Agravo de instrumento – Tributário – ITCMD – Enquadramento do caso concreto à hipótese de isenção prevista no art. 6º, I, “a” da Lei Estadual 10.705/00 – Constatação de que apenas parcela do imóvel será transmitida aos herdeiros, considerando a meação do cônjuge supérstite – Incidência do imposto sobre a fração do bem efetivamente acrescida ao patrimônio dos herdeiros – Precedentes – Decisão reformada para conceder a liminar – Recurso provido, com observação.


  
 

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2125700-88.2019.8.26.0000, da Comarca de São Vicente, em que são agravantes SANDRA MARIA PEGORARO ALMEIDA (JUSTIÇA GRATUITA) e JULIANA PEGORARO DE ALMEIDA (JUSTIÇA GRATUITA), é agravado DELEGADO DO POSTO FISCAL DE SANTOS.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 12ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso, com observação. V. U. Declara o 2º juiz, de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores EDSON FERREIRA (Presidente sem voto), SOUZA NERY E OSVALDO DE OLIVEIRA.

São Paulo, 10 de outubro de 2019.

Souza Meirelles

Relator

Agravo de instrumento n° 2125700-88.2019.8.26.0000

Agravante: Sandra Maria Pegoraro Almeida e outro

Agravada: Delegado do Posto Fiscal de Santos

Comarca: São Vicente

Vara: Vara da Fazenda Pública TJSP (voto nº 14869)

Agravo de instrumento – Tributário – ITCMD – Enquadramento do caso concreto à hipótese de isenção prevista no art. 6º, I, “a” da Lei Estadual 10.705/00 – Constatação de que apenas parcela do imóvel será transmitida aos herdeiros, considerando a meação do cônjuge supérstite – Incidência do imposto sobre a fração do bem efetivamente acrescida ao patrimônio dos herdeiros – Precedentes – Decisão reformada para conceder a liminar – Recurso provido, com observação

Agravo de instrumento manejado por Sandra Maria Pegoraro Almeida e outro nos autos de mandado de segurança impetrado em face do Delegado do Posto Fiscal de Santos, em trâmite perante a Vara de Fazenda Pública da Comarca de São Vicente, desafiando decisão que indeferiu medida liminar que visava à adoção de base de cálculo correspondente a metade do valor do imóvel, para fins de enquadramento em hipótese de isenção de ITCMD.

Vindicam as agravantes a desconstituição da r. interlocutória combatida, ao sustentar que o objeto da transmissão causa mortis recai sobre 50% do valor do imóvel, uma vez que a parcela restante refere-se à meação do cônjuge supérstite. Destarte, não há que se falar na incidência do ITCMD sobre o valor integral do imóvel, de modo que as quotas hereditárias transmitidas enquadram-se na isenção prevista no art. 6º, inciso I, alínea a, da Lei Estadual 10.705/2000.

Recurso tempestivo, processado com atribuição de efeito suspensivo e contrariado (fls. 60/67).

Tal, em abreviado, o relatório.

Dessume-se dos autos que as impetrantes ora agravantes, na qualidade de filhas herdeiras de Rogério de Almeida Silva, procederam à abertura de inventário pela via extrajudicial, tendo por objeto metade do único imóvel do de cujus, considerando que a outra metade corresponde à meação da viúva.

Nesse contexto, ao requerer a concessão da isenção prevista no art. 6º, I, “a”da Lei Estadual 10.705/00 sobreveio a negativa da autoridade fiscal, sob a motivação de que o imposto de transmissão há de incidir, na espécie, sobre a integralidade do valor do bem.

Contra tal indeferimento voltou-se a impetração, sobrevinda a r. decisão interlocutória que indeferiu a medida liminar requerida nos seguintes termos:

“Vistos.

Defiro a gratuidade. Anote-se.

