CSM/SP: Registro de Imóveis – Recusa de ingresso de formal de partilha que repete descrição que já consta em transcrição anterior – Dúvida procedente – Descrição que impede a própria localização do imóvel – Precedentes que permitem o ingresso de título que repete descrição lacunosa e cujo objeto é a integralidade do bem – Inaplicabilidade – Localização mínima do imóvel que se faz necessária – Impossibilidade de ingresso do título – Necessidade de prévia retificação – Apelação a que se nega provimento.

Apelação nº 1006360-55.2015.8.26.0309

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1006360-55.2015.8.26.0309
Comarca: JUNDIAÍ

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1006360-55.2015.8.26.0309

Registro: 2017.0000157969

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1006360-55.2015.8.26.0309, da Comarca de Jundiaí, em que são partes são apelantes VADETE SCAPINELLI FORTI, RAFAEL ISAAC FORTI, ERIKA APARECIDA FORTI RUIVO, MARLI SCAPINELLI LOURENÇÃO e DIVA SCAPINELLI DA SILVA, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE JUNDIAÍ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente sem voto), ADEMIR BENEDITO (VICE PRESIDENTE), PAULO DIMAS MASCARETTI(PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA), XAVIER DE AQUINO (DECANO), LUIZ ANTONIO DE GODOY(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E SALLES ABREU (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 10 de março de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1006360-55.2015.8.26.0309

Apelantes: Vadete Scapinelli Forti, RAFAEL ISAAC FORTI, Erika Aparecida Forti Ruivo, Marli Scapinelli Lourenção e Diva Scapinelli da Silva

VOTO Nº 29.729

Registro de Imóveis – Recusa de ingresso de formal de partilha que repete descrição que já consta em transcrição anterior – Dúvida procedente – Descrição que impede a própria localização do imóvel – Precedentes que permitem o ingresso de título que repete descrição lacunosa e cujo objeto é a integralidade do bem – Inaplicabilidade – Localização mínima do imóvel que se faz necessária – Impossibilidade de ingresso do título – Necessidade de prévia retificação – Apelação a que se nega provimento.

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença de fls. 433/435, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 1º Oficial do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Jundiaí e manteve a recusa do registro de formal de partilha extraído do inventário dos bens deixados por Alcides Isaco Forti, que tramitou na 3ª Vara Cível de Jundiaí.

Sustenta o apelante que a qualificação feita pelo Oficial deve ser sempre tendente a promover o registro dos títulos; que o título está formalmente em ordem; e que não há violação ao princípio da especialidade objetiva, uma vez que a descrição que consta no formal de partilha, embora vaga, repete a que consta na transcrição (fls. 243/262).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 445/447).

É o relatório.

De acordo com a transcrição nº 65.732 do 1º Registro de Imóveis de Jundiaí, Vadete Scapinelli, Laerte Antônio Scapinelli, Marli Scapinelli e Diva Scapinelli, no ano de 1966, receberam em doação com reserva de usufruto um imóvel de Benjamin Scapinelli e de Maria Luiza Costa Scapinelli (fls. 211/214).

Vadete Scapinelli casou-se com Alcides Isaco Forti, passando a se chamar Vadete Scapinelli Forti (fls. 313). Com o falecimento de Alcides em 16 de julho de 1991 (fls. 312), seus bens foram inventariados em processo que tramitou perante a 3ª Vara Cível de Jundiaí (fls. 309/343). Entre os bens inventariados, estava a fração ideal do imóvel objeto da transcrição nº 65.732 do 1º Registro de Imóveis de Jundiaí, que, na partilha, coube a Vadete Scapinelli Forti e aos filhos do casal (fls. 338/339 e 341).

Apresentado a registro, o Oficial desqualificou o formal de partilha, argumentando que a descrição do imóvel é tão vaga, que não permite sua localização no município. Ressaltou que embora haja precedentes desta Corregedoria Geral no sentido de permitir o ingresso de títulos com descrição deficiente, desde que em consonância com o registro a que se filia, a seu ver, essa exceção não pode abarcar descrições “flutuantes” de imóveis.

