Ação Direta de Inconstitucionalidade – Lei nº 5.772, de 21 de maio de 2015, do município de Sumaré, que “estabelece diretrizes para o tempo de atendimento e acomodações em cartórios no âmbito do município de Sumaré” – Alegado vício de iniciativa – Necessidade de identificar-se o alcance do vocábulo “cartório” empregado pela norma sindicada

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Direta de Inconstitucionalidade nº 2256226-51.2016.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é autor PROCURADOR GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, são réus PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE SUMARÉ e PREFEITO MUNICIPAL DE SUMARÉ.

ACORDAM, em Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “JULGARAM A AÇÃO PROCEDENTE EM PARTE. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), RENATO SARTORELLI, CARLOS BUENO, FERRAZ DE ARRUDA, ARANTES THEODORO, TRISTÃO RIBEIRO, BORELLI THOMAZ, JOÃO NEGRINI FILHO, SÉRGIO RUI, SALLES ROSSI, RICARDO ANAFE, ALVARO PASSOS, AMORIM CANTUÁRIA, BERETTA DA SILVEIRA, SILVEIRA PAULILO, EUVALDO CHAIB, ADEMIR BENEDITO, PEREIRA CALÇAS, XAVIER DE AQUINO, ANTONIO CARLOS MALHEIROS, FERREIRA RODRIGUES, EVARISTO DOS SANTOS, MÁRCIO BARTOLI E JOÃO CARLOS SALETTI.

São Paulo, 16 de agosto de 2017.

FRANCISCO CASCONI

RELATOR

Assinatura Eletrônica

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 2256226-51.2016.8.26.0000

COMARCA: SÃO PAULO

AUTOR: PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

RÉUS: PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE SUMARÉ E PREFEITO DO MUNICÍPIO DE SUMARÉ

VOTO Nº 32.502

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI Nº 5.772, DE 21 DE MAIO DE 2015, DO MUNICÍPIO DE SUMARÉ, QUE “ESTABELECE DIRETRIZES PARA O TEMPO DE ATENDIMENTO E ACOMODAÇÕES EM CARTÓRIOS NO ÂMBITO DO MUNICÍPIO DE SUMARÉ” – ALEGADO VÍCIO DE INICIATIVA – NECESSIDADE DE IDENTIFICAR-SE O ALCANCE DO VOCÁBULO “CARTÓRIO” EMPREGADO PELA NORMA SINDICADA – CARTÓRIOS JUDICIAIS SÃO ÓRGÃOS INTERNOS AO PODER JUDICIÁRIO, SENDO INCONSTITUCIONAL NORMA MUNICIPAL QUE ESTABELEÇA OBRIGAÇÕES E CONDICIONANTES AO SEU FUNCIONAMENTO – CARTÓRIOS EXTRAJUDICIAIS – PARTICULARES EM COLABORAÇÃO COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – EMBORA SUBMETIDO À FISCALIZAÇÃO DO JUDICIÁRIO, CONSTITUCIONAL A NORMA MUNICIPAL QUE DISCIPLINA TEMPO DE ESPERA EM FILA E ACOMODAÇÕES INTERNAS PARA MELHOR ATENDIMENTO DO PÚBLICO ART. 30, INCISO I, CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – PRECEDENTE DO C. STF – INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO – AÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.

Ação de inconstitucionalidade voltada contra a Lei nº 5.772, de 21 de maio de 2015, do Município de Sumaré/SP, que “estabelece diretrizes para o tempo de atendimento eacomodações em cartórios no âmbito do município de Sumaré”.

Delineada causa petendi repousa preponderantemente no alegado vício de iniciativa do Legislativo Municipal para elaboração do ato normativo impugnado, porquanto o tema nele regulado envolve matéria relacionada a serventias judiciais e extrajudiciais, reservada a competência para deflagração do processo legislativo ao Poder Judiciário.

Liminar deferida a fls. 71/72.

Informações prestadas pelo i. Presidente da Câmara Municipal (fls. 82). Apesar de devidamente notificado, o r. Prefeito deixou transcorrer in albis prazo para manifestação (fls. 105 e 116).

Citado, o Procurador-Geral do Estado manifestou-se a fls. 114/115, apontando desinteresse na defesa da lei contrastada, por tratar de matéria exclusivamente local.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça, em parecer encartado a fls. 118/124, reiterando as razões iniciais, insistiu na procedência da ação.

É o Relatório.

Relevante salientar que o parâmetro de aferição da constitucionalidade por este Órgão Especial recai sobre a Constituição do Estado de São Paulo[1].

A Constituição da República assegura, nos artigos 1º e 18, indistinta autonomia político-administrativa aos entes federados, no que se incluem os Municípios, cabendo-lhes instituir a organização de sua estrutura funcional para efetivo exercício da atividade estatal.

Indigitada autonomia organizacional engloba a legislativa, embora ambas não ostentem caráter absoluto, devendo respeito às balizas constitucionais de âmbito estadual e federal, como preveem não só os artigos 29 e 30 da Magna Carta, mas também o artigo 144 da Constituição Estadual:

“Artigo 144 – Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”

Significa dizer, portanto, que a independência legislativa municipal, por força da norma estadual de caráter remissivo (art. 144), deve agir dentro dos limites da competência constitucional atribuída ao ente federativo, observando ainda os princípios estabelecidos nas Constituições Estadual e Federal.

A presente ação direta de inconstitucionalidade tem como objetivo declarar inválida a Lei no 5.772, de 21 de maio de 2015, do Município de Sumaré, que “estabelece diretrizes para tempo de atendimento e acomodações em cartórios no âmbito do Município de Sumaré”, verbis (fls. 2/5):

Art. 1º – Ficam os cartórios, no âmbito do Município de Sumaré, obrigados a colocar à disposição dos usuários, pessoal suficiente em todos os setores de atendimento, para que este seja efetivado em tempo razoável.

