2ªVRP/SP: Ocorrendo equívoco do preposto, o qual foi corretamente orientado e fiscalizado, ato doloso do serventuário ou ainda um erro isolado e sem maior repercussão, tem-se aplicado o entendimento da insuficiência para configuração do ilícito administrativo do Registrador ou Tabelião em virtude da ausência de culpa e gravidade, respectivamente.


  
 

Processo 1079097-96.2018.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1079097-96.2018.8.26.0100

Processo 1079097-96.2018.8.26.0100 Pedido de Providências Tabelionato de Notas J.S.C.A. Juíza de Direito: Dra. Letícia Fraga Benitez VISTOS, Trata-se de expediente instaurado a partir de comunicação encaminhada por José Sidney Crespo Affonso, noticiando falsidade em reconhecimento de firma aposto em diversos documentos. O Sr. 12º Tabelião de Notas desta Capital manifestou-se às fls. 120/124. Designou-se audiência às fls. 149, oportunidade em que foram ouvidos Manoel Celestino dos Santos Nicolau, Jefferson de Souza, Rogério Manzanares Lindo e Delva Juliana Teixeira (fls. 177/194). O D. Representante do Ministério Público apresentou manifestação conclusiva às fls. 242/243. É o breve relatório. DECIDO. Positivou-se, na espécie, a ocorrência de abertura de cartões de assinatura em nome de José Sidney Crespo Affonso e sua ex-esposa, Sra. Julia Arzillo Affonso, com a utilização de documentos falsos, bem como o reconhecimento de firma em diversos documentos com base nos referidos cartões, cujos atos foram atribuídos ao 12º Tabelião de Notas da Capital. Consta da peça inicial que o interessado José Sidney Crespo Affonso já possuía cartão de assinatura arquivado perante à Serventia, mas que não efetuava qualquer reconhecimento desde 1998, tendo em vista que se encontra domiciliado no México desde 1999, com saída definitiva perante a Receita Federal em dezembro de 2000. Aduz, ainda, que, no ano de 2017 tomou conhecimento da existência de execuções de título extrajudicial em seu nome, as quais tinham por objeto dois contratos de locação celebrados em 2016 e 2017, em que o interessado figurava como fiador, contendo assinaturas falsas. Sendo assim, diligenciou junto à Unidade, momento em que constatou a abertura de novas fichas de assinatura em seu nome, no ano de 2005, e em nome de sua ex-esposa, Sra. Julia Arzilo Affonso, em 2017, em ambos os casos com a utilização de documentos falsos. Pois bem. Cumpre, primeiramente, frisar que o âmbito de atribuições do exercício desta Corregedoria Permanente dos Tabelionatos de Notas da Capital se desenvolve na esfera administrativa nesta 2ª Vara de Registros Públicos, limitado aos aspectos administrativos do serviço público delegado, com vistas a apurar eventual responsabilidade disciplinar do Delegatário. Vale dizer, não haverá formação de convencimento judicial para anulação dos atos notariais ou sobre responsabilidade civil. Impende ressaltar, ainda, que os fatos ocorreram quando o Delegatário anterior era o responsável pela Serventia, sendo certo que a renúncia à delegação, em nosso sentir, não acarretaria a perda de objeto do presente pedido de providências, uma vez que as supostas infrações remetem à período anterior à renúncia. Feita estas observações iniciais, após detalhada análise da documentação carreada aos autos e dos esclarecimentos prestados, bem como diante da oitiva dos envolvidos, reputo que, de fato, o antigo Delegatário tomou todas as precauções havidas por necessárias para a abertura das fichas de assinatura e para os reconhecimentos de firma, ora em análise. A despeito das alegações ventiladas pelo interessado, certo é que os documentos apresentados para a abertura das fichas de firma (fls. 127/128) demonstravam ser aparentemente verdadeiros (fls. 113/116), não indicando erro grosseiro, rasuras ou manejo de alterações. Ademais, a ausência do dígito verificador no documento de identificação de fls. 113, por si só, não configura falha suficiente à ensejar ilícito funcional, observando-se haver congruência da assinatura traçada na ficha com aquela existente na cédula, bem como correspondência entre a fisionomia do usuário e a fotografia estampada no RG. Observe-se, ainda, no ponto, que o item 182, do Capítulo XIV das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça apenas faculta ao Tabelião a exigência de renovação das assinaturas ou o preenchimento de outra ficha-padrão. Assim é que, havendo perfeita conferencia entre os padrões de assinatura do documento apresentado para reconhecimento de firma e a ficha padrão arquivada na unidade, em que pese tenha sido aberta em 2005, de fato, não seria obrigatória a nova abertura de cartão de assinatura. Ainda, nessa senda, extraí-se dos autos que José Sidney Crespo Affonso possuía cartão de assinatura na serventia desde 1987, sendo que, à época, não era exigida a reprografia do documento de identidade exibido, razão pela qual, quando da abertura do novo cartão em 2005, inexistente qualquer documento de identificação arquivado na Serventia para que fosse realizada eventual comparação. Sendo assim, em que pese a fraude perpetrada, verifica-se que foram atendidos todos os requisitos previstos nos itens 178 e 179 do Capítulo XIV das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, tendo