No registro, assim como no título que o repete, o imóvel transcrito sob o nº 65.732 no 1º Registro de Imóveis de Jundiaí é descrito da seguinte forma:

Um terreno contendo uma casa, um galinheiro, duas garagens, 4.000 pés de uvas, com a área de dois alqueires de terras, mais ou menos, situado no bairro de Corupira ou Engordador, neste município, dividindo com Orlando Scapinelli, Antônio Passilongo, Yutaka Korogui, e com propriedade remanescente dos doadores” (fls. 211).

A vagueza da descrição do imóvel objeto do formal de partilha é tal, que nem o posicionamento que assegura o ingresso de título que repita descrição precária já constante no fólio real justifica o acolhimento da pretensão do apelante.

Pela leitura da descrição do bem, nota-se que além de sua área ser aproximada (“dois alqueires de terras, mais ou menos”) e de suas confrontações fazerem referência a vizinhos (“dividindo com Orlando Scapinelli, Antônio Passilongo, Yutaka Korogui, e com propriedaderemanescente dos doadores”) fato que, isolados, não impediriam o registro do título chama atenção a circunstância de que não há qualquer identificação da medidas perimetrais do bem que encerram os aproximados dois alqueires, nem da distância de qualquer ponto identificável até algum ponto do imóvel.

Essa falta de identificação das medidas dos lados do terreno, aliada à referência ao nome dos vizinhos cuja titulação não se conhece (proprietários, possuidores, detentores…) e que provavelmente não estão mais no local impede a localização do bem. E não há como se negar que é função precípua do Registro Imobiliário possibilitar a identificação de um imóvel por meio da leitura de sua descrição, ainda que essa seja antiga, imprecisa e lacunosa.

Não se trata, portanto, de um retorno à posição mais formal que já vigorou na Corregedoria Geral e neste Conselho Superior da Magistratura, que, ao exigir estrita observância ao princípio da especialidade objetiva, condicionava o ingresso do título que repete a descrição do registro à prévia retificação da descrição do bem. Nessa época, não se admitia que imprecisões das transcrições de origem contaminassem a nova matrícula a ser descerrada.

Aqui, tenta-se evitar apenas que descrições que não permitem sequer a localização do imóvel sejam repetidas e utilizadas para o descerramento de novas matrículas.

Outro não é o entendimento do Desembargador Francisco Eduardo Loureiro, que, em comentário ao artigo 236 da Lei nº 6.015/73, antes da mudança de entendimento deste Conselho, consignou:

De um lado, o maior rigor na abertura das matrículas aperfeiçoa o sistema, mas, de outro, cria embaraço às partes que adquirem imóveis fiadas aos dados já constantes do registro, ainda que imperfeitos. A necessidade de prévia retificação pode conduzir, assim, a um indesejado atraso nos registros dos títulos e consequente insegurança aos direitos dos adquirentes. Parece que o posicionamento ideal é o anterior, de rejeitar apenas as descrições com imprecisões de tal modo grave que impeçam a própria localização do imóvel, ou causem riscos concretos de sobreposição” (Lei de registros públicos: comentada; coordenação José Manuel de Arruda Alvin Neto, Alexandre Laizo Clápis, Everaldo Augusto Cambles.  – Rio de Janeiro, 2014 – grifei).

E como já adiantado pelo Oficial em sua suscitação (fls. 294/299), os julgados deste Conselho que modificaram posicionamento anterior e passaram a dispensar a prévia retificação na hipótese de descrição precária do imóvel, desde que o título repetisse essa descrição e a transação abrangesse a totalidade do bem, pressupõem que ele esteja minimamente identificado:

Inobstante a precariedade da transcrição e os precedentes do Conselho Superior da Magistratura mencionados pelo Oficial, o posicionamento queatualmente prevalece, manifestado em julgados recentes, é no sentido de que não ofende ao princípio da especialidade a abertura de matrícula que abranja a totalidade do imóvel e que esteja de acordo com a descrição contida no registro anterior, desde que suficiente à sua identificação” (Apelação nº 3025524-04.2013.8.26.0224, Rel. Des. Elliot Akel, j. em 7/10/2014 – grifei).

