Questão esclarece acerca do usufruto judicial e a possibilidade de nova penhora sobre o imóvel.

Usufruto judicial. Nova penhora – possibilidade.

Para esta edição do Boletim Eletrônico a Consultoria do IRIB selecionou questão acerca do usufruto judicial e a possibilidade de nova penhora sobre o imóvel. Veja como a Consultoria do IRIB se posicionou acerca do assunto, valendo-se dos ensinamentos de Ademar Fioranelli:

Pergunta: A existência de usufruto judicial sobre o imóvel impede o registro de nova penhora sobre o bem?

Resposta: Sobre o usufruto judicial, Ademar Fioranelli explica o seguinte:

“A reforma da parte do Código de Processo Civil, nos termos da Lei 11.382/2006, reafirmou a tendência da satisfação do débito do credor exequente através de concessão, pelo Juízo da execução, do usufruto de móvel ou imóvel (art. 716).

(…)

O usufruto constituído sobre o imóvel não impedirá que sobre ele recaiam outras penhoras de outros credores do devedor comum ou mesmo da alienação judicial (hasta pública), sempre respeitando o direito real constituído, tendo o usufrutuário preferência na arrematação de que deverá ser intimado (art. 698 do CPC) e, não extinto o usufruto, será objeto da alienação judicial, a nua propriedade do bem.” (FIORANELLI, Ademar. “Usufruto e Bem de Família – Estudos de Direito Registral Imobiliário”, Quinta Editorial, São Paulo, 2013, p. 113 e 115).

Para maior aprofundamento na questão, recomendamos a leitura da obra mencionada.

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Fonte: IRIB (www.irib.org.br).

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


CSM/SP: REGISTRO CIVIL – REGISTRO DE ESCRITURA PÚBLICA DE UNIÃO ESTÁVEL – PRETENSÃO DE ACRÉSCIMO DO SOBRENOME DO COMPANHEIRO AO DA COMPANHEIRA – POSSIBILIDADE – INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 57, §2°, DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS E 1.565, §1°, DO CÓDIGO CIVIL, EM CONSONÂNCIA COM O ART. 226, §3°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – DÚVIDA IMPROCEDENTE, DETERMINANDO-SE O REGISTRO DA ESCRITURA, COM ACRÉSCIMO DO SOBRENOME.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 9000001-04.2013.8.26.0541

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 9000001-04.2013.8.26.0541, da Comarca de Santa Fé do Sul, em que são apelantes JOÃO LUÍS SCHOLL e ANDREZZA RUVIERI CARVALHO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS E DE INTERDIÇÕES E TUTELAS DA SEDE DA COMARCA DE SANTA FÉ DO SUL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, PARA DETERMINAR O REGISTRO DA ESCRITURA PÚBLICA DE UNIÃO ESTÁVEL COM O ACRÉSCIMO DO SOBRENOME DO COMPANHEIRO AO DA COMPANHEIRA, POSSIBILITANDO, DESSA FORMA, A ADOÇÃO DE SOBRENOME COMUM, V.U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GUERRIERI REZENDE, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.

São Paulo, 18 de março de 2014.

HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

Apelação Cível n° 9000001-04.2013.8.26.0541

Apelante: João Luis Scholl e Andrezza Ruvieri Carvalho

Apelado: Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Sede da Comarca de Santa Fé do Sul

VOTO N° 33.941

REGISTRO CIVIL – REGISTRO DE ESCRITURA PÚBLICA DE UNIÃO ESTÁVEL – PRETENSÃO DE ACRÉSCIMO DO SOBRENOME DO COMPANHEIRO AO DA COMPANHEIRA – POSSIBILIDADE – INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 57, §2°, DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS E 1.565, §1°, DO CÓDIGO CIVIL, EM CONSONÂNCIA COM O ART. 226, §3°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – DÚVIDA IMPROCEDENTE, DETERMINANDO-SE O REGISTRO DA ESCRITURA, COM ACRÉSCIMO DO SOBRENOME.

