Recurso administrativo – Pedido de Providências – Divulgação do faturamento das serventias extrajudiciais – Dever de transparência – Garantia do direito de acesso à informação e do princípio da publicidade – Prevalência do interesse público – Recurso conhecido e não provido

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS – 0004733-14.2015.2.00.0000

Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SANTA CATARINA

Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ

Advogado:

PR43824 – ILTON NORBERTO ROBL FILHO

DF33514 – FÁBIO LUIZ BRAGANÇA FERREIRA

MT8565 – ISABELA MARRAFON

DF49115 – GABRIELLA NASCIMENTO SANTOS

EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. DIVULGAÇÃO DO FATURAMENTO DAS SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS. DEVER DE TRANSPARÊNCIA. GARANTIA DO DIREITO DE ACESSO À INFORMAÇÃO E DO PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE. PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. A consolidação do regime democrático se dá por meio da participação dos cidadãos na fiscalização e controle da Administração Pública lato sensu e, portanto, não pode vicejar sem a garantia de acesso a informações de interesse coletivo produzidas ou custodiadas pelo Estado.

2. A atuação dos cartorários extrajudiciais não pode ser dissociada dos preceitos constitucionais e legais que asseguram o dever de transparência, pois, embora por delegação em caráter privado, prestam serviço público.

3. A plena divulgação dofaturamento das serventias extrajudiciais no sistema Justiça Aberta, para além de não contrariar nenhuma norma, confere prevalência às em vigor e mostra-se consentânea com o interesse público, com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e com os procedimentos adotados pelo Conselho Nacional de Justiça.

4. Recurso conhecido e não provido.

ACÓRDÃO

O Conselho, por maioria, negou provimento ao recurso administrativo, nos termos do voto do Conselheiro Marcio Schiefler Fontes. Vencidos os Conselheiros João Otávio de Noronha (Relator), Valtércio de Oliveira, Aloysio Corrêa da Veiga, Arnaldo Hossepian e André Godinho. Lavrará o acórdão o Conselheiro Marcio Schiefler Fontes. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros Henrique Ávila e Daldice Santana e, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 24 de abril de 2018. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Cármen Lúcia, João Otávio de Noronha, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema do Vale, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Arnaldo Hossepian, Valdetário Andrade Monteiro, André Godinho e Maria Tereza Uille Gomes.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA:

Trata-se de Recurso Administrativo em Recurso Administrativo nos autos do Pedido de Providências formulado pela ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SANTA CATARINA – ANOREG/SC em desfavor do CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ, no qual se requer, em síntese, seja tornada sem efeito a decisão monocraticamente proferida em 09/08/2016 pela então Corregedora Min. Nancy Andrighi, que determinou o arquivamento do recurso administrativo interposto. (ID 1955236)

Insurge-se o recorrente contra a decisão proferida, defendendo que, uma vez conhecido o recurso, (não sendo caso de recurso manifestamente intempestivo ou incabível), não poderia a relatora decidir monocraticamente.

Em 24 de outubro de 2016 reconheci o equívoco e reconsiderei a decisão de arquivamento determinando o prosseguimento do recurso (id 2023634).

No mérito recursal insurge-se o recorrente contra a divulgação irrestrita do rendimento bruto de serventias extrajudiciais, diante dos efeitos negativos sobre a segurança dos profissionais que trabalham junto aos Ofícios de Notas e de Registros.

Ressalta que a Resolução n. 215/2015 aprovada pelo Plenário do CNJ estabeleceu que “ as informações individuais e nominais da remuneração de membro ou servidor do Judiciário somente poderão ser disponibilizadas mediante prévia identificação do interessado, a fim de assegurar a segurança dos profissionais daquele Poder”.

Pretende que o Conselho Nacional de Justiça conceda adequada interpretação da Lei de Acesso às Informações nas atividades extrajudiciais, equiparando o tratamento ofertado aos membros do Poder Judiciário, “sob prejuízo de inaugurar uma disparidade injusta entre figuras imprescindíveis e complementares dentro do funcionamento do Estado”.

Ao final, defende que as razões utilizadas pela Min. Relatora para justificar o arquivamento do recurso não merecem prosperar visto que:

i) não há que se falar em judicialização da demanda, pois no Processo nº 0029768-63.2015.4.01.3400, em trâmite na 20ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal – TRF1, eis que foi requerida a anulação da decisão proferida pelo Plenário do CNJ na Consulta nº 3410-42.2013 e

ii) quanto à afirmação de que a questão sobre a divulgação do faturamento bruto das serventias extrajudiciais já teria sido exaustivamente apreciada pelo Plenário do CNJ na Consulta nº 3410-42.2013, afirma que o decidido na referida consulta, difere da questão discutida no presente procedimento.

Requer seja conhecido e provido o recurso a fim de que seja mitigada a publicidade do faturamento bruto das serventias extrajudiciais de todos os estados brasileiros.