Como lembra Alyne Yumi Konno (Registro de Imóveis – Teoria e Prática, Memória Jurídica, p. 20/21), tem-se admitido a mitigação da especialidade a fim de não obstar o tráfego de transações envolvendo imóveis, permitindo-se a manutenção de descrições imprecisas, constantes de antigas transcrições, quando da abertura da matrícula, desde que haja elementos mínimos para se determinar a situação do imóvel, e que ele seja transmitido ou onerado por inteiro, ou seja, desde que a nova matriz a ser aberta o abranja por inteiro” (Apelação nº 0015003-54.2011.8.26.0278, Rel. Des. Elliot Akel, j. em 2/9/2014 – grifei).

Correta, portanto, a decisão que jugou a dúvida procedente, sendo indispensável a prévia retificação da descrição do imóvel a que o formal de partilha se refere.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 24.07.2017 – SP)

Fonte: INR Publicações.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Dúvida inversa – Bem gravado com cláusula de impenhorabilidade não pode ser dado em alienação fiduciária, modalidade de garantia que se aperfeiçoa com leilão público da coisa alienada – A cláusula de impenhorabilidade abarca, além da penhora, atos voltados a futura venda forçada do bem, como arresto, hipoteca e alienação fiduciária – Precedente deste E. CSM – Registro negado – Recurso desprovido.

Apelação nº 1067944-37.2016.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1067944-37.2016.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1067944-37.2016.8.26.0100

Registro: 2017.0000300524

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1067944-37.2016.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes é apelante BANCO TRICURY S/A, é apelado 4º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u. Declarará voto convergente o Desembargador Ricardo Dip.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente sem voto), ADEMIR BENEDITO (VICE PRESIDENTE), PAULO DIMAS MASCARETTI(PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA), XAVIER DE AQUINO (DECANO), LUIZ ANTONIO DE GODOY(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E SALLES ABREU (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 25 de abril de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1067944-37.2016.8.26.0100

Apelante: Banco Tricury S/A

Apelado: 4º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO Nº 29.731

Registro de Imóveis – Dúvida inversa – Bem gravado com cláusula de impenhorabilidade não pode ser dado em alienação fiduciária, modalidade de garantia que se aperfeiçoa com leilão público da coisa alienada – A cláusula de impenhorabilidade abarca, além da penhora, atos voltados a futura venda forçada do bem, como arresto, hipoteca e alienação fiduciária – Precedente deste E. CSM – Registro negado – Recurso desprovido.

Cuida-se de recurso de apelação tirado de r. sentença que julgou procedente dúvida inversa, para o fim de manter a recusa a registro de alienação fiduciária de imóvel gravado com cláusula de impenhorabilidade.

O apelante afirma, em síntese, que a cláusula de impenhorabilidade não obsta a livre disposição do bem por seu proprietário. Pugna por interpretação restritiva do termo, como forma de se valorizar o direito à propriedade.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

A empresa São Marco Administração de Bens e Participações Ltda emitiu, em favor do apelante, cédula de crédito bancário. Simultaneamente, Rodolfo Marco Bonfiglioli e Maria Helena Scuracchio Bonfiglioli firmaram, com o apelante, contrato de alienação fiduciária de imóvel, vinculado à cédula de crédito bancário. O imóvel alienado fiduciariamente, todavia, está gravado com cláusula de impenhorabilidade.

À luz do art. 22 da Lei 9514/97, “alienação fiduciária é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.” Nos termos do artigo 26 da mesma Lei, caso a obrigação garantida pela alienação fiduciária não seja saldada a tempo e modo, a propriedade do imóvel consolida-se em nome do fiduciário, que, todavia, não poderá mantê-la para si. Estará o credor obrigado a promover leilão público do imóvel. A dívida e os custos inerentes à contratação da garantia serão saldados com o produto da alienação forçada, entregando-se ao devedor o montante que eventualmente sobejar (art. 27).

Não é da voluntária alienação do imóvel, pelo devedor fiduciante, ao credor fiduciário, que se está a cuidar. Trata-se, cumpre repisar, de modalidade de garantia que se efetiva por meio de alienação forçada. A transferência da propriedade resolúvel do imóvel ao credor não esgota o instituto. É, apenas, forma de viabilizar posterior leilão público, a cargo do próprio fiduciário, caso inadimplida a obrigação. A garantia aperfeiçoa-se quando da venda forçada do bem a terceiro.

