STJ resguarda terceiro de boa-fé em caso de compra de imóvel de parte de união estável

Após a dissolução de união estável, pode ocorrer de um dos ex-companheiros vender um bem sem o consentimento do outro. Nesses casos, o terceiro, quando é comprador de boa-fé, deve ser protegido. A decisão é da Terceira Turma do STJ, que julgou caso de um terceiro que adquiriu imóvel obtido por casal durante a união estável sem o conhecimento da ex-companheira do vendedor.

Ao ingressar com a ação de nulidade de escritura pública, a autora afirmou que os imóveis adquiridos na constância da união estável deveriam ter sido submetidos à partilha logo após a dissolução. Mas, ao invés disso, os bens foram alienados pelo ex-companheiro sem o consentimento da mulher. Ao julgar o caso, o TJ/PR considerou que não havia o reconhecimento da união estável no momento da aquisição dos imóveis e de sua alienação, o que confirma a validade do negócio jurídico. O pedido de nulidade feito pela autora foi julgado improcedente.

Inconformada, ela interpôs REsp no STJ sob o argumento de que a união estável e a aquisição dos bens, durante o período de convivência, haviam sido comprovadas nos autos e que o ex-companheiro não poderia ter outorgado a escritura de compra e venda sem o seu consentimento.

O Ministro Marco Aurélio Bellizze, relator, em análise do caso, afirmou que não havia o registro formal em cartório da união estável e que o vendedor do imóvel se apresentava perante a sociedade como solteiro, além de ser o único proprietário do bem, que estava em seu nome. Bellizze considerou, na decisão, que a falta de averbação da união estável em cartório afasta a ciência do terceiro sobre a convivência. Fato que determinou que o comprador de boa-fé não poderia ser prejudicado. A validade do negócio jurídico foi, portanto, reconhecida. A decisão foi unânime.

Para Nicolau Crispino, presidente do IBDFAM no Amapá, o julgado é importante porque confirma que deve ter uma preocupação com o terceiro de boa-fé. “Esse terceiro, estando de boa-fé, basta a sua demonstração de que ele não sabia, ou não poderia saber, que o vendedor era casado ou convivia com outra pessoa, logo estava vendendo uma coisa que não pertencia só a ele. E como era transcrito no registro imobiliário só o nome dele, ele não poderia saber que pertencia a outra pessoa que não seja o que estava lançado na propriedade”, diz.

O advogado ressalta ainda que demonstrado que o terceiro não conhecia a união estável do vendedor, ele não pode ver o negócio desfeito sob pena de colocar em risco um princípio do direito privado, que é a garantia e a proteção do terceiro de boa-fé.

Já para o companheiro que não participou do negócio o que cabe é entrar com uma ação de obrigação, no caso de cobrança de indenização de responsabilidade civil, junto ao ex-companheiro, para que ele devolva a parte relativa. Se não tiver nada definido, é metade do que ele recebeu com relação a cada imóvel ou bem.

Clique aqui e veja o acórdão.

Fonte: IBDFAM | 14/03/2018.

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CNJ – SERVENTIA EXTRAJUDICIAL – DESACUMULAÇÃO – VACÂNCIA.

O pressuposto das desacumulações (art. 49 da Lei nº 8.935/1994) é a vacância da titularidade. Não se trata de procedimento automático, pois se faz necessária a observância do parágrafo único do art. 26 da mencionada lei, além de se tratar de tema afeto à autonomia administrativa dos tribunais. A medida deve ser ultimada com a edição de lei formal e não por ato infralegal do tribunal.

CNJ – PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS: 0006290-02.2016.2.00.0000
LOCALIDADE: Ceará DATA DE JULGAMENTO: 09/03/2018 DATA DJ: 09/03/2018
RELATOR: Valtércio de Oliveira
LEI: LNR – Lei de Notários e Registradores – 8.935/1994 ART: 49

RECURSO ADMINISTRATIVO NO PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. INEXISTÊNCIA DE FATOS NOVOS A ENSEJAR A REFORMULAÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA RECORRIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO

1. Insurgência contra decisão monocrática que julgou improcedente pedido de desacumulação de serventias extrajudiciais baseada nas disposições do Código de Organização Judiciária do Estado do Ceará (COJECE) que, nas Comarcas do interior do Estado, atribuiu o serviço de registro de distribuição ao titular do Cartório do Primeiro Ofício da Comarca.

2. Ausência de ofensa ao princípio do concurso público na outorga de serventias extrajudiciais cumuladas com outras atividades, cuja legalidade fora objeto de análise pela Corregedoria Nacional de Justiça por ocasião da edição da Resolução CNJ nº 80/2010.

3. O pressuposto das desacumulações, conforme previsto no art. 49, da Lei nº 8.935/1994, é a vacância da titularidade. No entanto, não se trata de procedimento automático, pois se faz necessária a observância do parágrafo único do art. 26 da mencionada lei, além de se tratar de tema afeto à autonomia administrativa dos tribunais. Precedentes.

4. Respeitados os termos acima, a medida deve ser ultimada com a edição de lei formal e não por ato infralegal do tribunal. Precedentes do STF.

5. A inexistência de argumentos suficientes a alterar a decisão monocrática recorrida impede o provimento do recurso administrativo.

6. Recurso administrativo conhecido e não provido.

ÍNTEGRA

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS – 0006290-02.2016.2.00.0000

Requerente: AZIZ MANUEL FARIAS JEREISSATI
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ – TJCE
Advogado: CE2062 – AZIZ MANUEL FARIAS JEREISSATI

RECURSO ADMINISTRATIVO NO PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. INEXISTÊNCIA DE FATOS NOVOS A ENSEJAR A REFORMULAÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA RECORRIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO

1. Insurgência contra decisão monocrática que julgou improcedente pedido de desacumulação de serventias extrajudiciais baseada nas disposições do Código de Organização Judiciária do Estado do Ceará (COJECE) que, nas Comarcas do interior do Estado, atribuiu o serviço de registro de distribuição ao titular do Cartório do Primeiro Ofício da Comarca.

2. Ausência de ofensa ao princípio do concurso público na outorga de serventias extrajudiciais cumuladas com outras atividades, cuja legalidade fora objeto de análise pela Corregedoria Nacional de Justiça por ocasião da edição da Resolução CNJ nº 80/2010.

3. O pressuposto das desacumulações, conforme previsto no art. 49, da Lei nº 8.935/1994, é a vacância da titularidade. No entanto, não se trata de procedimento automático, pois se faz necessária a observância do parágrafo único do art. 26 da mencionada lei, além de se tratar de tema afeto à autonomia administrativa dos tribunais. Precedentes.

