Artigo: A Relativização da Unicidade Notarial: Breves Reflexões sobre o Provimento nº 08/2015 – Por Moacyr Petrocelli

*Moacyr Petrocelli

Publicado em 11 de fevereiro de 2015, o Provimento nº 08/2015 da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, promete boa repercussão no cenário dos serviços notariais paulistas. Adveio a lume este ato normativo, para alterar a redação das Normas dos Serviços Extrajudiciais do Estado de São Paulo (NSCGJ-SP), especialmente o item 52.2, do Capítulo XIV, que passa a vigorar com a seguinte redação:

52.2. Lavrada a escritura pública, a coleta das respectivas assinaturas das partes poderá ocorrer em até 30 dias, e nessas hipóteses as partes deverão apor ao lado de sua firma a data da respectiva subscrição.

52.2.1. Não sendo assinado o ato notarial dentro do prazo fixado, a escritura pública será declarada incompleta, observando-se a legislação que trata dos emolumentos.

A novel previsão normativa merece ser aplaudida. Mostra, novamente, o espírito de pioneirismo bandeirante na atividade extrajudicial.

Em verdade, o tema desde há muito merecia normatização. Havia legítimo reclamo das entidades de classe sobre a necessidade do estabelecimento de critérios objetivos para que os notários tivessem balizas institucionais de atuação. Afinal, são situações diuturnas nas serventias notariais. Em palavras mais simples, o que se quer dizer é que não pode o notariado deixar de acompanhar a evolução da sociedade e dinamização das relações jurídicas, sob pena de engessar o exercício da função pública notarial.

Com efeito, é cediço que os serviços notariais e registrais em geral estão vinculados ao comando legal. Nesse espírito, sabe-se que não há qualquer disposição legal que vede a lavratura de escritura pública mediante a coleta da assinatura das partes em momentos distintos. Assim, a nova previsão normativa, possibilitou ao notário a flexibilização temporal da coleta das firmas das partes. Passa-se, portanto, a não ser mais obrigatória a presença simultânea de todas as partes para a assinatura da escritura pública.

Adequou-se a atividade notarial ao dinamismo da vida moderna, possibilitando que a função pública notarial alcance com mais facilidade suas missões institucionais para a garantia da autenticidade, publicidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.

Nesse particular, um dos princípios sempre destacados como congênito à atuação do tabelião de notas é o da unicidade do ato notarial. Por este princípio, os atos praticados pelos notários devem ser realizados em uma única oportunidade, sem que haja interrupções temporais relevantes.

Sempre houve dificuldade de compreensão dos contornos exatos a serem dados a este princípio. Já é de algum tempo – principalmente para o notariado moderno, e mais ainda para aquele de tipo latino, como é o caso Brasil – que este comando principiológico não está a significar que colhida a vontade das partes, o notário deva desde logo lavrar a escritura pública e finalizar sua atuação notarial. Aliás, sua atuação cautelar, lastreada no saber jurídico e na prudência notarial, indispensável à profilaxia jurídica exercida por este profissional, recomenda que haja prévia audiência das partes, para que possa ser verificada a real intenção negocial dos interessados naquele ato jurídico, captando os desejos e as intenções, para que, após o aconselhamento e assessoria jurídica, o ato notarial seja praticado na melhor forma de direito. Além disso, é sabido que, normalmente, em especial nos negócios jurídicos imobiliários, são necessárias diligências preparatórias à prática do ato ou mesmo providências documentais externas à serventia. Todas essas circunstâncias inerentes à atuação do notário impedem que o ato notarial seja iniciado e encerrado em momento único. Em palavras outras, a lavratura de escritura pública, desde há muito, não pode ser considerada como um simples ato, mas verdadeiro procedimento, com sequência de atos concatenados destinados à consecução do ato-fim.

A rigor, na melhor técnica, o princípio da unicidade do ato notarial sempre teve nítido caráter instrumental. Vale dizer, a lavratura final do ato, sua leitura na presença das partes, a conferência pelos comparecentes e a outorga das assinaturas, é rito procedimental que deve ser uno, guiado pelo notário, praticado de uma só vez, em continuidade.

De todo modo, aponta a doutrina, que o princípio da unicidade notarial pode ser interpretado nessa dupla acepção – abstrata e instrumental.

Mencione-se, a propósito, que nem todos os atos notariais estão submetidos integralmente à unicidade. Veja-se, por exemplo, o caso da ata notarial, em que a própria natureza do ato permite a interrupção e o prosseguimento de sua lavratura. A descontinuidade é traço marcante da ata notarial, afinal, se os fatos se prolongam no tempo, sua captação também arrastará. Lembre-se, inclusive, que a desobediência a este princípio notarial sempre foi um dos traços apontados pelos especialistas para distinguir a escritura pública da ata notarial. Doravante, no Estado de São Paulo, com a nova previsão normativa, esta distinção entre ata notarial e escritura pública tende a não ser mais tão relevante ou, pelo menos, não ser tão intensa.

De fato, o que se pode perceber, sem rodeios, é que o princípio da unicidade do ato notarial tem necessitado abrandamento no dia a dia da serventia notarial.

Não sem razão.

O dinamismo e a complexidade das relações jurídicas contemporâneas reclamam uma atuação prudencial do notário, descontinuada. Tratar, assim, com excesso de rigor a unicidade do ato, no mais das vezes, impede o tabelião de notas de exercer da melhor forma possível seu mister. Noutros dizeres, para que a atuação do notário atenda aos objetivos para quais ela existe no cenário jurídico, a realidade cotidiana da função pública notarial demonstra justamente o oposto da unidade do ato, mormente quanto ao tempo de sua prática.

Foi este o espírito solidificado no Provimento nº 08 de 2015, da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo.

Estabelecida a mensagem exegética trazida pela salutar alteração normativa, convém apurar os principais efeitos notariais práticos da novel previsão. Diga-se: não é nosso objetivo – nem poderia sê-lo – esgotá-los. Todavia, algumas vicissitudes da prática tabelioa podem ser antevistas.

Cabe um alerta prefacial. A possibilidade de coleta a posteriori de assinaturas das partes deve ser vista como medida de caráter excepcional, devendo o tabelião acautelar-se para que o ato seja encerrado, tanto quanto possível, no menor lapso temporal. Isso garantirá a higidez jurídica do ato, e prestigiará a eficiência do serviço prestado. Na verdade, agir dessa forma não é nada mais do que afiançar a segurança jurídica, meta-base do fazer notarial. Nesse sentido, endossamos a posição de Paulo Roberto Gaiger Ferreira: “A melhor técnica notarial impõe que sejam os atos assinados na mesma data da lavratura, mas as atribulações e conveniências de nosso tempo permitem tolerar a assinatura em momento posterior”. (CASSETARI, Christiano (coord. Coleção Cartórios). Tabelionato de Notas. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 76).

Em síntese, a aplicação do permissivo normativo, ou seja, a possibilidade de fracionar a coleta das assinaturas deve ser medida de exceção. Apenas em casos especiais, o tabelião poderá facultar tal providência às partes, ou seja, que o façam dentro do prazo fatal de 30 dias. Enfim, agindo com cautela em casos que tais, o notário evitará situações meandrosas, que não são impossíveis de ocorrer. Imagine-se, por exemplo, que por obra do acaso, a parte da firma faltante venha a falecer. O ato ficaria incompleto, o que impossibilitaria de ser materializada a vontade das partes. São situações que podem aparecer na prática notarial. Por isso, a necessidade de encarar a autorização normativa como atitude excepcional.

Outra consideração imperativa refere-se à aferição do momento em que o ato notarial está completo para o direito. Não é difícil inferir do direito positivo que o ato notarial encerra-se com “a assinatura das partes e dos demais comparecentes, bem como a do tabelião ou seu substituto legal” (art. 215, § 1º, VII, do Código Civil). Ora, na ausência de assinatura de uma das partes, entende-se que o ato está incompleto, inapto à regular produção de seus efeitos jurídicos. Em realidade, sequer ele existe. Nesses casos, o tabelião declarará a escritura incompleta consignando as assinaturas faltantes. Frise-se, que diante dessa situação, é terminantemente vedado ao tabelião fornecer certidão ou traslado do ato declarado incompleto, salvo por ordem judicial.