Requer ainda que o acesso às informações sobre o faturamento bruto sejam disponibilizadas sem qualquer restrição ao Poder Judiciário, aos órgãos de controle e ao sistema Justiça Aberta ou outro sistema, por meio de senha específica e subsidiariamente aos membros da ANOREG/SC (quanto as serventias do estado de Santa Catarina);

Subsidiariamente pretende: que o acesso aos dados sobre o faturamento bruto das serventias extrajudiciais sejam disponibilizados mediante prévia identificação dos interessados.

Em memoriais, o requerente argumenta pela necessidade de parcial restrição da divulgação ampla e irrestrita do faturamento bruto mensal, reiterando os argumentos levantados no recurso administrativo.

É o relatório.

VOTO DIVERGENTE

Adoto o bem elaborado relatório apresentado pelo e. Ministro Corregedor, pedindo vênia, contudo, para divergir de Sua Excelência, ainda que circunscrito ao mérito.

Não há dúvida de que a consolidação do regime democrático se dá por meio da participação dos cidadãos na fiscalização e controle da Administração Pública lato sensu e que tal participação não pode vicejar sem acesso a informações de interesse coletivo produzidas ou custodiadas pelo Estado. Assim, cuidou a Constituição da República de prever o acesso à informação como direito fundamental (art. 5°, XXXIII) e de instituir o princípio da publicidade (art. 37, caput) como um dos regentes da Administração Pública.

De igual modo, buscando dar concretude aos preceitos constitucionais e, assim, reforçar o dever de transparência dos órgãos e entidades públicas, a Lei 12.527/2011 – Lei de Acesso à Informação (LAI) fixou procedimentos que consignam a publicidade como regra geral e o sigilo, como exceção.

Especificamente no tocante às informações referentes à remuneração, ao cargo e à função dos agentes públicos, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal no sentido de que tais dados são de interesse coletivo ou geral (SS 3902 AgR-segundo, Relator(a): Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 09/06/2011, DJe-189 Divulg 30-09-2011 Public 03-10-2011 Ement Vol-02599-01 PP-00055 RTJ Vol-00220-01 PP-00149), assim como fixou a tese de repercussão geral de que “é legítima a publicação, inclusive em sítio eletrônico mantido pela Administração Pública, dos nomes dos seus servidores e do valor dos correspondentes vencimentos e vantagens pecuniárias” (ARE 652777, Relator(a): Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/2015, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral – Mérito DJe-128 Divulg 30-06-2015 Public 01-07-2015). Faço estas observações porque o voto do e. Relator é no sentido de aplicar aos cartorários, por analogia, regras do CNJ aplicáveis a membro de Poder.

Além disso, de modo a garantir o cumprimento de seu dever constitucional, notadamente o de controle da legalidade e da moralidade pública, este Conselho passou a adotar como regra a livre e irrestrita publicidade de dados remuneratórios de magistrados e servidores.

Se é assim para magistrados, que são titulares do Poder Judiciário e atuam no exercício da mais típica atividade estatal, não há como estabelecer reserva ou garantia diferenciada a cartorários extrajudiciais, ainda que reconheça que os valores a serem divulgados sejam muito superiores aos dos magistrados. Até porque, muito embora em delegação em caráter privado, prestam serviço público (ARE 884854 ED, Relator: Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 23/06/2015, Acórdão Eletrônico DJe-151 Divulg 31-07-2015 Public 03-08-2015; ADI 2415, Relator: Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 22/09/2011, Acórdão Eletrônico DJe-028 Divulg 08-02-2012 Public 09-02-2012). Submetemse, portanto, ao dever de transparência, que é a regra, demandando de eventual exceção norma própria, que não admite analogia (RHC 27773, Relator(a): Min. Carlos Maximiliano, julgado em 09/01/1941). Não há como equiparar cartorários extrajudiciais a membros de Poder.

A divulgação dofaturamento bruto das serventias extrajudiciais no sistema Justiça Aberta, para além de não contrariar nenhuma norma, confere prevalência às em vigor, a começar pelos mandamentos constitucionais, e mostra-se consentânea com a jurisprudência da Suprema Corte e com os procedimentos adotados por este Conselho.

Daí por que entendo que prevalece o interesse público, na forma da lei, da plena divulgação dofaturamento das serventias extrajudiciais, sobretudo por se tratar de valores que são pagos pelos cidadãos, pela sociedade, e porque é essa transparência que permite o imprescindível exercício do controle.

Ante o exposto, peço vênia para divergir do r. voto proferido pelo e. Relator, para negar provimento ao recurso interposto e manter a decisão proferida.

Brasília/DF, data registrada no sistema

Conselheiro Márcio Schiefler Fontes

VOTO CONVERGENTE

Adoto o bem lançado relatório do Excelentíssimo Corregedor Nacional de Justiça.

E no mérito, registro, desde logo, que acompanho os fundamentos lançados na decisão, pedindo licença, apenas, para destacar, ainda, mais alguns pontos a reforçar o entendimento apresentado.