4. Respeitados os termos acima, a medida deve ser ultimada com a edição de lei formal e não por ato infralegal do tribunal. Precedentes do STF.

5. A inexistência de argumentos suficientes a alterar a decisão monocrática recorrida impede o provimento do recurso administrativo.

6. Recurso administrativo conhecido e não provido.

ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso administrativo, nos termos do voto do Relator. Declarou impedimento o Conselheiro Valdetário Andrade Monteiro. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 6 de março de 2018. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Cármen Lúcia, João Otávio de Noronha, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema do Vale, Daldice Santana, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Rogério Nascimento, Arnaldo Hossepian e Valdetário Andrade Monteiro.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso administrativo interposto por Aziz Manuel Farias Jereissati (Id 2142687), contra decisão monocrática proferida em 20 de março de 2017, que julgou improcedente o pleito de desacumulação dos Ofícios de Distribuição dos demais serviços cartorários nas Comarcas do Interior do Estado do Ceará, bem como a imediata realização de concurso público, e determinou o arquivamento do Pedido de Providências (Id 2119005).

Em suas razões, o recorrente manifesta seu inconformismo ao afirmar a existência de imoralidades, ilegalidades e inconstitucionalidades no exercício das delegações cartorárias extrajudiciais existentes em alguns Cartórios do Registro Civil do interior do Estado do Ceará cujos delegatários, conforme aduz, foram beneficiados com a acumulação do Ofício de Distribuição, sem o necessário concurso público, a partir do que dispôs art. 544, do Código de Organização Judiciária do Estado do Ceará (COJECE). Sustenta que a atribuição da titularidade da Distribuição aos Oficiais do Registro Civil beneficiou, sobretudo, os antigos titulares do Registro Civil das Comarcas de Aquiráz/CE, Eusébio/CE, Caucaia/CE, Juazeiro do Norte/CE, Iguatu/CE, Maracanaú/CE, Maranguape/CE e Sobral/CE, todas de grande porte econômico, integrantes na Região Metropolitana de Fortaleza, salvo Juazeiro do Norte/CE e Sobral/CE.

Registra que a decisão monocrática presumiu a possibilidade de acumulação sem estar baseada em qualquer prova, pois o Ofício de Distribuição foi estendido, pelo COJECE sem exceção e sem qualquer atenção ao volume de receita, a todos os cartórios de Registro Civil das comarcas do interior do estado, motivo pelo qual o recorrente afirma se tratar de decisão que pecou pelo desconhecimento da vida econômica e social do Estado do Ceará e o “silêncio, no caso, era bem melhor do que uma assertiva sem prova robusta dos fatos.”

O recorrente utiliza como exemplo o município de Maracanaú/CE, por se tratar de ente federativo que possui a segunda maior arrecadação municipal do estado – informação essa que pode ser obtida a partir de simples consulta ao sítio de busca google – sendo esse o motivo de não poder se conceber uma cumulação de atribuições dos serviços registrais numa comarca de grande porte, mesmo havendo autorização pelo COJECE. Destaca o caso do notário Gerardo Rodrigues Albuquerque Neto, o qual se submeteu ao concurso público para o 1º Notariado da Comarca de Maracanaú, mas atualmente, “como uma espécie de mágica”, ocupa o Ofício de Notas, o Ofício do Registro Civil e o Ofício de Distribuição da aludida comarca, momento em que o recorrente questiona se é possível a existência desse tipo de acumulação quando o serventuário submeteu-se ao concurso apenas para a atividade notarial, não estando entre as atribuições previstas na Lei nº 8.935/1994 para o Cartório de Notas o exercício do Ofício de Distribuição e do Registro Civil. Aduz que, se o CNJ em casos semelhantes afastou, de ofício, centenas de serventuários por não terem prestado concurso público para ingresso nos serviços, por que não afastar o titular Gerardo Rodrigues Albuquerque Neto somente do Ofício de Distribuição da Comarca de Maracanaú/CE, sem prejuízo da apuração dos demais casos semelhantes e existentes em outras comarcas do interior do estado do Ceará.

Aponta que esse tipo de acumulação, além de ser ilegal, fere o art. 236, § 3º, da Constituição Federal e os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade.

O recorrente ainda discorre sobre a existência de outro equívoco na decisão combatida em relação à aplicação da Lei nº 9.492/1997 quando esta determinou a criação da Central de Distribuição. Registra que, ao contrário do afirmado no decisum, referida lei não necessita da edição de outra lei para ser aplicada no âmbito dos Estados.

Por fim, destaca a necessidade da reforma da decisão monocrática que, sob seu ponto de vista, encontra-se “de toda equivocada”, para afastar imediatamente do exercício da atividade do Ofício de Distribuição extrajudicial da Comarca de Maracanaú/CE o titular Gerardo Rodrigues de Albuquerque Neto por este ter se submetido apenas ao concurso para o exercício de atividades notariais, apesar de exercer as atividades relativas ao Ofício do Registro Civil e de Distribuição. Após o afastamento, postula pela criação da Central de Distribuição, cabendo a este Conselho apurar ou não as irregularidades apontadas.

O tribunal apresentou suas contrarrazões, nas quais aponta o acerto da decisão monocrática e a improcedência do pleito recursal (Id 2181676).

Alega que eventuais desacumulações das atividades cartorárias extrajudiciais dependem da avaliação do Judiciário local, situando-se no âmbito de sua autonomia administrativa a ordenação das serventias extrajudiciais e seus serviços a partir da edição de lei formal, de iniciativa privativa das Cortes de Justiça.

Ressalva a realização de estudos para apresentação, à Assembleia Legislativa, ainda no ano de 2017, de proposição de instituição de novo Código de Organização Judiciária, propondo a alteração das regras atuais relativamente à organização dos serviços notariais e de registro.

O recorrente novamente se manifesta e aponta ausência de fundamento jurídico das contrarrazões apresentadas pelo TJCE, além de repisar toda a argumentação exposta nas razões de seu apelo (Id 2181800).

É o relatório.

VOTO

Primeiramente, defiro o pedido de tramitação prioritária à vista da documentação apresentada, nos termos do art. 1.048, inc. I, do Código de Processo Civil. No entanto, tal situação será informada à Presidência do CNJ, a quem compete a definição das pautas do Plenário.

Quanto à admissibilidade do recurso, vejo que se trata de apelo tempestivo, motivo pelo qual dele conheço.

