Promitente comprador não é obrigado a pagar cotas condominiais antes da imissão na posse

O promitente comprador de imóvel só passa a ser responsável pelo pagamento das cotas de condomínio após a imissão na posse do bem. É a partir daí que ele passa a exercer o domínio direto sobre o imóvel, usufruindo dos serviços prestados pelo condomínio, o que justificaria sua contribuição. Até então, pagar a taxa é obrigação do promitente vendedor. 

A tese foi aplicada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento de um recurso especial em ação que discutiu de quem é a responsabilidade pelo pagamento das cotas condominiais relativas ao período que antecedeu a imissão na posse do imóvel: do atual proprietário, à época promitente comprador do bem, ou do antigo dono. 

A peculiaridade do caso é que o compromisso de compra e venda tinha cláusula que dispunha sobre a responsabilidade do compromissário comprador pelo pagamento das cotas, desde sua assinatura. 

Ainda assim, seguindo o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, a Turma entendeu que a existência de eventual cláusula que atribua ao promitente comprador a responsabilidade pelo pagamento das cotas, quando não há imissão na posse do bem, obriga somente os contratantes e poderá fundamentar o exercício do direito de regresso, mas não vincula o condomínio. 

Obrigação propter rem 

No caso analisado, para obter o pagamento de cotas em atraso, o condomínio ajuizou duas ações de cobrança: uma contra o comprador e, posteriormente, outra contra o antigo proprietário do imóvel. A dívida era relativa ao período entre a assinatura do compromisso de compra e venda e a imissão na posse. 

Na primeira ação – do condomínio contra o compromissário comprador –, verificou-se que, na realidade, quem possuía legitimidade passiva e responsabilidade pelo pagamento da dívida era o promitente vendedor. A decisão, transitada em julgado, levou em consideração a natureza propter rem da obrigação, porque o vendedor, além de proprietário do bem, conforme registro imobiliário, era quem exercia o domínio direto. 

Pelo princípio da obrigação propter rem, responde pelo dever de pagar as cotas condominiais, na proporção de sua fração ideal, aquele que possui a unidade e que efetivamente exerce os direitos e obrigações de condômino. A dívida, assim, pertence à unidade imobiliária e deve ser assumida pelo propietário ou pelo titular dos direitos sobre a unidade. 

Para a ministra Nancy Andrighi, se foi comprovada na primeira ação de cobrança a inexistência da obrigação do compromissário comprador quanto ao pagamento das cotas condominiais (porque não houve imissão na posse do bem), não se pode afirmar agora o contrário apenas porque ele é, atualmente, o efetivo proprietário do bem ou porque assumira essa responsabilidade no compromisso de compra e venda. 

Relação material 

Segundo a relatora, o que define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais não é o registro do compromisso de venda e compra, mas a relação jurídica material com o imóvel, representada pela imissão na posse e pela ciência do credor acerca da transação. 

Não tendo havido a imissão na posse do compromissário comprador, o promitente vendedor continua a exercer, portanto, o domínio direto sobre o imóvel, usufruindo dos serviços prestados pelo condomínio, os quais justificam a sua contribuição. 

“Embora o registro do compromisso firmado em caráter irrevogável e irretratável na matrícula do imóvel seja apto a constituir o direito real à aquisição do bem, no entendimento desta corte ele não implica necessariamente a obrigação de prestação condominial”, explicou a ministra.

Dessa forma, a Turma negou o recurso e manteve a decisão que atribuiu ao antigo proprietário a responsabilidade pelas cotas de condomínio anteriores à imissão na posse do imóvel pelo comprador. 

Esta notícia se refere ao processo: REsp 1297239.

Fonte: STJ | 07/05/2014.

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Jurisprudência mineira – Embargo de terceiro – Penhora sobre imóvel em nome do cônjuge adquirido na constância do casamento – Cerceamento de defesa – Ausência de prova de doação

Jurisprudência Cível

EMBARGOS DE TERCEIRO – PENHORA SOBRE IMÓVEL EM NOME DO CÔNJUGE ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO – CERCEAMENTO DE DEFESA – AUSÊNCIA DE PROVA DE DOAÇÃO – DÍVIDA CONTRAÍDA ANTES DO CASAMENTO – OBRIGAÇÃO QUE NÃO SE COMUNICA – REDUÇÃO DA PENHORA COM EXCLUSÃO DA MEAÇÃO PERTENCENTE À EMBARGANTE

– Uma vez ausente a intimação das partes para depoimento pessoal, em razão da falta de pagamento de verba indenizatória do oficial de justiça, preclusa a oportunidade para a produção da prova.