Registre-se, ademais, que o novo permissivo deve ser aplicado apenas às escrituras públicas, não sendo correta sua aplicação aos testamentos públicos lavrados pelos tabeliães, dadas as inúmeras formalidades e solenidades previstas pela lei civil para o ato de última vontade. Isto é, a natureza do testamento público reclama a unicidade deste ato notarial, ou seja, sua lavratura nos moldes e requisitos legais, seguida da sua leitura em voz alta e assinatura do testador, das testemunhas e do tabelião (art. 1.864 do Código Civil). Sublinhe-se que a própria alocação normativa do novo item 52.2está a indicar nesse sentido, já que a norma principal (item 52) fala apenas em “escritura pública”.

Não se pode esquecer, ainda, das implicações relevantes que se terá a respeito da cobrança dos emolumentos pelos serviços prestados. Conforme apontado alhures, o Provimento 08/2015 é categórico em afirmar que “Não sendo assinado o ato notarial dentro do prazo fixado, a escritura pública será declarada incompleta, observando-se a legislação que trata dos emolumentos”.

Destaque-se, pois, que pelo ato notarial incompleto são devidos os emolumentos. A Lei nº 11.331/2002 – que trata dos emolumentos dos serviços notariais e de registro no Estado de São Paulo – é clara ao trazer nota explicativa à tabela incidente ao tabelionato de notas no sentido de que: “Pelo ato notarial declarado incompleto, por falta de assinatura, por culpa ou a pedido de qualquer das partes, será devido 1/3 (um terço) dos emolumentos. Se não for consignado o motivo, o escrevente e o Tabelião responderão solidariamente pela terça parte das parcelas previstas no art. 19, inciso I, letras “b”, “c” e “d”, desta lei”.

Repare, de imediato, a importância de o notário – ou aquele preposto que pratica o ato notarial – certificar os motivos do seu não encerramento. Deixando de fazê-lo, passará a ser solidariamente responsável pela terça parte dos emolumentos devidos pelo ato (especificamente nas parcelas dirigidas ao Estado, à Carteira de Previdência das Serventias e ao Fundo do Registro Civil).

Diante desses desdobramentos possíveis, no que toca aos emolumentos, parece correto que a cobrança pelo deva ser realizada pelo notário apenas quando encerrado por completo o ato notarial. É dizer, os emolumentos devem ser exigidos no momento em que seja aposta no livro a última assinatura, exaurindo-se a prática do ato.

Seria esta, inclusive, a data correta para lançamento da receita oriunda da prática do ato notarial no livro diário da serventia. É verdade, entretanto, que as Normas de Serviço do Estado de São Paulo preveem que a receita será lançada no dia da prática do ato, ainda que o notário não tenha recebido os emolumentos (item 55, Capítulo XIV, NSCGJ-SP). Todavia, a normativa é clara no sentido de considerar, para os serviços notariais, o “dia da prática do ato” como sendo o da lavratura do ato notarial e da emissão de certidão. Note-se, destarte, que nos casos de coleta postergada das firmas das partes, somente será lícito ao notário emitir o traslado do ato, após este se completar por inteiro, ou seja, após a coleta de todas as assinaturas dos comparecentes. Reforce-se, a propósito, que sendo o ato incompleto, na falta de qualquer assinatura, é terminantemente vedado ao notário que forneça certidões ou traslado daquele ato, salvo mediante ordem judicial. Em suma, a interpretação sistemática do fluxo do serviço notarial leva à conclusão de que o apontamento no livro de registro diário deverá ser feito quando ultimado o ato.

Deve-se considerar também que, exigir o pagamento do ato no momento da sua lavratura pode gerar imbróglio de difícil solução prática. Imagine, assim, que em uma escritura pública de compra e venda o comprador faça o recolhimento dos emolumentos no dia da lavratura do ato, momento este em que lança sua firma naquele ato notarial. O vendedor, de sua vez, como estava de viagem naquele dia, optou por assinar o ato 10 dias depois, quando de seu regresso. Durante a viagem, pensando melhor sobre a concretização do negócio, resolve por bem não concretizá-lo e sequer aparece no tabelionato. Nesse caso hipotético, tendo recebido os emolumentos no dia da lavratura do ato, é este o termo de referência para que sejam efetuados os repasses dos emolumentos às entidades as quais as parcelas estão previstas em Lei. Aliás, para algumas delas, o recolhimento dá-se semanalmente (art. 12, inciso I e III, da Lei nº 11.331/2002). Enfim, pode ocorrer de o titular daquele serviço notarial já ter realizado o recolhimento das guias àquelas entidades. Declarado a posteriori o ato incompleto, como proceder à devolução para o usuário dos 2/3 que lhe são de direito? Certamente não será questão fácil de ser solvida.

Por tudo isso, parece mais cautelosa a atitude de cobrar os emolumentos quando da assinatura da última parte. Em casos tais, para que se evitem contratempos, seria de bom tom que o notário, quando da audiência inicial das partes e diante da verificação da possibilidade de se aplicar a nova regra – ou seja, a coleta de assinatura em até 30 dias da lavratura do ato –, esclarecer aos interessados a existência do prazo fatal, e informá-los de que ultimado o termo final sem que todas as firmas sejam apostas no ato, este será considerado incompleto, incidindo, pois, a terça parte dos emolumentos devidos para o caso.

Outro caminho possível, seria a exigência pelo notário do depósito prévio do valor dos emolumentos.

A Lei nº 11.331/2002 autoriza em seu art. 13 que “salvo disposição em contrário, os notários e os registradores poderão exigir o depósito prévio dos valores relativos aos emolumentos e das despesas pertinentes ao ato, fornecendo aos interessados, obrigatoriamente, recibo com especificação de todos os valores”.

Apesar de ser este procedimento mais usual na serventia imobiliária, devido ao próprio procedimento registral típico do ofício predial, as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo permitem que os notários adotem o procedimento do depósito preambular dos emolumentos devidos. O item 69, do Capítulo XIII, da Normativa dispõe, in verbis:

69. Até o valor total previsto na tabela vigente, poderá o notário ou registrador exigir depósito prévio para a prática de atos solicitados, entregando recibo de depósito provisório.

69.1. Praticados os atos solicitados, o valor pago a título de depósito prévio converte-se em pagamento. Nesse caso, será lavrada, quando for o caso, cota-recibo à margem do ato praticado, e expedido recibo definitivo do valor pago, devolvendo-se, também, eventual saldo ao interessado.

Diante da nova possibilidade de coletar assinaturas em momento posterior à lavratura do ato notarial, certamente a exigência de depósito prévio pelo notário afigura-se como medida mais pertinente, evitando-se problemas futuros no caso de o ato ser declarado incompleto, em razão da ausência de assinatura de qualquer das partes que devam comparecer ao ato. Será, em verdade, cautela providencial para evitar a incidência da norma de responsabilização solidária dos titulares da delegação quanto à terça parte dos emolumentos devidos, nos termos acima ventilados.

Recorde-se, por necessário, que, em termos de escrituração dos livros obrigatórios da serventia, sendo admitido o depósito prévio, será de rigor seu lançamento no “Livro de Controle de Depósito Prévio” (item 44.1, Capítulo XIII, das NSCGJ-SP). Dito de outro modo, nos casos em que se admitir o depósito prévio, este deverá ser escriturado em livro próprio, especialmente aberto para o controle dessas importâncias, recebidas a título provisório, até que sejam os depósitos preliminares convertidos em pagamento dos emolumentos, ou devolvidos, conforme o caso.

Conforme se pode observar nessas breves anotações, há inúmeras questões e efeitos prático-jurídicos decorrentes do novo Provimento 08/2015, da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo. Certamente, o tema será paulatinamente amadurecido pelos notários, fixando-se diretivas para a homogeneização da atuação notarial em casos tais. Certeza, apenas, há uma. O tema ora normatizado é de extrema importância para atividade notarial, especialmente em razão da dinamização dos serviços extrajudiciais prestados à sociedade, longe de ser questão de lana-caprina.

Fonte: Notariado | 12/02/2015.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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PCA (CNJ): PEDIDOS DE PROVIDÊNCIAS E PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. PRORROGAÇÃO. ATO DISCRICIONÁRIO. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRECEDÊNCIA DOS APROVADOS NO CONCURSO ANTERIOR. VAGAS SURGIDAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO. NECESSIDADE DA ADMINISTRAÇÃO. CORTE ORÇAMENTÁRIO.