Trata-se de Dúvida, suscitada pelo Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Sede da Comarca de Santa Fé do Sul, a respeito da possibilidade de registrar Escritura Pública de União Estável com alteração do sobrenome da companheira, que pretende acrescer o sobrenome do companheiro.

O MM. Juiz Corregedor Permanente julgou procedente a Dúvida, afirmando que há necessidade de procedimento judicial, de jurisdição voluntária, para alteração de nome.

Inconformados com a respeitável decisão, os interessados interpuseram, tempestivamente, o presente recurso. Alegam, em síntese, que a alteração pode ocorrer, por analogia ao art. 1.565, §1°, do Código Civil e porque o Superior Tribunal de Justiça, interpretando os dispositivos que regem a matéria, conforme a Constituição Federal, já permitiu o registro.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

O recurso comporta provimento.

O Capítulo XVII, Subseção V, itens 113 a 116, das NSCGJ, permite o registro das sentenças declaratórias de reconhecimento de união estável e de escrituras públicas de contrato envolvendo união estável.

A alteração do sobrenome dos companheiros, quando do reconhecimento judicial de união estável, tal qual aquela permitida no art. 1.565, §1°, do Código Civil, para os nubentes, na hipótese de casamento, foi recentemente admitida pelo Superior Tribunal de Justiça, a quem cabe exercer a função nomofilácica, uniformizando a interpretação da legislação infraconstitucional.

Veja-se, a propósito, o trecho, pertinente ao caso, do julgamento do Recurso Especial n. 1.206.656-GO, voto da Ministra Nancy Andrighi:

"É sabido que as possibilidades de alteração de nome dentro da legislação nacional são escassas, ocorrendo, no mais das vezes, flexibilização jurisprudencial da vetusta Lei 6.015/73, em decorrência do transcurso de quase quatro décadas, entremeado pelo advento do divórcio e por nova constituição que, em muitos aspectos, fixou balizas novas para os relacionamentos interpessoais – como a igualdade entre os sexos dentro da relação familiar – e ainda, reconheceu a existência de novos institutos, v.g. a união estável, na qual se enquadra o relacionamento vivenciado pela recorrente nos últimos trinta anos.

Por óbvio, não obstante a recepção do texto legal pela Constituição de 1988, a Lei 6.015/73 tem merecido constantes ajustes, ditados tanto pela superveniente Constituição, como pelas profundas alterações sociais pelas quais o país tem passado nas últimas décadas.

Particularmente em relação aos companheiros, o art. 57, § 2°, da Lei 6.015/73 outorgava, nas situações de concubinato, tão somente à mulher, a possibilidade de averbação do patronímico do companheiro, sem prejuízo dos apelidos próprios – entenda-se, sem a supressão de seu próprio sobrenome -, desde que houvesse impedimento legal para o casamento.

Essa normatização refletia a proteção e exclusividade que se dava ao casamento – que era indissolúvel -, no início da década de 70 do século passado, pois este era o único elemento formador de família, legalmente aceito, fórmula da qual derivava as restrições impostas pelo texto de lei citado, que apenas franqueava a adoção de patronímico, por companheira, quando não houvesse a possibilidade de casamento, por força da existência de um dos impedimentos descritos em lei.

No entanto, a consolidação da união estável no cenário jurídico nacional, com o advento da Constituição de 1988, deu nova abrangência ao conceito de família e, por seu caráter prospectivo, vinculou a produção legislativa e jurisprudêncial desde então – naquela, imprimindo novos parâmetros para a criação de leis e nesta, condicionando o interprete a adaptar os textos legais recepcionados, à nova ordem jurídica.

Sob esse diapasão, a mera leitura do art. 57, §2°, da Lei 6.015/73, feita sob o prisma do §3º do art. 226 da CF, mostra a completa inadequação daquele texto de lei, o que exige a adoção de posicionamento mais consentâneo à realidade constitucional e social hoje existente.