– Se o imóvel foi adquirido na constância do casamento e a embargante não comprovou que a aquisição se deu mediante doação, houve comunicação ao patrimônio do executado, devendo ser mantida a penhora sobre a meação do executado. 

– Tendo a dívida sido contraída antes do casamento, a meação pertencente ao cônjuge do executado não responde pela dívida, nos termos do inciso III do art. 1.659 do CC.

Apelação Cível nº 1.0481.06.060399-2/001 – Comarca de Patrocínio – Apelante: Régia Mara Côrtes de Aguiar – Apelada: Val Luz Ltda. – Relator: Des. Rogério Coutinho

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em rejeitar a preliminar e dar parcial provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 30 de outubro de 2013. – Rogério Coutinho – Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

ROGÉRIO COUTINHO – 1 – Trata-se de embargos de terceiros propostos por Régia Mara Côrtes de Aguiar em face de Val Luz Ltda. buscando a anulação de penhora lançada sobre imóvel que alega ser de sua propriedade.

O Juiz da 1ª Vara Cível de Patrocínio – MG julgou improcedente a pretensão da embargante sob o fundamento de que a origem da dívida e a aquisição do bem penhorado datam da constância do casamento. Fundamentou, ainda, no fato de que se presume que a dívida foi contraída em prol da família (f. 46/49).

Inconformada, a embargante interpôs apelação, alegando, preliminarmente, ter ocorrido cerceamento de defesa em razão da falta do depoimento pessoal da apelada, requerido durante a instrução processual. No mérito, alegou que é equivocada a afirmativa de que o valor teria sido revertido em benefício da família da recorrente. O imóvel onde foi realizada a obra que deu origem à dívida é de propriedade do pai do executado, o que permite concluir que não houve proveito para a recorrente e sua família. Disse que a data da origem da dívida é anterior à data do matrimônio da recorrente. O contrato de prestação de serviço que deu origem à promissória foi firmado três meses antes do casamento e não foi impugnado pela recorrida na contestação.

Disse estar ausente a presunção de que houve benefício para a recorrente do débito contraído pelo executado (f. 62/73). 

Foram apresentadas as contrarrazões ao recurso (f. 76/83).

É o relatório.

2 – Conheço do recurso, visto que próprio, tempestivo e preparado.

Do cerceamento de defesa.

Em relação ao adiamento da audiência, vale ressaltar que o comparecimento pessoal da autora somente se justificaria em razão do depoimento pessoal requerido pela ré.

Ocorre que a parte ré deixou de recolher a verba indenizatória para que fosse expedido mandado de intimação da autora, a fim de que prestasse seu depoimento.

A falta de intimação desobriga a parte de comparecer, uma vez que não poderá ser aplicada a pena de confissão. Ademais, a ré desistiu do depoimento pessoal da autora, não havendo então motivo para o adiamento requerido, em razão da impossibilidade de comparecimento da autora. Dessa forma, não há prejuízo para a apelante.

Quanto à ausência do depoimento pessoal da embargada, a embargante também deixou de recolher a verba indenizatória para o cumprimento do mandado de intimação da parte contrária, mesmo após ser intimada especificamente para tal fim (f. 41/42).

Sem a devida intimação, a pena de confissão, único objetivo do depoimento pessoal, fica obstada em razão da exigência trazida pelo § 1º do art. 343 do CPC:

"Art. 343. Quando o juiz não o determinar de ofício, compete a cada parte requerer o depoimento pessoal da outra, a fim de interrogá-la na audiência de instrução e julgamento.

§ 1º A parte será intimada pessoalmente, constando do mandado que se presumirão confessados os fatos contra ela alegados, caso não compareça ou, comparecendo, se recuse a depor".

Restou configurada, então, a preclusão do depoimento pessoal pretendido.

Do mérito.

A controvérsia no presente caso reside na possibilidade de a penhora recair sobre imóvel que se encontra registrado em nome do cônjuge do executado.

Conforme afirmado pela própria embargante na petição inicial, o casamento ocorreu em 09.07.1999, sob o regime de comunhão parcial de bens.

De acordo com a norma do art. 1.658 do CC, na comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento.

Entretanto, o art. 1.659 do CC traz algumas exceções, entre elas a hipótese de o bem ter sido adquirido na constância do casamento, por doação.

O imóvel foi adquirido em 08.07.2002, nos termos da escritura pública de f. 11, portanto durante o casamento, o que, em princípio, evidencia que houve a comunicação ao executado.

Contudo, alega a embargante que o imóvel foi adquirido mediante doação de recursos por seu pai. Trouxe como único meio de prova de tal alegação uma declaração do executado nesse sentido.