PEDIDOS DE PROVIDÊNCIAS E PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. PRORROGAÇÃO. ATO DISCRICIONÁRIO. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRECEDÊNCIA DOS APROVADOS NO CONCURSO ANTERIOR. VAGAS SURGIDAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO. NECESSIDADE DA ADMINISTRAÇÃO. CORTE ORÇAMENTÁRIO.

  1. A prorrogação do prazo de validade de concurso público, prevista no art. 37, III, da CF/1988, constitui ato discricionário da Administração, do que se conclui que o candidato aprovado não possui direito subjetivo à prorrogação do certame. Precedentes do STF.
  1. Nada obsta a realização de um novo concurso ainda na vigência de certame anterior, tanto que o art. 37, IV, da Constituição Federal regula a hipótese de vigência concomitante de concursos sucessivos, assegurando a precedência dos aprovados sobre os novos concursados, durante o prazo de validade do certame.
  1. Esgotado o prazo de validade do concurso e uma vez improcedente o pleito de revisão do ato discricionário de não prorrogação, não há como garantir aos aprovados remanescentes direito subjetivo à reserva de vagas ou à precedência sobre os futuros aprovados.
  1. A despeito de não se poder compelir a administração a prorrogar a validade do concurso, deve ser reconhecido o direito à nomeação dos aprovados fora do limite de vagas previstas no edital se durante tal prazo surgirem novas vagas da mesma natureza das que deram causa à abertura do certame e restar demonstrada a necessidade de seu preenchimento. Precedentes do STF e do STJ.
  1. A inexistência de orçamento, fruto de corte na proposta orçamentária, obsta o reconhecimento do direito subjetivo à nomeação para os cargos que impliquem aumento de despesas, por ausência de pressuposto imprescindível ao provimento de cargos públicos.
  1. Demonstrados a necessidade do serviço e o surgimento de vagas no curso do certame cujo provimento represente mera reposição de pessoal, sem impacto orçamentário, impõe-se reconhecer que o ato de não prorrogação, sem prévia nomeação dos aprovados remanescentes para tais vagas, ofendeu a previsão editalícia e o direito subjetivo à nomeação.
  1. Procedência parcial do pedido.

VOTO

 I – DO INTERESSE GERAL

 Ressalto, de início, que o tema em discussão tem nítido “interesse geral” para todo o Poder Judiciário, a justificar a atuação do CNJ.

 Isso porque, a despeito de tratarem do concurso de Escrevente Técnico Judiciário do TJSP, a questão de fundo diz respeito à possibilidade ou não de revisão administrativa do ato de não prorrogação do certame, assim como ao suposto “direito à nomeação” dos concursados aprovados ou à precedência destes sobre os concursados do certame posterior, de modo que o entendimento a ser manifestado por este Conselho pode orientar o comportamento ou a atuação dos demais tribunais brasileiros em situações análogas.

 II – PRELIMINARES

 Conforme relatado, o TJSP arguiu preliminares de ausência de competência deste Conselho para realizar controle de constitucionalidade de ato administrativo, judicialização da matéria e perda de objeto.

 a) Da competência do CNJ para análise do tema

 O TJSP alega que os requerentes pretendem, de forma indireta, o controle de constitucionalidade do ato administrativo de não prorrogação do certame, o que não se inseriria no âmbito de competência deste Conselho.

 Não tenho dúvidas, contudo, acerca da competência do CNJ para análise do caso em tela.

 Conforme relatado, os requerentes insurgem-se contra a decisão (administrativa) do TJSP de não prorrogação do prazo de validade do concurso para provimento de cargos de Escrevente Técnico Judiciário do quadro de pessoal daquela Corte, sob o argumento, entre outros, de ofensa aos princípios constitucionais da moralidade e da eficiência previstos no art. 37, caput , da Constituição Federal.

 Trata-se, a toda evidência, de típica pretensão de controle de ato administrativo, competência precípua deste Conselho, a teor do artigo 103-B, § 4º, da Constituição Federal:

  •  4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

 I – (…)

II –  zelar pela observância do art. 37   –   e apreciar  , de ofício ou mediante provocação,  a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;

(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).

Note-se que, no contexto do controle da “legalidade” (lato sensu) dos atos administrativos, a Constituição conferiu ao CNJ o dever de zelar pela sua conformação com o disposto no artigo 37 da Carta Constitucional, consagrador dos princípios que regem a administração e que, segundo os requerentes, teriam sido violados.

Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente do Supremo Tribunal Federal:

EMBARGOS DECLARATÓRIOS OPOSTOS DE DECISÃO MONOCRÁTICA. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. SUPOSTO ATO ILEGAL DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. NÃO OCORRÊNCIA. CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO. OUTORGA DA DELEGAÇÃO APÓS EXPIRADO O PRAZO DE VALIDADE. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. I – O CNJ não praticou qualquer ilegalidade ao exercer o controle de ato administrativo praticado pelo Poder Judiciário, limitando-se, apenas, a aplicar as regras previstas no edital do concurso público, bem como no art. 37, III, da Constituição Federal , dentro dos estritos termos de sua competência. (…)

(STF: Embargos de Declaração no MS 28044/DF, Tribunal Pleno, Relator Min. Ricardo Lewandowski, j. 27.10.2011)

Rejeito a preliminar.

b) Da suposta judicialização da matéria

O TJSP assevera que “outros candidatos” teriam impetrado mandado de segurança perante aquela Corte com o mesmo propósito destes autos. Todavia, não indica o número de nenhuma ação judicial para corroborar a sua alegação.

Ademais, os requerentes afirmam que não ajuizaram nenhuma demanda judicial sobre o tema, o que seria essencial para o acolhimento desta prefacial. Afinal, este Conselho já pacificou o entendimento de que somente a judicialização prévia pelos próprios requerentes é suficiente para afastar a sua atuação. Nesse sentido:

(…)

2 – Questão foi judicializada pelo ajuizamento de mandado de segurança interposto pela DM Construtora de Obras Ltda., do qual há noticia de desistência, o que, no entanto, não impede a apreciação desse Conselho na medida em que não há identidade subjetiva entre a impetrante do mandado de segurança e o requerente neste procedimento de controle administrativo . (PCA n. 0005673-81.2012.2.00.0000, Rel. Conselheiro Sílvio Rocha, j. 08.10.2013)

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. PROCEDIMENTO DE SUCITAÇÃO DE DÚVIDA. MATRÍCULA DE IMÓVEL RESIDENCIAL. QUESTÃO INDIVIDUAL SEM REPERCUSSÃO NO ÂMBITO DO PODER JUDICIÁRIO. QUESTÃO JUDICIALIZADA PELA REQUERENTE. INVIABILIDADE. PRECEDENTES DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. RECURSO CONHECIDO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

  1. O Conselho Nacional de Justiça não se presta à apreciação de questões que envolvam interesse meramente individual e desprovidas de repercussão geral, sob pena de prejuízo de suas funções primordiais de planejamento, formulação e fiscalização do Poder Judiciário.
  2. A parte interessada não pode fazer uso, a um só tempo, dos procedimentos administrativos excepcionais assegurados pelo art. 103-B, § 4º da CF/88 perante o CNJ e dos meios judicialiformes.
  3. Recurso Conhecido a que se nega provimento. (PCA n. 0002675-09.2013.2.00.0000, Rel. Conselheiro Gilberto Valente, j. 10.09.2013)

 – Grifos inexistentes no original

 Rejeito.

c) Da suposta perda de objeto

 O TJSP aduz que o pedido dos requerentes teria perdido o objeto tendo em vista que o concurso em tela não foi prorrogado ou, em outras palavras, não seria possível a prorrogação de concurso já expirado.

 Essa questão, contudo, confunde-se com o próprio mérito da controvérsia, já que um dos pedidos formulados consiste exatamente na prorrogação da validade do certame.

 Rejeito.

 III – MÉRITO

 Conforme relatado, os requerentes insurgem-se contra o ato administrativo do TJSP que, em junho de 2014, decidiu não prorrogar o concurso público para provimento de cargos de Escrevente Técnico Judiciário e, ato contínuo, anunciou que deflagraria novo certame.

 Sustentam, em síntese, que como existiam mais de 3.000 cargos vagos e centenas de aprovados remanescentes, o ato do tribunal acabou por ofender os princípios constitucionais da moralidade e da eficiência.