Art. 2º – Para os efeitos desta lei, entende-se como tempo razoável para atendimento:

I – Até 30 (trinta) minutos em dias normais;

II – Até 45 (quarenta e cinco) minutos em véspera ou após feriados prolongados;

§1º – Os cartórios e suas entidades representativas informarão ao órgão encarregado de fazer cumprir esta lei as datas mencionadas nos incisos I e II.

§2º – O tempo máximo de atendimento referido nos incisos I e II leva em consideração o fornecimento normal dos serviços essenciais à manutenção do ritmo normal das atividades do cartório tais como energia, telefonia e transmissão de dados.

Art. 3º – Ficam os cartórios instalados no Município de Sumaré, obrigados a manter atendimento de idosos, gestantes, e pessoas com necessidades especiais no piso térreo do prédio onde se encontram instalados.

Art. 4º – Os estabelecimentos descritos no art. 1º desta lei, no âmbito municipal, deverão disponibilizar aos usuários:

I – Bebedouro com água potável;

II – Cadeiras com número suficiente de forma que os usuários aguardem seus atendimentos sentados;

III – Sanitários de uso público e que estejam em condições de uso e sinalizados;

IV – Emissor de senhas para controle de tempo de atendimento;

§1º – O comprovante de atendimento deverá conter:

a. Senha de atendimento;

b. Horário da emissão do comprovante;

c. Campo para inserir horário de atendimento.

§2º – Os estabelecimentos descritos no art. 1º desta lei, no âmbito municipal, deverão entregar um comprovante de atendimento autenticado por um funcionário ou eletronicamente com os horários em que o usuário retirou a senha e o que foi atendido, visando o cumprimento do art. 2º desta lei.

Art. 5º – Os estabelecimentos descritos no art. 1º desta lei, no âmbito municipal, deverão afixar, em local visível, o texto ou cartaz da presente lei, assim como destacar o número de atendimento do PROCON e outros órgãos fiscalizadores pertinentes.

Art. 6º – O não cumprimento das disposições desta lei sujeitará o infrator às seguintes punições:

I – advertência;

II – multa no valor de R$500,00 (quinhentos reais), por informação, podendo ser aplicada em dobro em caso de reincidência.

III – após a 3ª (terceira) reincidência, acarretará na suspensão do Alvará de funcionamento.

Art. 7º – As denúncias dos munícipes, devidamente comprovadas, deverão ser encaminhadas ao Órgão de Fiscalização Municipal ou PROCON, órgão municipal encarregado de zelar pelo cumprimento desta lei, concedendo-se direito de defesa ao cartório ou cartórios denunciados.”

A princípio, necessário identificar-se o sentido e alcance do vocábulo “cartório” empregado na Lei atacada. Conforme informação disponível no sítio eletrônico do Conselho Nacional de Justiça[2]:

“Há dois tipos de cartório: os judiciais e os extrajudiciais. Os primeiros também recebem o nome de varas. Elas são órgãos do Poder Judiciário presididos por juízes, os quais respondem pela guarda e execução de processos judiciais. Os cartórios extrajudiciais são vinculados a um tabelião ou oficial de registro. Eles recebem delegação do poder público para registrar atos extrajudiciais e fornecer certidões.”

Em análise à justificativa da norma sindicada (fls. 23), entende-se que o vocábulo “cartório” faz referência aos serviços extrajudiciais, na medida em que fundamenta sua importância pelo fato de ser “uma instituição essencial para que pessoas e empresas possam oficializar sua documentação […]”.

Ocorre que apesar de a norma ser produto das atividades típicas do Poder Legislativo, a função do Judiciário, como intérprete, é buscar a vontade da Lei (doutrina objetivista), que pode divergir daquela inicialmente adotada pelo legislador, em contraposição à doutrina subjetivista.

Desta feita, apesar de constar na justificativa da Lei a espécie de “cartório” a qual se pretende fazer referência, este apontamento está situado fora do corpo textual da norma, deixando em aberto o alcance e limite do vocábulo empregado, situação apta a gerar incertezas e insegurança jurídica na aplicação do estatuto no caso concreto.

Os cartórios judiciais são órgãos integrantes e internos ao Poder Judiciário, presididos por juízes que exercem diretamente poder hierárquico e disciplinar sobre os serviços e agentes públicos ali lotados. Na hipótese de edição de normas disciplinando o funcionamento de cartórios judicias por iniciativa do Legislativo municipal, patente a interferência e desequilíbrio entre os Poderes, razão pela qual devem ser excluídos os ofícios judiciais da interpretação da Lei, tendo em vista que esta prevê uma série de obrigações aos “cartórios”, cujo descumprimento acarreta sanções administrativas como advertência, multa e até cassação de alvará.

Por outro lado, a titularidade dos cartórios extrajudiciais e registrais apresenta natureza jurídica sui generis, pois exercida por particulares em colaboração com o Poder Público. Conforme Maria Zanella Di Pietro[3]:

“Nesta categoria entram as pessoas físicas que prestam serviços ao Estado, sem vínculo empregatício, com ou sem remuneração. Podem fazê-lo sob títulos diversos, que compreendem:

1 – Delegação do Poder Público, como se dá com os empregados das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, os que exercem serviços notariais e de registro (art. 236 da Constituição).