Ora, a declaração firmada pelo cônjuge, executado, não possui a capacidade de comprovar a doação do imóvel, visto que é parte diretamente interessada, não havendo qualquer outra prova nesse sentido. A própria escritura pública não faz qualquer referência à alegada doação.

Portanto, ausente a prova da doação, a comunicação do imóvel ao cônjuge deve ser reconhecida (art. 1.658 do CC), com a conseqüente meação a que faz jus o executado.

Nesse sentido, não resta dúvida sobre a possibilidade de penhora de 50% do imóvel, correspondente à meação do executado.

Com relação à outra metade do imóvel, pertencente à embargante, esta alega que não é responsável pelo pagamento da dívida, uma vez que foi contraída antes do casamento, e que não foi realizada em proveito da família do executado.

Analisando os autos, em especial o contrato de prestação de serviços, resta evidente que a dívida executada originou-se de obrigação assumida pelo executado antes do casamento (f. 14/15). Fato alegado na inicial e não impugnado pela embargada. Sobre a responsabilidade do cônjuge pelas obrigações assumidas antes do casamento, no regime de comunhão parcial, o art. 1.659, III, do CC traz outra exceção à comunhão:

"Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:

[…]

III – as obrigações anteriores ao casamento;".

Neste caso, tratando-se de regime parcial de comunhão de bens, a obrigação anterior integra o acervo de cada um.

Ocorre que, na obrigação anterior ao casamento, por ser pessoal, aquele que a contraiu deverá responder com seus bens particulares ou com sua meação, sob pena de tratamento igual ao que é dado ao regime de comunhão universal.

A hipótese de a responsabilidade recair sobre os bens do cônjuge somente ocorre nos casos de regime de comunhão universal, nos termos do art. 1.668, III, do CC.

Sobre o tema nos ensina Silvio Rodrigues:

“Pelo regime da comunhão parcial, destaca-se o patrimônio anterior ao casamento. Assim, separado o acervo de cada um previamente existente, também as obrigações anteriores são exclusivas do respectivo cônjuge. E nem mesmo as obrigações em função do casamento, se assumidas apenas por um, serão estendidas ao outro cônjuge, diferentemente do que ocorre no regime da comunhão universal” (Direito civil – direito de família. 28. ed. rev. e atual. por Francisco José Cahali. São Paulo: Saraiva, 2004, v. 6, p. 180/181).

Diante de tal conclusão, não se faz pertinente a análise sobre o benefício da dívida em favor do cônjuge e família, visto que prejudicada pela impossibilidade de a penhora onerar a meação da embargante.

3 – Assim, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa e dou parcial provimento ao recurso, apenas para reduzir a penhora à meação pertencente ao executado.

Custas recursais a serem rateadas entre as partes, igualmente.

É como voto.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Alexandre Santiago e Paulo Balbino.

Súmula – PRELIMINAR REJEITADA E RECURSO PROVIDO EM PARTE. 

Fonte: Arpen/Brasil – DJE/MG I 31/01/2014.

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As vantagens do contrato de alienação fiduciária frente ao compromisso de compra e venda para o vendedor e/ou agente financeiro

* Sylvie Boëchat

Ao longo de muitos anos e até hoje, para se concretizar o "sonho da casa própria", o instrumento contratual utilizado por grande parte da população brasileira foi o contrato de compromisso (ou promessa) de compra e venda, em que pese a legislação civil não tê-lo regulado como modalidade específica de contrato, mas apenas, na disciplina genérica dos contratos preliminares1.

No entanto, com a já "debutante" lei 9.514/97, a aquisição da propriedade imobiliária passou a contar, também, com outro importante instrumento: o contrato de alienação fiduciária, o qual trouxe significativas vantagens, principalmente para o vendedor/incorporador e/ou agente financeiro, no que toca especialmente às peculiaridades de sua forma de extinção, em comparação com a promessa de compra e venda.

Inicialmente, cumpre dizer que os institutos jurídicos da promessa de compra e venda e a alienação fiduciária são inconfundíveis, haja vista que fazem parte de regimes jurídicos distintos, com particularidades intrínsecas a cada um.

A primeira grande diferença entre eles está no fato de a promessa de compra e venda se constituir como um contrato preliminar autônomo enquanto a alienação fiduciária é um contrato de garantia e, portanto, acessório.

Assim, enquanto pré-contrato, pela promessa de venda, o titular do domínio de um imóvel, promitente vendedor, se obriga a transferi-lo, a título oneroso, ao promitente comprador, até que esse lhe pague a integralidade do preço, fixando-se obrigações recíprocas e mediante o atendimento de determinadas condições.