Dispõe o Decreto nº 46.655, de 01/04/2002, que regulamenta o ITCMD:

Art. 6º – Fica isenta do imposto:

I – a transmissão causa mortis :

a) de imóvel de residência, urbano ou rural, cujo valor não ultrapassar 5.000 (cinco mil) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo – UFESPs e os familiares beneficiados nele residam e não tenham outro imóvel;

b) de imóvel cujo valor não ultrapassar 2.500 (duas mil e quinhentas UFESPs, desde que seja o único transmitido.

No caso, o imóvel a ser transmitido possui valor venal de R$ 135.808,21 (fls. 11), ou seja, de 5.119,04 UFESPs.

A isenção legal não é concedida em virtude do valor a ser transmitido, mas sim, do valor do bem, ainda que seja respeitada a meação do cônjuge supérstite.

Assim, não vislumbro qualquer ilegalidade ou abuso de poder por parte do impetrado, motivo pelo qual INDEFIRO a liminar pleiteada.” (fls. 49)

Em que pese aos fundamentos da r. decisão agravada, o recurso comporta acolhida.

Com efeito, em relação às disposições legais que regem o ITCMD, nos termos do art. 38 do Código Tributário Nacional, a “a base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos”.

Em paralelo, o art. 9º da Lei Estadual n. 10.705/2000 determina que “a base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo)”.

Na vertente dos autos, as impetrantes pretendem efetuar o pagamento do imposto considerando a base de cálculo de apenas metade do valor imóvel, fração de fato transmitida às herdeiras (50%), considerando que os 50% remanescentes correspondem à meação do cônjuge supérstite.

Deveras, apenas parcela do imóvel está sendo transmitida às filhas do de cujus, considerando que a meação da viúva não será acrescida ao patrimônio das filhas herdeiras.

Assim, a base de cálculo do ITCMD há de corresponder ao valor proporcional à fração do bem efetivamente transmitida ao patrimônio das herdeiras, e não ao valor total do imóvel.

A controvérsia não é inédita nesta C. 12ª Câmara de Direito Público, rogando-se vênia para transcrever trecho de voto relatado pelo ínclito Des. Osvaldo de Oliveira ao julgar caso crivado de analogia envolvendo a incidência do ITCMD sobre fração dos bens deixados pelo de cujus, excluída a meação do cônjuge supérstite:

“Ora, se o ITCMD, como já esclarecido, incide sobre a sucessão, então o valor total dos depósitos bancários e aplicações financeiras que não pode ultrapassar 1.000 UFESP deve corresponder ao valor total da herança transmitida e não ao valor total deixado pelo de cujus.

Em outras palavras, para se aferir se incide ou não a isenção tributária, deve-se partir do valor efetivo da herança, excluída a meação, e não do valor dos bens vinculados ao nome do falecido, entre os quais está a meação, pois, sobre esta, não incide ITCMD.” (Apelação nº 1003933-52.2017.8.26.0071. 12ª Câmara de Direito Público. Rel. Des. Osvaldo de Oliveira. j. 29/05/2018)

Destarte, tendo por referência o valor venal do imóvel de R$ 135.808,21 (fls. 11), equivalente a 5119 UFESPs, tem-se que a fração efetivamente transmitida às herdeiras, proporcional a 50% do valor imóvel, não supera 5000 UFESPs, enquadrando a hipótese à situação prevista no art. 6º, inciso I, alínea “a”, da Lei Estadual n. 10.705/2000: in verbis

Artigo 6º – Fica isenta do imposto: (NR)

I – a transmissão “causa mortis”: (NR)

a) de imóvel de residência, urbano ou rural, cujo valor não ultrapassar 5.000 (cinco mil) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo – UFESPs e os familiares beneficiados nele residam e não tenham outro imóvel; (NR)

b) de imóvel cujo valor não ultrapassar 2.500 (duas mil e quinhentas) UFESPs, desde que seja o único transmitido; (NR)

Nesse mesmo sentido os precedentes deste E. Tribunal:

MANDADO DE SEGURANÇA – Impetração para o fim de afastar a exigibilidade de recolhimento do ITCMD – Isenção – Possibilidade – Ausência de interpretação extensiva – Cálculo do imposto que deve recair apenas sobre o quantum que se somou ao patrimônio do herdeiro – Inteligência do artigo 6º, inciso I, alínea a, da Lei Estadual nº 10.705/00 – Sentença concessiva da ordem mantida – Apelação da Fazenda Paulista e reexame necessário não providos. (Apelação nº 0041412-63.2011.8.26.0053. 5ª Câmara de Direito Público. Rel. Des. Fermino Magnani Filho. j. 22/02/2016)

AÇÃO CAUTELAR – Isenção de ITCMD – Apenas parte de imóvel será transmitido à herdeira, dessa forma, considera-se para verificação da isenção o valor venal da fração do bem a ser acrescida ao patrimônio da recorrida – Ressalte-se que o fragmento ostenta valor venal inferior ao limite de 5000 UFESPS, fazendo os apelados jus à benesse legal – Aplicabilidade do art. 6º, I, “a” da Lei 10.705/00 (Apelação nº 1015024-46.2013.8.26.0309. 9ª Câmara de Direito Público. Rel. Des. Carlos Eduardo Pachi. j. 09/03/2016)

Por derradeiro, observo que para fins de integral enquadramento à isenção instituída pelo mencionado art. 6º, I, a da Lei Estadual 10.705/2000, deverão as interessadas comprovar perante a autoridade tributária o preenchimento dos demais requisitos previstos na parte final do dispositivo (alusivos à condição de que os “familiares beneficiados nele residam e não tenham outro imóvel”).

Ante o exposto, de rigor a reforma da decisão agravada para reconhecer liminarmente o direito certo à adoção da base de cálculo proporcional à fração do bem efetivamente transmitida às impetrantes, para fins de ulterior enquadramento à hipótese de isenção prevista no art. 6º, I, “a” da Lei Estadual 10.705/2000.

Antecipo-me, por diretiva de economia processual e, sobretudo, visando a agilizar o acesso aos Tribunais Superiores, expender, à guisa de mera recomendação, os principais critérios que ordinariamente balizam esta Relatoria no juízo de admissibilidade dos embargos declaratórios, os quais expressam a compreensão majoritária deste Egrégio Tribunal de Justiça e do A. Superior Tribunal de Justiça e, uma vez observados, prestam-se como roteiro seguro para se suprimir eficazmente o risco de incorrerem as partes na sanção pecuniária estipulada no art. 1.026, parágrafo segundo, do Código de Processo Civil:

I – desnecessidade do enfrentamento pelo magistrado de todas as questões suscitadas pelas partes quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão (STJ, 1ª Seção, EDcl no MS 21.315-DF, Rel. Min. Diva Malerbi, j. 8.6.2016).

II Não se exige enumeração ou interpretação expressa de dispositivos legais, pois…

não cabe esse recurso em matéria cível para o Judiciário mencionar qual a lei, ou o artigo dela, ou da Constituição Federal etc., que esteja a aplicar. Deixar de fazê-lo não é omissão no sentido legal: não existe tal pressuposto para a completude do julgamento cível. Essa subsunção de natureza tópica é assunto para qualquer intérprete. Para a fundamentação do julgado o necessário e suficiente é que se trabalhe mentalmente com os conceitos vigentes contidos no sistema jurídico[1].”

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO.

I – Incabíveis os embargos de declaração se inexiste omissão, obscuridade ou contradição no acórdão recorrido.

II – O Tribunal não fica obrigado a pronunciar-se acerca de todos os artigos de lei invocados pela parte, desde que decida a matéria questionada sob fundamento suficiente para sustentar a manifestação jurisdicional.

III – Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no RMS 11.909/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/09/2005, DJ 26/09/2005, p. 268 o grifo o foi por nós)

III – os embargos de declaração não se prestam à revisão do julgado, posto que pelos quais “não se pede que redecida; pede-se que reexprima”[2] (PONTES DE MIRANDA, Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, Tomo VII, 1975, p. 400):

Embargos de declaração em embargos de declaração em agravo regimental em recurso especial. Repetição de indébito. Restituição por via de precatório. Possibilidade. Matéria decidida pela 1a. seção no REsp 1.114.404/MG, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJ 22/02/2010, sob o regime do art. 543-C do CPC. Inexistência de omissão. Revisão do julgado. Inadmissibilidade. Embargos de declaração da Fazenda Nacional rejeitados.