em vista que as fichas de assinatura juntadas aos autos contêm todos os elementos necessários, com especial destaque para: a) nome do depositante, endereço, profissão, nacionalidade, estado civil, filiação e data do nascimento; b) indicação do número de inscrição no CPF e do registro de identidade c) data do depósito da firma; d) assinatura do depositante, aposta 2 (duas) vezes; e) cópia reprográfica do documento de identidade apresentado para preenchimento da ficha-padrão, devidamente arquivado com a ficha-padrão para fácil verificação. Observa-se, ainda, que, após ser comunicado da ocorrência dos fatos pelo Interessado, cuidou o Sr. Notário de apontar uma restrição nos referidos cartões de assinatura, exigindo-se o comparecimento pessoal para novos reconhecimentos de firma, a fim de que se evitar novas fraudes, em observância ao disposto no item 188 do Capítulo XIV das Normas da Corregedoria Geral de Justiça. Por oportuno, importante ressaltar a presteza, tanto do ex-Delegatário quanto do Senhor Interino atualmente responsável pela Serventia, em atender as ordens deste Juízo, providenciando a juntada de toda a documentação que se fez necessária para apuração dos fatos. Em resumo, neste expediente verificatório não foi apurada ausência de orientação e, tampouco fiscalização, da parte do Sr. Tabelião; pelo contrário, o quadro probatório é indicativo à existência de orientação e fiscalização. Ausente, portanto, culpa, está excluída a possibilidade de instauração de processo administrativo disciplinar e futura imposição de sanção administrativa. Com efeito, os precedentes desta Corregedoria Permanente fixaram a possibilidade da responsabilização disciplinar do Oficial ou Tabelião somente no caso da possibilidade de comportamento (culposo) com aptidão para impedir ato contrário ao ordenamento jurídico (erro praticado pelo Titular ou preposto). Assim, ocorrendo erro de preposto, que poderia ser evitado com a orientação e ou fiscalização do Titular da Delegação, ocorre sua responsabilização administrativa-disciplinar; a exemplo de equívocos repetidos, situações perceptíveis com um mínimo de diligência e erros crassos que denotem clara falta de orientação ou fiscalização. De outra parte, ocorrendo equívoco do preposto, o qual foi corretamente orientado e fiscalizado, ato doloso do serventuário ou ainda um erro isolado e sem maior repercussão, tem-se aplicado o entendimento da insuficiência para configuração do ilícito administrativo do Registrador ou Tabelião em virtude da ausência de culpa e gravidade, respectivamente. Neste sentido é a recente decisão da Câmara Especial do Tribunal de Justiça, no Recurso Administrativo nº 0048142-07.2015.8.26.0100, j. 07.08.2017, como se observa do seguinte extrato do voto do Desembargador Salles Abreu, Presidente da Seção de Direito Criminal, como segue: “Há de se observar a concorrência de elementos objetivo e subjetivo para a caracterização da infração disciplinar do notário. Ou seja, a conduta havida por infração disciplinar ou funcional, deve-se observar uma conduta dolosa ou culposa do notário ou seu preposto, observando-se, neste último caso, uma falha no dever de cuidado na verificação da legalidade e legitimidade do ato. Mais que isto, a responsabilidade administrativa somente surge com a existência de uma conduta ilícita no aspecto dos deveres administrativos, sendo certo que tal qualificação da ilicitude não pode ser irrazoável ou mesmo fugir ao princípio da legalidade. Não se pode considerar ilícito administrativo a conduta que, em seu aspecto material e legal, não comporta nenhuma ilicitude conhecível de ofício, mas que tem seu regime de confronto vinculado à questão da eficácia ou ineficácia privada do ato, ou mesmo da aferição da divergência entre a vontade declarada e a vontade real do declarante. Embora a configuração do ilícito administrativo não se sujeite objetivamente ao princípio da tipicidade, não se pode esvaziar o conceito formal de culpa para se configurar a conduta culposa punível no âmbito administrativo.” Em suma, os elementos probatórios coligidos nos autos não autorizam a formação de convencimento judicial no sentido da adoção de providência censório-disciplinar em relação ao serviço correicionado, não se vislumbrando responsabilidade funcional apta a ensejar instauração do procedimento administrativo, de tudo se inferindo que a fraude não contou, à evidência, com a conivência da Serventia. Ante todo o exposto, à míngua de medida correcional a ser instaurada, determino o arquivamento dos autos. De outra parte, determino o bloqueio definitivo das ficha de firma em nome de José Sidney Crespo Affonso (fls. 127) e Julia Arzilo Affonso (fls. 128). No mais, como já houve comunicação do fato à Autoridade Policial, assim, desnecessário outras providências atinentes ao artigo 40 do Código de Processo Penal. Ciência ao Sr. Tabelião e ao Ministério Público. Encaminhe-se cópia desta decisão à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente sentença como ofício. I.C. ADV: DELVA JULIANA TEIXEIRA (OAB 179788/ SP)

Fonte: DJe/SP de 03.06.2019.7

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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