 Diante disso, pleitearam:

a) que o prazo de validade do concurso em tela seja prorrogado por mais um ano, a contar da decisão a ser proferida nestes autos;

b) que o TJSP se abstenha de publicar novos editais de concurso público para o cargo de Escrevente Técnico Judiciário enquanto houver candidatos remanescentes;

c) que sejam reservadas vagas no novo edital ou garantido o direito de precedência dos aprovados sobre os novos concursados;

d) que o TJSP preencha de imediato todas as 3.136 vagas de Escrevente Técnico Judiciário existentes até a data de validade do concurso, nomeando os aprovados no concurso público em questão;

e) que o TJSP substitua todos os servidores requisitados que exerçam em caráter precário as mesmas funções de Escrevente Técnico Judiciário, cuja cessão já tenha ultrapassado o prazo fixado na Resolução CNJ nº 88/2009, pelos aprovados no concurso público em tela;

f) alternativamente, que o TJSP se abstenha de cobrar dos aprovados no certame anterior a taxa de inscrição no novo concurso público e, ainda, lhes seja concedido acréscimo de 10% (dez por cento) na nota final;

g) que seja encaminhada cópia destes procedimentos, bem como da decisão final, para a Corregedoria Nacional de Justiça e para o Ministério Público Federal para apuração de eventual desvio de finalidade e responsabilização dos agentes públicos.

 Nas informações prestadas o TJSP sustentou a improcedência dos pedidos, salientando que diversas razões motivaram a não prorrogação do concurso em tela, as quais podem ser assim resumidas:

a) como todas as 1035 vagas postas no certame foram preenchidas e haja vista que os requerentes classificaram-se fora do número de vagas ofertadas, não teriam direito subjetivo à nomeação, mas mera” esperança carente de proteção jurídica “;

b) como restaram esgotadas as listas de aprovados em algumas regiões e não seria possível prorrogar a validade do concurso para apenas uma região, tornou-se “necessário , conveniente, oportuno e mais econômico ” que novo certame, abrangendo todas as Regiões Administrativas, fosse instalado;

c) é vedado aproveitar candidato aprovado de uma região em outra, nos termos do art. 38 do Regulamento Interno dos servidores do TJSP;

d) embora exista déficit de servidores em muitas comarcas, não havia orçamento disponível em 2014 para fazer frente às nomeações, ante o corte orçamentário ocorrido, e não há certeza de que haverá disponibilidade orçamentária em 2015;

e) pretende selecionar novos candidatos com perfil adequado para utilização do sistema de processo digital implantado;

 f) possui contrato válido com a VUNESP, de modo que, se autorizado novo certame, não haverá nenhum dispêndio de verbas públicas.

Antes da análise da controvérsia,  impõe-se relatar os contornos fáticos do caso em tela.

De acordo com o edital, o concurso em questão tinha prazo de validade de 1 ano, a contar da data da sua homologação, prorrogável por igual período, com o objetivo de preencher 1.035 (um mil e trinta e cinco) cargos vagos de Escrevente Técnico Judiciário, distribuídos nas 10 (dez) Regiões Administrativas Judiciárias.

Além das 1.035 vagas iniciais, o item 7 do edital previu a possibilidade do concurso também abranger os cargos que “vierem a ser criados no decorrer do prazo de validade do concurso, havendo interesse do serviço e disponibilidade orçamentária “. Confira-se a sua redação:

7. O Concurso terá validade de 01 (um) ano, a contar da data de sua homologação, prorrogável por igual período, a critério do Tribunal de Justiça , podendo abranger os cargos vagos e os que vierem a ser criados no decorrer do prazo de validade do concurso, havendo interesse do serviço e disponibilidade orçamentária.

Em complemento, o item 8 do edital assim dispôs:

” A aprovação no Concurso Público não gera direito à nomeação, reservando-se ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo o direito de nomear os candidatos aprovados na medida de suas necessidades e da disponibilidade orçamentária existente “.

De acordo com o TJSP, ” cada região teve um concurso com edital próprio “, de modo que as datas de homologação e, por consequência, as datas de expiração do prazo de validade variaram de região para região administrativa.

Assim, de acordo com o documento juntado (PP n. 0004481-45.2014.2.00.0000, ID1575443), o término do 1º ano de validade do concurso ocorreu entre 18/06/2014 e 27/06/2014, a depender da região administrativa.

Como visto, pelas regras editalícias (princípio da vinculação ao edital), os candidatos aprovados tinham direito subjetivo à nomeação para os 1.035 cargos oferecidos no edital, de forma gradual, na medida do interesse e da disponibilidade orçamentária.

Ainda de acordo com o edital (item 7), os aprovados também poderiam ser nomeados para os cargos criados por lei ou surgidos no curso do certame (decorrentes de aposentadoria, exoneração, demissão etc), desde que cumpridos os dois requisitos : 1) interesse ou necessidade de serviço; 2) disponibilidade orçamentária.

Registre-se, também, que o próprio TJSP confirmou o surgimento de novas vagas no prazo de validade do concurso. De acordo com a planilha apresentada em suas informações complementares, quando do encerramento do certame (junho de 2014) existiam um total de 1.138 vagas , não computados ” os cargos criados e reservados para Comarcas ou Foros Distritais ainda não instalados “; “os cargos criados pela L.C. 1.208/2013, para instalação do Departamento Estadual de Execuções Criminais e Departamento Estadual de Inquéritos Policiais, esclarecendo que os mesmos ficam liberados somente quando da instalação das citadas Unidades”; “os 70 cargos transformados pela L.C. 1.111/2010 e os 57 cargos vagos criados pela L.C. 1.149/2011”; e “11 cargos vagos decorrentes de pena de demissão da Comarca da Capital, que podem eventualmente entrar com ação judicial” (ID1575443 do PP n. 0004481-45.2014.2.00.0000).

Como visto, dos 1.138 cargos vagos acima mencionados foram excluídos todos os criados por lei e ainda não providos, dentre eles, por exemplo, os 400 novos cargos de Escrevente Técnico Judiciário criados pela Lei Complementar n. 1.208, de 23.07.2013 (durante o prazo de validade do certame).

Isso talvez explique a diferença entre a quantidade de cargos vagos mencionada pelo TJSP (1.138, após as exclusões mencionadas) e a constante em documento disponível no portal da transparência no sítio eletrônico desse Tribunal (http://www.tjsp.jus.br/Institucional/CanaisComunicacao/ Transparencia/ResCNJ102/Default.aspx), trazido aos autos pelos requerentes, segundo o qual, em maio de 2014 , existiam 3.136 cargos vagos de Escrevente Técnico Judiciário.

Incontroverso, portanto, que quando da expiração do concurso existiam centenas de cargos vagos de Escrevente Técnico Judiciário.

Também restou demonstrado que, quando do término do 1º ano de validade do certame, subsistia lista de aprovados remanescentes em todas as regiões administrativas do Tribunal. Na verdade, somente em poucas circunscrições judiciárias não existiam mais candidatos aprovados, conforme se infere da planilha constante do PP n. 4792-36 (ID1557458).

De outro lado, o próprio TJSP reconheceu a necessidade ou o interesse da administração no preenchimento dos cargos vagos existentes, tanto que anunciou a realização de novo certame para provê-los:

” Com o esgotamento das listas de candidatos aprovados para parte do Estado, foi necessário, conveniente, oportuno e mais econômico, que novo certame, abrangendo todas as Regiões Administrativas, viesse a ser instalado – o que ainda não aconteceu. Antes disso, formulou o interessado o presente pedido de providências. “

A intenção de iniciar novo concurso ainda no segundo semestre de 2014 (logo após o termino do prazo de validade do certame em tela) também foi registrada em notícias veiculadas pelo jornal Folha Dirigida trazida aos autos

pelos requerentes (http://webfw.folhadirigida.com.br/fd/Satellite/concursos/noticias-TJSP-escrevente-2014-2000071893640/Edital-sai-em-junho-ou-julho-afirma-presidente-do-TJSP-2000074730790-1400002102880).

Na verdade, parece-me óbvia e notória a necessidade desse provimento, considerando que boa parte dos cargos vagos foram criados por leis de iniciativa do próprio Tribunal (art. 96, II, da Constituição Federal).

Em síntese, quando do termo final do 1º ano de validade do certame existiam: i) centenas de cargos vagos, inclusive criados por lei dentro do prazo de validade do concurso; ii) centenas de candidatos aprovados para todas as regiões administrativas (exceto para algumas circunscrições); e iii) interesse ou necessidade no preenchimento desses cargos.