[…]”

Corroborando a ideia de que os cartórios extrajudiciais não são órgãos do Judiciário:

“Atente-se que não se incluem como órgãos do Judiciário os notários e os registradores, delegados para a prática de serviço público na condição de profissionais privados (operadores do Direito) […].”[4]

Desta feita, quanto aos cartórios extrajudiciais, entendo inexistir inconstitucionalidade da norma sindicada, tendo em vista não tratar de matéria propriamente vinculada aos registros públicos, mas assunto de interesse local, cuja competência legislativa foi atribuída aos Municípios por força do artigo 30, inciso I, da Constituição da República. Nesse mesmo sentido se pronunciou o C. Supremo Tribunal Federal:

“Distrito Federal: competência legislativa para fixação de tempo razoável de espera dos usuários dos serviços de cartórios. 1. A imposição legal de um limite ao tempo de espera em fila dos usuários dos serviços prestados pelos cartórios não constitui matéria relativa à disciplina dos registros públicos, mas assunto de interesse local, cuja competência legislativa a Constituição atribui aos Municípios, nos termos do seu art. 30, I. 2. A LD 2.529/2000, com a redação da LD 2.547/2000, não está em confronto com a Lei Federal 8.935/90 – que disciplina as atividades dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, nos termos do art. 236, § 1º, da Constituição – por tratarem de temas totalmente diversos. 3. RE conhecido e desprovido.”

(STF. Primeira Turma. Recurso Extraordinário no 397.094/DF, rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, j. em 29 de agosto de 2006, destacado).

Anota o E. Relator:

“Relativamente às instituições bancárias, temos precedentes que reconheceram a competência dos Municípios para legislar quanto: a) obrigatoriedade de instalação de dispositivos de segurança (RE 240.406, Velloso, RTJ 189/1.150; 312.050-AgR, 05.04.2005, 2ª T, Celso); b) tempo de espera em fila para atendimento ao público (RE 432.789, 14.06.2005, 1ª T, Eros); instalação de cadeiras de espera (AI 506.487-AgR, 30.11.2004, 2ª T, Velloso); e, por fim, a instalação de bebedouros e sanitários (RE 418.492-AgR, 2ª T, 13.12.2005, Gilmar; e decisões individuais nos RE 208.383, Néri, e AI 347.739, Jobim).

Em todas essas hipóteses, rejeitou-se a alegação de que os Municípios estariam usurpando a competência legislativa da União ou as prerrogativas fiscalizadoras do Banco Central do Brasil.

Do mesmo modo, não há falar em violação do art. 22, XXV, da Constituição Federal, uma vez que a imposição legal de um limite ao tempo de espera em fila dos usuários dos serviços prestados pelos cartórios não constitui matéria relativa à disciplina dos registros públicos, mas assunto de interesse local, cuja competência legislativa a Constituição atribui aos Município, nos termos do seu art. 30, I.

E nem se diga que o disposto na LD 2.529/2000, com a redação da LD 2.547/2000, estaria em confronto com a Lei Federal 8.935/90 que disciplina as atividades dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, nos termos do art. 236, §1º, da Constituição , por tratarem de temas totalmente diversos.”

No mais, colhe-se do voto do E. Ministro Carlos Augusto Ayres de Freitas Britto:

“Senhor Presidente, como falou o Subprocurador-Geral da República, Dr. Rodrigo Janot, aqui oficiante, cuida-se, no caso, de uma legislação de contorno, uma legislação lateral, ou seja, atua a latere do conteúdo da atividade notarial e de registro. O Ministro Sepúlveda Pertence também deixou claro que as coisas são diferentes.

Também, com o devido respeito ao advogado, que tão bem se houve no uso da tribuna, o fato de cartório não ser pessoa jurídica não descaracteriza essa relação com sua clientela vou chamar de clientela , porque não pode ser mesmo pessoa jurídica, esta não faz concurso público, e a Constituição prevê que a delegação se faz a um agente habilitado em concurso público de provas ou de provas e títulos. Aliás, um dos traços distintivos da atividade notarial e de registro é que ela é atividade pública, sim, porém não propriamente um serviço público, porque o serviço público, quando trespassado para a iniciativa privada, viabiliza-se por um contrato, seja de permissão, seja de concessão, assinado como empresa; aqui, a delegação não contempla nenhuma empresa, mas, sim, uma pessoa natural que se habilita em concurso público de provas e títulos.

Acompanho o voto do eminente Relator integralmente.”

Registre-se, ainda, que Leis regulando tempo de espera e acomodações em cartórios extrajudiciais são encontradas em Municípios espalhados por todo o Brasil como, por exemplo, em Goiânia/GO (Lei no 9.271/13)[5], Teresina/PI (Lei no 4.368/13)[6], Curitiba/PR (Lei no 14.576/14)[7], Juiz de Fora/MG (Lei no 13.126/15)[8] e Rio Branco/AC (Lei no 2.117/15)[9].

Meu voto, portanto, julga procedente em parte a pretensão para conferir interpretação conforme a Constituição, no sentido de que o vocábulo “cartório” empregado pela norma compreende apenas os extrajudiciais, ou seja, aqueles vinculados a um tabelião ou oficial de registro, afastada qualquer interpretação que faça incidir a Lei sobre os cartórios judiciais ou outros órgãos internos do Poder Judiciário.

Des. FRANCISCO CASCONI

Relator

Assinatura Eletrônica


Notas:

[1] Exceção refere-se às normas previstas na Constituição da República de reprodução obrigatória pelos Estados, situação em que é permitido à Corte local utilizar-se do parâmetro constitucional federal, conforme recente entendimento adotado pela Corte Suprema em regime de repercussão geral (STF. Recurso Extraordinário no 650898-RS, Plenário. Rel. originário Min. Marco Aurélio, Rel. para acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 01 de fevereiro de 2017, repercussão geral).

[2] In. http://cnj.jus.br/ouvidoria-page/carta-de-servicos-ao-cidadao/83913-cartorios-judiciais-eextrajudiciais-2

[3] In. Direito Administrativo, São Paulo: Editora Atlas, 2014, 27 ed., p. 603.

[4] In. “Comentários à Constituição do Brasil”, coordenação científica de J.J. GOMES CANOTILHO, GILMAR FERREIRA MENDES, INGO WOLFGANG SARLET E LENIO LUIZ STRECK, Ed. Saraiva, 5ª tiragem, 2014, págs. 2162 e 2163.

