Devolução de parcelas na rescisão de compra e venda não depende de iniciativa do interessado

Decretada a resolução do contrato de promessa de compra e venda, o juiz deve determinar a restituição das parcelas pagas pelos compradores, ainda que isso não tenha sido expressamente pedido pela parte interessada. Este foi o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que negou recurso da Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais (Cohab/MG), mantendo a determinação da segunda instância para a restituição dos valores já pagos pelos compradores.

Inicialmente, a companhia ajuizou ação de resolução de compra e venda e de reintegração de posse, alegando inadimplência do casal comprador do imóvel. Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente. O casal comprador apelou e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), apesar de confirmar a resolução do contrato e a reintegração da posse do imóvel, determinou que a Cohab/MG restituísse 50% das parcelas pagas pelo casal, para evitar enriquecimento sem causa.

A companhia interpôs, então, recurso especial no STJ, sustentando que a decisão de determinar a restituição seria ultra petita (além do pedido), porque não foi requerida pelo casal. Para a Cohab/MG, a restituição das parcelas exigiria iniciativa da parte interessada.

Obrigação

Ao julgar a questão, o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, afirmou que a resolução dos contratos bilaterais, como o do caso, consiste basicamente em extingui-lo e, consequentemente, desconstituir a relação obrigacional estabelecida. Ele explicou que “se o credor, na petição inicial, pede a resolução do contrato, não há necessidade ao devedor, na contestação ou em reconvenção, de requerer a devolução das prestações entregues ao credor, a qual pode e deve ser determinada de ofício pelo juiz como decorrência lógica da decretação de resolução do contrato”.

O ministro ressaltou que o credor, em consequência do pedido de resolução do contrato de compra e venda, também possui o direito ao recebimento das prestações entregues ao devedor, que se manifesta, no caso, com a reintegração de posse do imóvel.

A jurisprudência da Terceira e da Quarta Turma do STJ, ainda que os precedentes não sejam recentes, sempre entendeu ser desnecessária a iniciativa da parte ré (o comprador, no caso) para assegurar a devolução das parcelas do preço.

No julgamento em questão, ao determinar que a Cohab/MG restituísse as parcelas do preço pagas pelos compradores, que já possuíam a obrigação, desde a sentença, de restituir o imóvel, o TJMG “nada mais fez do que concretizar a eficácia restitutória da resolução do contrato de promessa de compra e venda decretada pela sentença”, concluiu o ministro.

Fonte: STJ. Publicação em 03/04/2013.


A locação no Registro de Imóveis

Por João Pedro R. S. de Arruda Camara[1]

O ingresso do contrato de locação no serviço registral imobiliário, mais especificamente na matrícula do imóvel locado, tem se mostrado um assunto espinhoso para proprietários, inquilinos, corretores e advogados que atuam no ramo imobiliário. Para que dúvidas e perplexidades sobre o tema sejam sanadas, é preciso uma pequena incursão sobre a sistemática registral brasileira e sua finalidade.

Em apertada síntese, pode-se dizer que o registro imobiliário serve para constituir direitos sobre imóveis, principalmente os chamados direitos reais (propriedade, superfície, servidão, usufruto, direito de promitente comprador, hipoteca, propriedade fiduciária, etc.), dando-lhes publicidade para que possam gerar todos os efeitos jurídicos que lhes são inerentes, mormente aqueles efeitos que atingem terceiros, isto é, que extrapolam a órbita dos direitos e deveres do transmitente e do adquirente do direito real.

A regra geral do art. 1.227 do Código Civil diz que os direitos reais sobre bens imóveis só nascem com o registro da aquisição no cartório de registro de imóveis competente. Essa regra é bastante conhecida no meio jurídico-imobiliário pelo seguinte ditado: “Quem não registra não é dono”. E esse ditado pode ser corretamente ampliado para “quem não registra não tem direito real sobre imóvel”, pois não só a propriedade como todos os outros direitos reais só se constituem com o registro.

Entretanto, existem ainda direitos que não são reais, mas mesmo assim a lei determina o seu registro ou averbação na matrícula do imóvel. Na verdade, tudo que de alguma forma tenha relevância jurídica para o imóvel e todos que com ele se relacionem, merece ingresso no registro imobiliário.

Nesse contexto, o legislador acertadamente identificou no contrato de locação dois direitos que merecem ser levados a registro. O primeiro é o direito do locatário à vigência da locação em caso de alienação do imóvel a terceiros; o segundo é a preferência do locatário à aquisição do imóvel, caso o proprietário deseje aliená-lo. Note-se que são dois direitos distintos; o primeiro está previsto no art. 8º da Lei de Locações de Imóveis Urbanos (Lei nº 8.245/91), e o seu registro está determinado no art. 167, inciso I, item 3 da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73); o segundo encontra-se disciplinado nos arts. 27 a 34 da Lei nº 8.245/91, e a sua averbação está positivada no art. 167, inciso II, item 16 da Lei nº 6.015/73.

Mas por que se praticar dois atos registrais se o contrato de locação é o mesmo? É que o sistema registral imobiliário brasileiro é de registro de direitos, e não de registro de títulos. Em outras palavras, o que se registra ou averba na matrícula do imóvel não é o contrato ou documento celebrado entre as partes (título), mas o direito ou direitos nele contidos. É por isso que ao ser levada ao Registro de Imóveis uma escritura de compra e venda com hipoteca, esta origina dois atos registrais na matrícula; um registro relativo à compra e venda (transmissão do direito de propriedade ao comprador); e outro referente à hipoteca (constituição do direito de hipoteca em favor do credor). Da mesma forma, um contrato de locação tem a possibilidade de originar dois atos distintos na matrícula do imóvel, relativos a dois direitos que não são reais, mas que produzem efeitos jurídicos diretamente sobre o imóvel e seu proprietário.

