, é o seguinte:

O DESEMBARGADOR ERIVAN LOPES, PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ (TJPI), em atenção à Resolução nº 81, de 9 de junho de 2009, do CNJ, às decisões proferidas pelo CNJ no Procedimento de Controle Administrativo nº 0002012-26.2014.2.00.0000 e no Procedimento de Controle Administrativo nº 0005199-08.2015.2.00.0000, bem como à decisão proferida pela Comissão do Concurso, conforme ata publicada no Diário da Justiça Eletrônico nº 8.062, de 16 de setembro de 2016, p. 14-20, torna públicas a inclusão do subitem 13.1.1.1 e a retificação dos subitens 13.1 e 13.9, “d”, do Edital nº 1, de 19 de julho de 2013, conforme a seguir especificado, bem como convoca os candidatos aprovados na prova oral para apresentação de títulos.

[…]

13.1 A avaliação de títulos valerá, no máximo, 10,00 (dez) pontoscom peso dois, observado o seguinte:

[…]

13.1.1.1 Para fins de aferição de pontos na prova de títulos, somente será admitida a apresentação dos títulos adquiridos até a data da primeira publicação do edital de abertura do concurso (19/7/2013), sendo esta limitação extensiva a todos os títulos elencados no subitem 13.1 do edital do concurso.

[…]

13.9.1 […]

[…]

d) para exercício de atividade/serviço prestado como autônomo: será necessária a entrega de 3 (três) documentos: 1 – diploma de graduação em Direito, a fim de se verificar qual a data de conclusão, com exceção do inciso II, e atender ao disposto no subitem 13.9.1.3 deste edital; 2 – comprovação de efetivo exercício da atividade de advocacia, na forma do art. 5º da Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia e da OAB); e 3 – declaração do contratante/beneficiário que informe o período (com início e fim, se for o caso) da relação contratual.

[…]

Pelo que se verifica, então, uma das atribuições passíveis de avaliação e aquilatação como título constituía-se na experiência como profissional da advocacia ou de outro cargo, emprego ou função privativa de bacharel em Direito, por um mínimo de três anos até a data da primeira publicação do edital de abertura do concurso, que ocorreu em 19/07/2013, e que isso fosse comprovado, na hipótese de o candidato desempenhar a profissão autonomamente, que é o que invoca aqui a recorrente, mediante a entrega conjunta de três documentos, a saber, (a) do diploma da graduação em Direito, (b) da comprovação do efetivo exercício da advocacia na forma do art. 5.º do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994) e (c) de declaração do contratante ou beneficiário que informasse o período (com início e fim, se fosse o caso) da relação contratual.

O indeferimento dos pontos pleiteados pela recorrente, como bem observa-se de fls. 111, deu-se face a ausência do item (c), ou seja, de declarações dos contratantes ou beneficiários dos serviços prestados, pois a teor do regramento referido deveria haver a apresentação concomitante dos três documentos.

A irresignação deduzida transpõe a mera interpretação do edital, exigindo para além disso que se examine ainda a exatidão do que decidido pelo Conselho Nacional de Justiça.

Nesse sentido, a recorrente comprova que ao proferir a decisão no PCA n. 0002012-26.2014.2.00.0000 o Em. Conselheiro Fabiano Silveira determinou não exatamente a modificação das regras de avaliação conforme feita no transcrito Edital n. 32, de 30/09/2016, mas a inclusão de outra modalidade de comprovação da atividade advocatícia (e-STJ fls. 123/125):

Diante de tais fatos, ternos que o Tribunal requerido deve facultar a todos os candidatos habilitados à fase de avaliação de títulos o uso da prerrogativa prevista no aludido ato normativo, permintinido-lhes a comprovação do exercício da advocacia nos termos do Regulamento Geral da OAB.

Ante o exposto, DEFIRO a liminar para determinar ao TJPI que, além das modalidades já previstas no item 13.9.1, “d”, do Edital n° 1, de 2013, assegure aos candidatos inscritos no concurso público, para efeito de avaliação de títulos, o direito de comprovar o exercício da advocacia com a apresentação dos documentos listados no parágrafo único do art. 5.º do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB. Para tanto, o TJPI deve conferir ampla publicidade a esta decisão por meio de aviso geral aos candidatos.

