Apelação Cível – Ação de Anulação de Negócio Jurídico – Sentença de Improcedência – Insurgência que não prospera – Contrato de Doação realizado pelo genitor da Autora à sua esposa – Inexistência de direitos sucessórios da Donatária – Irrelevância, tendo em vista o teor contratual do ato de disposição – Doação integral do patrimônio sem reserva para o Doador – Inocorrência – Doador que possuía outro Imóvel no momento da disposição, bem como, reservou o usufruto do bem para si – Infração ao artigo 548 do CCB não configurada – Contrato firmado por Doador em estágio terminal – Irrelevância – Doença grave que, por si só, não indica a incapacidade da pessoa – Escritura lavrada por Tabelião em diligência à casa do Doador – Presunção “juris tantum” de legalidade – Autora que não logra êxito em comprovar a ausência de discernimento do Doador no ato – Requerente que não cumpre com seu ônus processual estabelecido no artigo 373, “I”, do CPC – Sentença mantida – Ratificação, nos termos do artigo 252, do Regimento Interno – Recurso não provido


  
 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1015661-76.2019.8.26.0344, da Comarca de Marília, em que é apelante EDITH PEREIRA GERONIMO (ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA), é apelada MARIA FRANCISCA CAMARGO GERÔNIMO,.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS (Presidente sem voto), HERTHA HELENA DE OLIVEIRA E JOSÉ CARLOS FERREIRA ALVES.

São Paulo, 18 de dezembro de 2020.

PENNA MACHADO

Relator

Assinatura Eletrônica

VOTO Nº: 14.043

APELAÇÃO Nº: 1015661-76.2019.8.26.0344

APELANTE: EDITH PEREIRA GERONIMO

APELADOS: MARIA FRANCISCA CAMARGO GERÔNIMO

COMARCA: MARÍLIA

JUIZA “A QUO”: PAULA JACQUELINE BREDARIOL DE OLIVEIRA

APELAÇÃO CÍVEL. Ação de Anulação de Negócio Jurídico – Sentença de Improcedência – Insurgência que não prospera – Contrato de Doação realizado pelo genitor da Autora à sua esposa – Inexistência de direitos sucessórios da Donatária – Irrelevância, tendo em vista o teor contratual do ato de disposição – Doação integral do patrimônio sem reserva para o Doador – Inocorrência – Doador que possuía outro Imóvel no momento da disposição, bem como, reservou o usufruto do bem para si – Infração ao artigo 548 do CCB não configurada – Contrato firmado por Doador em estágio terminal – Irrelevância – Doença grave que, por si só, não indica a incapacidade da pessoa – Escritura lavrada por Tabelião em diligência à casa do Doador – Presunção “juris tantum” de legalidade – Autora que não logra êxito em comprovar a ausência de discernimento do Doador no ato – Requerente que não cumpre com seu ônus processual estabelecido no artigo 373, “I”, do CPC – Sentença mantida – Ratificação, nos termos do artigo 252, do Regimento Interno. RECURSO NÃO PROVIDO.

Trata-se de Apelação interposta em face da r. Sentença de fls. 150/153, cujo relatório se adota, que julgou improcedente a “Ação Declaratória de Anulação de Doação de Imóvel”, ajuizada por Edith Pereira Gerônimo, em face de Maria Francisca Camargo Gerônimo, condenando a Autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 18% (dezoito por cento) do valor da causa, observada a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita.

Inconformada, apela a Autora (fls. 158/166), alegando, em síntese, a existência de provas a comprovarem a incapacidade do Doador em razão da doença que o acometia, especificamente, câncer em estágio terminal.

Aponta que a doação foi realizada em desatenção aos termos do artigo 548 do Código Civil, tendo em vista que o Doador não teria reservado, para si, bens suficientes para sua subsistência; esclarece ainda que a Requerida somente teria direito em relação ás benfeitorias realizadas no Imóvel, dado que a Requerente se casou com o doador em julho de 2.014, no regime de comunhão parcial de bens, e o bem teria sido adquirido no ano de 1.999.

Por fim, requer o provimento do Recurso, com a final procedência dos pedidos realizados.

Recurso processado regularmente, com apresentação das Contrarrazões (fls. 170/177).

É o breve Relatório.

Cuida-se de “Ação Declaratória de Anulação de Doação de Imóvel”, ajuizada por Edith Pereira Gerônimo, em face de Maria Francisca Camargo Gerônimo, alegando, para tanto, que o Imóvel descrito às fl. 02, era de propriedade de Paulo Cesar Gerônimo, genitor da Autora e casado no regime da comunhão parcial de bens com a Requerida, adquirido nos idos de 1.999.

Contudo, aduz que nos idos de 2.017, o sr. Paulo foi acometido de grave doença, em estágio terminal, e teria realizado a doação do bem à Ré, sem qualquer reserva de bens para si; falecendo sequencialmente.

