Entrevista: CELSO CAMPILONGO – “A GRATUIDADE ROMPE COM O EQUILÍBRIO DO CONTRATO ENTRE O ESTADO E OS CARTÓRIOS”

“A gratuidade rompe com o equilíbrio do contrato entre o Estado e os Cartórios”

Celso Campilongo, doutor e professor de Teoria Geral do Direito da USP e da PUC-SP, fala sobre as consequências do excesso de gratuidade na atividade de registradores e notários.

A Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (ARPEN/SP) conversou com Celso Campilongo, professor titular do departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da USP e PUC, que foi um dos palestrantes do “Seminário Nacional: Gratuidade no Extrajudicial e a Consequência de sua Política”, realizado no último dia 19 de agosto e organizado pela Academia Paulista de Direito (APD).

Campilongo destacou que a ideia de promover uma inclusão dos mais necessitados precisa ser aprimorada e não excluída, pois o atual modelo deixa lacunas para que surjam aproveitadores, o que provoca uma sobrecarga na atividade extrajudicial. Abaixo a entrevista na íntegra.

Arpen-SP: Qual a importância de se debater a política de gratuidade que incide sobre as atividades registrais e notariais no Brasil?

Celso Campilongo: A importância de se discutir a gratuidade é enorme. No Seminário realizado pela Academia Paulista de Direito (APD), pudemos identificar três problemas: de caráter político, jurídico e econômico.

Arpen-SP: Quais seriam os problemas políticos envolvidos?

Celso Campilongo: Do ponto de vista político, a atividade notarial e registral é uma atividade que tem uma origem muito anterior ao próprio advento do Estado. Uma atividade, como muito bem colocou o desembargador Ricardo Dip, comunitária e social. Ao longo do tempo, o Estado, numa inversão de papeis acaba delegando à comunidade aquilo que já era função da comunidade, com base em um contrato que possui expectativa do notário e registrador. A gratuidade do ponto de vista político, rompe com o equilíbrio do contrato entre o Estado e os cartórios.

Arpen-SP: E como esta questão é vista do ponto de vista jurídico?

Celso Campilongo: Do ponto de vista jurídico isso é duvidoso. Essa foi a exposição do doutor Eduardo Arruda Alvim. É duvidoso que uma isenção, uma gratuidade (de taxas e emolumentos) seja legal. Ainda que eventualmente o fosse, deveria se enfrentar do ponto de vista jurídico a questão do reequilíbrio econômico contratual.

Arpen-SP: Quais as repercussões da gratuidade em termos econômico?

Celso Campilongo: Esta atividade é desempenhada em caráter privado e exige uma constante atualização, informatização, recursos eletrônicos que devem ser renovados. A gratuidade é incompatível com o que se exige e se espera do trabalho, mais do que isso, compromete a independência econômica dos cartórios.

Arpen-SP: Quais os impactos que o excesso de gratuidade sobre os serviços extrajudiciais pode vir a causar para a prestação destes serviços? Como isso afeta o usuário do serviço?

Celso Campilongo: A mais dramática consequência dessa desconstrução da função notarial e registral é a de tratar esta atividade importante para a ordem jurídica como se fosse um terreno abandonado, uma área de ninguém.

Arpen-SP: Como o Poder Judiciário pode colaborar com a padronização da concessão de gratuidade nos serviços delegados?

Celso Campilongo: Existe um mal costume de pessoas que abusam, que tem um comportamento oportunista. A pessoa não tem a necessidade da gratuidade, mas já que um ou outro pode se beneficiar desta regalia, acaba utilizando. A gratuidade tem um caráter expansivo que não pode ser tolerado. A gratuidade deveria ser a exceção, num sistema jurídico, no qual a atividade registral e notarial é desempenhada em caráter privado. Não pode se transformar em regra, porque vicia, mata a ideia constitucional de que esses serviços são exercidos em caráter privado, o que significa que não tem caráter gratuito.