Intimem-se as partes.

À Secretaria Processual, para as providências cabíveis.

(Destacamos)

Assim, cumpria à banca examinadora e à comissão do concurso permitir que a avaliação de títulos na modalidade atividade profissional de advocacia prestada autonomamente pudesse ser comprovada tanto nos termos da redação original do Edital n. 01/2013 quanto na forma estabelecida pelo art. 5.º do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB, que assim estabelece:

Art. 5º Considera-se efetivo exercício da atividade de advocacia a participação anual mínima em cinco atos privativos previstos no artigo 1º do Estatuto, em causas ou questões distintas.

Parágrafo único. A comprovação do efetivo exercício faz-se mediante:

a) certidão expedida por cartórios ou secretarias judiciais;

b) cópia autenticada de atos privativos;

c) certidão expedida pelo órgão público no qual o advogado exerça função privativa do seu ofício, indicando os atos praticados.

O cotejo entre o que previam originalmente o edital de abertura e o posteriormente modificado, bem como o disposto no regulamento geral transcrito, na decisão do CNJ e na decisão de rejeição da pontuação de títulos, conduz ao provimento do recurso ordinário.

Para todos os efeitos, nada obstante o disposto no Edital n. 01, de 19/07/2013, e no Edital n. 32, de 30/09/2016, por determinação superior provinda do Conselho Nacional de Justiça deveria ser admitido como forma de comprovação da atividade advocatícia além daquelas estabelecidas em ambos esses editais também o disposto no art. 5.º do Regulamento Geral da OAB, ou seja, deveria ser considerado como efetivo exercício da atividade de advocacia a participação anual em cinco atos privativos de advogado, em causas ou questões distintas, devidamente comprovado por certidão de cartório ou secretaria judicial, por cópia autenticada de atos privativos ou por certidão expedida por órgão público no qual o advogado exerça função.

Cabe referir que da leitura do preceito normativo não há indicação nem da conjunção aditiva “e” tampouco da alternativa “ou”, de modo que deixasse claro se as modalidades de comprovação aceitas são cumulativas ou disjuntivas.

No entanto, a mim não parece razoável que a interpretação resulte em regra de cumulação das formas de comprovação, pena de se exigir uma atuação redundante do profissional na medida em que se sobreporiam documentos que apenas corroborariam um mesmo fato, como por exemplo nas hipóteses das alíneas “b” e “c”, em que a cópia autenticada de atos privativos seria suficiente, tornando desnecessária a certidão de indicação desses mesmos atos.

De todo modo, ao prevalecer a conclusão de que a observância do art. 5.º do Regulamento Geral da OAB criava uma forma a mais de comprovação da atividade profissional, e que esse preceito a seu turno resulta em normas que preconizam três hipóteses de isso ocorrer, a atuação da recorrente com a colação dos documentos de e-STJ fls. 101/107 revelava-se em princípio satisfatória, obrigando à banca examinadora que ao menos examinasse os documentos e aferisse-os efetivamente.

De outro lado, a motivação adotada pela comissão do concurso ao desprover o recurso administrativo é também ilegal.

Como se vê em e-STJ fl. 111, concluíram justamente que era possível a avaliação porque não se juntaram declarações do contratante/beneficiário dos serviços, embora a teor da regra do art. 5.º do Regulamento Geral isso não fosse de fato necessário.

Em sendo assim, impositivo que se anule o ato administrativo e que se determine às autoridades impetradas que promovam nova avaliação dos documentos, observado exclusivamente o teor do referido regramento da OAB.

Essa incompatibilidade entre os critérios de avaliação da banca examinadora e as regras prescritas pelo CNJ autoriza que o Poder Judiciário intrometa-se excepcionalmente na seara do certame, a fim de corrigir uma ilegalidade flagrante perpetrada pela banca examinadora, como prescrito no precedente firmado no Supremo Tribunal Federal com o julgamento do RE 632.853/CE, relator o Em. Ministro Gilmar Mendes:

Recurso extraordinário com repercussão geral. 2. Concurso público. Correção de prova. Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas. Precedentes. 3. Excepcionalmente, é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame. Precedentes. 4. Recurso extraordinário provido.