Da leitura do requerimento inicial formulado neste Pedido de Providências, bem como do Recurso Administrativo ora submetido à analise deste Plenário, verifica-se que a Associação Requerente reconhece a validade da decisão anteriormente proferida por este Conselho Nacional em resposta à Consulta 3410-42.2013. Expressamente, a Requerente afirma que “o que se pleiteia neste Pedido de Providência é a correta aplicação da Lei Federal nº. 12.257/2011 e da Consulta nº. 3410-42.2013”.

Em outras palavras, não pretende a Associação Requerente novamente discutir se as serventias judiciais devem ter seus dados divulgados ou não nos termos da Lei de Acesso à Informação, matéria que está judicializada, mas tão somente discutir a adequada aplicação da referida norma às atividades notarias e registrais dentro dos parâmetros constitucionais. De modo mais claro, sendo certo que os dados devem ser divulgados, a insurgência ora apresentada está relacionada apenas ao modo como as pessoas terão acesso a tais dados: de modo irrestrito ou se é possível fazer restrições no acesso aos valores brutos auferidos pelos Cartórios de Registros e Notas.

E nesse aspecto, constata-se que a divulgação ampla e irrestrita dos valores arrecadados pelas serventias judiciais não mais se coaduna com a atual jurisprudência do CNJ sobre a matéria.

No julgamento do Ato Normativo nº 3739-88.2012.2.00.0000, que regulamentou a divulgação das atividades do Poder Judiciário nos termos da Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527, de 2011), foi aprovada a redação da Resolução nº 215 de 16/12/2015.

Naquela oportunidade, entendeu o CNJ, por maioria, que as informações individuais e nominais da remuneração dos membros ou servidores do Poder Judiciário somente poderão ser disponibilizadas mediante a prévia identificação do interessado, no intuito de se assegurar a segurança das partes envolvidas.

Especificamente, oportuna a transcrição de trecho esclarecedor do voto do Conselheiro Bruno Ronchetti de Castro (Vistor), extraído da fundamentação do acórdão:

Como cediço, a segurança é uma das garantias fundamentais previstas na Constituição Federal (art. 5°, caput, CF/88) e, portanto, assiste a todas as pessoas, é indissociável de outros direitos fundamentais e vincula diretamente os poderes públicos.

Assim, cuida-se de direito fundamental que impõe ao Estado o dever de garantir não só a preservação da ordem pública, mas a incolumidade das pessoas e de seu patrimônio. Contudo, o que se observa é que o recrudescimento da criminalidade tem representado grande obstáculo ao exercício dos direitos de cidadania, ensejando, portanto, a adoção de políticas e medidas de segurança.

No que tange à segurança dos agentes públicos, a adoção dessas medidas também é premente, sobretudo porque mais expostos que os particulares da iniciativa privada, por força do princípio da publicidade que rege a Administração Pública.

Quanto ao particular, impende destacar que, na hipótese em apreço, cuida-se de norma destinada a regulamentar, dentre outros, o acesso à remuneração e proventos percebidos por todos os servidores e membros do Poder Judiciário, agentes que, no exercício de um Poder da República, são responsáveis por prolação de decisões com alto grau de relevo e que, não raras vezes, suscitam inconformismos e descontentamentos, ficando sujeitos a intimidações, ameaças e até mesmo violências, razão por que a preocupação com a segurança se mostra legítima e salutar.

Nessa senda, é oportuno destacar excerto da mencionada SS 3902/SP, na qual o Ministro Ayres Britto, em seu r. voto, reconheceu que a divulgação desses dados acaba por fragilizar a segurança dos servidores e seus familiares

(…)

Todavia, o que se constata, hodiernamente, é que a rede mundial de computadores permite, aos seus usuários, o acesso aos mais variados dados de qualquer brasileiro, dentre eles e com relativa facilidade, àqueles referentes ao CPF, à identidade e ao endereço da pessoa.

Dessa forma, em uma breve busca na rede, é possível verificar a disponibilidade dessas informações. Confira-se, a propósito, matérias sobre o tema

(…)

Nessa esteira, é forçoso reconhecer que o cruzamento dos dados atualmente disponíveis, quais sejam, remuneração, CPF, endereço, telefone e, possivelmente, outras informações, torna extremamente frágil a segurança dos agentes públicos e de seus familiares e pressupõe, assim, a adoção de medidas assecuratórias.

Portanto, é diante desse contexto que se propõe medida que garanta o efetivo controle social, sem apartar-se da segurança dos agentes públicos, já que, não obstante a necessidade de identificação do interessado para o acesso nominal, as informações relativas à remuneração estarão plenamente disponíveis em lista geral que contenha a individualização dos cargos, matrícula e dados remuneratórios.

Outrossim, cumpre asseverar que a medida ora proposta não implica mutação quanto à natureza do tipo de acesso à informação, alterando-a de transparência ativa para passiva, porquanto a mera identificação do interessado não significa existência de nenhum requerimento para acesso a tais informações, tampouco avaliação subjetiva por terceiro quanto à possibilidade do acesso.

Ademais, vale ressaltar que a mera identificação prévia do interessado não dificulta ou impede o acesso à informação, já que, uma vez fornecidos seus dados pessoais, o acesso à informação nominal e individualizada da remuneração e proventos percebidos pelo membro ou servidor do Poder Judiciário será imediato.