Para se superar esse imbróglio é necessário, preliminarmente, reconhecer-se que o fato social reconhecido supervenientemente como união estável, carece de específica regulação quanto à adoção de sobrenome pelo(a) companheiro(a), não se encontrando na Lei 6.015/73, os elementos necessários para a regulação da matéria, pois em seu artigo 57, trata, na verdade, da adoção de patronímico em relações concubinárias, em período anterior à possibilidade de divórcio, focando-se, portanto, nas relações familiares à margem da lei, que não podiam ser regularizadas ante a indissolubilidade do vínculo conjugal, então existente.

Por óbvio, esse anacrônico artigo de lei não se presta para balizar os pedidos de adoção de sobrenome dentro de uma união estável, situação completamente distinta daquela para qual foi destinada a referida norma.

Assim, à mingua de regulação específica, solve-se a questão pela aplicação analógica das disposições específicas do Código Civil, relativas à adoção de sobrenome dentro do casamento, porquanto se mostra claro o elemento de identidade entre os institutos e a parelha ratio legis relativa à união estável, com aquela que orientou o legislador na fixação, dentro do casamento, da possibilidade de acréscimo do sobrenome de um dos cônjuges, pelo outro.

Símeis – a situação regulada: adoção do patronímico do cônjuge em casamento, e a questão sem regulação: adoção do patronímico do companheiro em união estável -, a solução aplicada à circunstância normalizada deve, igualmente, servir para a fixação da possibilidade de adoção de patronímico de companheiro dentro da união estável, pois, onde impera a mesma razão, deve prevalecer a mesma decisão – ubi eadem legis ratio ibi eadem dispositivo.

A única ressalva que se faz, e isso em atenção às peculiaridades da união estável, é que seja feita prova documental da relação, por instrumento público, e nela haja anuência do companheiro que terá o nome adotado, cautelas dispensáveis dentro do casamento, pelas formalidades legais que envolvem esse tipo de relacionamento, mas que não inviabilizarão a aplicação analógica das disposições constantes no Código Civil à espécie."

O Oficial argumenta que o enunciado 12 da ARPEN-SP – que trata da interpretação das NSCGJ sobre registro civil das pessoas naturais – previu, em consonância com esse voto, a possibilidade de registro de título judicial – logo, sentença – que disponha sobre a alteração do sobrenome da companheira ou do companheiro.

Leia-se o enunciado 12: "Se no título em que se reconheceu a união estável constou que o companheiro acresceu o sobrenome do outro, tal alteração do nome deverá constar do registro da união estável e das respectivas certidões".

Da locução "título em que se reconheceu a união estável", o Oficial tira a conclusão de que se trata, tão somente, de sentença judicial. Afinal, título de reconhecimento de situação jurídica equivale a sentença declaratória e, mais, na hipótese, constitutiva.

As indagações que se fazem, no entanto, são as seguintes: a) a união estável só pode ser constituída por sentença que a reconheça ou também por escritura pública; b) essa escritura pública pode ser levada a registro, tal como a sentença de reconhecimento; c) o Superior Tribunal de Justiça entendeu que sentença de reconhecimento de união estável pode dispor sobre alteração do sobrenome da companheira ou do companheiro e deve ser registrada; d) a união estável é equiparada ao casamento, como forma de constituição de família e e) a adoção de sobrenome comum é inerente ao senso médio de constituição de um núcleo familiar, por qual razão se deve impedir o registro de escritura pública de união estável que preveja o acréscimo do sobrenome a um dos companheiros?

Não se vislumbra por qual motivo se deva tratar de forma diferente, sob esse aspecto, o registro de uma sentença de reconhecimento de união estável e o registro de uma escritura pública de união estável. Se o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que cabe a alteração do sobrenome quando do reconhecimento de união estável, fazendo-o por equiparação ao casamento, parece claro que também cabe essa alteração por meio de escritura pública.