(RE 632853, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-125 DIVULG 26-06-2015 PUBLIC 29-06-2015)

Dessa feita, dou provimento ao recurso ordinário para concedera a segurança, nos termos da fundamentação.

Inverto o ônus da sucumbência quanto às custas do processo.

Deixo de condenar em honorários recursais tendo em vista o disposto no art. 25 da Lei 12.016/2009 (RMS 51.721/ES, de minha relatoria, Segunda Turma, julgado em 06/10/2016, DJe 14/10/2016).

É o voto. – – /

Dados do processo:

STJ – RMS nº 58.895 – Piauí – 2ª Turma – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJ 13.12.2018

Fonte: INR Publicações.

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Recurso Especial – Direito civil e processual civil (CPC/1973) – Direito das sucessões – Sucessão do companheiro – Concorrência com os colaterais – Norma do art. 1.790 Código Civil – Inconstitucionalidade proclamada pelo STF – Paridade com a sucessão do cônjuge – Recurso especial desprovido.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.617.344 – PR (2016/0200496-0)

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

RECORRENTE : SAULO PERALTO

ADVOGADOS : ROBERTO PERALTO – PR012320

CLÓVIS PINHEIRO DE SOUZA JUNIOR – PR016746

RECORRIDO : NEURIDE TEREZINHA TUMELERO

ADVOGADOS : LEONILDO BAGIO – PR018594

CLAUDEMIR MORAIS DA SILVA – PR029708

DÉBORA CRISTINE DE CASTRO JANTSCH – PR068561

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL (CPC/1973). DIREITO DAS SUCESSÕES. SUCESSÃO DO COMPANHEIRO. CONCORRÊNCIA COM OS COLATERAIS. NORMA DO ART. 1.790 CÓDIGO CIVIL. INCONSTITUCIONALIDADE PROCLAMADA PELO STF. PARIDADE COM A SUCESSÃO DO CÔNJUGE.

RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

DECISÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos etc.

Trata-se de recurso especial interposto por SAULO PERALTO em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, assim ementado:

AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA CUMULADA COM DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE INVENTÁRIO ADMINISTRATIVO E ADJUDICAÇÃO DE BENS. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE. INSURGÊNCIA DO AUTOR. NULIDADE DA DECISÃO. NÃO OCORRÊNCIA. DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA, REFERENTE A EXISTÊNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL,EIS QUE INCONTROVERSA. INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DESNECESSIDADE. QUESTÃO PATRIMONIAL SEM O INTERESSE DE INCAPAZES. CONCORRÊNCIA ENTRE OS COLATERAIS E A COMPANHEIRA SOBREVIVENTE DO AUTOR DA HERANÇA. IMPOSSIBILIDADADE. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 1.790, III, DO CÓDIGO CIVIL PELO ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TRIBUNAL, ANTE A AFRONTA DO DISPOSITIVO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE, POR CONFERIR À COMPANHEIRA TRATAMENTO DIVERSO DO CÔNJUGE.DECISÃO VINCULANTE AOS DEMAIS ÓRGÃOS FRACIONADOS DESTE TRIBUNAL. SENTENÇA ESCORREITA. RECURSO NÃO PROVIDO. (fl. 482)

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.

Em suas razões, alega a parte recorrente violação dos arts. 1.790 e 1.839 do Código Civil, sob o argumento de que os colaterais deveriam ter sido chamados a suceder em concorrência com a companheira.

Contrarrazões ao recurso especial às fls. 549/563.

Juízo de admissibilidade realizado com base nas normas do CPC/1973, por ser a lei processual vigente na data de publicação do acórdão ora impugnado (cf. Enunciado Administrativo n. 2/STJ).

É o relatório.

Passo a decidir.

O recurso especial não merece ser provido.

A controvérsia diz respeito ao tratamento distinto conferido pelo Código Civil de 2002 aos direitos sucessórios do companheiro em comparação aos direitos do cônjuge supérstite.

