1ªVRP/SP: anuente que não é detentor de domínio não pode gravar o imóvel e não pode revogar cláusulas restritivas


Processo 0049468-70.2013 Dúvida Renan Martins Sanches 18º oficial de Registro de Imóveis – Dúvida – escritura de doação com cláusulas de impenhorabilidade, incomunicabilidade e inalienabilidade – previsão para que terceiro anuente tenha poderes para revogar as cláusulas restritivas, quando do óbito dos doadores – anuente não é detentor de domínio, não pode gravar o imóvel e não pode revogar cláusulas restritivas necessidade de retificação da escritura de doação – dúvida procedente. CP 257 Vistos. 1. O 18º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (RI) suscitou dúvida a requerimento de RENAN MARTINS SANCHES (RENAN). 1.1. Segundo narrado no termo de dúvida, RENAN pretende que seja registrada escritura de doação (fls. 05-11), em que ele figura como donatário do imóvel de matrícula 61.743 do 18º RI (fls. 26-29), imóvel este pertencente a RICARDO SANCHES (RICARDO) e MARIA DE FÁTIMA MARTINS DA SILVA (MARIA). 1.2. O título foi apresentado ao 18º RI (prenotação 607.357) e foi recusado. A qualificação negativa decorreu da presença, no título, de disposição que prevê a possibilidade de Adelaide Martins da Silva (mãe do donatário e esposa de RICARDO) revogar, em ocasião do falecimento dos doadores, cláusulas de impenhorabilidade, incomunicabilidade e alienabilidade, porém, com anuência do donatário. 1.2.1. Adelaide casou-se com RICARDO, no regime da comunhão parcial de bens, depois que ele adquiriu o imóvel. Logo, ela não possui direitos reais sobre o referido bem. Segundo entendimento do registrador, da mesma forma que ela não poderia impor cláusulas restritivas na doação, jamais poderia revogálas. Adelaide apenas surge na escritura como anuente, para fins de atendimento ao disposto no artigo 1.647 do Código Civil. 1.2.2. Por fim, o registrador asseverou que a possibilidade de terceiro revogar cláusulas restritivas é uma condição resolutiva puramente potestativa, já que, sobrevindo óbito dos doadores, o cancelamento das restrições ficaria ao livre arbítrio de Adelaide. 1.3. Inconformado com a recusa, RENAN requereu que fosse suscitada a presente dúvida (fls. 23-25). 1.4. O termo de dúvida foi instruído com documentos (fls. 05-29). 2. O suscitado apresentou impugnação (fls. 32-35). 3. O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls. 42-44). 4. É o relatório. Passo a fundamentar e decidir. 5. RENAN pretende registrar escritura de doação com cláusulas restritivas de domínio e previsão para que uma anuente as revogue no caso de falecimento dos doadores. 6. Adelaide não é titular de domínio do imóvel de matrícula 61.743 do 18º RI. Ela não figurou como doadora (apenas com anuente) e, por decorrência lógica, ela não pode instituir nenhuma cláusula restritiva de domínio. Não se pode onerar, alienar ou restringir aquilo de que não se é proprietário: ostentar a condição de ‘titular de domínio’ é essencial para impor as restrições (Fioranelli, Ademar. Das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 19, g. n.) 6.1. Se ela não pode clausular o bem imóvel, objeto da doação, por não ser proprietária, claramente ela também não poderá revogar cláusulas instituídas pelos doadores, mesmo após o falecimento destes. Isso porque as cláusulas restritivas se tornam irretratáveis depois do óbito do(s) doador(es): Os gravames de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade são instituídos em garantia do donatário, sendo possível o seu cancelamento pelo doador em vida, com anuência do donatário. Porém, após a morte do doador, as cláusulas tornam-se irretratáveis, perdurando até o falecimento do donatário, ou do último sobrevivente, se houver mais de um donatário, mesmo em se tratando de adiantamento de legítima (RT, 313/112, apud Fioranelli, Ademar. Das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 71, g. n.) 7. Observa-se, então, que o vício da escritura de doação decorre não do fato de existir condição resolutiva potestativa, mas sim do fato de Adelaide simplesmente não ter poderes para dispor do imóvel e clausulá-lo com disposições restritivas de domínio. Supondo que ela pudesse levantar as cláusulas restritivas, mesmo assim tal ato não estaria sob seu livre arbítrio porque a própria escritura de doação prevê a necessidade de anuência do donatário e, logo, não há que se falar em potestatividade (fls. 07 in medio). 8. Apesar do acima exposto, nada impede que o tempo de vida de Adelaide seja considerado como condição resolutiva da cláusula de inalienabilidade temporária, afinal, trata-se de mera condição temporal, permitida pela lei por não ser impossível. 9. O título, da maneira como se apresenta, não poderá ingressar em fólio real. Necessária será sua retificação, por outra escritura, para que haja expressa previsão de que apenas os doadores possam levantar as cláusulas restritivas de impenhorabilidade, incomunicabilidade e alienabilidade, tudo com o necessário consentimento do donatário. 10. Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo 18º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (RI), a requerimento de RENAN MARTINS SANCHES. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Desta sentença cabe apelação, com efeito suspensivo e devolutivo, para o E. Conselho Superior da Magistratura, no prazo de quinze dias. Uma vez preclusa esta sentença, cumpra-se a Lei 6.015/73, artigo 203, I, e arquivem-se os autos se não for requerido mais nada. P. R. I. São Paulo, 1 de novembro de 2013. Josué Modesto Passos JUIZ DE DIREITO.