Ressalte-se que estão presentes, ademais, as duas condicionantes previstas no voto da Ministra Nancy Andrighi: há prova documental da relação, por instrumento público – a própria Escritura -, e nela há anuência do companheiro que terá o nome adotado.

Nesses termos, pelo meu voto, à vista do exposto, dou provimento do recurso, para determinar o registro da Escritura Pública de União Estável com o acréscimo do sobrenome do companheiro ao da companheira, possibilitando, dessa forma, a adoção de sobrenome comum.

HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Fonte: DJE/SP de 20.05.2014.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


2ªVRP/SP não autoriza inventário extrajudicial quando existir testamento válido.

Processo 1091149-03.2013.8.26.0100 – Cautelar Inominada – Propriedade – N.M. e outros – VISTOS. Trata-se de ação cautelar inominada de iniciativa de N M requerendo a autorização para proceder ao inventário extrajudicial em que pese a existência de testamento (a fls. 02/14 e 17/21). O Colégio Notarial apresentou manifestação favorável (a fls. 23/31). O …º Tabelião de Notas da Capital indicado para a prática do atos igualmente relatou sua concordância (a fls. 45/46). A representante do Ministério Público se manifestou favoravelmente à realização do ato notarial (a fls.48/49). É o breve relatório. DECIDO. Inicialmente observo a natureza administrativa deste processo donde não cabe aplicação direta do regramento do Código de Processo Civil, assim não se cogita de ação cautelar de natureza jurisdicional. Pelo o que há nos autos está em curso ação de abertura, arquivamento e registro de testamento e o requerente pugna pela realização do inventário extrajudicial havendo autorização do Juízo competente. Nestes termos, passamos ao conhecimento deste pedido administrativo. A situação em exame refere-se à possibilidade da realização de inventário (em verdade arrolamento) extrajudicial na hipótese da existência de testamento válido após sua abertura ou apresentação, arquivamento, registro e cumprimento em processo jurisdicional (CPC, art. 1.125 e ss.). O Colégio Notarial do Brasil Seção de São Paulo, o Instituto Brasileiro de Direito de Família, Juízos da Vara da Família e das Sucessões do Foro Central da Comarca de São Paulo, o Ministério Público e mesmo precedente administrativo desta 2ª Vara de Registros Públicos do Foro Central da Comarca de São Paulo (processo n. 0072828-34.2013.8.26.0100, decisão proferida em 14.02.2014) alicerçados em interpretação teleológica do disposto no art. 982 do Código de Processo Civil tem entendimento firme acerca da possibilidade do inventário extrajudicial na sucessão testamentária no caso de concordância entre herdeiros e legatários capazes. São compreensões respeitáveis voltadas à eficiente prestação do imprescindível serviço público destinado à atribuição do patrimônio do falecido aos herdeiros e legatários. Ideologicamente não poderíamos deixar de ser favoráveis à essa construção na crença da necessidade da renovação do Direito no sentido de facilitar sua aplicação e produção de efeitos na realidade social, econômica e jurídica. Não obstante, é necessário adequar a compreensão ao ordenamento jurídico conforme nossos estudos e ditames da ciência jurídica, pena da ausência de legitimidade de sua concreção no meio social. Não estamos aqui a defender um retorno ao positivismo e tampouco uma interpretação limitada em conformidade à célebre assertiva de Montesquieu o juiz é a boca que pronuncia as sentenças da lei. Impende considerar o contexto social na aplicação do Direito, assim, acompanhamos o pensamento de António Pedro Barbas Homem, conforme segue: A época contemporânea produziu um direito impecável na sua apresentação formal, mas despojado de alma. O estilo seco e sem adjectivos e a linguagem fria e impessoal das leis denuncia uma ciência do direito que procura a perfeição dogmática, mas tantas vezes esquecendo que o direito existe para disciplinar a economia e a sociedade de modo justo, organizando direitos e interesses e não para responder a problemas