A decisão monocrática recorrida, ao julgar improcedente o pedido, assentou:

“O cerne da questão consubstancia-se em pedido de desacumulação do Cartório Distribuidor dos demais serviços cartorários das comarcas do interior do Estado do Ceará.

Ao analisar a norma que regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro, Lei 8.935/1994, é possível verificar que o art. 26 estabelece a impossibilidade de acumulação dos serviços indicados no art. 5º, salvo nos “Municípios que não comportarem, em razão do volume dos serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços”. Os serviços constantes do art. 5º, são os seguintes:

Art. 5º. Os titulares de serviços notariais e de registro são os:

I – tabeliães de notas;

II – tabeliães e oficiais de registro de contratos marítimos;

III – tabeliães de protesto de títulos;

IV – oficiais de registro de imóveis;

V – oficiais de registro de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas;

VI – oficiais de registro civis das pessoas naturais e de interdições e tutelas;

VII – oficiais de registro de distribuição.

Levando-se em consideração o volume da receita, foi permitida a acumulação dos serviços em determinados Municípios do Estado do Ceará que não comportaram a instalação de mais de um dos serviços, não seria possível a instalação de Ofício Distribuidor autônomo. Nessa ótica, o serviço de distribuição foi acumulado com o serviço do 1º Ofício das Comarcas do Interior do Estado do Ceará.

À vista disso, o Código de Organização e Divisão Judiciária do Estado do Ceará (COJECE) confiou ao titular do Cartório do 1º Ofício das Comarcas do Interior as funções próprias de oficial de registro de distribuição, nos termos do que dispõe art. 544, vejamos:

Art. 544. Nas Comarcas do interior do Estado, onde foi implantado o sistema de secretarias de varas, as funções de distribuição extrajudicial – salvo nas comarcas em que regularmente instalado serviço de registro de distribuição da espécie, de conformidade com a Lei Federal nº 8.935/94 – serão exercidas pelo titular do Cartório do Primeiro Ofício da Comarca ou, nos casos de vacância da titularidade ou de impedimento, pelo respectivo substituto, […]

Apesar dessa previsão, no ano de 2015, o requerido editou a Resolução nº 1, de 23 de janeiro, do Órgão Especial, que criou o Serviço de Distribuição de Títulos de Protestos na Comarca de Entrância Final onde houvesse mais de um tabelionato de Protestos de Títulos. No entanto, para a instalação desse serviço autônomo de distribuição seria necessária a edição de lei formal e não ato infralegal, motivo pelo qual houve por bem revogar a mencionada norma e reorganizar os serviços da forma prevista no art. 544, do COJECE (Id 2072593, fls. 9 – 11). Portanto, a re-acumulação dos serviços extrajudiciais deu-se de forma diferente da que argumenta o requerente quando afirma que o tribunal havia “recuado” quanto à instalação da Central de distribuição, “deduzindo infundados fundamentos, com escopo de premiar, obviamente, algum ou alguns dos serventuários dos cartórios extrajudiciais”. Além dessa afirmativa carecer de comprovação, reconheceu-se que a formulação dessas atividades não poderia ocorrer por meio de resolução, mas sim a partir da edição de lei formal.

É bem verdade que a existência de um cartório distribuidor tornaria mais equânime a partilha de protestos e outros títulos entre as serventias dessa natureza, mas a conclusão inarredável é a de que a desacumulação ora pretendida insere-se no âmbito da autonomia administrativa conferida pela Constituição Federal aos tribunais pátrios, o que impede a atuação deste Conselho.

Além do mais, o exercício da função de distribuição pelo 1º Ofício das Comarcas do Interior do Estado do Ceará encontra respaldo legal no COJECE. Eventuais desacumulações de serventias extrajudiciais dependerão de avaliações do Judiciário local, o qual deverá promovê-las sempre que verificada a sua necessidade a partir da fiscalização e avaliação rotineira ‘das atividades notariais e registrais a fim de verificar o volume dos serviços e as receitas geradas pelas serventias’ (PCA nº 00004268-73.2013.2.00.0000).

O próprio Supremo Tribunal Federal já assentou entendimento sobre o tema ao afirmar que a ordenação das serventias extrajudiciais e dos seus serviços se insere no âmbito da organização judiciária de cada Estado, sendo necessária a edição de lei formal de iniciativa privativa dos Tribunais de Justiça, nos termos dos arts. 96, II, e 125, d § 1º, da CF (ADI nº 4.140).

No julgamento do PCA nº 0001156-28.2015.2.00.0000, este Conselho também reconheceu a autonomia do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios para a organização de seus serviços auxiliares, conforme se extrai da ementa do julgado:

RECURSO ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS. OFÍCIO EXTRAJUDICIAL. ÁREA GEOGRÁFICA. DEFINIÇÃO. POSSIBILIDADE. AUTONOMIA CONSTITUCIONAL. LEI DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA. OBSERVÂNCIA. EXTINÇÃO DE SUCURSAL. CRIAÇÃO DE SERVENTIA. FATOS INDEPENDENTES. CARTÓRIO DE PROTESTO DE TÍTULOS. COMPETÊNCIA TERRITORIAL TEMPORÁRIA. MEDIDA EXCEPCIONAL.

1. Recurso administrativo contra decisão monocrática que julgou improcedente o pedido de anulação de ato de Tribunal que estabeleceu a área geográfica de serventia extrajudicial e a competência temporária de cartório de protesto de títulos.

2. Observadas as regras estabelecidas na Lei de Organização Judiciária, é inerente à autonomia constitucional dos Tribunais a reorganização dos serviços auxiliares segundo suas necessidades. Esta prerrogativa inclui a criação ou extinção de ofícios extrajudiciais e suas sucursais, bem como a definição o território de atuação das serventias.

3. A criação de ofício extrajudicial tem natureza constitutiva e está desvinculada de situações pretéritas. Não é exigível que novas serventias observem a área geográfica de sucursais extintas ante a inexistência de direito adquirido sobre o território da delegação. Precedentes do STF e STJ.

4. Atende ao interesse público a decisão do Tribunal que, excepcionalmente, mantém a competência temporária de cartório de protesto de títulos em região administrativa que não possui ofício desta natureza. Ausência de violação aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

5. Recurso a que se nega provimento.

(CNJ – RA – Recurso Administrativo em PCA – Procedimento de Controle Administrativo – 0001156-28.2015.2.00.0000 – Rel. FERNANDO MATTOS – 8ª Sessão Virtualª Sessão – j. 08/03/2016). (grifos meus)

Reproduzo, ainda, outro precedente:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO POR PROVIMENTO E REMOÇÃO NA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS JUDICIALIZADAS. INCLUSÃO NA LISTA DAS SERVENTIAS OFERECIDAS EM CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NAS ATIVIDADES NOTARIAIS E REGISTRAIS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE.

