Jurisprudência: Direito empresarial. Certidões negativas e transformação de sociedade simples em empresarial.

Para efetuar o registro e o arquivamento de alteração contratual, a fim de promover a transformação de sociedade civil em empresária, não é exigível a apresentação de certidões negativas de débitos com o FGTS e com a União, exigindo-se, contudo, certidão negativa de débito com o INSS. Realmente, o Decreto-Lei n. 1.715/1979 e a Lei n. 8.036/1990 exigem, para o registro e o arquivamento de alteração contratual como a aqui analisada, a apresentação de certidões negativas de débitos com o FGTS e com a União. Ocorre que a Lei n. 8.934/1994 – que entrou em vigor posteriormente a esses mencionados diplomas normativos – estabeleceu, no parágrafo único do seu art. 37, que, para instruir os pedidos de arquivamento, além dos referidos nesse artigo (dentre os quais não constam certidões negativas de débitos com o FGTS ou com a União), “nenhum outro documento será exigido das firmas individuais e sociedades referidas nas alíneas a, b e d do inciso II do art. 32″. Nesse contexto, a Terceira Turma, no REsp 1.290.954-SC (DJe 25/2/2014), firmou entendimento no sentido de que Lei n. 8.934/1994 derrogou os dispositivos de leis anteriores que estabeleciam outras exigências para o arquivamento de atos societários nas Juntas Comerciais. No referido julgado, confrontou-se a Lei n. 8.934/1994 com as leis tributárias anteriores, identificando-se uma antinomia de segundo grau, em que há conflito entre os critérios cronológico e da especialidade. Concluiu-se, então, que há de prevalecer o critério cronológico, pois o enunciado normativo “nenhum outro documento será exigido”, contido na Lei n. 8.934/1994, tem conteúdo nitidamente derrogatório, excluindo a possibilidade de subsistirem leis anteriores em sentido contrário. Portanto, não mais subsistem as exigências de certidões negativas de débitos com o FGTS e com a União, porque previstas em leis anteriores (Decreto-Lei n. 1.715/1979 e Lei n. 8.036/1990). Prevalece, apenas, a exigência de certidão negativa do INSS, pois inserida na Lei n. 8.212/1991 por força da Lei n. 9.032/1995, que é posterior à Lei n. 8.934/1994. Além disso, cabe ressaltar que, de fato, o parágrafo único do art. 34 do Decreto n. 1.800/1996 afirma que, obrigatoriamente, para instruir os pedidos de arquivamento, “Nenhum outro documento, além dos referidos neste Regulamento, será exigido das firmas mercantis individuais e sociedades mercantis, salvo expressa determinação legal, reputando-se como verdadeiras, até prova em contrário, as declarações feitas perante os órgãos do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins”. Percebe-se, desse modo, que o Decreto foi bastante claro, diversamente da lei, quanto à possibilidade de se exigirem outros documentos por determinação legal. Deve-se indagar, entretanto, se o Decreto extrapolou as balizas da Lei. Ademais, uma interpretação sistemática dos arts. 32 da Lei n. 8.934/1994 e 11 da LC n. 123/2006 poderia conduzir ao entendimento de que não teria havido derrogação de dispositivos de leis anteriores à Lei n. 8.934/1994. Todavia, o entendimento do aludido REsp 1.290.954-SC, da Terceira Turma do STJ, deve ser reafirmado. Isso porque a interpretação da lei deve privilegiar o sentido que mais se harmoniza com os princípios constitucionais, pois estes se encontram no vértice da pirâmide normativa, de onde emanam normas fundamentais que se irradiam por todo ordenamento jurídico, alcançando inclusive as relações jurídicas de direito privado. Com esse entendimento, a interpretação do caso em análise deve ser conduzida pelos princípios fundamentais da ordem econômica, especialmente o da livre iniciativa, previsto no art. 170 da CF. Sob a ótica da livre iniciativa, o Estado deve respeitar a autonomia de vontade dos sócios de uma sociedade, não podendo impedir que estes criem, modifiquem ou extingam sociedades empresárias, salvo nos casos expressamente previstos em lei. A regra no direito brasileiro, portanto, é a livre iniciativa e a autonomia da vontade dos sócios, sendo exceção a interferência estatal. Nesse passo, verifica-se que a norma do art. 37 da Lei n. 8.934/1994, ao impor exigências para a concretização da vontade dos sócios, apresenta natureza excepcional num sistema jurídico regido pela livre iniciativa, devendo, pois, receber interpretação restritiva. Desse modo, o trecho “nenhum outro documento será exigido” (art. 37, parágrafo único, da Lei n. 8.934/1994) não pode receber interpretação extensiva, para que se admitam outras restrições à autonomia de vontade dos sócios, previstas em leis anteriores. De mais a mais, ressalte-se que, além de a dispensa de certidões negativas não alterar em nada o crédito tributário – que permanece ativo, podendo ser redirecionado contra a nova sociedade (que surgiu por transformação da sociedade simples em sociedade empresária), conforme o disposto no art. 132 do CTN -, a Fazenda, nos casos excepcionais em que a transformação societária seja implementada com o objetivo deliberado de frustrar a satisfação do crédito tributário, poderá se valer da desconsideração da personalidade jurídica ou da cautelar fiscal para proteger seus interesses. REsp 1.393.724-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 28/10/2015, DJe 4/12/2015.