Não se trata, portanto, de solicitação prévia ou requerimento, tampouco de medida capaz de inibir ou constranger o interessado a ter acesso à informação, até porque haverá a possibilidade deste optar por manter seus dados pessoais em sigilo.

O que se pretende, tão somente, é a prévia identificação daqueles que desejam, em complemento aos dados relativos à remuneração, saber o nome dos agentes que percebem determinada remuneração, como forma de garantir, minimamente, a segurança destes.

(…)

Portanto, é com fundamento nas razões apresentadas que se considera que a presente proposta não busca suprimir direito que perfaz nossa democracia, mas sim promover a concordância de direitos fundamentais, de modo a assegurar os princípios republicanos e dar concretude aos mandamentos constitucionais.

(…)

Diante do exposto, e com o intuito de assegurar os princípios republicanos e conferir segurança aos agentes públicos, reputo necessário o acréscimo do § 2° no presente dispositivo de modo a contemplar a previsão de identificação prévia do interessado que pretenda ter acesso às informações individualizadas de remuneração.

Dessa forma, com os fundamentos acima transcritos, acompanho o respeitável voto do eminente Corregedor Nacional de Justiça para conhecer do presente recurso e, no mérito, dar-lhe provimento para, com fundamento na atual jurisprudência do CNJ quanto ao tema, em especial no tocante à necessária proteção e segurança dos agentes públicos, determinar que o acesso aos dados relacionados ao faturamento bruto das serventias extrajudiciais contemple a previsão de simples e prévia identificação do interessado.

É como voto.

Conselheiro André Godinho

Assinatura digital certificada

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):

1. Do julgamento monocrático

Preliminarmente, constato que a alegação do recorrente quanto à impossibilidade de julgamento monocrático da questão posta em debate, procede.

Inaugurado o julgamento pelo Plenário Virtual, com registro de voto divergente, é de afastar-se a possibilidade de julgamento monocrático pelo relator.

2. Da ausência de identidade entre o pleito ora formulado e o objeto da Consulta n. 3410-42.2013

Conforme relatado, pretende o recorrente seja levada ao Pleno deste Conselho a questão relativa à divulgação do faturamento bruto dos Cartórios de Registro e Notas seguindo os ditames da Lei 12.527/2011.

Insurge-se, afirmando que a questão posta no Procedimento de Consulta nº·0003410-42.2013.2.00.0000·não guarda similaridade com o objeto do presente expediente.

Na decisão, proferida pela Corregedora Min. Nancy Andrighi, decidiu-se pelo arquivamento do presente recurso, com base nos seguintes fundamentos: i) o fato da questão ora em debate já ter sido definida pelo Plenário do CNJ no Procedimento de Consulta nº 0003410-42.2013.2.00.0000, em que se concluiu pela aplicabilidade da Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso às Informações) em relação aos serviços prestados e à arrecadação das serventias; e ii) na judicialização da questão, visto ter sido objeto de ações perante o STF (AO 1874/DF e MS 32694/DF), e perante a 20ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal – TRF1 (Processo nº 0029768-63.2015.4.01.3400).

Assiste razão ao recorrente.

De fato, o objeto do presente expediente diverge da questão formulada na Consulta n. 3410-42.2013 e cujo acórdão é contestado em ações perante o STF (AO 1874/DF e MS 32694/DF), e·perante a 20ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal – TRF1 (Processo nº 0029768-63.2015.4.01.3400).

Por certo, enquanto na Consulta n. 3410-42.2013 foi reconhecido que as serventias extrajudiciais estão submetidas à Lei de Acesso à Informação e que, por conseguinte, devem fornecer dados sobre o número de atos praticados e o valor arrecadado nas serventias, no presente Pedido de Providências, o requerente pretende a correta aplicação da Lei Federal n. 12.527 e do decidido nos autos da Consulta n. 3410-42.2013, com vistas a impedir o acesso irrestrito ao faturamento bruto dos cartórios.

A propósito, confira-se:

CONSULTA. LEI Nº 12.527/2011 – LEI DE ACESSO A INFORMAÇÕES PÚBLICAS. INFORMAÇÕES REFERENTES A SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS.

1) Os serviços notariais e de registro são atividades próprias do Poder Público, obrigatoriamente exercidas em caráter privado, cuja prestação é delegadas a particulares, por meio de concurso público, sob a fiscalização do Poder Judiciário.

2)·Caracterizando-se como função pública, os serviços de notas e registros estão sob incidência da Lei de Acesso à Informação,· mesmo porque suas atividades são inteiramente fiscalizadas pelo Poder Judiciário, que não pode se furtar de fornecer os dados que possui sobre numero de atos praticados nas serventias e valor arrecadado.

3) Com mais razão deve o Poder Judiciário informar o valor da arrecadação que obtém com os selos fiscalizatórios, conferindo transparência a todos os seus atos.

Consulta respondida afirmativamente.

(CNJ – CONS – Consulta – 0003410-42.2013.2.00.0000 – Rel. EMMANOEL CAMPELO – 178ª Sessão – j. 05/11/2013).