Cabe aos tribunais avaliar a conveniência de incluir ou não as serventias sub-judice nos concursos. A decisão em um ou outro sentido, repita-se, não poderá ser considerada ilegal, vez que não há norma que a vede.

Serventias extrajudiciais acumuladas com tabelionatos de notas e protesto de títulos. Possibilidade uma vez configurada a exceção do art. 26 da Lei n. 8.935/1994. Ausência dos requisitos para a desacumulação.

Nos termos do art. 26 da Lei n. 8.935/1994, a regra geral é a especialização dos serviços descritos no art. 5º, ficando a sua acumulação reservada aos municípios onde não seja possível, em razão do volume dos serviços ou da receita.

Na hipótese, a acumulação dos serviços de tabelionato de notas e de tabelionato de protesto de títulos em 25 comarcas declinadas pelo requerente se justifica pois estas serventias configuram a exceção prevista no art. 26, considerando a população e o quadro socioeconômico de cada uma. Pedido julgado improcedente.

(CNJ – PCA – Procedimento de Controle Administrativo – 0006510-73.2011.2.00.0000 – Rel. JOSÉ GUILHERME VASI WERNER – 144ª Sessão – j. 26/03/2012). (grifos meus)

Portanto, incumbe aos Tribunais de Justiça a missão de promover estudos regulares a fim de avaliar a real necessidade de acumular ou desacumular serventias extrajudiciais, não cabendo ao CNJ promover imiscuir-se nessa seara.

Não se olvida, por fim, que o ingresso na atividade notarial e de registro se dá pela via do concurso, conforme dispõe a Constituição Federal em seu art. 236, § 3º. Todavia, vejo ser possível admitir ao delegatário do 1º Ofício das Comarcas do Interior do Estado a assunção das atividades de distribuidor de títulos, em acumulação às suas funções para a qual prestou concurso público, pois a própria lei admite o exercício simultâneo das atividades quando o Município não comportar, em razão do volume dos serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços, o que afasta, de plano, qualquer argumento em relação à possível ofensa ao princípio do concurso público.

Ante o exposto, julgo improcedente o presente Pedido de Providências e determino o arquivamento dos autos, após as intimações de praxe.

Brasília, data registrada no sistema. GUSTAVO TADEU ALKMIM

Conselheiro Relator”

A partir das razões recursais, constata-se que o recorrente demonstra inconformismo com o teor da decisão recorrida, mas não apresenta qualquer fato novo que enseje a alteração do julgado. Pelo contrário, o recorrente inova o pedido apresentado no requerimento inicial ao noticiar a situação específica do titular da Comarca de Maracanaú/CE, Gerardo Rodrigues de Albuquerque Neto, invocando argumentos que não merecem prosperar.

A questão originalmente proposta encerra a análise da desacumulação do Cartório Distribuidor dos demais serviços prestados pelos cartórios extrajudiciais das Comarcas do interior do Estado do Ceará, e a posterior promoção de concurso público para a assunção da atividade.

O art. 236 da Constituição Federal estabelece as diretrizes sobre o exercício das atividades cartorárias extrajudiciais no Brasil, reservando à lei ordinária a regulamentação da matéria. Nessa conjuntura, editou-se a Lei nº 8.935/1994, mais conhecida como Lei dos Cartórios, a qual dispôs sobre os serviços notariais e de registro e, por decorrência lógica, reproduziu a norma constitucional que determina a realização de concurso público para o ingresso nessas atividades.

No art. 5º do normativo operou-se a especialização dos serviços que seriam prestados pelos cartórios extrajudiciais, implicando dizer que cada unidade haveria de exercer uma atividade específica: de notas; de registro de contratos marítimo; registro de imóveis; de registro de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas; de registro civis das pessoas naturais e de interdições e tutelas, bem como de registros de distribuição, não se admitindo, a priori, a acumulação dos serviços em uma mesma serventia. É o que se constata da leitura dos dispositivos constantes na Lei nº 8.935/1994:

Art. 5º Os titulares de serviços notariais e de registro são os:

I – tabeliães de notas;

II – tabeliães e oficiais de registro de contratos marítimos;

III – tabeliães de protesto de títulos;

IV – oficiais de registro de imóveis;

V – oficiais de registro de títulos e documentos e civis das pessoas jurídicas;

VI – oficiais de registro civis das pessoas naturais e de interdições e tutelas;

VII – oficiais de registro de distribuição.

O cerne do inconformismo reside exatamente nessa questão: a lei estabelece a especialização dos serviços, enquanto algumas serventias extrajudiciais do interior do Estado do Ceará desempenham mais de uma atividade, o que beneficiaria seus titulares que não prestaram concurso para o desempenho de todos esses serviços.

No requerimento inicial, transpareceu que a insurgência se voltava contra os titulares do 1º Ofício das Comarcas do interior do estado que, apesar de terem prestado concurso público para o desempenho de uma determinada atividade, foram amparados com disposição do Código de Divisão e Organização Judiciária do Estado do Ceará (COJECE) que lhes atribuiu o exercício do Ofício de Distribuição sem que tenham habilitação específica para essa atividade.

No entanto, no recurso foi possível divisar que o inconformismo do recorrente reside especificamente em relação a um dos titulares de cartório extrajudicial de Maracanaú/CE, Gerardo Rodrigues de Albuquerque Neto, o qual possui atribuições de Oficial de Notas, de Oficial Distribuidor e de Registro Civil, enquanto aprovado em certame público apenas para a atividade notarial.

Nesse sentido, reafirmo a fundamentação utilizada na decisão monocrática, proferida pelo meu antecessor, o então Conselheiro Gustavo Tadeu Alkmim, de que a acumulação de determinadas atividades ocorreu por expressa autorização legal, pois ao mesmo tempo em que a Lei dos Cartórios determina a especialização das atividades, excepciona a regra quando os Municípios não comportarem, “em razão do volume dos serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços” (art. 26, parágrafo único).

O art. 544 do COJECE preceituou que “[…] nas Comarcas do interior do Estado, onde foi implantado o sistema de secretarias de varas, as funções de distribuição extrajudicial – salvo nas comarcas em que regularmente instalado serviço de registro de distribuição da espécie, de conformidade com a Lei Federal nº 8.935/94 – serão exercidas pelo titular do Cartório do Primeiro Ofício da Comarca ou, nos casos de vacância da titularidade ou de impedimento, pelo respectivo substituto, […]”.