Fonte: DJE/SP | 28/03/2014.

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Jurisprudência mineira – Apelação Cível – Direito de Família – Divórcio Direto – Imóvel pendente de financiamento – Partilha das parcelas quitadas durante a convivência conjugal até a data da separação fática


Apelação Cível – Direito de Família – Divórcio Direto

APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DE FAMÍLIA – DIVÓRCIO DIRETO – REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS – IMÓVEL PENDENTE DE FINANCIAMENTO – PARTILHA DAS PARCELAS QUITADAS DURANTE A CONVIVÊNCIA CONJUGAL ATÉ A DATA DA SEPARAÇÃO FÁTICA – RECURSO NÃO PROVIDO

– Na dicção dos arts. 1.658 e 1.666 do Código Civil, o regime da comunhão parcial implica a divisão de todos os bens adquiridos na constância do casamento, excetuadas as hipóteses legais de não comunicabilidade.

– Em se tratando de imóvel financiado, só é cabível a partilha das parcelas que foram amortizadas durante o período da relação conjugal, considerando-se o marco final a data da separação fática do casal.

– Sem o registro no Cartório de Imóveis, não há falar em direito de propriedade (art. 1.245 do CC), de modo que incabível a divisão do bem.

Recurso não provido.

Apelação Cível nº 1.0720.10.001638-8/001 – Comarca de Visconde do Rio Branco – Apelante: A.A.A. – Apelado: N.A.S.A. – Relator: Des. Raimundo Messias Júnior

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos em negar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 11 de fevereiro de 2014. – Raimundo Messias Júnior – Relator. 

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. RAIMUNDO MESSIAS JÚNIOR – Trata-se de recurso de apelação interposto por A.A.A. em face da sentença proferida pela MM. Juíza de Direito da Vara Cível/Precatórias da Comarca de Visconde do Rio Branco/MG, a qual julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, decretando-se o divórcio do casal e determinando-se a partilha dos bens comuns nos seguintes termos (f. 131/136):

“Quanto à partilha de bens, reconheço como patrimônio comum dos litigantes: os direitos relativos a uma motocicleta Honda CG/150 CC, […]; os direitos relativos a um veículo Fiat Uno Mille, […]; um lote situado na Rua […]; e uma casa de morada localizada na Rua Maria Jorge, […], tudo na proporção de 50% para cada um dos cônjuges.

