TJSP: Rerratificação de escritura pública – Pequena incorreção na descrição do imóvel – Promitente vendedora que já faleceu – Ausência de prejuízo a seus interesses – Impossibilidade de comparecimento dos outorgantes para a lavratura de nova escritura pública – Possibilidade de substituição da declaração de vontade por provimento do Poder Judiciário – Alvará autorizando que o Tabelião rerratifique o instrumento público – Precedentes deste Egrégio Tribunal – Recurso provido.

EMENTA

RERRATIFICAÇÃO DE ESCRITURA PÚBLICA. Indeferimento da inicial por falta de interesse de agir. Pequena incorreção na descrição da área de imóvel que se pretendeu alienar. Promitente vendedora que já faleceu. Ausência de prejuízo a seus interesses. Impossibilidade de comparecimento dos outorgantes para a lavratura de nova escritura pública. Possibilidade de substituição da declaração de vontade por provimento do Poder Judiciário. Alvará autorizando que o tabelião rerratifique o instrumento público, nos termos descritos na inicial. Precedentes deste Egrégio Tribunal. Recurso provido. (TJSP – Apelação Cível nº 0022916-62.2012.8.26.0566 – São Carlos – 4ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Milton Carvalho – DJ 09.04.2013)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0022916-62.2012.8.26.0566, da Comarca de São Carlos, em que é apelante OTAVIANO GRACINDO DE PAIVA, é apelado O JUIZO.

ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso para expedir em favor do autor alvará autorizando que 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de São Carlos – SP promova a rerratificação da escritura pública registrada em seu livro 280, folhas 112, para que ao imóvel ali descrito sejam atribuídas as mesmas metragens e confrontações constantes de sua matrícula. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores MAIA DA CUNHA (Presidente sem voto), FÁBIO QUADROS E NATAN ZELINSCHI DE ARRUDA.

São Paulo, 21 de março de 2013.

MILTON CARVALHO – Relator.

RELATÓRIO

Trata-se de pedido de pedido de concessão de alvará judicial para rerratificação de escritura pública de compra e venda, desacolhido pela respeitável sentença de fls. 15/16, que indeferiu a petição inicial por falta de interesse de agir.

Inconformado, apela o autor, sustentando, em síntese, que celebrou negócio jurídico para a alienação de um imóvel com Francisca Soares de Carvalho, representante do Espólio de Joaquim dos Santos Filho, mas que a escritura pública por meio do qual foi realizada a avença contém incorreções que precisam ser sanadas para que a compra e venda do imóvel possa se aperfeiçoar por meio de seu registro. Aduz que é necessário que o juízo expeça alvará ao 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de São Carlos – SP, para que proceda à rerratificação do instrumento público, posto que a alienante do imóvel já faleceu.

Não houve resposta.

É como relato.

VOTO

O recurso é de ser acolhido.

A despeito do nome atribuído à ação, o que o autor pretende é obter alvará para que possa suprimir declaração de vontade da promitente vendedora de um imóvel, já falecida (fls. 07), a fim de obter, junto ao 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de São Carlos Títulos a rerratificação de instrumento público.

Observa-se que a escritura pública a ser corrigida apresenta pequena incorreção acerca da metragem da medida da superfície do imóvel a que se refere, fazendo referência à área de 300 m² quando se verifica na matricula do imóvel que ele possui, na realidade, 303,45 m².

Em que pese o afirmado pelo juízo de primeiro grau, não há como exigir-se do autor que compareça acompanhado do outro outorgante, já falecido, perante o tabelião para a lavratura de nova escritura. Tampouco é possível impor que requeira ao juízo do inventário de Francisca Soares de Carvalho que nomeie inventariante para representá-la na rerratificação de escritura, posto que o representante do espólio poderia recursar-se a fazê-lo.

Em hipóteses como a presente, em que não é possível obter o consentimento direto da promitente vendedora do imóvel, e que não suportará ela qualquer prejuízo com o provimento da demanda, é possível que o Poder Judiciário substitua sua declaração de vontade, autorizando o tabelionato a promover a alteração do instrumento público.

Em situação muito semelhante já se afirmou:

Uma escritura pública é um documento que prova a constituição ou transferência de direitos reais (art. 134, II, do Código Civil) e, como todo ato jurídico, é suscetível de emendas. A retificação, no entanto, somente é possível por outra escritura pública.

Como apresenta-se impossível obter o consentimento dos vendedores, pode o Juiz atuar em prol da segurança dos atos jurídicos e permitir que o Cartório de Notas lavre a escritura de retificação independente da presença deles. E poderá faze-lo porque a mudança não envolve cláusulas com dicionais de aceitação e sim policitação do instrumento, ou seja determinação do objeto contratual, confrontações e características, tal como explicava JOÃO MENDES DE ALMEIDA JÚNIOR,"Programa de Ensine de Prática Forense", ed. Freitas Bastos, 1958, pág, 141) .