De outro bordo, em que pese a denominação que lhe foi atribuída, a cláusula de impenhorabilidade não se limita a obstar a penhora do bem. A correta intelecção de “impenhorabilidade” é a que abarca qualquer modalidade de garantia que possa implicar futura alienação forçada, aí, evidentemente, inserida a penhora, mas não a ela restrita. Espraia-se, e.g., ao arresto, à hipoteca e à alienação fiduciária.

Na esteira dos magistérios de Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza:

“Menos rigorosa é a imposição exclusivamente da impenhorabilidade, que impede que o bem seja objeto de atos de constrição judicial (arresto, penhora), inviabilizando sua alienação forçada, mas permitindo a livre alienação voluntária pelo proprietário, assim como sua comunicação em decorrência de matrimônio (dependendo, por certo, do regime de bens adotado).” (As Restrições Voluntárias na Transmissão de Bens Imóveis Cláusulas de Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade, São Paulo: Quinta Editorial, 2012, p. 19, g.n.)

Pertinentes as lições de Ademar Fioranelli, que expressamente alude à vedação da alienação fiduciária de imóvel gravado com cláusula de impenhorabilidade:

Por seu lado, a cláusula de impenhorabilidade visa subtrair o imóvel da garantia de credores, que não podem apreender o bem para satisfação de obrigações. Ainda que o proprietário detenha o poder de disposição, pela imposição isolada da mesma cláusula, não poderá oferecer o bem assim gravado em garantia ‘hipotecária’ ou de ‘alienação fiduciária’, direitos reais de garantia típicos que têm como escopo assegurar a satisfação dos créditos concedidos. As consequências imediatas, quando promovida a execução para cumprimento da obrigação contraída, são a penhora e a expropriação da coisa; e para a alienação fiduciária, a perda do domínio em favor do credor fiduciário, após purgada a mora.” (Das Cláusulas de Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 25, g.n.)

A impossibilidade de alienar em garantia imóvel gravado com cláusula de impenhorabilidade também restou explicitamente mencionada em v. acórdão deste E. CSM, como se extrai de fls. 68/70, ainda que o cerne da questão a ser decidida, lá, fosse diverso (Apelação Cível 0000006-12.2011.8.26.0587, Rel. Des. José Renato Nalini, j. 24/5/12).

Desta feita, bem postada a recusa do Sr. Oficial, nego provimento ao recurso.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

Conselho Superior da Magistratura

Apelação 1067944-37.2016.8.26.0100 SEMA

Dúvida de registro

VOTO 47.197

1. Registro, à partida, adotar o relatório lançado pelo insigne Relator da espécie.

2. Permito-me, da veniam, lançar um reparo.

3. Já é tempo de deixar de admitir o que se convencionou chamar dúvida “inversa”, ou seja, aquela levantada pelo próprio interessado, diretamente ao juízo corregedor.

A prática, com efeito, não está prevista nem autorizada em lei, o que já é razão bastante para repelila, por ofensa à cláusula do devido processo (inc. LIV do art. 5º da Constituição), com a qual não pode coadunarse permissão ou tolerância (jurisprudencial, nota) para que os interessados disponham sobre a forma e o rito de processo administrativo, dispensando aquele previsto no estatuto de regência (Lei n. 6.015, de 31-12-1973, arts. 198 et seqq.).

Se o que basta não bastara, ainda há considerar que ao longo de anos a dúvida inversa tem constituído risco para a segurança dos serviços e mesmo para as justas expectativas dos interessados. É que, não rara vez, o instrumento vem sendo manejado sem respeito aos mais elementares preceitos de processo registral (o primeiro deles, a existência de prenotação válida e eficaz), de modo que termina sem bom sucesso, levando a delongas que o paciente respeito ao iter legal teriam evitado.

4. Superada a preliminar, entretanto, voto pelo não provimento do recurso, porque o bem impenhorável não pode ser dado em garantia, mesmo fiduciária, como bem determina a lei (caput do art. 1.420 do Código Civil, regra geral aplicável, também, aos negócios regidos pela Lei n. 9.514, de 20-11-1997) e explicitam Ademar FIORANELLI (Das Cláusulas de Inalienabilidade, Impenhorabilidade e Incomunicabilidade. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 25) e precedente deste mesmo Conselho (AC 0000006-12.2011.8.26.0587).