[5] In. http://www.goiania.go.gov.br/html/gabinete_civil/sileg/dados/legis/2013/lo_20130527_000009271.html

[6] In. https://leismunicipais.com.br/a/pi/t/teresina/lei-ordinaria/2013/437/4368/lei-ordinarian-4368-2013-fica-estabelecido-no-ambito-do-municipio-de-teresina-o-tempo-limite-deatendimento-aos-usuarios-dos-cartorios-de-notas-e-registros-de-imoveis-para-os-servicos-deautenticacao-de-documentos-e-reconhecimentos-de-firmas-e-da-outras-providencias

[7] In. https://leismunicipais.com.br/a/pr/c/curitiba/lei-ordinaria/2014/1458/14576/lei-ordinarian-14576-2014-dispoe-sobre-o-tempo-maximo-para-atendimento-aos-clientes-em-cartoriospublicos-e-da-outras-providencias

[8] In. http://www.camarajf.mg.gov.br/sal/norma.php?njt=LEI&njn=13126&njc=

[9] In. http://portalcgm.riobranco.ac.gov.br/lai/wp-content/uploads/2015/02/LEI-N%C2%BA-2.117-de-07-de-Julho-de-2015-Disp%C3%B5e-sobre-o-tempo-m%C3%A1ximo-para-atendimento-aosclientes-em-Cart%C3%B3rios-no-Munic%C3%ADpio-de-Rio-Branco.pdf

Dados do processo:

TJSP – Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2256226-51.2016.8.26.0000 – São Paulo – Órgão Especial – Rel. Des. Francisco Casconi – DJ 21.08.2017

Fonte: INR Publicações.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de dação em pagamento – Qualificação negativa – Questionamento a respeito da base de cálculo utilizada para recolhimento do imposto sobre transmissão de bens móveis – ITBI – Análise pela oficial registradora, na matéria concernente ao imposto de transmissão, que deve se ater ao seu recolhimento, sem alcançar o valor – Não configuração de flagrante irregularidade no recolhimento – Recolhimento antecipado de ITBI que não afronta as NSCGJ – Precedente do C. Conselho Superior da Magistratura – Dúvida julgada improcedente para afastar a exigência de recolhimento de alegada diferença do imposto devido à Municipalidade – Apelação não provida.

Apelação nº 1024222-11.2015.8.26.0577

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1024222-11.2015.8.26.0577
Comarca: SÃO JOSÉ DOS CAMPOS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1024222-11.2015.8.26.0577

Registro: 2018.0000429243

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 1024222-11.2015.8.26.0577, da Comarca de São José dos Campos, em que é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO EST. DE SP, é apelado PROGRESSO EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento à apelação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 24 de maio de 2018.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1024222-11.2015.8.26.0577

Apelante: Ministério Público do Estado de São Paulo

Apelado: Progresso Empreendimentos Imobiliários Ltda.

VOTO Nº 37.345

Registro de Imóveis – Escritura pública de dação em pagamento – Qualificação negativa – Questionamento a respeito da base de cálculo utilizada para recolhimento do imposto sobre transmissão de bens móveis – ITBI – Análise pela oficial registradora, na matéria concernente ao imposto de transmissão, que deve se ater ao seu recolhimento, sem alcançar o valor – Não configuração de flagrante irregularidade no recolhimento – Recolhimento antecipado de ITBI que não afronta as NSCGJ – Precedente do C. Conselho Superior da Magistratura – Dúvida julgada improcedente para afastar a exigência de recolhimento de alegada diferença do imposto devido à Municipalidade – Apelação não provida.

Trata-se de recurso de apelação [1] interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas de São José dos Campos SP, que julgou improcedente a dúvida registrária e afastou o óbice imposto pela registradora referente à exigência de recolhimento da diferença devida a título de ITBI [2]. Alega, em síntese, que à registradora compete realizar rigorosa fiscalização do recolhimento dos tributos incidentes sobre o ato a ser registrado, sob pena de, não o fazendo, ser responsabilizada civil e até criminalmente. Sustenta que o registro deve ser recusado em situações excepcionais, como ocorre no caso concreto em que a diferença a recolher é significativa, de forma que a exigência formulada pela registradora deve ser mantida.

A apelada apresentou contrarrazões [3].

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento da apelação [4].

A apelada, então, reiterou suas anteriores manifestações nos autos [5].

É o relatório.

O dissenso versa sobre a possibilidade de registro da Escritura de Dação em Pagamento, lavrada em 08 de julho de 2015, tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 97.682, dado em pagamento por Jenny Velloso para Progresso Empreendimentos Imobiliários Ltda., pelo valor de R$ 81.645,00, em troca de participação societária no percentual indicado no Instrumento Particular de Constituição de Sociedade em Conta de Participação firmado pelas partes.

A Ofícial do 1º Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas de São José dos Campos SP desqualificou o título e exigiu o recolhimento da diferença do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis ITBI devido à Prefeitura Municipal de São José dos Campos, referente ao negócio jurídico celebrado, em montante a ser calculado com base no valor venal do imóvel. Aduz a registradora que a certidão de quitação de ITBI apresentada com o título refere-se ao recolhimento realizado em 23 de janeiro de 2015, data em que o imóvel ainda se encontrava cadastrado como rural e, portanto, tendo como base de cálculo o valor da transação, ou seja, R$ 81.645,00. Ocorre que, no momento da transmissão da propriedade, o imóvel já havia passado a ser considerado urbano, o que enseja a mudança da base de cálculo para o pagamento do imposto, na medida em que o valor venal do imóvel excede o valor da transação (art. 5º da Lei Complementar Municipal nº 383/2009).