Não obstante, o TJSP optou por não prorrogar o concurso – pelos fundamentos transcritos resumidamente acima – e, antes mesmo do termo final de validade, anunciou que seria aberto novo certame para preenchimento das vagas existentes para o mesmo cargo posto no certame não prorrogado.

Delineados os aspectos fáticos, impõe-se analisar os pedidos formulados.

a) DO PEDIDO DE PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO

 Pretendem os requerentes a prorrogação do prazo do concurso, por mais um ano, a contar da decisão a ser proferida nestes autos.

 O prazo de validade dos concursos públicos, a possibilidade da sua prorrogação, assim como a precedência dos aprovados sobre os novos concursados são temas previstos no art. 37, III e IV, da Constituição Federal. Confira-se:

 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

 (…)

 III – o prazo de validade do concurso público será de até dois anos,   prorrogável uma vez   , por igual período;

 IV – durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira;

 Ao interpretar esses dispositivos, o STF consolidou o entendimento de que a prorrogação do prazo de validade de concurso público constitui ato discricionário da Administração , do que se conclui que o candidato aprovado não possui direito subjetivo à prorrogação do certame. Nesse sentido:

 Agravo regimental no recurso extraordinário. Administrativo. Concurso público. Prequestionamento. Ausência. Prazo de validade. Prorrogação. Ato discricionário. Reexame de cláusulas editalícias e de fatos e provas. Impossibilidade. Precedentes. 1. Não se admite o recurso extraordinário quando os dispositivos constitucionais que nele se alega violados não estão devidamente prequestionados. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. 2. A Corte tem reconhecido a discricionariedade da Administração pública no tocante à prorrogação do prazo de validade de concursos públicos. 3. Inadmissível, em recurso extraordinário, a análise de cláusulas editalícias e o reexame do conjunto fático-probatório da causa. Incidência das Súmulas nºs 454 e 279/STF. 4. Agravo regimental não provido. (AgReg no RE 594410/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 29.04.2014)

 AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. 1) PRORROGAÇÃO DE PRAZO DE VALIDADE DE CONCURSO PÚBLICO: JUÍZO DE CONVENIÊNCIA E DE OPORTUNIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRECEDENTES. 2) LEGITIMIDADE AD CAUSAM. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL: OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (AgReg no RE 733649/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 13.08.2013)

 Diante disso, tenho que a decisão discricionária do TJSP pela não prorrogação de concurso público, balizada pelo juízo de conveniência e oportunidade típico de mérito administrativo, não pode ser revista por este Conselho.

 A impossibilidade de compelir o TJSP a prorrogar o concurso, porém, não obsta o eventual reconhecimento de que esse ato administrativo ofendeu direito subjetivo dos candidatos aprovados à nomeação, na linha de precedentes do próprio STF, conforme será adiante analisado.

 Improcede.

b) DO PLEITO DE NÃO PUBLICAÇÃO DE NOVOS EDITAIS DE CONCURSO

 Os requerentes pretendem seja determinado ao TJSP que, enquanto houver candidatos remanescentes, se abstenha de publicar novos editais de concurso público para o cargo de Escrevente Técnico Judiciário.

 Sem razão os requerentes.

 Registre-se, em primeiro lugar, que vislumbro nenhuma incompatibilidade entre a abertura de um novo concurso e o provimento principal que os aprovados remanescentes buscam obter, qual seja, a precedência na nomeação (sobre os novos concursados) ou o direito à nomeação.

 Isso porque nada obsta a realização de um novo concurso ainda na vigência de certame anterior, situação que não é incomum na atualidade, inclusive no Judiciário. Ao contrário, ante a alta rotatividade atual de servidores, notadamente nos órgãos com extenso quadro de pessoal, o desencadeamento de novo certame na vigência de outro é medida altamente benéfica à administração, porquanto garante a manutenção de aprovados aptos a serem chamados (ainda que em cadastro de reserva) sempre que necessário.

 Consegue-se, assim, rápida renovação do quadro, a minorar os efeitos deletérios dessa rotatividade nos serviços prestados, o que não ocorreria caso se aguardasse o término do prazo de validade de um certame para, só então, desencadear um novo.

 Essa compatibilidade é reforçada pelo lapso temporal necessário entre a publicação do edital e a homologação do certame, a demandar vários meses, quiçá anos. Assim, nada mais salutar que, encerrado o prazo de validade de um certame, o tribunal já esteja com outro vigente ou em andamento.

 É exatamente para as hipóteses de vigência concomitante de concursos sucessivos – a reforçar essa possibilidade – que o art. 37, IV, da Constituição Federal assegura a nomeação preferencial dos selecionados no concurso anterior:

 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(…)

IV – durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira;

Por conseguinte, não há razão jurídica para obstar a realização de novo certame, seja para as circunscrições administrativas em que não há mais candidatos aprovados, seja para aquelas em que há remanescentes.

Improcede.

c) DO PLEITO DE RESERVA DE VAGAS OU DO DIREITO DE PRECEDÊNCIA

Os requerentes também pleiteiam reserva de vagas ou precedência na nomeação em relação aos candidatos que venham a ser aprovados no próximo concurso.

Como visto, o art. 37, IV, da Carta Constitucional garante o direito de precedência dos candidatos aprovados sobre os novos concursados apenas ” durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação “.

Assim, como improcedente o pleito de prorrogação do prazo do certame (vide tópico supra), esgotado desde junho de 2014, não há como garantir-lhes o direito subjetivo à reserva de vagas ou à precedência sobre os futuros aprovados.

 Registre-se, contudo, que o direito de precedência não se confunde com o direito à nomeação, o que será apreciado a seguir.

Improcede.

d) DO PEDIDO DE NOMEAÇÃO DOS APROVADOS PARA AS VAGAS SURGIDAS ATÉ A DATA DE VALIDADE DO CONCURSO

Os requerentes também pleiteiam a nomeação dos aprovados no concurso em tela para todas as 3.136 vagas de Escrevente Técnico Judiciário existentes quando do término da validade do certame. Fundamentam, entre outros, no entendimento manifestado pelo STF no RE n. 581.113.

Conforme exposto acima, o edital do concurso (item 7) previu a possibilidade de nomeação dos aprovados para os cargos surgidos no curso do certame (criados por lei ou decorrentes de aposentadoria, exoneração, demissão etc), desde que cumpridos os dois requisitos: 1) interesse ou necessidade de serviço; e 2) disponibilidade orçamentária.

Também restou demonstrado alhures que, quando do termo final do 1º ano de validade do certame, existiam centenas de cargos vagos – inclusive criados por lei dentro do prazo de validade do concurso -, centenas de candidatos aprovados e, especialmente, interesse ou necessidade no seu preenchimento.

Recorde-se que o próprio TJSP confirmou o surgimento de novas vagas no prazo de validade do concurso, como também reconheceu a necessidade do seu preenchimento, evidenciando assim a presença do primeiro dos requisitos previstos no edital.

A defesa apresentada, na verdade, centrou-se na ausência do segundo requisito, qual seja, a inexistência de orçamento para fazer frente às nomeações em 2014, somada à incerteza de disponibilidade financeira em 2015.

Melhor explicando, afirma o TJSP que a proposta orçamentária de 2014 foi da ordem de R$ 9.083.603.153, porém, foram aprovados apenas R$ 6.293.852.844 para o orçamento com pessoal. Ou seja, houve um corte nos recursos orçamentários propostos pelo Tribunal, o que teria inviabilizado o preenchimento dos novos cargos. Vale transcrever o respectivo trecho das informações prestadas (PP 0004135-94.2014.2.00.0000, ID1520940):

A proposta orçamentária para 2014 enviado pelo Tribunal de Justiça foi da ordem de R$ 9.083.603.153, sendo que aprovados e destinados para o orçamento de pessoal foi apenas R$ 6.293.852.844.

Isso significa que NÃO HÁ POSSIBILIDADE LEGAL DE NOMEAÇÃO.  – grifo inexistente no original

Tais informações também deixaram evidente a incerteza orçamentária para o ano de 2015, confirmando assim o dilema financeiro por que passa os tribunais brasileiros, notadamente os Estaduais. Confira-se (PP 0004135-94.2014.2.00.0000, ID1520940):

Não se nega aqui a falta de servidores em muitas comarcas  , mas, não obstante existam os cargos, NÃO HÁ VAGA, compreendendo-se como vaga a somatória do cargo e a disponibilidade financeira para fazer frente ao pagamento . Tal definição surge no TJSP uma vez que o orçamento destinado é sempre insuficiente, em razão dos cortes nos valores solicitados, o que impossibilita o preenchimento de todos os cargos vagos existentes e que eventualmente venham a surgir.