Fonte: Anoreg/BR – Informativo de Jurisprudência do STJ N° 0573 | 18/02/2016.

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STJ: DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E PROCESSUAL CIVIL. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ECLESIÁSTICA DE ANULAÇÃO DE MATRIMÔNIO.

É possível a homologação pelo STJ de sentença eclesiástica de anulação de matrimônio, confirmada pelo órgão de controle superior da Santa Sé. De início, o § 1º do art. 216-A do RISTJ prevê a possibilidade de serem homologados “os provimentos não judiciais que, pela lei brasileira, tiverem natureza de sentença”. Nesse contexto, as decisões eclesiásticas confirmadas pelo órgão superior de controle da Santa Sé são consideradas sentenças estrangeiras para efeitos de homologação. Isso porque o § 1º do art. 12 do Decreto federal n. 7.107/2010 (que homologou o acordo firmado entre o Brasil e a Santa Sé, relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, aprovado pelo Decreto Legislativo n. 698/2009) determina que a “homologação das sentenças eclesiásticas em matéria matrimonial, confirmadas pelo órgão de controle superior da Santa Sé, será efetuada nos termos da legislação brasileira sobre homologação de sentenças estrangeiras”. Aliás, não há como sustentar a inconstitucionalidade deste dispositivo legal, tendo em vista que ele apenas institui, em matéria matrimonial, que a homologação de sentenças eclesiásticas, confirmadas pelo órgão de controle superior da Santa Sé – que detém personalidade jurídica de direito internacional público -, será realizada de acordo com a legislação brasileira. Além disso, o caráter laico do Estado brasileiro não impede a homologação de sentenças eclesiásticas, tanto que o Brasil, nos termos do art. 3º de referido Decreto federal n. 7.107/2010, reconhece a personalidade jurídica das instituições eclesiásticas. Além do mais, vale salientar, quanto ao procedimento, que o Código de Direito Canônico assegura plenamente o direito de defesa e os princípios da igualdade e do contraditório, sendo que, nas causas que tratem da nulidade ou dissolução do casamento, sempre atuará o defensor do vínculo, que, por ofício está obrigado a apresentar e expor tudo o que razoavelmente se puder aduzir contra a nulidade ou dissolução (Cân. 1432) e, mais, a sentença favorável à nulidade do matrimônio será submetida a reexame necessário pelo tribunal de segundo grau (Cân. 1682). SEC 11.962-EX, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 4/11/2015, DJe 25/11/2015.

Fonte: STJ – Informativo nº 574 | 26/11 a 18/12 de 2015.

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STJ: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA COM RESERVA DE DOMÍNIO E PROTEÇÃO POSSESSÓRIA REQUERIDA POR VENDEDOR.