A exigência formulada pela Oficial para registro do título, contudo, não se sustenta. Este C. Conselho Superior da Magistratura vem decidindo que ao registrador compete verificar tão somente o recolhimento dos tributos relativos aos atos cuja prática lhe é atribuída, pois não lhe cabe discutir o valor recolhido, matéria de interesse exclusivo da Fazenda Pública, a quem a lei reserva os meios próprios para haver do contribuinte diferenças de recolhimento de impostos que entenda devidas. Sobre o tema:

“Assentou-se orientação, neste Conselho Superior, no sentido de que o elastério conferido ao artigo 289 da Lei 6.015/73, e agora ao artigo 30, XI, da Lei 8.935, é o de que ao serventuário compete verificar tão só a ocorrência do pagamento do imposto relativo aos atos cuja prática lhe é acometida. Ou seja, no caso, em que se busca a prática de ato registrário, a qualificação do Oficial, na matéria concernente ao imposto de transmissão, não vai além da aferição sobre seu recolhimento, e não sobre a integralidade de seu valor. Com efeito, qualquer diferença de imposto deve ser reclamada pela Fazenda na esfera própria [6].”

Na mesma linha, foi decidido no julgamento da Apelação nº 0002604-73.2011.8.26.0025, em voto da lavra do então Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça, Desembargador José Renato Nalini, que:

“A falha apontada pelo Oficial envolve questão de questionamento no âmbito do direito material.

Não foi atacada a regularidade formal do título nem mesmo a temporalidade do recolhimento ou o ato em si. Ao contrário, a exigência envolve exame substancial do montante do pagamento do imposto devido, que é atribuição dos órgãos fazendários competentes, sendo que seu questionamento mereceria a participação da Fazenda Pública, principal Interessada.

Ao Oficial cabe fiscalizar, sob pena de responsabilização pessoal, a existência da arrecadação do imposto previsto e a oportunidade em que foi efetuada. O montante, desde que não seja flagrantemente equivocado, extrapola a sua função.

Neste sentido é o parecer da D. Procuradora de Justiça, citando precedente deste E. Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível 996-6/6, de 09/12/2008).”

Desse modo, extrapolou a registradora suas atribuições, pois não lhe cabe atuar como agente fiscal, exigindo a complementação do imposto pago.

Veja-se que, no caso concreto, o valor da transação que constou na escritura de dação em pagamento foi o mesmo utilizado para o cálculo do ITBI (R$ 81.645,00), lançado em 12 de janeiro de 2015, quando o imóvel ainda estava cadastrado como rural junto ao INCRA.

E muito embora a Escritura de Dação em Pagamento somente tenha sido lavrada em 08 de julho de 2015 [7], ou seja, meses depois do recolhimento do imposto de transmissão, já decidiu este C. Conselho Superior da Magistratura pela inexistência de irregularidade nessa hipótese. A propósito, merece ser transcrito trecho de voto proferido então Corregedor Geral de Justiça, Desembargador Pereira Calças, ao analisar caso bastante semelhante envolvendo recolhimento de ITBI na Comarca de São José dos Campos/SP:

“Dispõe o item 15 do Capítulo XIV das NSCGJ:

15. O Tabelião de Notas manterá arquivos para os seguintesdocumentos necessários à lavratura dos atos notariais, em papel, microfilme oudocumento eletrônico:

(…);

b) comprovante ou cópia autenticada do pagamento do Imposto sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis, de direitos reais sobre imóveis e sobre cessão de direitos a sua aquisição ITBI e do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação ITCMD, quando incidente sobre o ato, ressalvadas as hipóteses em que a lei autorize a efetivação do pagamento após a sua lavratura;

Pelas Normas de Serviço, salvo autorização legal expressa, o comprovante de recolhimento de ITBI deve ser apresentado no momento da lavratura da escritura de compra e venda.

Assim, ainda que o fato gerador do ITBI ocorra somente com a transmissão da propriedade o que ocorre com o registro do título na serventia imobiliária , fato é que as NSCGJ exigem que o tributo seja recolhido, em regra, de forma antecipada, no caso, antes mesmo da lavratura da escritura Pública (…)” (grifo no original) [8].

Destarte, segundo as NSCGJ, o comprovante de recolhimento de imposto de transmissão de bens imóveis, salvo autorização legal expressa, deve ser apresentado no momento da lavratura do ato notarial. Ou seja, o recolhimento do tributo, em regra, é feito antes mesmo da ocorrência do fato gerador do ITBI, ou seja, da transmissão da propriedade do imóvel o que se dá com o registro do título no fólio real.

E tal como no precedente transcrito, também aqui o recolhimento não foi feito em data aleatória, mas sim, em 23 de janeiro de 2015, ou seja, poucos dias após a assinatura da minuta do contrato constitutivo de sociedade em conta de participação [9]. Por outro lado, foi apresentada certidão expedida pela Prefeitura de São José dos Campos/SP, atestando a inexistência de débitos tributários relativos ao imóvel em questão [10].

Nesse cenário, caberá apenas ao Município, se constatado recolhimento a menor, efetuar o lançamento da diferença e se valer dos meios adequados para a respectiva cobrança.

Por conseguinte, não estando configurado flagrante equívoco no recolhimento do ITBI, correto o afastamento do óbice ao registro, devendo ser mantida a sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente.

Nesses termos, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator


Notas:

[1] Fls. 128/129.

[2] Fls. 120/122.

[3] Fls. 133/147.

[4] Fls. 170/171.

[5] Fls. 174/192.

[6]CSMSP – APELAÇÃO CÍVEL: 28.382-0/7. LOCALIDADE: São Paulo. DATA JULGAMENTO: 28/09/1995. DATA DJ: 07/12/1995. Relator: Antônio Carlos Alves Braga. No mesmo sentido: Apelação Cível n.º 22.679-0/9.

[7] Fls. 10/16.