Cito o seguinte trecho da exordial:

“8. A aplicação constitucionalmente adequada da Lei n. 12.527/2011, em que se atenda ao direito de acesso à informação sem descuidar da obrigação do Estado em resguardar a segurança de seus cidadãos, determina que a publicação das informações referentes ao rendimento bruto dos ofícios seja mitigada, restringida aos Órgãos de Controle da atividade de notas e registros e ao fisco, especialmente a esta Corregedoria Nacional de Justiça, ao Conselho Nacional de Justiça e aos magistrados estaduais responsáveis pela fiscalização das atividades. Outrossim, é pertinente também que os rendimentos auferidos por cada serventia ofertada em concurso sejam devidamente disponibilizados por ocasião dos concursos públicos de provas e títulos para ingresso e remoção na carreira por meio do Edital que regulamenta o concurso.” (Id 1802130)

3. Da mitigação da Lei n. 12.527/2011

Conforme relatado, a parte recorrente pretende seja mitigada a publicidade do faturamento bruto das serventias extrajudiciais de todos os estados brasileiros, de modo que o acesso aos dados de faturamento somente sejam disponibilizados mediante prévia identificação do interessado, garantindo a segurança dos envolvidos e afastando o anonimato.

Requer ainda que o acesso às informações sobre o faturamento bruto seja disponibilizado sem qualquer restrição ao Poder Judiciário, aos órgãos de controle e ao sistema Justiça Aberta ou outro sistema, por meio de senha específica e subsidiariamente aos membros da ANOREG/ SC (quanto as serventias do estado de Santa Catarina).

Com efeito, a atual jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça firmou-se no sentido de que a divulgação das atividades do Poder Judiciário não mais se submete ao acesso irrestrito e amplo da sociedade.

Na oportunidade, ponderou-se que o direito à segurança, como garantia fundamental prevista na Constituição Federal assiste a toda a sociedade, inclusive aos integrantes do Poder Judiciário, cabendo ao Poder Público manter a incolumidade dos seus agentes públicos.

Ressaltou-se que a facilidade de cruzamento de dados pessoais dos agentes públicos na internet aumentaria o risco à segurança dos servidores e de sua família e que a mera identificação do interessado não impede o acesso integral às informações e nem pressupõe avaliação subjetiva do terceiro interessado.

Em consequência, interpretou-se a Lei de Acesso à Informação a fim de que o acesso aos dados individuais e nominais dos membros e servidores do Poder Judiciário dependessem da prévia identificação do interessado, com vistas a assegurar não só a segurança dos envolvidos como evitar os efeitos nocivos do anonimato.

Por oportuno, destaco excerto do julgamento do Ato Normativo nº 3739-88.2012.2.00.0000:

“Assim, à vista do entendimento pacificado pela Suprema Corte, é inequívoco o direito de acesso às informações relativas a remuneração e proventos de agentes pagos pelos cofres públicos, porquanto se referem a valores fixados em lei e cuja publicidade é inerente à natureza da atividade pública prestada. No entanto, cumpre ponderar que, para além de dizerem respeito à Administração Pública, tais informações alcançam também a órbita de direitos da pessoa física do agente público e seus familiares, razão pela qual tem-se imprescindível a conjugação de medida capaz de identificar o destino desses dados, a fim de se resguardar o direito à segurança e a vedação ao anonimato. Como contrapartida, portanto, o acesso a tais informações deve se dar mediante simples e prévia identificação do interessado, com a possibilidade de sigilo de seus dados, cautela necessária que em nada viola os princípios constitucionais e as aludidas diretrizes do C. STF”

Do aludido julgamento, resultou a Resolução n. 215/2015, a qual, no artigo 6º, §§ 2º e 3º estabelece, in verbis:

Art. 6º Os sítios eletrônicos do Poder Judiciário deverão conter: […]

§ 2° As informações individuais e nominais da remuneração de membro ou servidor mencionadas na alínea “d” do inciso IV serão automaticamente disponibilizadas mediante prévia identificação do interessado, a fim de se garantir a segurança e a vedação ao anonimato, nos termos do art. 5°, caput e inciso IV, da Constituição Federal, salvaguardado o sigilo dos dados pessoais do solicitante, que ficarão sob a custódia e responsabilidade da unidade competente, vedado o seu compartilhamento ou divulgação, s o b a s p e n a s d a l e i .

§ 3° A identificação a que se refere o § 2° será limitada ao nome completo e ao número de um dos s e g u i n t e s d o c u m e n t o s :

I – C a r t e i r a N a c i o n a l d e H a b i l i t a ç ã o ( C N H ) ; I I – R e g i s t r o G e r a l d e I d e n t i d a d e C i v i l ( R G ) ; I II – C a d a s t r o d e P e s s o a s F í s i c a s ( C P F ) ; I V – T í t u l o d e E l e i t o r .

Em suma, este Conselho Nacional de Justiça orienta-se, atualmente, no sentido de que o acesso aos dados dos servidores e membros do Poder Judiciário depende de prévia identificação do interessado, ponderando-se o acesso a informação e a segurança dos servidores.