Dela se originam, portanto, direitos pessoais, de natureza obrigacional, e ainda – sob condição suspensiva – direito real de aquisição sobre coisa alheia, caso seja feito o seu registro no competente cartório de registro de imóveis2, oportunidade em que seus efeitos passam a se operar não só entre os contratantes, mas também perante terceiros, pela publicidade, permitindo, inclusive, o exercício do direito de sequela3 por parte do compromitente comprador.

Outrossim, diante do pagamento do preço, nasce para o promitente vendedor uma obrigação de fazer, representada pela necessária outorga do contrato de compra e venda, por meio do ato formal e solene da escritura, a ser lavrada por tabelião, a qual, uma vez registrada no cartório imobiliário competente, transferirá a propriedade imobiliária para o comprador.

Por sua vez, enquanto contrato acessório de garantia, a alienação fiduciária normalmente é atrelada a um contrato principal, de empréstimo ou financiamento, celebrado pelo devedor fiduciante para aquisição de imóvel, no qual o proprietário (fiduciante) transfere ao credor (agente financeiro, p.ex.), em caráter resolúvel, a propriedade do imóvel4, registrando tal ato jurídico no competente cartório imobiliário5, até que haja o cumprimento das obrigações do contrato principal. Desse modo, com o pagamento da dívida e a quitação dada ao devedor fiduciante, segue-se, assim, com o cancelamento da garantia no registro de imóveis, revertendo-se a propriedade do imóvel ao antigo devedor fiduciante6.

Essas peculiares distinções entre os contratos em questão produzem efeitos diversos no tocante à extinção do vínculo obrigacional, no caso de inadimplemento do devedor.

No compromisso de compra e venda não é possível a resolução automática (de pleno direito) do contrato em virtude de inadimplemento, sendo imprescindível o envio e recebimento efetivo de notificação premonitória ou interpelação judicial ao devedor (promitente comprador) para constituição em mora e sua eventual purgação7.

Além disso, a resolução do compromisso de compra e venda somente se opera por meio de ação judicial8, com o retorno das partes ao estado anterior, na qual o juiz fará a análise de seus pressupostos justificadores, inclusive no tocante à culpa9, como também definirá outras questões importantes decorrentes da relação jurídica estabelecida entre os contratantes, tais como: a reintegração da posse do imóvel ao promitente vendedor; os limites da restituição ao devedor das quantias recebidas, com a dedução de eventual multa contratual compensatória, comissão de corretagem, despesas de comercialização, demais encargos de mora e inadimplemento e a taxa de ocupação, caso o imóvel já tiver sido disponibilizado ao promitente comprador.

Diante dessas exigências impostas notadamente ao compromitente vendedor para efetivar a extinção do contrato pelo inadimplemento do compromitente comprador, a modalidade contratual do pacto adjeto de alienação fiduciária, trazida pela lei 9.514/97, apresenta um procedimento bem mais simplificado para extinção do contrato para o vendedor e/ou agente financeiro, por meio da excussão do objeto da garantia10, independentemente de ação judicial.

Assim, em caso de inadimplemento do devedor fiduciante, este deverá ser constituído em mora, por solicitação do credor fiduciário ao oficial do cartório de registro de imóveis competente, a quem caberá cumprir tal providência, seguindo-se o procedimento previsto nos parágrafos do art. 26 da lei 9.514/97.

Desse modo, caso não seja purgada a mora no prazo legal, o oficial do cartório de imóveis averbará a consolidação da propriedade11 em nome do credor fiduciário, com a correlata extinção da dívida do devedor fiduciante, seguindo-se a venda do imóvel em leilão e a entrega do saldo ao devedor fiduciante, se houver – após a reposição integral da quantia mutuada e encargos12- salvo se não houver lance que alcance o valor da dívida e encargos, hipótese em que, excepcionalmente, o imóvel permanecerá no patrimônio do credor fiduciário13.

Vale dizer que é praxe no mercado de crédito imobiliário estabelecer-se como padrão, para fins de leilão, o preço do imóvel fixado no contrato de compra e venda com pacto adjeto de alienação fiduciária14, mediante a sua atualização monetária na época própria, para que seja arrecada quantia superior ao valor do crédito, atendendo-se aos interesses econômicos de ambos os contratantes, haja vista que, assim, o credor poderá receber a integralidade de seu crédito e o devedor poderá recuperar, ao menos, parte do que pagou, atendendo-se, com isso, ao princípio da vedação do enriquecimento sem causa15.