Equivale a afirma r que a providência que o autor esperava obter do Magistrado não viria a consagrar prejuízo algum, o que desestrutura a rejeição imposta. Pelo contrario: a medida visa acertar um documento público para torna-lo efetivo e registrável, de sorte que a contribuição do Judiciário para esse fim atende um ideal de pacificação social, escopo do processo (Apelação Cível, nº 062.827-4/2, 3ª Câmara da Direito Privado, rel. Ênio Santarelli Zuliani, j. 09/02/1999) (realce não original).

Por tais fundamentos, dá-se provimento ao recurso para expedir em favor do autor alvará autorizando que 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de São Carlos – SP promova a rerratificação da escritura pública registrada em seu livro 280, folhas 112, para que ao imóvel ali descrito sejam atribuídas as mesmas metragens e confrontações constantes de sua matrícula.

MILTON PAULO DE CARVALHO FILHO – Relator.

Fonte: Boletim Eletrônico INR nº 5784 – Jurisprudência


JT reconhece fraude à execução em caso de alienação de bem imóvel entre parentes

Um dos meios utilizados pela Justiça para viabilizar o pagamento do crédito reconhecido em uma ação é a penhora de bens do devedor. Mas, muitas vezes, ocorre de um terceiro alegar que o bem penhorado não mais pertence ao devedor e, sim, a ele, pessoa estranha ao processo, e ajuíza a ação denominada "embargos de terceiro", pedindo a desconstituição da penhora. Em um caso analisado pela Turma Recursal de Juiz de Fora, os julgadores rejeitaram a pretensão nesse sentido, ao constatar a tentativa de fraude à execução. Isso ocorre quando o executado-devedor aliena bens ou direitos de sua propriedade, quando já corre contra ele demanda judicial capaz de levá-lo ao estado de insolvência (que é quando o devedor possui mais dívidas do que bens para saldá-las). A matéria é tratada no artigo 593, inciso II, do Código de Processo Civil.

No caso do processo, os julgadores constataram que a sócia de uma empresa vendeu o imóvel para o seu próprio irmão, depois do ajuizamento de uma ação trabalhista contra ela, quando já se encontrava em estado de insolvência. Em seu recurso, o irmão da devedora tentou convencer os julgadores de que havia comprado o imóvel da irmã em 2010, antes da distribuição da ação, em 2011. Ele sustentou que apenas o reconhecimento das firmas no contrato foi feita após a celebração do negócio, o que se justifica por ter sido realizado entre parentes, em confiança mútua.

No entanto, a relatora do recurso, juíza convocada Maria Raquel Ferraz Zagari Valetim, não acatou esses argumentos. Ela esclareceu que o fato de o embargante não figurar formalmente como proprietário não impede o ajuizamento dos embargos de terceiro, já que ele é possuidor do imóvel. Nesse sentido, citou a Súmula 84 do STJ, pela qual "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda, ainda que desprovida de registro". Nesses termos, foi reconhecida a legitimidade do embargante.

Já quanto à alegação de fraude, ficou claro para a relatora que tudo não passou de uma tentativa de impedir a execução. Ao analisar as provas, ela não teve dúvidas de que a "transação" ocorreu após o ajuizamento da ação trabalhista. Nesse sentido, destacou que, apesar de constar uma data de 2010 no "Contrato de Compra e Venda de Imóveis", as firmas só foram reconhecidas em 2011. "Tal situação, indubitavelmente, impede a certeza acerca da data da formalização do contrato", ressaltou, citando o artigo 370 do CPC, que trata da situação ao dispor que, em relação a terceiros, deverá ser considerado datado o documento no dia em que for registrado ou a partir do ato ou fato que estabeleça, de modo certo, a anterioridade da formação do documento.

A relatora também pontuou que, ao contrário do alegado pelo embargante, o bem penhorado não consta na declaração relativa ao exercício de 2011, mas somente na posterior. Também outros documentos no nome do embargante, como IPTU e contrato de locação, se referem ao ano 2011 ou 2012. Pesou ainda o fato do embargante ser irmão da sócia executada na reclamação trabalhista. De acordo com a relatora, ela foi incluída no polo passivo da demanda desde o início, em razão da paralisação das atividades empresariais, havendo pedido de condenação solidária dos reclamados. Portanto, não se pode argumentar que a personalidade jurídica impediu o conhecimento da demanda. Por fim, dados do processo sinalizaram a insolvência da devedora, demonstrando que contra ela se arrastam outras execuções.

Diante desse contexto e chamando a atenção para as peculiaridades do processo, a Turma de julgadores considerou o negócio jurídico ineficaz perante a execução, nos termos do artigo 593, inciso II, do CPC. A penhora sobre o imóvel foi confirmada.

( 0000874-51.2012.5.03.0035 AP )

Fonte: TRT3. Publicação em 10/04/2013.