4. Acesso aos dados de produtividade das serventias extrajudiciais e Aplicação da Resolução n. 215/2015 do CNJ às serventias extrajudiciais.

A parte requerente pretende, seja aplicada às serventias extrajudiciais o disposto na Resolução n. 215/2015, que regulamentou o acesso aos dados nominais dos membros e dos servidores do Poder Judiciário.

O cerne da controvérsia reside na possibilidade ou não da aplicação por analogia da Resolução n. 215/2015, em especial o seu artigo 6º, §§ 2º e 3º aos dados de faturamento das serventias extrajudiciais.

O art. 236 da Constituição Federal dispõe que os serviços notariais e de registros são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Judiciário.

Estabelece, no seu § 1º que “ Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização dos seus atos pelo Poder Judiciário.”

Daí decorre que, ainda que os cartorários não figurem como titular ou ocupem cargo público efetivo, cabe ao Poder Judiciário o papel de fiscalizar as atividades que exercem.

Os notários, tabeliães e registradores, embora não percebam remuneração ou recursos advindos do ente público, exercem atividade de interesse da coletividade, do qual decorre a necessidade de divulgação das informações pertinentes a sua atividade.

Conforme já decidido nos autos da consulta n. – 0003410-42.2013.2.00.0000, as serventias extrajudiciais submetem-se às disposições da Lei de Acesso à Informação, cabendo, por conseguinte, ao Poder Judiciário fiscalizar a correta divulgação dos dados de produtividade dos cartórios.

Definiu-se que as serventias extrajudiciais devem informar os dados relativos ao faturamento bruto das serventias.

Porém, não fixou limites ou restrições para este acesso, o que, por ora, permite que as informações das serventias extrajudiciais sejam publicadas de modo amplo e irrestrito aos interessados.

A Resolução n. 215/2015, editada pelo Conselho Nacional de Justiça já definiu, para os membros e servidores do Poder Judiciário, que o acesso aos dados nominais e da remuneração desses agentes públicos depende de prévia identificação do interessado.

Ponderou-se, na ocasião, os riscos à segurança dos agentes do Poder Judiciário e os efeitos nocivos do anonimato,

Por esta mesma razão, concluo que o acesso aos dados de faturamento das serventias extrajudiciais deve restringir-se àqueles interessados que previamente se identifiquem, à semelhança do art. 6º, §§ 2º e 3º.

E não poderia ser diferente.

Aos dias de hoje, em consulta ao Sistema Justiça Aberta, é possível constatar que várias serventias possuem faturamento semestral de grande monta, inclusive de milhões de reais.

Ao contrário dos membros e servidores do Poder Judiciário, os titulares das serventias não possuem remuneração limitada pelo teto constitucional.

Ademais, é certo que os notários, tabeliães e registradores devem arcar com despesas trabalhistas e de funcionamento da serventia.

Contudo, esta informação nem sempre é de conhecimento daqueles que acessam os dados sobre o faturamento bruto das serventias, o que pode causar errônea conclusão sobre a real remuneração do oficial de cartório.

Ainda, constata-se que muitas serventias extrajudiciais não possuem o aparato de segurança que as sedes do Poder Judiciário, ainda que em comarcas pequenas, detêm.

Desse modo, permitir o livre e amplo acesso aos dados de faturamento bruto das serventias extrajudiciais, poderia ocasionar grave risco à segurança não só dos agentes públicos, como de seus familiares e dos usuários dos serviços cartorários.

Convém ressaltar que embora a Resolução n. 215/2015 se dirija aos membros e servidores do Poder Judiciário, tenho pela aplicação das suas disposições, mormente dos art. 6º, §§ 2º e 3º, aos dados de faturamento das serventias extrajudiciais.

Isso porque, o teor da Resolução n. 215/2015 (e do seu art. 6º, §§ 2º e 3º) evidencia uma mudança de paradigma na jurisprudência deste Conselho, após a vigência da Lei de Acesso à Informação.

Assentou-se que o princípio da informação deve coadunar com a garantia constitucional da segurança dos agentes públicos, que assim também o são os oficiais de cartório, ainda que não exerçam, cargo público efetivo.

Ante o exposto, o acesso a tais informações deve se dar mediante simples e prévia identificação do interessado, com a possibilidade de sigilo de seus dados, cautela necessária que em nada viola os princípios constitucionais e as aludidas diretrizes do colendo Supremo Tribunal Federal, razões pelas quais dou provimento ao recurso administrativo.

Os Tribunais devem adequar o sistema de consulta no sentido do que dispõe o art. 6º, §§2º e º3, da Resolução CNJ n. 215/2015.

Submeto o presente ao Plenário.

É o voto.

Brasília, 2018-05-01.

Dados do processo:

CNJ – Pedido de Providências nº 0004733-14.2015.2.00.0000 – Santa Catarina – Rel. Cons. João Otávio de Noronha – DJ 03.05.2018

Fonte: INR Publicações.