teóricos (O justo e o injusto. Lisboa: AAFDL, 2005, p. 44). Também interessante é pensamento de Eduardo Vera-Cruz Pinto ao tratar da diversidade entre lei e Direito nos seguintes termos: Não se pode dar o nome de Direito a qualquer normação da sociedade através da lei do Estado. Mesmo em democracia política e em Estado regido pela Constituição, os discursos políticos das maiorias que se constituem circunstancialmente nos parlamentos, enunciados sob a forma de normas legais publicadas no Diário da República, não são por si só, regras de Direito. O Direito inicia o seu percurso histórico em Roma: através de modos específicos (jurídicos) de criar regras de Direito assentes no labor criativo de pessoas com auctoritas, saber assente na experiência e socialmente reconhecido, que eram adoptadas pela comunidade; regras que eram praticadas em ambiente de separação e equilíbrio de poderes, efectivada pelas magistraturas, e aplicadas por um processo que envolvia o pretor; o iudex e o advocatus visando a justiça do caso concreto (Curso livre de ética e filosofia do direito. Cascais: Principia, 2010, p. 185/186). Conforme Gustavo Zagrebelsky (Il diritto mite. Torino: Eunadi, 1992, p. 181), o juiz deve considerar a lei e a realidade na aplicação do Direito, a consideração única do caso conduziria a uma casuística incompatível com o a existência do Direito como ordenamento, de outra parte, a consideração exclusiva do ordenamento levaria a uma ciência teorética inútil às finalidade do Direito. Diante disso, a construção e interpretação dos fundamentos da presente decisão administrativa passará pelo equilíbrio e comunicação do Direito com suas finalidades, todavia, sempre preso ao dado legislativo como emanação das opções estatais pelo fio condutor da soberania estatal. O art. 982, caput, do Código de Processo Civil estabelece: Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário (grifos nossos). De outra parte, os itens 117, alínea “j”, 129 e 129.1 do Capítulo XIV, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça têm a seguinte redação: 117. Na lavratura da escritura deverão ser apresentados os seguintes documentos: j) certidão comprobatória da inexistência de testamento (Registro Central de Testamentos). 129. É possível a lavratura de escritura de inventário e partilha nos casos de testamento revogado ou caduco ou quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento. 129.1. Nessas hipóteses, o Tabelião de Notas solicitará, previamente, a certidão do testamento e, constatada a existência de disposição reconhecendo filho ou qualquer outra declaração irrevogável, a lavratura de escritura pública de inventário e partilha ficará vedada e o inventário far-se-á judicialmente. Diante disso, as NSCGJ são claras ao permitir a lavratura de inventário extrajudicial diante de dois requisitos: (i) testamento revogado, caduco ou com invalidade reconhecida por decisão judicial com trânsito em julgado e, (ii) ausência de conteúdo não patrimonial nas disposições testamentárias (CC, art. 1.857, p. 2º). Nessa perspectiva a situação ora pretendida é expressamente proibida pela redação atual das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça ante a notícia da existência de testamento válido conforme procedimento de jurisdição voluntária em curso. Não obstante, a compreensão elaborada não tratou da prescrição administrativa da E. Corregedoria Geral da Justiça e sim das leis incidentes, sabidamente o fundamento último daquela. Mesmo assim, modestamente, no momento, pensamos não ser possível a lavratura de inventario extrajudicial diante da presença de testamento válido. Há diversidade entre a sucessão legítima e testamentária no campo da estrutura e função de cada qual, para tanto, conforme Norberto Bobbio (Da estrutura à função. Barueri: Manole, 2007, p. 53), devemos indagar não apenas a estrutura (“como o direito é feito”) mas também a função (“para que o direito serve”) e, nesse pensamento, vamos concluir pela diversidade estrutural das espécies de sucessão. Somente na sucessão testamentária existe um negócio