(…)

4. É da tradição mais respeitável dos estudos de processo que o recurso de Embargos de Declaração, desafiado contra decisão judicial monocrática ou colegiada, se subordina, invencivelmente, à presença de pelo menos um destes requisitos: (a) obscuridade, (b) contradição ou (c) omissão, querendo isso dizer que, se a decisão embargada não contiver uma dessas falhas, o recurso não deve ser conhecido e, se conhecido, deve ser desprovido.

5. Não se presta este recurso sui generis à finalidade de sustentar eventual incorreção do decisum hostilizado ou propiciar novo exame da própria questão de direito material, de modo a viabilizar, em sede processual inadequada, a desconstituição de ato judicial regularmente proferido; no caso, da leitura da extensa peça recursal, observasse claramente ser esse o intuito da embargante.

6. Ante o exposto, rejeitam-se os Embargos Declaratórios. (STJ, EDcl nos EDcl no AgRg no REsp nº 1.086.243/SC, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1ª Turma, j. 5.2.2013 o grifo o foi por nós).

IV – Ainda que se entenda que o julgado contém vícios, o art. 1.025, do Código de Processo Civil é expresso no sentido de que:

Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de préquestionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”.

Ficam as partes notificadas de que, em caso de oposição de embargos declaratórios, o processamento e o julgamento serão realizados por meio de sessão virtual permanente.

Postas tais premissas, por meu voto, dou provimento ao recurso, com observação.

Souza Meirelles

Desembargador Relator

Voto nº 48.144

Agravo de Instrumento nº 2125700-88.2019.8.26.0000

Comarca: São Vicente

Agravantes: Sandra Maria Pegoraro Almeida e Juliana Pegoraro de Almeida

Agravado: Delegado do Posto Fiscal de Santos

Interessado: Estado de São Paulo

DECLARACAO DE VOTO

Concorde com o voto do eminente Desembargador SOUZA MEIRELLES, ilustre Relator sorteado, penso, entretanto, seja meu dever esclarecer que o não acompanho na parte final de sua manifestação, aquela referente à antecipação de seu entendimento acerca dos embargos de declaração.

E assim o faço por entender ser vedado ao Poder Judiciário antecipar-se ao pedido do eventual interessado, pedido cuja formulação ainda nem sequer é possível, por isso que não há como oferecer embargos declaratórios antes de proferido o julgamento.

É do próprio voto do eminente Desembargador Relator o reconhecer estar ele antecipando-se às partes, para estabelecer critérios de admissibilidade de eventuais, futuros e incertos embargos de declaração.

Tais condições, no entanto, não se encontram elencadas no dispositivo legal que trata dos embargos declaratórios (CPC, art. 1.022), decorrendo apenas de construção jurisprudencial e esbarrando na vedação insculpida no inciso XXXV, do artigo 5º, da Constituição Federal.

A advertência quase soa como ameaça ao asseverar que observados os critérios referidos “suprime-se eficazmente o risco da sanção pecuniária estipulada no art. 1 .026, parágrafo segundo, do Código de Processo Civil”.

Estas as razões pelas quais meu voto, embora acompanhe aquele proferido pelo eminente Des. SOUZA MEIRELLES, não o subscreve em relação à prepostera abordagem da questão dos embargos de declaração.

José Orestes de SOUZA NERY, Desembargador

Notas:

[1] EDcl nº 147.433-1/4-01/SP, 2ª Câmara Civil, citados nos EDcl nº 199.368-1, julgado pela 1ª Câmara, Des. Rel. Guimarães e Souza.

[2] PONTES DE MIRANDA, Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, Tomo VII, 1975, p. 400. – – /

Dados do processo:

TJSP – Agravo de Instrumento nº 2125700-88.2019.8.26.0000 – São Vicente – 12ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Souza Meirelles – DJ 16.10.2019

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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