DO EXPOSTO, por meu voto preliminar, julgava extinto o processo, sem resolução de mérito, prejudicado o recurso de apelação interposto por Banco Tricury S. A.

No mérito, nego provimento ao recurso, para o fim de que, mantido o r. decisum da inferior instância, não se proceda ao rogado registro stricto sensu.

É como voto.

Des. RICARDO DIP

Presidente da Seção de Direito Público (DJe de 24.07.2017 – SP)

Fonte: INR Publicações.

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1ª VRP/SP: Cancelamento de Usufruto. Recolhimento do ITCMD. Desnecessidade. (ementa NÃO oficial). Processo 1057875-09.2017.8.26.0100

– Pedido de Providências – Registro de Imóveis – 4º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo – Roberto Baptista Pereira de Almeida Filho – Vistos.Trata-se de pedido de providências formulado pela Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Roberto Baptista Pereira de Almeida Filho, pretendendo o cancelamento do usufruto registrado sob nº 06, na matrícula nº 170.468, em razão do óbito da usufrutuária.O título restou qualificado negativamente, pois exigiu-se a apresentação da guia devidamente recolhida do ITCMD relativo ao cancelamento do usufruto, tendo em vista que, por ocasião da doação, referido imposto foi pago apenas sobre o valor de 2/3 do imóvel, restando o saldo remanescente sobre 1/3. Juntou documentos às fls.06/36.O interessado argumenta que não há previsão legal para o recolhimento exigido pela Registrador e que o Decreto Estadual nº 46.655/02 extrapolou os limite da sua competência legislativa, instituindo novo critério de tributação, o que é vedado pelos artigos 150, I CF e 97, I, CTN (fls. 39/45).O Ministério Público opinou pela improcedência do pedido (fls.52/55).É o relatório.Passo a fundamentar e a decidir.Em que pesem os respeitáveis argumentos da Registradora e da D Promotora de Justiça, bem a decisão deste Juízo no feito nº 1066337-86.2016.8.26.0100, referente à necessidade do recolhimento de 1/3 na instituição do usufruto por ato não oneroso, este entendimento foi recentemente reformado pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça no Recurso Administrativo CGJ 0010952 – 51/2017-E, rel: Corregedor Geral da Justiça: Manoel Pereira Calças, in verbis:”Registro de Imóveis – Averbação de Cancelamento de usufruto pela morte da usufrutuária – Consolidação da propriedade do bem em nome do nu proprietário – Exigência de complementação do ITCMD, calculado e recolhido sobre 2/3 do valor do bem por ocasião da doação da nua propriedade – Exigência mantida pela Juíza Corregedora Permanente – Consolidação da propriedade que não caracteriza hipótese de incidência do tributo – Precedente desta Corregedoria Geral – Decreto Regulamentar nº 46.655/2002, que, na espécie extrapola seus limites – parecer pelo provimento do recurso”Conforme constou no corpo do mencionado Acórdão:”….Em situação idêntica , o então Juiz Assessor da Corregedoria, Dr. Álvaro Luiz Valery Mirra, apresentou parecer, devidamente aprovado Pelo Corregedor Geral da Justiça, Des. Luiz Elias Tâmbara:O recurso comporta provimento, merecendo acolhida os argumentos expedindos pela recorrente, em conformidade, inclusive, com decisão normativa do Ilustríssimo Senhor Coordenador da Administração Tributária do Estado de São Paulo, recentemente proferida (Decisão Normativa CAT – 10, de 22.06.2009 – DOE 23.06.2009, p.14)De acordo com a referida decisão normativa, que aprovou entendimento expresso na Resposta à Consulta nº 152/2008, de 13.05.2009:I – Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de pessoa Jurídica, tendo em vista os requerimentos de averbação de cancelamento de usufruto decorrente de óbito do usufrutuário, indaga se as isenções do ITCMD referentes à transmissão de imóveis e valores, previstas no artigo 6º, I, alíneas “a” e “b”, e I, alínea”a” da Lei nº 10.705/2000 aplicam-se à extinção do usufruto.2 – para melhor entendimento da matéria transcrevemos o dispositivo constitucional que outorga aos Estados e ao Distrito Federal a competência para a instituição do Imposto sobre Transmissão ‘Causa Mortis’ e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD, nos seguintes termos:Art. 155 – Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:I – transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;3 – No exercício desta competência , o estado de São Paulo instituiu o importo por meio da Lei nº 10.705/2000, que em seu artigo 2º dispõe:Art. 2º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:I – por sucessão legítima ou testamentária, inclusive a sucessão provisóriaII – por doação;4 – Conforme se verifica, no que se refere à transmissão em decorrência da morte, para a lei paulista, somente ocorre o fato gerador do ITCMD quando o de cujus transmitir bens ou direitos aos seus herdeiros, sejam eles legítimos ou testamentários, ou ao legatário. Tanto é assim que a Lei 10.705/2000, ao tratar dos contribuintes do imposto na transmissão causa mortis somente se refere ao herdeiro e ao legatário (artigo 7º, inciso I), não havendo qualquer previsão de exigência do imposto em relação àquele que recebe bem ou direito em decorrência da morte de outrem sem, no entanto, ser seu sucessor hereditário, ou em razão de testamento. 5 – É importante destacar que o usufruto é sempre temporário, sendo que por força do artigo 1410, I, do Código Civil, no máximo será vitalício. Assim, sem prejuízo do disposto nos artigos 1.411 e 1.946 do Código Civil, o usufrutuário não transmite, por sucessão hereditária ou testamentária, o direito de usufruto. 6 – Neste sentido, com a morte do usufrutuário do imóvel, a propriedade plena se consolida na pessoa do nu proprietário.E na legislação paulista, não há previsão de incidência do ITCMD quando da consolidação da propriedade plena, ou quando da extinção do usufruto. 7 – Vale lembrar que o direito de propriedade , embora possa ser cindido quanto ao ser exercício, é uno. Em virtude da própria natureza temporária do usufruto, o verdadeiro proprietário do bem, em última análise, é o titular da nua propriedade, já que a extinção do usufruto é inevitável. 8 – Releva considerar também que, mesmo que se considere a consolidação da propriedade pela extinção do usufruto como uma transmissão de direitos, não se trata de transmissão hereditária ou testamentária de modo a ensejar a cobrança de ITCMD, ainda que, coincidentemente, o nu proprietário seja herdeiro legitimo ou usufrutuário.9 – Assim, em conclusão, na situação apresentada não há incidência do ITCMD” (autos nº 2009/38005).Finalmente:”…Não há dúvida de que o artigo 31 do Decreto nº 46.655/2002, que regulamenta a Lei Estadual nº 10.705/2000, expressamente prevê a necessidade de complementação do ITCMD, por ocasião da consolidação da propriedade plena na pessoa do nu proprietário. Essa hipótese de incidência, todavia, diante dos limites estabelecidos pela Constituição Federal (artigo 155, 1, da CF3) e do silêncio absoluto da Lei Estadual que o instituiu, não poderia ser criada por decreto regulamentar”.Ainda acerca da presente questão, o Egrégio Tribunal de Justiça da Capital já firmou posicionamento de não ser devido o recolhimento do imposto:”Apelação Cível. Mandado de Segurança. ITCMD. Cancelamento de usufruto, sem recolhimento do imposto. Admissibilidade. Tributo que deve incidir apenas nos casos de transmissão causa mortis e doação, nos termos do art. 155 da CF. Concessão da segurança em primeiro grau. Manutenção da r. Sentença. Precedente. Recurso não provido” (Apelação Cível nº 1018585-65.2016.8.26.0053. Rel: Des. Antonio Celso Faria – 8ª Camara de Direito Público, j: 19.10.2016).Em suma, a inconstitucionalidade do Decreto Estadual não é analisada nesta esfera administrativa, sendo certo que a exceção de limites estabelecidos viola o princípio da legalidade tributária, uma vez que não é possível exigir o pagamento de tributo sem lei que o institua.Diante do exposto, julgo procedente pedido de providências formulado pela Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Roberto Baptista Pereira de Almeida Filho, e consequentemente determino o cancelamento do usufruto registrado sob nº 06 na matrícula nº 170.468.Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.P.R.I.C.São Paulo, 17 de julho de 2017.Tania Mara Ahualli Juíza de Direito – ADV: SIBELE MARTA CORTE BACHERT (OAB 136509/SP) (DJe de 24.07.2017 – SP)

Fonte: DJE/SP.

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