Assim, entendendo pela invalidade da doação, seja porque foi realizada por pessoa incapaz, seja porque realizada sem a reserva de bens em favor do doador, ou ainda, pela inexistência de direito sucessório da Requerida, pois o bem teria sido adquirido anteriormente ao matrimônio contraído pela Ré junto ao “de cujus”, ajuizou a presente Ação, buscando a declaração da nulidade do Contrato de Doação firmado.

Respeitadas profundamente as razões recursais apresentadas, o Recurso interposto não deve ser acolhido.

Inicialmente, afasta-se de plano as questões relativas a eventual direito sucessório da Donatária, tendo em vista que o que se discute nestes Autos é o Contrato de Doação realizado, sendo irrelevante, ao menos para este fim, discutir sobre a ordem sucessória e incidência do regime de bens para tanto, dado o caráter eminentemente negocial do ato de disposição.

Não obstante, também se mostra despicienda a discussão acerca da doação integral dos bens integrantes do patrimônio do Doador, sem que esse estabelecesse reserva para a sua subsistência.

E tal se dá, pois, conforme restou incontroverso nos Autos, o Doador possuía outro Imóvel no momento da doação, fato o qual, por si só, já afasta o reconhecimento de tal assertiva.

Ainda que assim não fosse, as discussões referentes à aplicabilidade do artigo 528 do Código Civil só possuem pertinência enquanto vivo o doador, pois, justamente visam inibir comportamentos abusivos ou pródigos nas liberalidades, que possam levar o benfeitor à situação de miséria, sendo certo que tal discussão se mostra irrelevante após a morte do Doador.

Ademais, conforme consta na Escritura guerreada, a Doação foi efetivada com reserva de usufruto, e assim, assegurando ao doador patrimônio suficiente para a sua subsistência, já que o Imóvel doado não lhe rendia qualquer tipo de renda.

Por fim, resta apenas apurar se o Negócio Jurídico formulado foi efetuado por absolutamente incapaz.

Com efeito, e como é cediço, eventual doença de um dos contratantes, por mais grave que possa ser, por si só, não tem o condão de gerar a presunção absoluta de incapacidade de sua parte, sendo imprescindível a comprovação efetiva que este, por conta da moléstia que lhe acomete, tenha perdido o discernimento necessário para realizar os atos ordinários da vida civil.

Tal premissa resta ainda mais evidenciada com as inovações trazidas pela Lei 13.146/2015, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que, expressamente revogou os incisos “II” e “III” do artigo 3º, do Código Civil, que considerava absolutamente incapazes aqueles que: “por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos”; e, “os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade”.

Entretanto, e do que se extrai dos Autos, a Autora não logrou êxito em comprovar nos Autos que o Doador teria sofrido debilidade de suas faculdades mentais em razão da grave doença que o acometeu.

Em verdade, o que se viu foi justamente o contrário, com o deslocamento do Tabelião até a residência do Doador, local aonde lavrou a Escritura, na presença do Cartorário, o qual, dada a sua função pública, possui a obrigação de zelar pela higidez do procedimento, com a análise da capacidade das Partes.

Isto posto, se houve a lavratura da Escritura sob estas condições, tal documento público goza da presunção “juris tantum” de legitimidade, veracidade e legalidade.

Consequentemente, caberia a Autora trazer aos Autos provas de que tal ato tenho sido praticado mesmo diante da incapacidade do Doador, o que não ocorreu, não cumprindo a Apelante com seu ônus processuais, na forma estabelecida nos termos do artigo 373, inciso “I”, do Código de Processo Civil.

Logo, inexistindo qualquer elemento a evidenciar a invalidade do Contrato de Doação realizado, ao menos diante do quanto elencado nestes Autos, nada há a alterar no r. “decisum” questionado.

Sendo assim, não infirmadas as fundamentações de fato e de Direito expostas pela D. Juíza “a quo”, infundadas as razões recursais, não há nada a reparar na r. Sentença de Primeiro Grau acertadamente proferida, ratificando-se seu teor, conforme os termos do artigo 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça.

De qualquer modo, para viabilizar eventual acesso às vias extraordinária e especial, considero prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional, observando o pacífico entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, tratando-se de prequestionamento, é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido decidida (EDROMS 18205 / SP, Ministro FELIX FISCHER, DJ 08.05.2006 p. 240).

Pelo exposto, NEGA-SE PROVIMENTO AO RECURSO, mantida na totalidade a r. Sentença de Primeiro Grau proferida, majorando-se os honorários de sucumbência arbitrados exclusivamente em favor dos d. Patronos do Réu, para a proporção de 19% (dezenove por cento) do valor da causa, nos termos do artigo 85, parágrafo 11º do Código de Processo Civil.

Penna Machado

Relatora – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1015661-76.2019.8.26.0344 – Marília – 2ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Penna Machado – DJ 20.01.2021

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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