Se o concurso viesse a ser prorrogado, até se pode cogitar de que os dois fatores já se apresentassem até 2015. Todavia, não é certo que tal disponibilidade financeira exista antes de junho/2015 (prazo final da validade dos concursos se prorrogados). Assim, se se aguardasse até 2015 para se abrir novo certame, o Tribunal de Justiça amargaria por muitos meses com a falta de servidores. – grifo inexistentes no original.

Diante disso, para a adequada análise do pedido de nomeação dos candidatos aprovados torna-se  necessário separar os cargos vagos de Escrevente Técnico Judiciário em duas categorias: i) decorrentes de mera reposição de servidores ( impacto orçamentário) e ii) decorrentes sem de cargos criados no curso do certame ( com impacto orçamentário).

d.1 – Das vagas decorrentes de reposição de servidores – ausência de impacto orçamentário

O TJSP juntou aos autos planilha com descrição dos cargos que estavam vagos quando do término de validade do concurso (PP n. 0004481-45.2014.2.00.0000, ID1575443), da qual se extrai que parte dessas vagas (ainda que pequena) decorre de exoneração dos ocupantes anteriores, de modo que o seu preenchimento representará mera “reposição de pessoal”, ou seja, não causará nenhum impacto nas finanças.

do Tribunal. Tais vagas estão expressas na coluna “Disponíveis em 18/6/2014” e identificadas sob a rubrica “Decorrente de Exoneração – DJ xxxx” (data da publicação do ato).

Nesse passo, o corte orçamentário no exercício de 2014 não justifica a omissão do Tribunal em nomear os candidatos aprovados para essas vagas, uma vez que, repita-se, já existiam quando do término da validade do certame e o seu provimento não gera nenhum impacto orçamentário.

Em outras palavras, no tocante às vagas surgidas no curso do certame (decorrentes de mera reposição de pessoal – “exoneração”), os dois requisitos previstos no edital (interesse e disponibilidade orçamentária) já estavam preenchidos quando do término do prazo de validade. Logo, a não prorrogação do concurso acabou por ofender o direito subjetivo (e pré-existente) à nomeação.

Registre-se que o conceito de “reposição de pessoal” (assim considerado aquele que não gera impacto orçamentário) está bem delineado nas regras orçamentárias, a exemplo do Anexo V da Lei de Diretrizes Orçamentárias 2014 (Lei 12.952/2014):

Para fins de reposição , considera-se exclusivamente o preenchimento de cargos efetivos e cargos /funções comissionadas ocupadas em março de 2013, cujas despesas compunham a base de projeção para a definição dos limites de “Pessoal e Encargos Sociais” para 2014, não gerando, assim , impacto orçamentário. Neste contexto, excluem-se as vagas originadas de aposentadorias e falecimentos que impliquem em pagamento de pensões, por se tratarem de mera reclassificação orçamentária, ou seja, não geram economia em termos de impactos orçamentários”.

Registra-se, de outro lado, que o “direito subjetivo” dos aprovados, fundado em previsão expressa do edital, não pode ser obstado pela intenção superveniente do TJSP de, no novo certame, selecionar candidatos com perfil mais adequado à utilização do sistema de processo digital .

Aliás, esse “novo perfil” já poderia (e deveria) ter sido exigido no concurso findo, considerando que quando foi inaugurado (em 2012) esse Tribunal de há muito tinha desencadeado o seu projeto de modernização tecnológica, que apenas culminou com a implantação (prevista e planejada) de sistema de processo eletrônico.

Outrossim, nada obsta que a capacitação para uso de ferramenta eletrônica se dê em cursos específicos de formação inicial ou continuada, a exemplo dos oferecidos pelo próprio TJSP aos seus milhares de servidores do quadro atual.

 Por conseguinte, defiro o pedido de nomeação dos aprovados remanescentes para os cargos vagos que representem mera reposição de pessoal (sem impacto orçamentário), observada a ordem de classificação e as regras editalícias relativas às listas por circunscrição e por região administrativa.

 d.2 – Das novas vagas surgidas no curso do certame – preenchimento com impacto orçamentário

 No tocante às demais vagas surgidas no curso do certame (fruto da criação de cargos por lei ou decorrentes de aposentadoria, falecimento etc), cujo preenchimento impacta o orçamento do Tribunal, não merece prosperar a tese dos requerentes.

 A razão é simples: quando do término do 1º ano de validade do certame não estava preenchido o segundo requisito previsto no edital, qual seja, a disponibilidade orçamentária. Afinal, conforme demonstrado acima, houve sensível corte no orçamento de pessoal de 2014, representado pelo cotejo entre a proposta orçamentária enviada pelo TJSP (R$ 9.083.603.153) e o orçamento aprovado (R$ 6.293.852.844).

 Ausente tal requisito, não há como reconhecer o direito subjetivo à nomeação (para as vagas que impliquem aumento de despesas).

 Nesse passo, a incerteza acerca do orçamento de 2015 apenas confirma que os requerentes detinham, quando da não prorrogação do concurso, mera “expectativa de direito”.

 Esse fato – ausência de orçamento – também torna inaplicável ao caso em tela o precedente do STF mencionado pelos requerentes (Recurso Extraordinário n. 581.113), especificamente no tocante às vagas cujo provimento implique aumento de despesas. Senão vejamos.

 d.2.1 – Da inaplicabilidade do Precedente do STF (RE 581.113) para as vagas cujo preenchimento gere impacto orçamentário

 A doutrina e a jurisprudência vem entendendo que a impossibilidade de compelir a administração a prorrogar um concurso – porquanto fruto de um ato discricionário – não obsta que se reconheça as consequências dessa não prorrogação, notadamente quando gere ofensa ao direito subjetivo dos aprovados à nomeação. Isso se dá, por exemplo, quando a administração deixa escoar propositadamente o prazo de validade como meio de se evadir ao comando do inciso IV, do art. 37, da Constituição Federal, deflagrando, logo em seguida, novo certame com a mesma finalidade.

 A esse respeito, vale recordar a sempre valiosa lição do Professor Celso Antônio Bandeira de Mello (Curso de Direito Administrativo, 26. ed, São Paulo: Malheiros, 2009, p. 279-280):

 Os concursos públicos terão validade de até dois anos, prorrogáveis uma vez, por igual período (art. 37, III), isto é, por tempo igual ao que lhes haja sido originariamente consignado (art. 37, IV). No interior de tal prazo os aprovados terão precedência para nomeação sobre novos concursados (art. 37, IV). Como consequência desta prioridade, a Administração   só com eles poderá preencher as vagas existentes dentro de seu período de validade quer já existissem quando da abertura do certame,   quer ocorridas depois. É certo, outrossim, que não poderá deixá-lo escoar simplesmente como meio de se evadir ao comando de tal regra, nomeando em seguida os aprovados no concurso sucessivo, que isto seria um desvio de poder. Com efeito, se fosse possível agir deste modo, a garantia do inciso IV não valeria nada, sendo o mesmo uma “letra morta “ . (grifo inexistente no original)

Nesse mesmo sentido o precedente do STF no RE 581.113/SC, segundo o qual, a despeito de não se poder compelir a Administração a prorrogar a validade do concurso, deve ser reconhecido o direito dos aprovados à nomeação se durante tal prazo surgirem novas vagas da mesma natureza das que deram causa à abertura do certame e restar demonstrada a necessidade de seu preenchimento. Confira-se:

Concurso público. Criação, por lei federal, de novos cargos durante o prazo de validade do certame. Posterior regulamentação editada pelo Tribunal Superior Eleitoral a determinar o aproveitamento, para o preenchimento daqueles cargos, de aprovados em concurso que estivesse em vigor à data da publicação da Lei.

  1. A Administração, é certo, não está obrigada a prorrogar o prazo de validade dos concursos públicos; porém, se novos cargos vêm a ser

criados, durante tal prazo de validade, mostra-se de todo recomendável que se proceda a essa prorrogação   .

 2. Na hipótese de haver novas vagas, prestes a serem preenchidas, e razoável número de aprovados em concurso ainda em vigor quando da edição da Lei que criou essas novas vagas, não são justificativas bastantes para o indeferimento da prorrogação da validade de certame público razões de política administrativa interna do Tribunal Regional Eleitoral que realizou o concurso .