Arpen-SP: Como avalia a importância da atividade notarial e registral para a sociedade?

Doutor Celso Campilongo: Tive a oportunidade de escrever um pequeno livro a respeito desse tema, sobre a função notarial. Acho que vivemos em um contexto onde o Direito produzido pelo Estado tem limites, a jurisdição estatal tem limites, e estes limites tanto no campo jurisdicional como legislativo de atuação estatal, podem ser supridos por algumas estâncias intermediárias com caráter de neutralidade, dentre essas estâncias estão as atividades registrais e notariais. Nesse contexto de diminuição da importância de quem produz a lei geral e abstrata e de quem produz a norma individual e concreta, fica evidente que se emerge a função de notários e registradores. Nesse particular, os notários e registradores, que tem atuação como um polo de produção normativa importante e, de alguma forma uma função de suplência em relação as carências do Legislativo e Judiciário, são polos de produção do Direito e precisam ser valorizados.

Fonte: Arpen – SP | 12/09/2016

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TJ/AC: Negada anulação de reconhecimento de paternidade a homem que alegou ter sofrido “pressão psicológica”

Decisão considera prevalência da irrevogabilidade e da irretratabilidade dos atos praticados de forma livre e consciente.

A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Acre (TJAC) confirmou, nos autos da Apelação nº 0700395-66.2013.8.01.0009, o entendimento de que atos voluntários de reconhecimento de paternidade somente podem ser anulados mediante a constatação de vício de consentimento por erro ou coação – nunca por mero arrependimento.

A decisão, publicada na edição nº 5.719 do Diário da Justiça Eletrônico (DJE, fl. 75), considera a prevalência da irrevogabilidade e da irretratabilidade dos atos praticados de forma livre e consciente, bem como o “pleno conhecimento do recorrente quanto à inexistência de liame biológico com a menor apelada” no momento do registro voluntário de paternidade.

Entenda o caso

O apelante teve negado pelo Juízo da Vara Cível da Comarca de Senador Guiomard pedido de anulação de assentamento voluntário de paternidade de uma garota de sete anos de idade, mediante o entendimento de que a ausência de vínculo biológico (entre ambos) não é suficiente para o cancelamento do registro de nascimento da menor.

A sentença assinala que o autor “tinha pleno conhecimento de que a investigada não era sua filha” quando a registrou, não havendo, por outro lado, demonstrado que o reconhecimento voluntário de paternidade ocorrera “em virtude de eventual coação sofrida”, impondo-se, dessa maneira o indeferimento do pedido anulatório.

Inconformado, J. L. interpôs recurso de apelação junto à 1ª Câmara Cível do TJAC buscando a reforma da decisão, sustentando, em síntese, que o registro voluntário ocorreu de forma inadvertida e “sob pressão psicológica”, restando entre as partes litigantes verdadeira “ausência de relação de socioafetividade”.

Anulação negada

A relatora do recurso, desembargadora Eva Evangelista, no entanto, rejeitou a argumentação do apelante, assinalando que a jurisprudência somente admite anular reconhecimento voluntário de paternidade “quando comprovado a existência de vício de consentimento”, o que não ocorreu no caso.

“Considerando a falta de provas de vícios de consentimento (…), desnecessário qualquer análise quanto à configuração, ou não, de paternidade socioafetiva”, anotou a magistrada de 2º Grau em sua decisão.

Assim, no entendimento da relatora, prepondera no caso a irrevogabilidade do reconhecimento voluntário de paternidade pelo apelante no registro de nascimento da menor “porquanto constituído mediante ato unilateral de vontade, praticado de forma livre e consciente, sem qualquer vício em sua origem”.

Os demais desembargadores que compõem a 1ª Câmara Cível do TJAC acompanharam, à unanimidade, o voto da relatora, mantendo, assim, a sentença exarada pelo Juízo da Vara Cível da Comarca de Senador Guiomard “por seus próprios fundamentos”.

Fonte: TJ / AC | 09/09/2016

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