Ainda que sem prévia ou concomitante rescisão do contrato de compra e venda com reserva de domínio, o vendedor pode, ante o inadimplemento do comprador, pleitear a proteção possessória sobre o bem móvel objeto da avença. A cláusula de reserva de domínio ou pactum reservati dominii é uma disposição inserida nos contratos de compra e venda que permite ao vendedor conservar para si a propriedade e a posse indireta da coisa alienada até o pagamento integral do preço pelo comprador, o qual terá apenas a posse direta do bem, enquanto não solvida a obrigação. Neste contexto, segundo doutrina, “o domínio não se transmite com o contrato e entrega da coisa, mas automaticamente com o pleno pagamento”. Desde que formulado o pacto com reserva de domínio, o comprador tem conhecimento que recebe a mera posse direta do bem e o vendedor, por pressuposto, sabe que a sua propriedade é resolúvel, uma vez que o primeiro poderá adquirir a propriedade do bem com o pagamento integral do preço, sendo franqueado à parte vendedora/credora optar pelo procedimento que melhor lhe convier a fim de ressarcir-se dos prejuízos havidos com o ajuste inadimplido. Saliente-se que nem a lei nem a doutrina impõem, textual ou implicitamente, a necessidade de ajuizamento preliminar de demanda rescisória do contrato de compra e venda com reserva de domínio, para a obtenção da retomada do bem. Isso porque não se trata, aqui, da análise do ius possessionis (direito de posse decorrente do simples fato da posse), mas sim doius possidendi, ou seja, do direito à posse decorrente do inadimplemento contratual, onde a discussão acerca da titularidade da coisa é inviabilizada, haja vista se tratar de contrato de compra e venda com reserva de domínio onde a transferência da propriedade só se perfectibiliza com o pagamento integral do preço, o que não ocorreu em razão da inadimplência do devedor. A fim de melhor elucidar a questão, o ius possessionis é o direito de posse, ou seja, é o poder sobre a coisa e a possibilidade de sua defesa por intermédio dos interditos (interdito proibitório, de manutenção da posse ou de reintegração de posse). Trata-se de conceito que se relaciona diretamente com a posse direta e indireta. Já o ius possidendi é o direito à posse, decorrente do direito de propriedade, ou seja, é o próprio domínio. Em outras palavras, é o direito conferido ao titular de possuir o que é seu, independentemente de prévio ajuizamento de demanda objetivando rescindir o contrato de compra e venda, uma vez que, nos ajustes cravados com cláusula de reserva de domínio, a propriedade do bem, até o pagamento integral do preço, pertence ao vendedor, ou seja, não se consolida a transferência da propriedade ao comprador. Destaque-se que não se trata das hipóteses em que o STJ assevera que o deferimento da proteção possessória está condicionado à prévia conclusão do contrato (AgRg no REsp 1.337.902-BA, Quarta Turma, DJe 14/3/2013; e AgRg no REsp 1.292.370-MS, Terceira Turma, DJe 20/11/2012). Isso porque, nas ações em que se discute o ius possessionis, ainda que fundada em contrato de compra e venda inadimplido, no qual não consta cláusula de reserva de domínio, a propriedade já se transfere de plano, razão pela qual, por não comportar a tutela possessória dilação processual necessária à discussão da ocorrência, ou não, do inadimplemento contratual, essa não pode ser requerida sem que seja oportunizado ao comprador/devedor questionar o descumprimento da obrigação, em face da abusividade das cláusulas contratuais ou purgar a mora quando se verificar a ocorrência de pagamento substancial do preço. Desta feita, a discussão do contrato e, por conseguinte, a sua rescisão deve se dar em momento anterior ao ajuizamento da ação possessória ou, ao menos de forma concomitante, em cumulação de ações, sendo o pleito possessório pedido subsidiário em relação à pretensão rescisória do contrato, pelo inadimplemento obrigacional, uma vez que somente após a resolução contratual é que poderá haver posse injusta a aclamar a retomada do bem. REsp 1.056.837-RN, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 3/11/2015, DJe 10/11/2015.

Fonte: STJ – Informativo nº 573 | 12 a 25 de Novembro de 2015.

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