 3. Recurso extraordinário provido. (RE 581.113/SC, Primeira Turma, Rel. Ministro Dias Toffoli, j. 05.04.2011).

Para melhor compreensão, vejam-se os seguintes trechos do voto condutor do acórdão:

S e é certo que não se pode compelir a Administração a prorrogar, obrigatoriamente, o prazo de todo e qualquer concurso público que venha a realizar, uma vez que tal faculdade se insere no poder discricionário que lhe é inerente, não é menos certo que, se, ainda durante o prazo de validade do concurso, novos cargos da mesma natureza desses que deram causa à abertura do certame foram criados, parece inegável o direito dos aprovados em serem nomeados e, para tanto, pertinente se mostrava a prorrogação do prazo de validade do concurso .

(…)

Recusando-se a proceder dessa maneira, inegavelmente, o Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Santa Catarina violou direito líquido e certo dos recorrentes à nomeação, infringindo, ainda, os ditames constitucionais que devem nortear a atuação da Administração Pública, notadamente os princípios da legalidade e da eficiência.

E isso porque, tendo sido aprovados para determinados cargos públicos, mas não logrando classificação que lhes permitisse pronta chamada, os recorrentes ficaram no aguardo da abertura de novas vagas, o que efetivamente veio a ocorrer, ainda no prazo de validade do concurso.

Assim, como os cargos criados eram ocupados por pessoas de fora da carreira da justiça eleitoral dos Estados, havia fundamentos suficientes a justificar a prorrogação do prazo de validade do concurso, de modo que aqueles que lograram aprovação nesse certamente viessem a ser oportunamente chamados a ocupar esses cargos.

Tampouco se mostra razoável admitir que o melhor seria a abertura de novo e igual concurso público para o preenchimento dos cargos, uma

vez que havia aprovados em número suficiente para tanto, remanescentes de concurso recentemente realizado,   ainda dentro de seu prazo

de validade original quando da edição da lei que criou tais cargos   .

(…)

Merece, pois, provimento o presente recurso, para a concessão da segurança impetrada pelos recorrentes, determinando-se que o Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Santa Catarina, tomando por parâmetro as vagas existentes até a data do encerramento do prazo de validade do aludido concurso, proceda à nomeação dos ora recorrentes para os cargos para os quais foram regularmente aprovados.”

Acrescento, ainda, os seguintes trechos dos votos proferidos pelos Ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello nesse mesmo caso:

Senhora Presidente, seria irracional abrir um concurso e não prover as vagas, até porque a Administração Pública se sujeita não apenas ao princípio da legalidade, mas também ao princípio da economicidade e da eficiência. Em existindo vagas e em existindo candidatos aprovados, o interesse público exige que essas vagas sejam providas .” (Min. Ricardo Lewandowski)

Presidente, apenas duas palavras, não para divergir do relator, mas para ressaltar que, durante muitos anos, vingou jurisprudência – que, a meu ver, mereceu excomunhão maior – segundo a qual somente se teria direito subjetivo à nomeação no caso de preterição, como se – assentei no acórdão – a Administração Pública pudesse brincar com o homem candidato e praticamente tripudiar, deixando escorar o prazo de validade do concurso, com vagas abertas, às vezes anunciadas no edital, sem preenchimento.” (Min. Marco Aurélio Mello)

Destaque-se o fato de o STF, no caso acima transcrito, ter adentrado na análise dos fundamentos que levaram a administração a não prorrogar o certame para, após, concluir que ” não são justificativas bastantes para o indeferimento da prorrogação da validade de certame público razões de política administrativa interna do Tribunal Regional Eleitoral que realizou o concurso” . Vale dizer: embora a não prorrogação seja um ato discricionário, os seus fundamentos podem ser analisados para se concluir pela existência ou não do direito subjetivo à nomeação.

Nesse mesmo sentido, confira-se também o seguinte julgado da 2ª Turma do STF:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282 DO STF. ADMINISTRATIVO. INVESTIDURA EM CARGO OU EMPREGO PÚBLICO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. SUBMISSÃO À REGRA CONSTITUCIONAL DO CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO QUE PASSA A FIGURAR DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

(…)

III – O Plenário desta Corte, no julgamento do RE 598.099/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, firmou entendimento no sentido de que possui direito subjetivo à nomeação o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital de concurso público.

IV – O direito à nomeação também se estende ao candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital na hipótese em que surgirem novas vagas no prazo de validade do concurso. Precedentes .

V – Agravo regimental a que se nega provimento. (AgReg no RE 790897/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 25.02.2014)

O Superior Tribunal de Justiça também tem decidido que, comprovada a existência de vagas e a necessidade do seu preenchimento, a mera expectativa do candidato aprovado fora do número de vagas oferecidas no edital convola-se em direito subjetivo à nomeação, a exemplo do seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR. NOMEAÇÃO. TERMO INICIAL DO PRAZO DECADENCIAL CONTRA AUSÊNCIA DE NOMEAÇÃO DE CANDIDATO. EXPIRAÇÃO DO PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS. SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS DENTRO DO PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO. ACOLHER A ALEGAÇÃO DE QUE A DEFINIÇÃO ACERCA DO SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS SE DEU APÓS A EXPIRAÇÃO DO PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME IMPORTA EM ANÁLISE DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL DO ESTADO DA BAHIA DESPROVIDO.

(…)

 2. Embora o candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital do certame possua mera expectativa de direito à nomeação, caso fique comprovado nos autos a necessidade de a Administração preencher as vagas existentes, o candidato passa, então, a ter direito subjetivo a ser nomeado.

 (…)

 5. Agravo Regimental da ESTADO DA BAHIA desprovido. (STJ: AgRg no REsp 1357029/BA, Primeira Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 08.04.2014)

 Com efeito, parece-me claro que os fundamentos expostos acima podem ser aplicados para solução de parte da controvérsia do caso em tela, especificamente no tocante às vagas cujo provimento represente mera reposição de pessoal , sem impacto orçamentário, tendo em vista que quando do término do 1º ano de validade do certame existiam, igualmente, candidatos aprovados, vagas abertas e necessidade de contratação de pessoal, o que só reforça o deferimento do pedido analisado no item d.1.

 Esse precedente, contudo, não pode ser aplicado para as vagas cujo provimento implique aumento de despesas , tendo em vista uma particularidade do caso concreto: a ausência de orçamento.

 Registre-se, em primeiro lugar, que essa realidade do caso em tela não foi discutida ou enfrentada no referido precedente.

 Na verdade, como esse tema (ausência de orçamento) não foi utilizado como fundamento para a não prorrogação do concurso e, por conseguinte, não estava inserido no “quadro fático” em análise, impõe-se concluir que o precedente transcrito partiu do pressuposto de que havia orçamento disponível para preenchimento das vagas surgidas no prazo de validade do certame.

 Esse pressuposto também decorre do fato de a Constituição Federal exigir prévia dotação orçamentária como requisito para a aprovação da lei criadora dos novos cargos, a teor do seu artigo 169, § 1º:

 Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar. (Redação dada pela pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos , empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta,

 inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público,   só poderão ser feitas   :  (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda

 Constitucional nº 19, de 1998)

 I – se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;

 (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

 II – se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.

 (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

  Assim, uma vez promulgada a lei criadora de novos cargos, é de se presumir a existência de prévio orçamento para fazer frente às nomeações, circunstância que por certo não passou ao largo do olhar do STF.

 No presente caso, contudo, como por demais frisado, não obstante a existência de cargos vagos criados por lei no curso do certame, o TJSP demonstrou ter havido significativo corte na proposta orçamentária encaminhada, o que impossibilitou o seu provimento .

 Nesse cenário, não se pode afirmar que o ato de não prorrogação do certame ofendeu direito subjetivo dos requerentes à nomeação para as vagas cujo provimento implique aumento de despesas (cerca de 3 mil, segundo os requerentes), uma vez que a existência de orçamento era um pressuposto e um dos requisitos explicitados no próprio edital.

 Entendimento noutro sentido representaria, na prática, obrigar o provimento de centenas de cargos sem prévia dotação orçamentária (ou sem a certeza de que haverá orçamento para tanto até junho de 2015, prazo limite de validade do certame), o que não se pode admitir .

 Esse entendimento aplica-se, igualmente, às vagas decorrentes de aposentadoria e falecimento de servidores. Afinal, o provimento dos cargos decorrentes dessas duas hipóteses também enseja aumento de despesas com pessoal, embora em outra rubrica (proventos de aposentadoria e pensão por morte).