Pela interpretação conjunta da Lei dos Cartórios com o COJECE, vê-se ser possível a cumulação das atividades numa mesma unidade e, no caso das serventias extrajudiciais do ente federativo, os serviços de Distribuição foram reunidos aos do “Cartório do Primeiro Ofício da Comarca”, por razões econômicas ou quantitativas, cujos titulares obtiveram a outorga dos Ofícios já cumulados a partir da sua aprovação em certame público, mesmo que a habilitação no certame tenha se destinado ao exercício de apenas uma atividade.

É nesse prisma que o recorrente anseia por modificar uma situação atual enquanto a formatação desses cartórios ocorreu há mais de 20 (vinte) anos, sob a égide da edição da Lei nº 8.935 e do COJECE, ambas datadas de 1994. Não se olvide que a realidade social e econômica, por serem diferentes das que hoje se conhece, certamente influenciou a elaboração das leis e, logicamente, da ressalva constante no parágrafo único do art. 26, da Lei dos Cartórios, ao possibilitar a acumulação das atividades cartorárias nos Municípios que não comportarem a instalação de mais de um dos serviços em razão do volume dos serviços ou da receita.

Não há como renovar uma situação, considerando a atual evolução da doutrina relativa às atividades notarial e registral, sem que haja violação aos direitos subjetivos integralizados pelos delegatários que obtiveram esse título, de forma legítima, há mais de 20 (vinte) anos. Situação diferente seria se os oficiais em referência não tivessem se habilitado por meio de concurso público para o exercício de, ao menos, uma das atividades.

E mesmo com a afirmação do recorrente colhida singelamente nos sítios de busca – sobre o município de Maracanaú/CE possuir, desde sua criação em 1985, a segunda maior arrecadação municipal do estado do Ceará – a possibilidade de reunir as atividades em uma unidade tanto poderá decorrer do critério econômico (da própria arrecadação da serventia ao prestar as atividades) quanto do quantitativo (em termos de volume de serviço). Portanto, a prática adotada pelo TJCE encontra-se em sintonia com os ditames legais.

Não procede, de igual forma, as alegações que somente o TJCE ou este CNJ, de ofício, pudessem produzir provas sobre as informações das serventias extrajudiciais apontadas. Os dados relativos aos ofícios extrajudiciais podem ser facilmente consultados a partir do sistema Justiça Aberta, constante na página do Conselho Nacional de Justiça e coordenado pela Corregedoria Nacional de Justiça[1]. Neste, disponibilizam-se informações sobre o nome do titular do cartório, forma de investidura (se substituto ou titular) data da instalação do ofício, atribuições, localização, dados complementares (quantidade de funcionários, horário de funcionamento, quantidade de atos praticados e arrecadação semestral), além de informações sobre as decisões concernentes à Resolução CNJ nº 80/2010.

Por oportuno, é importante tecer algumas considerações acerca das circunstâncias que levaram à edição da Resolução CNJ nº 80/2010, a qual teve como escopo declarar “a vacância dos serviços notariais e de registro ocupados em desacordo com as normas constitucionais pertinentes à matéria, estabelecendo regras para a preservação da ampla defesa dos interessados, para o período de transição e para a organização das vagas do serviço de notas e registro que serão submetidas a concurso público”.

Dentre as razões de sua edição encontram-se, primordialmente, a necessidade da observância das normas constitucionais sobre o ingresso na atividade notarial, cuja vacância tivesse ocorrido após a promulgação da Constituição Federal (art. 236, § 3º); as inúmeras falhas e irregularidades encontradas nos serviços extrajudiciais no curso de inspeções realizadas pela Corregedoria Nacional de Justiça; o respeito aos ditames estabelecidos na Lei nº 8.935/1994; a necessidade de conceder segurança jurídica às questões que envolvessem a mesma matéria a fim de evitar contradições, dentre outras questões.

Em decorrência das diversas irregularidades e ilegalidades verificadas pelo Órgão Censor Nacional, o art. 1º do normativo em referência declarou “a vacância dos serviços notariais e de registro cujos atuais responsáveis não tenham sido investidos por meio de concurso público de provas e títulos para a outorga de delegações de notas e de registro, na forma da Constituição Federal de 1988” e incumbiu aos tribunais de elaborar listas das delegações vagas e das providas, estas segundo o regime constitucional vigente, indicando, inclusive, os títulos de investiduras dos então responsáveis pelas unidades (art. 1º, §§ 1º e 2º, Resolução CNJ nº 80/2010).

A partir dos dados coletados, a Corregedoria Nacional de Justiça organizou a Relação Provisória de Vacâncias das unidades vagas, publicada na Seção I do Diário Oficial da União, de 22 de janeiro de 2010, ao tempo em que proporcionou aos interessados a impugnação da inclusão da vaga na referida listagem. Esse prelúdio acerca do trabalho desenvolvido pela Corregedoria Nacional indica o desacerto total das argumentações expostas pelo recorrente quando aponta favoritismos a determinados delegatários de serventias extrajudiciais do interior do Estado do Ceará. A primeira razão é a de que a acumulação dos serviços encontra seu fundamento nos critérios exaustivamente apontados, os definidos pela Lei nº 8.935/1994 e pelo COJECE, além de se tratar de questão amplamente avaliada pelo Órgão Censor Nacional nos autos do Pedido de Providências nº 000384-41.2010.2.00.0000.

Veja-se que o cartório extrajudicial apontado no recurso – o titularizado por Gerardo Rodrigues de Albuquerque Neto – foi instalado em 1995, anos antes da edição da Resolução CNJ nº 80/2010[2] (Id 2056023, fl. 15), e a legalidade da acumulação dos serviços foi avaliada, inclusive, durante os trabalhos realizados pelo Órgão Censor Nacional. Não constam irregularidades nem no provimento da unidade, nem na acumulação dos serviços, tanto que a serventia sequer figurou na Relação Provisória de Vacância, conforme informações levantas no sistema Justiça Aberta.

No tocante à legalidade da delegação ao titular do 1º Ofício de Maracanaú/CE para exercer não só as atividades de registrador civil, mas também de distribuidor, o documento constante no Id 2056023 (fl. 15) é hábil para confirmar a submissão de Gerardo Rodrigues de Albuquerque Neto à concurso público para ingresso no serviço notarial. Porém, o descontentamento do recorrente se volta para o fato de a outorga ter sido realizada para titularização apenas do Ofício de Notas e não do de Distribuição, sem que tenha havido a aprovação do notário em certame público para o exercício dessa última atividade – de distribuição.