jurídico a ser cumprido, o que, por si só, implica na diversidade dos procedimentos previstos em lei para atribuição dos bens do falecido. Paulo Nader comenta essa distinção da seguinte forma: (…) Quem não faz testamento revela a sua concordância tácita com as medidas da lei. Dispor em testamento significa adotar fórmulas sucessórias distintas das previstas no ordenamento. De nenhum sentido ou eficácia o testamento que se limita a induzir à partilha de modo coincidente com o plano da lei. Justifica-se, na medida em que desvia o destino de seu patrimônio, ou de parte dele, do rumo fixado em lei. Se irmãos são os herdeiros mais próximos, pode o hereditando excluí-los da sucessão, beneficiando parentes mais distantes ou estranhos. Se todos são filhos, poderá beneficiar a um ou vários deles, destinando-lhes a sua quota disponível, ou seja, metade de seu patrimônio (Curso de direito civil. v. 6. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 206). Na sucessão testamentária há necessidade de se assegurar a execução da vontade do falecido testador e a proteção de interesses de familiares próximos, daí seu processamento sob a presidência de Juiz de Direito e, respeitosamente, em nosso pensamento, sem a possibilidade normativa do processamento em atividade extrajudicial delegada. As questões de conteúdo não patrimonial, a fiscalização à efetivação da vontade do testador, a eventual figura do testamenteiro e presença de institutos a exemplo da redução das disposições testamentárias e da deserdação não nos parece adequado ao processamento em atividade de serviço extrajudicial delegado. Além disso, a interpretação do testamento que não ocorre no procedimento de jurisdição voluntária de apresentação ou abertura do de testamento cabe ao juiz. Conforme Maria Berenice Dias A função interpretativa cabe ao juiz, que precisa cercar-se de elementos de convicção, buscando conhecer o perfil do testador no momento em que elaborou o testamento. Tem que procurar conhecer o que quis o testador (Manual das sucessões. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 428). Enfim, o ordenamento jurídico aproxima, determina e impõe o processamento da sucessão testamentária em unidade judicial como se depreende dos regramentos atualmente incidentes e dos institutos que cercam a sucessão testamentária; daí a razão da parte inicial do art. 982 caput, do Código de Processo Civil iniciar excepcionado expressamente a possibilidade de inventario extrajudicial no caso da existência de testamento independentemente da existência de capacidade e concordância de todos interessados na sucessão; porquanto há necessidade de se aferir e cumprir (conforme os limites impostos à autonomia privada na espécie) a vontade do testador o que não pode ser afastado mesmo concordes osherdeiros e legatários. A interpretação pretendida, com o devido respeito, envolve tantas exceções que em nosso sentir não permite uma compreensão científica em conformidade com os mandamentos legais incidentes pelo fio condutor da Constituição da República. Noutra quadra, a presente decisão administrativa não trata de qualquer juízo e nem poderia, de decisões e compreensões de natureza jurisdicional, nosso papel é limitado ao cumprimento das determinações judiciais sem qualquer consideração. Nada obstante, sem ingressar no exame das particularidades da formação da coisa julgada em processos de jurisdição voluntária o certo é a não inclusão dos Srs. Tabeliães da Comarca da Capital e desta Corregedoria Permanente nos limites subjetivos da coisa julgada atinente a processo de jurisdição voluntária de abertura, registro e cumprimento de testamento. Ante o exposto, conheço do pedido e o indefiro no âmbito administrativo por reconhecer a impossibilidade da realização de inventário extrajudicial na hipótese de existência de testamento válido independentemente da capacidade e concordância dos herdeiros e legatários. Ciência ao Ministério Público. P.R.I. – ADV: WALDIR LUIZ BRAGA (OAB 51184/SP) 

Fonte: DJE/SP | 19/05/2014.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.