A cláusula do contrato de locação que impõe ao adquirente do imóvel locado o dever de honrar a locação até seu termo final é uma disposição que extrapola os limites dos direitos e obrigações das partes contratantes (locador e locatário), vinculando um terceiro estranho a essa relação contratual. É justamente por isso que a lei exige que o direito de vigência seja publicizado na matrícula do imóvel, a fim de que o pretenso comprador saiba, de antemão, que terá de respeitar a locação até o fim do prazo contratual.

Porém, conforme dispõe o art. 8º da Lei nº 8.245/91 – e aqui está o âmago da questão –, são necessários dois requisitos para que o direito de vigência seja constituído em favor do locatário. O primeiro é que no contrato haja cláusula expressa constituindo o direito de vigência (este direito não se presume, tem que ser instituído pela vontade das partes); e o segundo é que este direito esteja registrado[2] no cartório de registro de imóveis competente, na matrícula do imóvel locado. Sem esses dois requisitos o locatário não terá reconhecido o direito de permanecer no imóvel, caso este seja alienado. Por isso, o corretor, gestor imobiliário e/ou consultor jurídico deve orientar seu cliente (principalmente se este for o locatário) sobre as vantagens de se fazer o registro do direito de vigência, e, a contrário senso, sobre os riscos do não registro.

A título de exemplo, imaginemos uma locação comercial, cujo locatário investe em benfeitorias e publicidade, fixa seu ponto no imóvel, esperando ali permanecer por anos a fio, entretanto se esquece de incluir no contrato a cláusula de vigência em caso de alienação, ou pior, apesar de ter feito constar tal cláusula no contrato, deixou de registrá-lo. Vem o locador e vende o imóvel a um terceiro que não pretende manter a locação, e esse comprador denuncia a locação dentro do prazo de noventa dias contados da data do registro da aquisição. Nesse caso, não restará alternativa ao locatário, senão desocupar o imóvel no prazo de noventa dias a partir da denúncia. É o que diz a lei (art. 8º da Lei nº 8.245/91), corroborada por farta jurisprudência dos tribunais pátrios.

O direito de preferência à aquisição do imóvel (também chamado de preempção), diferentemente do de vigência, é conferido ao locatário independentemente de cláusula expressa no contrato, sendo inclusive inafastável por disposição contratual, porém é imprescindível a sua averbação na matrícula do imóvel para que possa ter eficácia.

Esse direito confere ao inquilino a preferência para adquirir o imóvel em igualdade de condições com terceiros, devendo o proprietário dar-lhe conhecimento de sua intenção de venda e condições do negócio, a fim de que ele possa exercer ou não seu direito.

Caso a preferência seja desrespeitada, o inquilino poderá reclamar perdas e danos ou haver para si o imóvel, se o requerer no prazo de seis meses, a contar do registro da venda na serventia imobiliária. Note-se aqui a repercussão na esfera jurídica de terceiro alheio ao contrato de locação, já que o comprador poderá perder o imóvel em favor do locatário, restando àquele apenas o direito de receber de volta o que pagou pelo imóvel. E isto é motivo mais que suficiente para justificar a determinação legal de averbação do direito de preferência na matrícula (art. 167, II, 16, da Lei nº 6.015/73). Vale lembrar, ainda, que se a escritura de compra e venda for lavrada por valor abaixo do realmente acertado pelas partes, configurando sonegação fiscal dos contratantes, o locatário só precisará depositar o valor indicado na escritura para haver para si o imóvel.

Enfim, o registro do direito de vigência da locação em caso de alienação, quando estipulado pelas partes, e a averbação do direito de preferência são medidas obrigatórias, nos termos do art. 169 da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73), e imprescindíveis para dar efetividade a tais direitos e, assim, conferir segurança não só a seus titulares como a terceiros que porventura tenham interesse no imóvel.

João Pedro R. S. de Arruda Camara
Registrador de Imóveis substituto em Brasília/DF
Especialista em Direito Registral Imobiliário
Coordenador da ENNOR

 


[1] João Pedro R. S. de Arruda Camara- Registrador de Imóveis substituto em Brasília/DF, Especialista em Direito Registral Imobiliário e Coordenador da ENNOR

[2] A Lei nº 8.245/91 fala em averbação do direito de vigência, contudo o art. 167, I, 3, da Lei nº 6.015/73 (Lei dos Registros Púbicos), c/c art. 576 do Código Civil de 2002, deixam claro que o ato a ser praticado é de registro.

Fonte: ANOREG/BR. Publicação em 03/04/2013.


Concurso: TJRS abre seleção para outorga de 159 cartórios no estado

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) divulgou nesta quarta-feira (3/4) o edital do concurso para outorga de delegação de serviços notariais e registrais do estado. De acordo com o documento de abertura, existem 159 serventias, sendo 106 para provimento e outras 159 para remoção. O Instituto de Estudos Superiores do Extremo Sul (Ieses) organizará o certame.

Para tentar as vagas reservadas a provimento, o candidato deve ser bacharel em direito ou possuir pelo menos dez anos de função em cartórios. Já para remoção, o interessado deve ter exercido titularidade de atividade notarial ou de registro por mais de dois anos. Interessados podem se inscrever de 11 de abril a 10 de maio, pelo site www.cartorio.tjrs.ieses.org. A taxa é de R$ 160.

Todos os inscritos passarão provas objetivas, provas escritas, provas práticas, provas orais, avaliação de títulos, sindicância de vida pregressa, exames de sanidade física e psiquiátrica e teste de aptidão psicológica. O cronograma de provas ainda não foi divulgado.

Veja o edital de abertura.

Fonte: CorreioWeb. Publicação em 03/04/2013.