Há evidente equívoco na recalcitrância e, para demonstrá-la, retomo a motivação relacionada à Resolução CNJ nº 80/2010. Se o desempenho da atividade de distribuidor pelo Oficial do 1º Ofício estivesse em desacordo com a norma constitucional do art. 236, § 3º, tal situação teria sido externada na decisão publicada no Diário Oficial de 22 de janeiro de 2010, fato que não ocorreu.

Não é preciso tecer fundamentos longos para se explicar que se houve submissão ao concurso público para a obtenção da outorga – 1º Ofício – e se a própria lei conferiu a essa mesma serventia extrajudicial – 1º Ofício – o exercício da distribuição de títulos, não há como vislumbrar ilegalidades ou mesmo inconstitucionalidades no ato. Trata-se de simples dedução: se as atividades estão legalmente acumuladas em uma mesma unidade por força de lei – em razão do volume dos serviços ou da receita – para o qual o delegatário recebeu a outorga para o exercício de uma delas, não há como divisar qualquer ilegalidade ou mesmo violações a princípios constitucionais.

E mesmo que essas observações retomem a questão da necessidade apontada pelo recorrente – de desacumular os serviços prestados pelo titular do 1º Notariado da Comarca de Maracanaú/CE – esse quadro somente poderá ocorrer caso a titularidade da serventia seja declarada vaga. Quero dizer que o art. 49, da Lei dos Cartórios determina que será a partir da vacância que se procederá à desacumulação dos serviços prestados pelo cartório extrajudicial, e novamente destaca a necessidade da observância do reiterado art. 26 e seu parágrafo único (o qual permite a acumulação das atividades nos Municípios que não comportarem, em razão do volume dos serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços).

A decisão combatida assentou de forma clara que o procedimento de desacumulação não é automático, além de se encontrar na órbita da autonomia administrativa dos tribunais, a depender “de avaliações do Judiciário local, o qual deverá promovê-las sempre que verificada a sua necessidade a partir da fiscalização e avaliação rotineira ‘das atividades notariais e registrais a fim de verificar o volume dos serviços e as receitas geradas pelas serventias’ (PCA nº 00004268-73.2013.2.00.0000)”. Quanto ao tema, vem a calhar o registro da seguinte jurisprudência desta Corte:

EMENTA: RECURSO EM SEDE DE PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CARTÓRIOS. EXTINÇÃO DE SERVENTIA. PREVISÃO LEGAL. TRANSFERÊNCIA DAS ATRIBUIÇÕES. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE FATO NOVO. NÃO PROVIMENTO.

I. Recurso contra decisão que julgou improcedente o pedido constante do PCA, por considerar que o Tribunal extinguiu serventia extrajudicial em razão do disposto em Lei Complementar Estadual.

II. O então titular da serventia extrajudicial sofreu sanção disciplinar de perda da delegação, assim, diante da previsão em Lei Complementar Estadual, o Tribunal extinguiu o serviço, atendendo, dessa forma, ao princípio da reserva legal.

III. O artigo 26, parágrafo único, da Lei 8935/1994, autoriza a acumulação dos serviços notariais e de registro na hipótese de desinteresse da Administração na manutenção do serviço com uma única especialidade, cuja análise se insere na autonomia administrativa conferida aos tribunais.

III. Inexistindo, nas razões recursais, qualquer elemento novo capaz de alterar o entendimento adotado, a decisão monocrática combatida deve ser mantida.

IV. Recurso conhecido, uma vez que tempestivo, mas que, no mérito, nega-se provimento. (CNJ – PCA – Procedimento de Controle Administrativo – nº 0002757-35.2016.2.00.0000 – Rel. CARLOS LEVENHAGEN – 20ª Sessão Plenário Virtual – j. 19/5/2017)

Desse modo, caso se compreenda pela necessidade de desacumulação das atividades cartoriais extrajudiciais, respeitados os termos acima, a medida deve ser ultimada com a edição de lei formal e não por ato infralegal do tribunal.

Na ocasião da criação da Central de Distribuição pelo TJCE, conforme noticia o requerimento inicial, houve a instalação da unidade por meio de resolução (de nº 01/2015, do Órgão Especial – Id 2056023, fls. 11 e 12), a qual foi posteriormente revogada pela própria Corte ao reconhecer que “a distribuição de títulos e documentos de dívida destinados a protesto é matéria de destinada à reserva legal”.

Acertado foi o motivo pelo qual se revogou o normativo que pretendeu a criação do mencionado ofício, inclusive por estar em perfeita sintonia com jurisprudências do Supremo Tribunal Federal, as quais ressaltam a necessidade da edição de lei formal para a criação, extinção, acumulação e desacumulação de unidades, consoante se verifica no precedente abaixo:

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PROVIMENTOS N. 747/2000 E 750/2001, DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO ESTADO DE SÃO PAULO, QUE REORGANIZARAM OS SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO, MEDIANTE ACUMULAÇÃO, DESACUMULAÇÃO, EXTINÇÃO E CRIAÇÃO DE UNIDADES. 1. REGIME JURÍDICO DOS SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO.

[…]

2. CRIAÇÃO E EXTINÇÃO DE SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS. As serventias extrajudiciais se compõem de um feixe de competências públicas, embora exercidas em regime de delegação a pessoa privada. Competências que fazem de tais serventias uma instância de formalização de atos de criação, preservação, modificação, transformação e extinção de direitos e obrigações. Se esse feixe de competências públicas investe as serventias extrajudiciais em parcela do poder estatal idônea à colocação de terceiros numa condição de servil acatamento, a modificação dessas competências estatais (criação, extinção, acumulação e desacumulação de unidades) somente é de ser realizada por meio de lei em sentido formal, segundo a regra de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Precedentes.

3. PROCESSO DE INCONSTITUCIONALIZAÇÃO. NORMAS “AINDA CONSTITUCIONAIS”. Tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal indeferiu o pedido de medida liminar há mais de dez anos e que, nesse período, mais de setecentas pessoas foram aprovadas em concurso público e receberam, de boa-fé, as delegações do serviço extrajudicial, a desconstituição dos efeitos concretos emanados dos Provimentos n. 747/2000 e 750/2001 causaria desmesurados prejuízos ao interesse social. Adoção da tese da norma jurídica “ainda constitucional”. Preservação:

a) da validade dos atos notariais praticados no Estado de São Paulo, à luz dos provimentos impugnados; b) das outorgas regularmente concedidas a delegatários concursados (eventuais vícios na investidura do delegatário, máxime a ausência de aprovação em concurso público, não se encontram a salvo de posterior declaração de nulidade); c) do curso normal do processo seletivo para o recrutamento de novos delegatários.