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CSM/SP: Registro de imóveis – Escritura de Compra e Venda, em que a vendedora é representada por procuração – Outorgante falecida antes da lavratura – Prevalência, excepcionalmente, da validade do mandato, dadas as suas peculiaridades – Contrato acessório de compra e venda imobiliária, já quitado – Validade da escritura – Registro cabível – Recurso provido.

Apelação nº 1004286-05.2017.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1004286-05.2017.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1004286-05.2017.8.26.0100

Registro: 2018.0000187374

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1004286-05.2017.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes são apelantes OSVALDO DOS SANTOS CORDEIRO e MARIA SANTOS SOARES CORDEIRO, é apelado 4º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso, para julgar improcedente a dúvida suscitada, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 16 de março de 2018.

PINHEIRO FRANCO

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação nº 1004286-05.2017.8.26.0100

Apelantes: Osvaldo dos Santos Cordeiro e Maria Santos Soares Cordeiro

Apelado: 4º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

VOTO Nº 37.316

Registro de imóveis – Escritura de Compra e Venda, em que a vendedora é representada por procuração – Outorgante falecida antes da lavratura – Prevalência, excepcionalmente, da validade do mandato, dadas as suas peculiaridades – Contrato acessório de compra e venda imobiliária, já quitado – Validade da escritura – Registro cabível – Recurso provido.

Cuida-se de recurso de apelação tirado de r. sentença do MM. Juiz Corregedor Permanente do 4º Oficial de Registro de Imóveis, que julgou procedente dúvida suscitada para o fim de manter a recusa a registro de escritura de compra e venda imobiliária, em que a vendedora, já falecida, é representada por procuração, tida por extinta com a morte.

Sustentam os apelantes que a peculiaridade da situação, em que o mandato é contrato acessório de compromisso de compra e venda já quitado, faz com que a morte da outorgante não o extinga. Defenderam a validade da procuração e da escritura pública, que comportaria registro.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Consoante dispõe o art. 682, inciso II, do Código Civil, a morte do mandante faz cessar o mandato. Esta a norma em que se funda o Oficial para obstar o registro da escritura de compra e venda versada nos autos, dando por revogado o mandato outorgado ao interessado em virtude da morte da outorgante.

Não obstante, na hipótese vertente, o mandato se reveste de características peculiares. Trata-se, em verdade, de contrato acessório de compra e venda imobiliária já quitada, com a específica finalidade de viabilizar o registro da transferência do bem. Ou, na dicção do art. 686, parágrafo único, do Código Civil, de mandato com poderes de cumprimento ou confirmação de negócio anteriormente entabulado ao qual está vinculado, de tal sorte que irrevogável, por explícita disposição da norma em voga.

Assim é que a morte do mandante, ainda que conhecida pelo mandatário, não faz cessar o mandato em questão, não se aplicando o disposto no art. 682, inciso II, do Código Civil. É o quanto esclarece o Ilustre Desembargador Cláudio Luiz Bueno de Godoy:

“De modo excepcional, não se extinguirá pela morte do mandante o mandato em causa própria (art. 685) e aquele estabelecido no interesse comum, portanto também do mandatário. Outra hipótese é a de o mandante já ter quitado o mandatário de todas as suas obrigações antes do falecimento.” (“Código Civil Comentado”, SP: Manole, 2016, 10ª ed., p. 681; sem grifos no original).

Irrelevante, neste passo, que o texto do art. 686, parágrafo único, do Código Civil mencione “revogação” e não, “extinção” do mandato. A intelecção da norma é obstar o fim do mandato, impedindo a concretização do contrato do qual é acessório, mormente se já quitado.

Mais uma vez, pertinentes os ensinamentos do Eminente Desembargador Claudio Luiz Bueno de Godoy, ao discorrer sobre a irrevogabilidade do mandato, na hipótese do parágrafo único do art. 686 referido:

“É, por exemplo, o mandato conferido para pagamento dedébitos, enfim para a execução de contratos, inclusivepreliminares. São, no dizer de Caio Mário, mandatos acessóriosde outro contrato, ou mesmo cláusula dele constante (Instituiçõesde Direito Civil, 10ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1999, vol. III,p. 265)” (“Código Civil Comentado”, SP: Manole, 2016, 10ª ed., p. 686).

Sobre o tema, a lição de Maria Helena Diniz:

“Prevalecerão, apesar do óbito do mandante, a procuração em causa própria (RT 502:66; CC art. 685, 2ª parte) e o mandato outorgado para dar escritura de venda de imóvel cujo preço já tenha sido recebido (AJ 100:149, 96:59, 97:71; RF 134:442). (“Curso de Direito Civil Brasileiro”, 28ª ed., vol. III, Saraiva, 2012, p. 424).

Nesse sentido, entendendo vigente o mandato e viável o registro, mesmo com a morte do mandante, a sedimentada orientação deste E. CSM:

“REGISTRO DE IMÓVEIS DÚVIDA – ESCRITURA DE COMPRA E VENDA – ALIENANTES REPRESENTADOS POR MANDATÁRIO – FALECIMENTO DE DOIS DOS VENDEDORES MANDANTES MANDATO NÃO EXTINTO – APLICAÇÃO DO ART. 686 DO CÓDIGO CIVIL – POSSIBILIDADE DE REGISTRO – RECURSO PROVIDO.” (Apelação Cível nº 3000355-45.2013.8.26.0408, Rel. Des. Elliot Akel, DJ 30/4/15).