[8]TJSP – Apelação nº: 1024158-98.2015.8.26.0577 – Relator(a): Pereira Calças – Comarca: São José dos Campos – Órgão julgador: Conselho Superior de Magistratura – Data do julgamento: 25/08/2017 – Data de publicação: 30/08/2017 – Data de registro: 30/08/2017.

[9] Fls. 57/68.

[10] Fls. 17/19. (DJe de 26.07.2018 – SP)

Fonte: INR Publicações | 30/07/2018.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Formal de Partilha – Herdeiros que se declararam como mantenedores de uniões estáveis – Princípio da especialidade subjetiva – Herdeiros que devem ser qualificados com as indicações de seus estados civis – Necessidade, ainda, de apresentação das anuências dos respectivos companheiros com as declarações de uniões estáveis, uma vez que, no presente caso concreto, não participaram da ação de inventário – Dúvida procedente, mas por fundamento distinto daquele adotado pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis para a recusa do registro – Recurso não provido, com determinação.

Apelação nº 1101111-45.2016.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1101111-45.2016.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1101111-45.2016.8.26.0100

Registro: 2018.0000272836

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1101111-45.2016.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO EST. DE SP, é apelada IVANICE SERAFIM PEREIRA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso para manter o julgamento de procedência da dúvida e, portanto, a negativa de registro do formal de partilha, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 10 de abril de 2018.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1101111-45.2016.8.26.0100

Apelante: Ministério Público do Estado de São Paulo

Apelado: Ivanice Serafim Pereira

VOTO Nº 37.294

Registro de Imóveis – Formal de Partilha – Herdeiros que se declararam como mantenedores de uniões estáveis – Princípio da especialidade subjetiva – Herdeiros que devem ser qualificados com as indicações de seus estados civis – Necessidade, ainda, de apresentação das anuências dos respectivos companheiros com as declarações de uniões estáveis, uma vez que, no presente caso concreto, não participaram da ação de inventário – Dúvida procedente, mas por fundamento distinto daquele adotado pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis para a recusa do registro – Recurso não provido, com determinação.

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra a sentença de fls. 314/319 que julgou “parcialmente procedente” dúvida suscitada e manteve a recusa ao registro de formal de partilha que abrange imóvel objeto da matrícula 76.002 do 8º Oficial de Registro de Imóveis da Capital.

Sustentou o apelante, em resumo, que a dúvida deve ser julgada procedente, mantendo-se o óbice ao registro do formal de partilha. Entende o recorrente que a qualificação de união estável a partir de simples declaração dos interessados é incompatível com o sistema registral imobiliário e que, por essa razão, é imprescindível a formalização da união estável e seu registro antes do ingresso do formal de partilha no fólio real. Caso optem por manter a união estável na informalidade, sugere que retifiquem o estado civil constante do formal de partilha.

A Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 340/342).

É o relatório.

Nas primeiras declarações apresentadas no arrolamento dos bens deixados pelo falecimento de Maria Alexandre Pereira foram: a) o herdeiro Nilo Serafim Pereira qualificado como companheiro de Maria Edeniuda da Silva; b) a herdeira Ivanice Serafim Pereira como companheira de Laércio Ferreira dos Santos; c) a herdeira Creuzenice Serafim Pereira como companheira de Salviano da Silva Cruz (fls. 21).

Diante da qualificação desses herdeiros, o Sr. Oficial de Registro de Imóveis negou o ingresso do formal partilha pela ausência do prévio registro de escritura declaratória de união estável no Registro de Imóveis da comarca do domicílio dos companheiros, ou de prévio registro de escritura declaratória de união estável no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais.

A interpretação adotada pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis encontra respaldo nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça que em seu Capítulo XX determinam que será averbada na matrícula do imóvel a união estável declarada judicialmente ou estabelecida por escritura pública registrada no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais (item 11, “b”, 5), e prosseguem dispondo:

85. As escrituras antenupciais e as escrituras públicas que regulem regime de bens na união estável serão registradas no Registro de Imóveis da comarca em que os cônjuges ou companheiros têm ou tiverem seu último domicílio sem prejuízo de sua averbação obrigatória no lugar da situação dos imóveis de propriedade ou dos que forem sendo adquiridos.

85.1. O registro da convenção antenupcial ou da escritura pública envolvendo regime de bens na união estável mencionará, obrigatoriamente, os nomes e a qualificação dos cônjuges ou companheiros, as disposições ajustadas quanto ao regime de bens e a data em que se realizou o casamento ou da escritura pública, constante de certidão que deverá ser apresentada com a escritura. Se essa certidão não for arquivada em cartório, deverão ainda ser mencionados no registro o cartório em que se realizou o casamento, o número do assento, o livro e a folha em que tiver sido lavrado ou do registro da escritura envolvendo a união estável no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais“.

Porém, respeitados os entendimentos em sentido contrário, considerado que a matéria comporta nova interpretação.

São requisitos da união estável a convivência pública, contínua e duradoura entre duas pessoas, estabelecida com o objeto de constituição de família, ou como previsto no art. 1723 do Código Civil:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família

§ 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.

§ 2o As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável“.

Os requisitos enumerados no Código Civil para a constituição de união estável não contemplam a celebração de ato formal, ou a realização de cerimônia revestida de formalidades específicas.

Diante disso, e ao contrário do casamento, a união estável tem como característica própria a informalidade, ou informalismo, para a sua formação.

A ausência de formalismo, ademais, é apontada por Euclides de Oliveira como um dos requisitos da união estável (“União Estável: do concubinato ao casamento: antes e depois do Código Civil”, 6º ed., São Paulo: Editora Método, 2003, p. 122), esclarecendo o autor:

A união estável é tipicamente livre na sua formação. Independe de qualquer formalidade, bastando o fato em si, de optarem, homem e mulher, por estabelecer vida em comum. Bem o diz ANTONIO CARLOS MATHIAS COLTRO, assinalando que a união de fato se instaura ‘a partir do instante em que resolvem seus integrantes iniciar a convivência como se fossem casados, renovando dia a dia tal conduta, e recheando-a de afinidade e afeição, com vistas à manutenção da intensidade.