 Nesse sentido, também é impositivo concluir que o ato de não prorrogação do concurso – fundado na ausência de orçamento em 2014 (entre outros fundamentos) -, não teve o intuito de preterir os aprovados remanescentes ou beneficiar os futuros aprovados, muito menos de esvaziar o comando do artigo 37, IV, a Constituição.

 Também vale observar que o anúncio de um novo certame (a ser concluído em 2015), longe de caracterizar desvio de finalidade, revelou tão somente a preocupação salutar da administração em manter lista de aprovados para fazer frente às futuras nomeações. Afinal, ainda que não haja orçamento suficiente em 2015 (fato ainda incerto), a validade do novo certame permitirá a nomeação dos novos concursados nos anos subsequentes.

Em outras palavras, ainda que prorrogado fosse o certame em tela, seria necessário desencadear um novo concurso, seja para dar provimento aos cargos não preenchidos até junho de 2015, seja para manter lista de aprovados para as vagas surgidas posteriormente.

À guisa de conclusão, embora o mencionado precedente do STF acabe por reforçar o deferimento do pedido analisado no item d.1, de nomeação para as poucas vagas cujo provimento represente mera reposição de pessoal (sem impacto orçamentário), não pode ser aplicado para aquelas cujo provimento implique aumento de despesas.

e)  DO PEDIDO DE SUBSTITUIÇÃO DOS SERVIDORES REQUISITADOS PELOS APROVADOS REMANESCENTES

Os requerentes pretendem, ainda, que o TJSP substitua, pelos aprovados no concurso público em tela, todos os servidores requisitados que exerçam em caráter precário as mesmas funções de Escrevente Técnico Judiciário, cuja cessão já tenha ultrapassado o prazo fixado na Resolução CNJ nº 88/2009.

Como visto, o pedido está fundado no disposto no art. 3º, § 1º, da Resolução CNJ n. 88, que assim dispõe:

 Art. 3º O limite de servidores requisitados ou cedidos de órgãos não pertencentes ao Poder Judiciário é de 20% (vinte por cento) do total do quadro de cada tribunal, salvo se a legislação local ou especial disciplinar a matéria de modo diverso.

  • 1º Os servidores requisitados ou cedidos deverão ser substituídos por servidores do quadro, no prazo máximo de 4 (quatro) anos, na proporção mínima de 20% (vinte por cento) por ano, até que se atinja o limite previsto no caput deste artigo .
  • 2º O disposto no parágrafo anterior não se aplica aos órgãos em relação aos quais este Conselho, em análise concreta, já determinou a devolução dos requisitados ou cedidos.
  • 3º Deverão os Tribunais de Justiça dos Estados em que houver legislação local estabelecendo percentual superior ao do caput deste artigo encaminhar projeto de lei para adequação a esse limite, ficando vedado envio de projeto de lei para fixação de limite superior.

 Note-se que a Resolução CNJ n. 88 autoriza a requisição de servidores de órgãos não pertencentes ao Judiciário, até o limite de 20% do total do quadro do Tribunal. Com efeito, o prazo acima mencionado objetiva a redução desses requisitados tão somente quando em percentual superior ao limite de 20%.

 No presente caso, contudo, não há nenhum indício de que o TJSP possui requisitados em percentual superior ao limite fixado pelo CNJ, notadamente exercendo as atribuições típicas do cargo para o qual os requerentes restaram aprovados (Escrevente Técnico Judiciário).

 Ademais, os procedimentos em tela não são adequados à análise de suposto descumprimento da Resolução CNJ n. 88, tema afeto à Presidência deste Conselho, nos termos do art. 6º, XIV c/c o art. 101 do Regimento Interno.

 f) ISENÇÃO DA TAXA DE INSCRIÇÃO E ACRÉSCIMO DE 10% NA NOTA FINAL EM NOVO CONCURSO

 Quanto a esse ponto, os requerentes pleiteiam:

 determinar, alternativamente no caso de não acatamento dos pedidos deduzidos nos itens 1 e 2, que, para novo concurso público aberto para o mesmo cargo, o TJSP se abstenha de cobrar a taxa de inscrição aos candidatos aprovados no concurso do Edital de 28.08.12 que demonstrem interesse na participação no novo concurso, como forma de compensação à violação de direitos aqui verificada.”

 determinar, alternativamente no caso de não acatamento dos pedidos deduzidos nos itens 1 e 2, que seja concedido acréscimo de 10% (dez por cento) na nota final dos candidatos advindos do Edital de Abertura de 28.08.12 que eventualmente queiram participar de novo concurso público para o mesmo cargo, de forma a tratá-los com isonomia material dada a quebra de preferência em descompasso com o art. 37, III da CF.”

 Conforme se verifica, os pedidos acima visam eventual compensação dos candidatos pela suposta ” violação de direitos aqui verificada ” e pela ” quebra de preferência em descompasso com o art. 37, III da CF “, o que não foi reconhecido acima.

Na verdade, já foi determinada a “reparação” do único direito subjetivo reconhecido (direito à nomeação para as vagas decorrentes de mera reposição de pessoal).

 Ademais, os pedidos em questão não encontram respaldo legal a autorizar o seu deferimento.

 Improcede.

 g) DO ENVIO DE CÓPIA À CORREGEDORIA NACIONAL E MPF

 Pretendem os requerentes, por fim, seja encaminhada cópia destes procedimentos, bem como da decisão final, para a Corregedoria Nacional de Justiça e para o Ministério Público Federal para apuração de eventual desvio de finalidade e responsabilização dos agentes públicos.

 Não vislumbro, contudo, nenhum indício de desvio funcional ou de finalidade que justifique tal providência.

  IV – CONCLUSÃO

Diante do exposto, VOTO PELA PARCIAL PROCEDÊNCIA do pedido para reconhecer que o ato de não prorrogação do concurso, sem prévia nomeação dos candidatos aprovados para os cargos que já se encontravam vagos (omissão) e cujo provimento represente mera reposição de pessoal, sem impacto orçamentário , ofendeu a previsão editalícia e, em última análise, o direito subjetivo à nomeação.

Por conseguinte, determino ao TJSP que proceda à nomeação dos aprovados remanescentes para os referidos cargos, observada a ordem de classificação e as regras editalícias relativas às listas por circunscrição e por região administrativa.

Após as comunicações de praxe, arquive-se.

Brasília, 2015-02-10.

RUBENS CURADO SILVEIRA

Conselheiro

 Fonte: DJ- PCA – CNJ | 12/02/2015.

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Questão esclarece acerca da anuência dos cônjuges proprietários de imóvel confrontante, no procedimento de retificação administrativa de área.

Retificação de área. Imóvel confrontante. Proprietários casados – cônjuge – anuência.

Nesta edição do Boletim Eletrônico esclarecemos dúvida acerca da anuência dos cônjuges proprietários de imóvel confrontante, no procedimento de retificação administrativa de área. Veja como a Consultoria do IRIB se posicionou acerca do assunto, valendo-se dos ensinamentos de Eduardo Augusto:

Pergunta: No caso de retificação administrativa de área, quando os proprietários dos imóveis confrontantes forem casados, devem ser apresentadas as anuências de ambos os cônjuges?

Resposta: Eduardo Augusto, ao abordar o assunto, assim explicou:

“Ora, se a lei autoriza um condômino representar os demais proprietários, mesmo que eles nem se conheçam, por que a lei impediria que uma pessoa casada anuísse pelo casal? Argumentar que isso se justifica por trazer segurança ao cônjuge é uma grande incoerência, pois a lei dispensou a segurança dos demais condôminos, cuja afeição mal se presume. Se, para a anuência, a lei dispensa a participação de todos os titulares do imóvel confrontante, aceitando a participação de qualquer um deles, o proprietário casado poderá anuir sozinho, sem a participação de seu cônjuge.

(…)

Conclusão: está legitimado a anuir à retificação qualquer um dos proprietários tabulares do imóvel confrontante, independentemente de seu estado civil.” (AUGUSTO, Eduardo Agostinho Arruda. “Registro de Imóveis, Retificação de Registro e Georreferenciamento: Fundamento e Prática”, Série Direito Registral e Notarial, Coord. João Pedro Lamana Paiva, Saraiva, São Paulo, 2013, p. 401-402).
Recomendamos, para maior aprofundamento no assunto, a leitura da obra acima mencionada.

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Fonte: IRIB.

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