4. Ação direta julgada improcedente.

(ADI2415, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 22/09/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-028 DIVULG08-02-2012 PUBLIC 09-02-2012)

Portanto, equivoca-se o recorrente quando afirma ser desnecessária a e edição de lei para a criação de serventias extrajudiciais.

Pelas razões expostas, conheço do recurso administrativo interposto, por preencher os requisitos de admissibilidade, e, no mérito, nego provimento, nos termos da fundamentação.

Defiro o pedido de tramitação prioritária, nos termos do art. 1.048, inc. I, do CPC. Informe à Presidência do CNJ.

Após as intimações de praxe, arquivem-se os autos.

Brasília, data registrada no sistema.

Valtércio de Oliveira
Conselheiro

[1]http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/justica-aberta.
[2] Disponível em: http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/justica-aberta. Acesso em 18 de abril de 2017.

Brasília, 2018-03-07.

Fonte: IRIB | 15/03/2018.

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CORREIÇÃO – ROGAÇÃO PELO INTERESSADO.

Ao Corregedor Geral da Justiça incumbe analisar, segundo critérios de conveniência e oportunidade, a necessidade de realizar correições ordinárias e extraordinárias nas delegações notariais e de registro (art. 28, XXI e XXII, do RITJSP). Incabível a pretensão no sentido de que se faça correição extraordinária em serventia extrajudicial.

CGJSP – PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS: 0001297-42.2017.8.26.0068
LOCALIDADE: Barueri DATA DE JULGAMENTO: 21/02/2018 DATA DJ: 12/03/2018
UNIDADE: 1
RELATOR: Geraldo Francisco Pinheiro Franco
LEI: LRP – Lei de Registros Públicos – 6.015/1973 ART: 212 ss

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS – Registro de Imóveis – Abertura irregular de matrículas – Duplicidade de registros – Remessa dos interessados às vias ordinárias.

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MATRÍCULA – ABERTURA IRREGULAR. Abertura irregular de matrículas – Duplicidade de registros – Remessa dos interessados às vias ordinárias.

CORREIÇÃO – ROGAÇÃO PELO INTERESSADO. Ao Corregedor Geral da Justiça incumbe analisar, segundo critérios de conveniência e oportunidade, a necessidade de realizar correições ordinárias e extraordinárias nas delegações notariais e de registro (art. 28, XXI e XXII, do RITJSP). Incabível a pretensão no sentido dee que se faça correição extraordinária em serventia extrajudicial. (Ementa do editor).

ÍNTEGRA

PROCESSO Nº 0001297-42.2017.8.26.0068 – BARUERI – RONALDO FABIANO DOS SANTOS ALMANÇA E OUTROS. ADVOGADA: ELEN APARECIDA DIAS QUINTINO, OAB/SP 337.247. – (74/2018-E) – DJE DE 12.3.2018, P. 18.

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS – Registro de Imóveis – Abertura irregular de matrículas – Duplicidade de registros – Remessa dos interessados às vias ordinárias.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Inconformado com a r. sentença que desacolheu seu pedido[1], Ronaldo Fabiano dos Santos Almança e Ricardo de Lima Pereira interpuseram recurso objetivando a realização de correição extraordinária para apuração de falta funcional por parte do Oficial do 1º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Barueri/SP e consequente correção dos registros irregulares encontrados, cancelando-se as matrículas existentes em duplicidade. Requerem, também, a suspensão dos processos administrativos nos 0008581-48.2010.8.26.0068 e 1012268-06.2016.8.26.0068, além do bloqueio de todas as matrículas oriundas da transcrição nº 20.182 do 8º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo, assim como das matrículas nos 27.438 e 35.075, estas do 1º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Barueri/SP.

Processado o recurso, houve manifestação do Oficial Registrador[2] e da Procuradoria Geral de Justiça, que opinou por seu não provimento[3].

Então, os autos foram remetidos a esta E. CGJ[4].

É o relatório.

Opino.

Alegam os recorrentes que adquiriram os direitos hereditários sobre os bens deixados por Catharina Basseto Orsi e Rodolpho Orsi, consubstanciados na parte ideal correspondente a 6% de uma área localizada no Município de Santana de Parnaíba, objeto da transcrição nº 6.919 do 16º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo que, por sua vez, teve origem na transcrição nº 12.286 daquele mesmo Cartório de Registro de Imóveis.

Ocorre que, segundo afirmam, a matrícula nº 27.438 do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Barueri também teve origem na transcrição 12.286 do 16º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo, certo que, na mencionada matrícula, foram omitidas as confrontações do imóvel, o que impede sua exata localização.

Discorrem, ainda, sobre irregularidades havidas na abertura, pelo 1º Cartório de Registro de Imóveis de Barueri/SP, de matrículas oriundas da transcrição 20.182 do 8º Cartório de Registro de Imóveis da Capital e consequente duplicidade de registros, além da dificuldade de localização exata da área adquirida.

Reputam necessária, assim, a apuração das irregularidades apontadas mediante a realização de correição extraordinária para correção dos registros e da duplicidade encontrada, indicação da real localização da área adquirida, assim como o bloqueio das matrículas questionadas e suspensão dos demais processos envolvendo as fraudes apontadas.

Desde logo, é preciso consignar que ao Corregedor Geral da Justiça incumbe analisar, segundo critérios de conveniência e oportunidade, a necessidade de realizar correições ordinárias e extraordinárias nas delegações notariais e de registro (art. 28, XXI e XXII, do RITJSP), sendo certo que, ao longo das últimas gestões, foram realizadas inúmeras correições nas diversas Comarcas do Estado de São Paulo.

Incabível, pois, a pretensão deduzida pelos recorrentes no sentido de reforma da sentença para que se faça correição extraordinária na serventia extrajudicial em questão, a seu pedido.

Da mesma forma, não encontra amparo legal a pretensão de suspensão de outros processos administrativos, nos quais se discutem irregularidades referentes a matrículas oriundas da mesma transcrição. Os pleitos são diversos e não há risco de decisões contraditórias.