Na união estável basta o mútuo consentimento dos conviventes, que se presume do seu comportamento convergente e da contínua renovação pela permanência” (Euclides de Oliveira, obra citada, p. 124).

A informalidade para a constituição da união estável, entretanto, convive com a exigência de observação de formas específicas para que certos atos e negócios jurídicos produzam os efeitos que deles se pretende.

Assim ocorre, em especial, quanto aos atos e negócios jurídicos que têm como característica a constituição de direitos reais sobre imóveis que são oponíveis “erga omnes” por força da publicidade decorrente de seu registro.

Desse modo, para o julgamento da dúvida suscitada, devem ser diferenciados os atos e negócios jurídicos relacionados aos direitos da personalidade cuja oponibilidade em relação a terceiros prescindem de cerimônia e forma prescritas em lei, como ocorre com a constituição de família por meio da união estável, e os atos e negócios jurídicos que demandam publicidade específica, por meio de sua inscrição em Registro Público, como ocorre com os direitos reais imobiliários.

O que se pretende, in casu, é por meio do registro de formal de partilha torna público o direito de propriedade que foi adquirido pelos herdeiros por meio de sucessão hereditária e, assim, conferir ao referido direito oponibilidade “erga omnes”.

Para isso, deverão os herdeiros ser qualificados com indicação de seus estados civis (art. 176, § 1º, III, 2, “a”, da Lei nº 6.015/74).

E para efeito de registro deverá ser entendimento como estado civil o de solteiro, casado, viúvo, separado e divorciado, não o constituindo, portanto, o de “companheiro”, embora possa essa qualidade ser indicada tanto em atos e negócios jurídicos como nos documentos e registros que deles decorrerem.

Portanto, para efeito de registro imobiliário, permanece aplicável a lição de Irineu Antonio Pedrotti:

A qualificação do homem e da mulher compreende nacionalidade, naturalidade, filiação, estado civil, RG, CPF/MF, domicílio, residência, e outros caracteres subsidiários. Como estado civil pode dizer que é solteiro, casado, viúvo, separado consensual ou judicialmente (anteriormente desquitado amigável ou judicialmente), divorciado amigável ou judicialmente.

Mas, agora, com a Constituição de 1988, não poderá dizer unido estavelmente?

E, esse estado não demonstra a entidade familiar dada pela nova norma constitucional?

O concubinato e/ou a sociedade de fato, e/ou a união estável não cria, em verdade um estado civil e nem modifica a condição jurídica que a pessoa tem. Tratandose que alguém que viva more uxório será considerado concubino, companheiro, unido estavelmente, por se encontrar configurada essa situação jurídica.

Pode-se usar a expressão unido estavelmente para demonstrar a existência de uma entidade familiar, autorizada pelo preceito constitucional…” (“Concubinato – União Estável”, 4º ed., São Paulo: LEUD, 1999, p. 203/204).

A necessidade de indicação do estado civil do titular do direito real permanece presente porque a união estável pode coexistir com o casamento, desde que constituída com pessoa separada de fato, como previsto no § 1º do art. 1.723 do Código Civil:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente“.

Em outros termos, a união estável pode ser mantida tanto entre duas pessoas solteiras, viúvas, separadas ou divorciadas, como entre pessoas casadas, desde que separadas de fato de seus respectivos cônjuges.

Bem por isso, não há como admitir no Registro Imobiliário que tem como finalidade precípua a de promover a publicidade dos direitos reais inscritos, com estrita observação do princípio da especialidade subjetiva para que possam produzir efeitos “erga omnes”, que o titular de direito dessa natureza seja qualificado simplesmente como “companheiro”, ou “em união estável”, sem que se indique seu real estado civil que pode, em tese, ser o de casado.

Em sendo casado não poderá o titular do direito real ser, ao mesmo tempo, qualificado como “companheiro” ou “em união estável”, ressalvado prévio reconhecimento judicial da existência da união estável, porque o Registro de Imóveis não comporta a simultânea inscrição de direitos de propriedade que sejam conflitantes entre si.

Desse modo, ou titular do direito é qualificado no Registro de Imóveis como solteiro, viúvo, separado ou divorciado e mantendo união estável, do que não decorrerá eventual direito conflitante entre eventual cônjuge e companheiro, ou é casado e, em consequência, não poderá ser qualificado também como “em união estável”, pois neste caso os direitos do cônjuge e do companheiro poderão ser incompatíveis entre si, exceto se o reconhecimento da união estável decorrer de ação judicial que atinja o imóvel.

Por todos esses motivos, o Provimento nº 37/2004 da Eg. Corregedoria Nacional de Justiça delimita seu alcance e efeitos e discrimina as diferentes hipóteses para registro da união estável no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais.

Em razão da informalidade para sua constituição e, em regra, para sua dissolução, o art. 1º do Provimento nº 37/2004 da Corregedoria Nacional de Justiça prevê que o registro da união estável no Registro Civil das Pessoas Naturais é faculdade dos companheiros:

Art. 1º. É facultativo o registro da união estável prevista nos artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil, mantida entre o homem e a mulher, ou entre duas pessoas do mesmo sexo“.

Sendo facultativo, não deve esse registro ser exigido para que um dos companheiros, ou ambos, pratiquem atos ou negócios jurídicos compatíveis com a autonomia da vontade.