Nesse sentido, cumpre apontar que a alienação fiduciária possui critério legal próprio para acertamento de haveres, conforme previsto nas regras do art. 27, parágrafos 4º, 5º e 6º da lei 9.514/97, não sendo justificada a analogia em relação aos critérios usualmente estabelecidos para extinção do compromisso de compra e venda, firmados por entendimento jurisprudencial16.

Assim, na promessa de compra e venda, a resolução do contrato se processa com o retorno das partes ao statu quo ante, com apuração de haveres definida judicialmente, tomando-se por base a dinâmica jurisprudencial; enquanto que, na alienação fiduciária, independentemente de ação judicial, promove-se a excussão do imóvel por meio de leilão, restituindo-se ao devedor eventual quantia que exceder ao valor do crédito do credor fiduciário.

Por fim, tendo em vista que a propriedade é transmitida em caráter resolúvel ao credor fiduciário, a ele é atribuída a posse indireta do imóvel, permanecendo o devedor fiduciante na posse direta17. Desse modo, caso este não pague a dívida, no todo ou em parte, a consequência natural será a consolidação da propriedade em favor do credor fiduciário, nascendo para ele, ou seus sucessores, o direito à reintegração na posse, com deferimento liminar para desocupação em sessenta dias, mediante a prova do registro da consolidação da propriedade na matrícula imobiliária18.

Portanto, diante dessas particularidades dos modos de extinção por inadimplemento dos contratos em estudo, acredita-se que o contrato de compra e venda com pacto adjeto de alienação fiduciária, instituído pela lei 9.514/97, se apresenta como instrumento mais seguro, eficiente e menos burocratizado do que o compromisso de compra e venda, para que vendedores/incorporadores de imóveis e/ou agentes financeiros imobiliários firmem as transações comerciais com seus consumidores.

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Notas

1. Artigos 462 a 466, CC/2003. Há algumas outras menções sobre o contrato de compromisso de venda e compra nos artigos 1225, VII, 1.417 e 1.1418 do CC.

2. Art. 5º do Decreto 58/37 e 22 com alteração pela Lei 6.014/73; art. 25 da Lei 6766/79; art. 32, parágrafo 2º da Lei 4591/64 e art. 1471, CC.

3. “…a promessa de compra e venda irretratável e irrevogável transfere ao promitente comprador os direitos inerentes ao exercício do domínio e confere-lhe o direito de buscar o bem que se encontra injustamente em poder de terceiro. Serve, por isso, como título para embasar ação reivindicatória.” (STJ – Resp nª 55.941/DF, 3ª Turma, j. 17.2.1998, v.u.)

4. Art. 22 da Lei 9.514/97

5. Art. 23 da Lei 9.514/97

6. Art. 25 e parágrafos da Lei 9.514/97

7. Decreto 745/69 – Art. 1º Nos contratos a que se refere o artigo 22 do Decreto-Lei nº 58, de 10 de dezembro de 1937, ainda que deles conste cláusula resolutiva expressa, a constituição em mora do promissário comprador depende de prévia interpelação, judicial ou por intermédio do cartório de Registro de Títulos e Documentos, com quinze (15) dias de antecedência. Súmula 76, STJ – A falta de registro do compromisso de compra e venda de imóvel não dispensa a prévia interpelação para constituir em mora o devedor.

8. Artigo 475, CC

9. Arts. 392 e 396, CC.

10. Excussão é o direito que tem o credor de se fazer pagar pelo produto da venda da coisa dada em garantia.

11. A propriedade, então, deixa de ser resolúvel e torna-se definitiva em favor do credor fiduciante.

12. Artigo 586, CC

13. Artigo 27 e parágrafos da Lei 9.514/97.

14. Artigo 24, VI, Lei 9.514/97

15. Artigo 53, CDC

16. REsp 97.538/SP; REsp 332.947/MG; Súmula 3/TJSP.

17. Artigos 23, parágrafo único e 24, V, da Lei 9.514/97

18. Artigo 30, Lei 9.514/97

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Referências Bibliográficas

CHALHUB, Melhim Namem, “Negócio Fiduciário”; 4ª Edição; Editora Renovar, 2009.

ANTONIO JÚNIOR, Valter Farid, “Compromisso de Compra e Venda”; 1ª Edição; Editora Atlas, 2009.

SCAVONE JÚNIOR, Luiz Antonio; “Direito Imobiliário – Teoria e Prática”; 6ª Edição; Editora Forense, 2013.

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* Sylvie Boëchat é coordenadora da área Cível do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados.

Fonte: Migalhas I 16/12/2013.

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