No que tange à edificação da casa situada na Rua […], deve a autora restituir ao varão 50% do valor pago a título de financiamento, no período de 20.11.2006 até março de 2010, bem como 50% do valor gasto na construção da parte de alvenaria da segunda morada, excluindo-se a fase final da obra, ou seja, o acabamento, tudo a ser apurado em liquidação de sentença”.

Insurge-se o apelante, exclusivamente, contra a forma da partilha do imóvel que servia de residência para o casal, qual seja o situado na Rua […], adquirido mediante financiamento na constância do casamento.

A tese é que o bem foi acrescido de benfeitorias e foi valorizado ao longo do tempo. Assim, para uma justa partilha, seria necessário fixar a restituição ao varão, ora apelante, na fração de 50% do imóvel, recaindo sobre ele a obrigação de ressarcir a apelada em 50% dos valores gastos a título de financiamento e gastos comprovados com a reforma desde a separação de fato do casal. Nesses termos, pugna pelo provimento de sua irresignação, asseverando que a partilha do imóvel, tal como foi feita, segundo o valor das prestações do financiamento pagas na constância da vida conjugal, afronta seu direito de propriedade, requerendo, ainda, o exercício exclusivo sobre a posse do imóvel (f. 142/146). 
Sem contrarrazões (f. 153-v.).

A Procuradoria-Geral de Justiça considerou desnecessária a sua intervenção (f. 158). 

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cinge-se a controvérsia a aferir se o imóvel localizado na Rua […], adquirido mediante financiamento na constância do casamento, deverá ser objeto de partilha em sua integralidade, porquanto a sentença recorrida apenas determinou a partilha de metade dos valores pagos até a data de separação de fato do casal, além de 50% das quantias empreendidas na construção da parte de alvenaria da segunda morada, excluindo-se a fase final da obra, ou seja, o acabamento, tudo a ser apurado em sede de liquidação de sentença.

Ponto conflitante, ainda, diz respeito ao pedido do autor de exercício exclusivo da posse sobre o imóvel litigioso.

Compulsando os autos (f. 09), constata-se que as partes eram casadas pelo regime da comunhão parcial de bens, previsto nos arts. 1.658/1.666 do Código Civil.

Por tal regime, compreende-se que devem ser partilhados igualitariamente todos os bens adquiridos a título oneroso na constância do enlace matrimonial, independentemente da prova da contribuição de cada cônjuge para o atingimento da resultante patrimonial, porquanto se presume que o acúmulo de patrimônio seja produto da soma do esforço mútuo do casal.

A respeito do tema, preleciona Maria Berenice Dias:

“A comunhão do patrimônio comum atende a certa lógica e dispõe de um componente ético: o que é meu é meu, o que é teu é teu e o que é nosso, metade de cada um. Assim, resta preservada a titularidade exclusiva dos bens particulares e garantida a comunhão do que for adquirido durante o casamento. Nitidamente, busca evitar o enriquecimento sem causa de qualquer dos cônjuges. O patrimônio familiar é integrado pelos bens comuns, que não se confundem com os bens particulares e individuais dos sócios conjugais. Comunica-se apenas o patrimônio amealhado durante o período de convívio, presumindo a lei ter sido adquirido pelo esforço comum do par” (DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 245).

Nessa perspectiva, depreende-se que, na constância da vida conjugal, o casal contratou financiamento imobiliário para aquisição do imóvel que servia de residência para a família (f. 15/16 e f. 23).

Tal financiamento, prevendo 300 (trezentas) parcelas, não foi quitado na constância do casamento, sendo amortizadas, até a separação de fato do casal – a qual, segundo pontuado pelas partes, ocorreu em março de 2010 -, aproximadamente 20 prestações.

Dessa forma, permanecendo a apelada na posse do imóvel, e assumindo exclusivamente o pagamento das prestações remanescentes do financiamento imobiliário, consoante se extrai dos recibos de pagamento juntados às f. 81/86, não merece reparo a sentença que determinou a partilha dos valores do financiamento que foram adimplidos durante a convivência marital. 