“REGISTRO DE IMÓVEIS DÚVIDA JULGADA PROCEDENTE – RECUSA DE INGRESSO DE ESCRITURA DE VENDA E COMPRA COM CESSÃO DE DIREITOS – VENDEDORES, REPRESENTADOS POR PROCURADOR, FALECIDOS NA ÉPOCA DA LAVRATURA DO ATO – AFIRMAÇÃO DE INVALIDADE DO ATO PELA CESSAÇÃO DOS PODERES OUTORGADOS – EXAME QUE EXTRAPOLA OS LIMITES DA QUALIFICAÇÃO DO TÍTULO, RESTRITA AOS ASPECTOS FORMAIS – RECURSO PROVIDO.” (Apelação Cível n.º 3000311-26.2013.8.26.0408, Rel. Des. Elliot Akel, 30/4/15).

REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura de Compra e Venda – Provável falecimento de outorgante vendedora representada por procurador e conseqüente extinção do mandato, que não autoriza a recusa do título – Qualificação registrária limitada ao juízo cognitivo formal – Recurso provido.” (Apelação Cível 562-6/6, Rel. Des. Gilberto Passos, j. 30/11/06).

Diante do exposto, dou provimento ao recurso, para julgar improcedente a dúvida suscitada.

PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 02.05.2018 – SP)

Fonte: INR Publicações | 04/05/2018.

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CSM/SP: Registro de imóveis – Inventário extrajudicial – Falecido casado sob o regime da separação obrigatória de bens – Viúva que não tem a situação jurídica de herdeira – Necessidade de sua participação no inventário extrajudicial ante a condição de interessada em virtude de ser potencial titular do direito real de habitação – Recurso não provido.

Apelação nº 1005304-64.2015.8.26.0445

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1005304-64.2015.8.26.0445
Comarca: PINDAMONHANGABA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1005304-64.2015.8.26.0445

Registro: 2018.0000234932

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 1005304-64.2015.8.26.0445, da Comarca de Pindamonhangaba, em que é apelante ANTONIO CARLOS QUINTÃO VIEIRA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE PINDAMONHANGABA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 28 de março de 2018.

PINHEIRO FRANCO

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação nº 1005304-64.2015.8.26.0445

Apelante: Antonio Carlos Quintão Vieira

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Pindamonhangaba

VOTO Nº 37.326

Registro de imóveis – Inventário extrajudicial – Falecido casado sob o regime da separação obrigatória de bens – Viúva que não tem a situação jurídica de herdeira – Necessidade de sua participação no inventário extrajudicial ante a condição de interessada em virtude de ser potencial titular do direito real de habitação – Recurso não provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Antônio Carlos Quintão Vieira contra a r. sentença de fls. 56/59, que manteve a recusa ao registro de escritura pública de sobrepartilha do Espólio de Darcy Braga Vieira em razão da não participação da viúva na sobrepartilha.

Em síntese, o apelante sustenta que deve ser afastado o óbice ao registro da escritura pública, porquanto a viúva não é herdeira do falecido em razão de ter sido casada com o de cujus pelo regime da separação legal de bens.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 94/95).

É o relatório.

A viúva era casada com o falecido pelo regime da separação obrigatória de bens nos termos do artigo 1641, inciso II, do Código Civil, assim, não possui a situação jurídica de herdeira em conformidade ao disposto no artigo 1.829, inciso I, do Código Civil.

Noutra quadra, o artigo 610 do Código de Processo Civil dispõe:

Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial.

§ 1o Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.

§ 2o O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. (grifos meus)

Essa previsão normativa não exige apenas a presença dos herdeiros no inventário extrajudicial, mas também dos interessados, ou seja, aquelas pessoas com interesse jurídico na sucessão mortis causa.

Neste caso concreto, a viúva tem a situação jurídica de interessada em razão de ser potencial titular do direito real de habitação com fundamento no artigo 1831 do Código Civil, pelo o que consta dos autos.

A redação do referido dispositivo legal é a seguinte:

Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.

Nessa ordem de ideias, deve a viúva participar, na condição de interessada, do inventário extrajudicial, uma vez que há potencial direito real de sua titularidade estabelecido sobre bem imóvel que compõe o acervo hereditário.

O fato do direito real em questão ser constituído ope legis, independentemente de registro, não modifica a situação da irregularidade na formação do título extrajudicial.

O registro da partilha permitirá a possibilidade de transmissão da propriedade do bem pelos herdeiros, o que é do interesse da titular do direito real de habitação, especialmente no aspecto de sua publicidade.

Nestes termos, foi correta a recusa do registro frente à irregularidade no título para a produção dos efeitos jurídicos a ele consentâneos.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 02.05.2018 – SP)

Fonte: INR Publicações.

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