Também em decorrência da informalidade para sua constituição e dissolução, e por independer de outra publicidade para sua existência, o art. 5º do Provimento nº 37/2004 da Corregedoria Nacional de Justiça determina que o registro da união estável no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais produzirá efeitos patrimoniais entre os companheiros, não prejudicando terceiros que não tiverem participado da escritura pública:

Art. 5º. O registro de união estável decorrente de escritura pública de reconhecimento ou extinção produzirá efeitos patrimoniais entre os companheiros, não prejudicando terceiros que não tiverem participado da escritura pública“.

Por seu turno, para preservação da segurança jurídica que os registros públicos visam proporcionar nas relações sociais, o art. 8º do Provimento nº 37/2004 da Corregedoria Nacional de Justiça determina que a união estável com pessoa casada não poderá ser inscrita no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais, exceto se separada judicial ou extrajudicialmente, ou se a declaração da união estável decorrer de sentença judicial transitada em julgada:

Art. 8º. Não poderá ser promovido o registro, no Livro E, de união estável de pessoas casadas, ainda que separadas de fato, exceto se separadas judicialmente ou extrajudicialmente, ou se a declaração da união estável decorrer de sentença judicial transitada em julgado“.

Ao delimitar o alcance e os efeitos, e discriminar as hipóteses em que admitido o registro da união estável no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais, o Provimento nº 37/2014 da Eg. Corregedoria Nacional de Justiça serve de parâmetro para o ingresso união estável nos demais Registros Públicos que, como exposto, não pode ser causa para a concomitante inscrição de direitos reais de igual natureza, entre cônjuge e companheiro, que sejam conflitantes entre si.

Portanto, a meu ver, esses parâmetros devem nortear a fixação dos requisitos para o ingresso, no Registro de Imóveis, de título em que o titular do direito inscrito se qualifique como “companheiro”, ou “em união estável”.

O primeiro requisito é que a existência da união estável decorra de declaração conjunta dos companheiros, ou de sentença judicial transitada em julgado.

Assim porque a declaração unilateral de vontade, ou seja, de que é ou foi mantida união estável, somente obriga quem a realizou, sem criar ou prejudicar direito de terceiro que dela não tiver participado.

É também necessário que conste no título o real estado civil do titular do direito, ou seja, solteiro, casado, viúvo, separado ou divorciado.

Não sendo casado, não há vedação para que o titular de direito inscrito seja qualificado conforme seu estado civil, com indicação de que mantém união estável desde que também constem no registro o nome do respectivo companheiro e o restante de sua qualificação.

Em sendo o titular do direito casado ao tempo da aquisição do direito real, sua inscrição no Registro Imobiliário com indicação de que mantém união estável e consignação do nome e qualificação do companheiro dependerá da apresentação de prova de que a união estável foi declarada por sentença judicial transitada em julgado, em que reconhecido que se trata de bem comum dos companheiros, podendo essa prova ser feita por certidão do processo ou por demonstração do registro da união estável no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais, pois esse registro também dependerá da prova da declaração judicial da união estável.

Outra situação possível é da aquisição de bem a título oneroso por companheiro que seja casado, com posterior averbação de separação ou divórcio. Nesse caso, a averbação da existência da “união estável”, com o nome e qualificação do companheiro, poderá ser feita depois do registro da partilha decorrente da dissolução do casamento, observando-se, sempre, que a declaração da existência da união estável dependerá de ato bilateral, ou seja, deverá ser feita pelos dois companheiros, ou deverá decorrer de sentença transitada em julgado em que reconhecido que se trata de bem comum entre os companheiros.

Além disso, em todas as hipóteses em que admitida a inscrição da união estável deverá constar no registro do imóvel o regime de bens adotado caso diverso da comunhão parcial de bens que é o regime legal (art. 1.725 do Código Civil), sendo que no silêncio presumir-se-á o regime de comunhão parcial.

Observados os requisitos que forem imprescindíveis para a inscrição da união estável sem risco de inscrição de presumidos direitos de propriedade conflitantes, e diante da informalidade para sua constituição e dissolução, não se mostra necessária a prévia obrigação de registro de escritura pública declaratória no Registro de Imóveis, como se se tratasse de pacto antenupcial, ou de prévio registro no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais, exceto se esse registro for utilizado como prova de que a união estável foi declarada por meio de sentença judicial transitada em julgado no caso de um dos companheiros ser casado.

Outro requisito, consistente na apresentação dos documentos necessários à confirmação da qualificação dos companheiros, exceto se já apresentados ao Tabelião de Notas que tiver lavrado escritura pública que for levada à registro, foi indicado na bem fundamentada r. sentença objeto do recurso, da lavra da MM. Juíza Corregedora Permanente, Dra. Tânia Mara Ahuali.

Resta, por fim, apreciar o resultado da qualificação tendo em conta o formal de partilha apresentado para registro.

Neste caso concreto, os herdeiros que se identificaram como mantedores de uniões estáveis não estão qualificados com os seus respectivos estados civis, e somente Ivanice e seu companheiro Laércio apresentaram declaração conjunta confirmando a existência de união estável (fls. 257).

A declaração de fls. 265 não foi prestada pelos demais herdeiros e respectivos companheiros e, em consequência, não se presta como prova da união estável para efeito de registro.

Destarte, não se encontra obstáculo para o registro de título em que os adquirentes do direito a ser inscrito sejam identificados como mantedores de união estável, independentemente do prévio registro da união estável no Livro nº 3 – Registro Auxiliar, do Registro de Imóveis do domicílio dos companheiros, ou no Livro “E” do Registro Civil das Pessoas Naturais, desde que observados os requisitos indicados, o que, in casu, não ocorre.

Ante o exposto, pelo meu voto nego provimento ao recurso para manter o julgamento de procedência da dúvida e, portanto, a negativa de registro do formal de partilha.

Ainda, determino a remessa de cópia do v. acórdão à Corregedoria Geral da Justiça, para estudos visando eventual revisão das Normas de Serviço.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 26.07.2018 – SP)

Fonte: INR Publicações.

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