Frise-se que as partes não possuem a propriedade do imóvel, o que só se perfectibiliza com o registro no Cartório de Imóveis, conforme preceitua o art. 1.245 do CC.

Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes:

“Ementa: Apelação cível. Direito de família. Divórcio direto. Imóvel financiado. Partilha das parcelas adimplidas no período da convivência conjugal. Sentença mantida. – No regime da comunhão parcial de bens, todos os bens adquiridos na constância do casamento devem ser partilhados, pois passam a integrar o patrimônio comum do casal, pouco importando se houve ou não contribuição financeira por ambos os cônjuges. Em se tratando de imóvel financiado junto à instituição financeira, somente aquelas parcelas adimplidas durante a relação conjugal deverão ser rateadas entre o casal. Tratando-se de imóvel financiado, quanto às prestações vincendas, não há como partilhar aquilo que nem sequer é de propriedade do casal, porquanto, até o adimplemento integral do contrato, não são eles proprietários do imóvel, mas somente promitentes compradores, conforme se verifica inclusive de cláusula contratual” (Apelação Cível nº 1.0024.11.183275-4/001, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relator: Des. Washington Ferreira, julgado em 30.10.2012).

“Apelação cível. União estável. Reconhecimento e dissolução. Partilha de imóvel financiado. Meação alcança apenas as parcelas do financiamento pagas durante a constância da união. – A meação deve incidir sobre o montante pago durante a união e não sobre a totalidade do bem, sob pena de enriquecimento indevido, somado ao fato de que, após a separação de fato, o apelado assumiu o pagamento das parcelas vincendas. Apelo desprovido” (Apelação Cível nº 70049009160, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relatora: Des.ª Munira Hanna, julgado em 22.05.2013).

Não admitindo partilha de bem cuja propriedade ainda não foi registrada, pendente financiamento para a sua aquisição, não é viável a solução apontada pelo apelante para a partilha relativa ao bem.

Saliente-se, por oportuno, que a sentença cuidou de incluir nos valores a serem partilhados os afetos às benfeitorias relativas à construção da parte de alvenaria da segunda morada, excluindo, apenas, em escorreita decisão, as quantias empregadas no acabamento do pavimento suplementar do imóvel, visto que os recibos acostados às f. 89/121 atestam que a apelada suportou sozinha os custos da obra.

Com efeito, se o apelante sugere que a sentença deixou de reconhecer algumas benfeitorias, incumbir-lhe-ia o ônus de comprovar a alegada extensão das mesmas e os correspondentes custos, para, então, pleitear a partilha das despesas correspondentes, mas nunca a valorização do imóvel, assinalando que a propriedade do mesmo não é passível de partilha. 

Acresça-se que a prova testemunhal foi devidamente interpretada pela Magistrada a quo, cujos depoimentos sugeriram que o imóvel conjugal estava em fase preparatória para a edificação do segundo pavimento (f. 66/67), tendo tal detalhe composto a conclusão da sentença para fins de partilha.

Por derradeiro, não merece prosperar o pedido do apelante de ter para si a posse do imóvel.

A uma, porque a apelada vem exercendo a posse desde a separação de fato.

A duas, porque a apelada assumiu a obrigação e vem pagando as parcelas do financiamento.

A três, porque irá reembolsar o apelante dos valores que contribuiu para o pagamento do financiamento.

Logo, a posse sobre o imóvel deve permanecer com a apelada, a qual vem se responsabilizando pelo pagamento das parcelas atinentes ao financiamento imobiliário.

Dessarte, por todo ângulo, o apelante somente fará jus à metade do valor efetivamente pago das parcelas do financiamento do imóvel, durante a convivência conjugal, até a data limite da separação de fato do casal.

Com esses argumentos, nego provimento ao recurso e mantenho integralmente a sentença, pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

Custas recursais, pelo apelante, suspensa a exigibilidade, ex vi do art. 12 da Lei 1.060/50. 

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Caetano Levi Lopes e Hilda Maria Pôrto de Paula Teixeira da Costa.

Súmula – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. 

Fonte: Arpen/Brasil | 28/03/2014.

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