O Tribunal de origem, em juízo de arguta clarividência, se antecipou ao pronunciamento do Supremo Tribunal Federal acerca da questão, declarando, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do referido art. 1.790, inciso III, do Código Civil, tendo sido lavrado acórdão do incidente com a seguinte ementa:

INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. SUCESSÃO DA COMPANHEIRA. ARTIGO 1.790, III, DO CÓDIGO CIVIL. INQUINADA AFRONTA AO ARTIGO 226, § 3o, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, QUE CONFERE TRATAMENTO PARITÁRIO AO INSTITUTO DA UNIÃO ESTÁVEL EM RELAÇÃO AO CASAMENTO. NECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO DO COLENDO ÓRGÃO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE DE LEI INFRACONSTITUCIONAL DISCIPLINAR DE FORMA DIVERSA O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE. ELEVAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL AO “STATUS” DF ENTIDADE FAMILIAR. INCONSTITUCIONALIADE RECONHECIDA. CONHECIMENTO DO INCIDENTE, DECLARADO PROCEDENTE.

1. Inconstitucionalidade do artigo 1.790, III, do Código Civil por afronta ao principio da igualdade, já que o artigo 226, § 3o, da Constituição Federal conferiu tratamento similar aos institutos da união estável e do casamento, ambos abrangidos pelo conceito de entidade familiar e ensejadores de proteção estatal.

2. A distinção relativa aos direitos sucessórios dos companheiros viola frontalmente o principio da igualdade material, uma vez que confere tratamento desigual àqueles que, casados ou não, mantiveram relação de afeto e companheirismo durante certo período de tempo, tendo contribuído diretamente para o desenvolvimento econômico da entidade familiar.(1DI 536.589-9/01, Órgão Especial, Rei. Des. Sérgio Arenhart, j. 04/12/2009)

Tempos depois, o Supremo Tribunal Federal trilhou o mesmo entendimento, no julgamento do RE 878.694/MG, pelo rito da repercussão geral, conforme ementa abaixo transcrita:

Direito constitucional e civil. Recurso extraordinário. Repercussão geral. Inconstitucionalidade da distinção de regime sucessório entre cônjuges e companheiros.

1. A Constituição brasileira contempla diferentes formas de família legítima, além da que resulta do casamento. Nesse rol incluem-se as famílias formadas mediante união estável.

2. Não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto é, a família formada pelo casamento e a formada por união estável. Tal hierarquização entre entidades familiares é incompatível com a Constituição de 1988.

3. Assim sendo, o art. 1790 do Código Civil, ao revogar as Leis nºs 8.971/94 e 9.278/96 e discriminar a companheira (ou o companheiro), dando-lhe direitos sucessórios bem inferiores aos conferidos à esposa (ou ao marido), entra em contraste com os princípios da igualdade, da dignidade humana, da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente, e da vedação do retrocesso.

4. Com a finalidade de preservar a segurança jurídica, o entendimento ora firmado é aplicável apenas aos inventários judiciais em que não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, e às partilhas extrajudiciais em que ainda não haja escritura pública.

5. Provimento do recurso extraordinário. Afirmação, em repercussão geral, da seguinte tese: “No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”. (RE 878694, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 10/05/2017, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-021 DIVULG 05-02-2018 PUBLIC 06-02-2018)

Desse modo, estando o acórdão recorrido em sintonia com precedente qualificado do Supremo Tribunal Federal, não é cabível firmar entendimento diverso no âmbito desta Corte Superior.

Destarte, o recurso especial não merece ser provido.

Ante o exposto, com base no art. 932, inciso IV, do CPC/2015 c/c a Súmula 568/STJ, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.

Advirta-se que eventual recurso interposto contra este decisum estará sujeito às normas do CPC/2015 (cf. Enunciado Administrativo n. 3/STJ), inclusive no que tange à aplicação de multa processual.

Intimem-se.

Brasília (DF), 12 de dezembro de 2018.

MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

Relator – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.617.344 – Paraná – 3ª Turma – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJ 17.12.2018

Fonte: INR Publicações.

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