Por outro lado, os pedidos de eliminação da duplicidade de matrículas – o que se daria, em tese, pelo cancelamento de uma delas – e de identificação da exata localização da área adquirida não podem ser acolhidos nesta via administrativa da Corregedoria Permanente. A respeito do tema, ensina Narciso Orlandi Neto:

“Quando dois direitos sobre o mesmo imóvel não podem coexistir, não  podem gravar simultaneamente o mesmo objeto, não podem ter titulares diferentes, diz-se que são contraditórios. No processo de qualificação podem também ser considerados contraditórios direitos cuja preferência será dada pela ordem da inscrição (hipotecas simultaneamente constituídas sem declaração de grau). Interessa aqui aquela primeira espécie de contradição. Os princípios que informam o Registro de Imóveis não permitem que direitos contraditórios permaneçam simultaneamente registrados. E quando ocorre duplicidade, há erro suscetível de retificação pelo prejudicado que, em princípio, é qualquer um dos dois titulares. A simples coexistência dos direitos no registro a ambos prejudica e legitima para a retificação. No sistema de matrículas, salvo erro grosseiro, não há possibilidade de duplicidade de registros na mesma matrícula. O que pode existir é: a) duplicidade de transcrições; b) duplicidade de matrículas; c) transcrição e matrícula contraditórias, quando a última não tem origem na primeira. Há quem entenda que, havendo duplicidade de transcrições ou de matrículas, pode e deve ser cancelada, até na via administrativa, a que foi feita por último. Foi o que decidiu o Conselho  Superior da Magistratura de São Paulo, no julgamento de apelação em processo de dúvida: “O caminho correio, ocorrendo duplicidade de registros, é a decretação da nulidade do efetivado em último lugar. Essa providência pode ser adotada na via administrativa, com fulcro no art. 214 da Lei n. 6.015/73“(RT 592/88). A solução é correta para as hipóteses referidas por Gilberto Valente da Silva, isto é, existência de duplicidade de matrícula por inofensivo erro interno, por exemplo, por falta de remissão da abertura da primeira na transcrição anterior. A solução é o cancelamento da segunda, com transporte dos atos nela praticados para a primeira, com fundamento no art. 213, caput, já que há erro evidente (A Matrícula, trabalho apresentado no XX Encontro dos Oficiais de Registro de Imóveis do Brasil, 1993). No mesmo sentido, Celestino A. Cano Tello, Iniciación ai Estúdio de Derecho Hipotecário, Editorial Civitas, Madrid, 1982, p. 284). Mas não será diversa a solução se, na segunda matrícula, aberta inadvertidamente, tiver sido registrado um direito real incompatível com aquele registrado na primeira matrícula, v. g., a hipoteca constituída por quem alienara o imóvel? Com certeza a duplicidade não será irrelevante, inofensiva. Será temerária uma solução simplista, que não atente para a possibilidade de prevalecer o direito inscrito na segunda matrícula. E discutível? Sim. Bem por isso, a solução tem de ser encontrada na via contenciosa. A duplicidade de registros não leva necessariamente à conclusão de que um deles é nulo de pleno direito. Devem ser separadas as duas anomalias (…). As consequências da duplicidade de registros foram bem expostas pelo Conselho Superior da Magistratura de São Paulo. Decidiu o órgão, em caso de duplicidade de registros: “A regra do art. 859 do Código Civil, autorizadora do princípio da presunção, não pode ser chamada por nenhum daqueles titulares dos registros duplos. A presunção de que o direito pertence àquele em cujo nome está registrado não pode conviver com o duplo registro (…). Em outras palavras, a presunção de veracidade do registro desaparece quando há duplicidade”.

Prossegue o doutrinador, anotando que: “(…) a consequência é a impossibilidade de prática de qualquer ato em qualquer das correntes filiatórias, até que, na via adequada, se decida pela prevalência de uma ou de outra (Ap. 4.094, j . Em 24-6-1985, RT 599/99)”.

Mais adiante, depois de reafirmar que o duplo registro faz desaparecer a presunção relativa de verdade de seu conteúdo, conclui que sua restauração depende da eliminação da duplicidade pelo titular, por meio do cancelamento do registro contraditório nas vias ordinárias. E adverte que o registro nulo de pleno direito tem de ser cancelado, mas ressalva que nem sempre o segundo registro será o nulo de pleno direito, esclarecendo que:

“O cancelamento na via administrativa, quase sempre sem ciência do titular, priva-o do direito ao devido processo legal. Para quem entende que só o titular de direito inscrito tem legitimidade para atacar, com ação real, outra inscrição, o cancelamento do registro do prejudicado será fatal para a pretensão retificatória. Fique bem claro que não estamos cuidando aqui da nulidade de pleno direito, mas de conflito de interesses baseado no Registro de Imóveis. O cancelamento do registro por motivo que não seja a nulidade de pleno direito, depende sempre de processo contencioso, exatamente porque implica, para o titular do registro cancelado, a perda do direito real. E no processo contencioso deve ser cancelado, não o registro feito por último, mas aquele cuja corrente filiatória não está perfeita. O juiz examinará as duas linhas das transmissões, verificará se têm a mesma origem, quando ocorreu a bifurcação, qual o motivo e qual a que, dentro dos princípios que informam o registro, deve prevalecer. O registro cuja linha desrespeitou o princípio da continuidade, por exemplo, não sobreviverá. Essa solução é indiscutível quando da existência de duas correntes filiatórias distintas. A outra, de cancelamento administrativo do último registro, pode ser admitida, mas quando a contradição está na mesma matrícula. O titular de direito já o transmitiu, mas ele aparece em outro registro, como transmitente. Neste caso há evidente violação do princípio da disponibilidade: o transmitente já transmitira tudo o que tinha. Aqui sim, está presente a nulidade de pleno direito, justificando o cancelamento. Quando as duas correntes filiatórias estão em matrículas diversas, não há como cancelar-se administrativamente uma delas. O efeito da duplicidade é o desaparecimento da presunção do registro e da disponibilidade do titular, e ambos os registros são atingidos. Mesmo na via contenciosa, o simples exame dos registros pode não ser suficiente para uma conclusão segura. Qualquer das partes litigantes pode alegar, em seu favor, o usucapião ordinário. Se estiver na posse do imóvel há mais de dez anos, de boa fé, não se lhe negará a aquisição por usucapião, ainda que o registro em seu nome não venha de uma linha filiatória perfeita e não resista a um confronto com a outra linha. Mas é exatamente para isso que serve o usucapião ordinário.” .

E conclui, por fim, que: “fora das vias ordinárias, é temerário o cancelamento do registro, porque priva-se o titular do direito constitucional de defender seu direito, não podendo o juiz supor que o titular do registro a cancelar  não tem nenhum direito a defender” (“Retificação do Registro de Imóveis”, Ed. Oliveira Mendes, pp. 102/108).

No caso concreto, verifica-se o conflito de interesses oriundo de correntes filiatórias diversas, de forma que apenas por intermédio de processo contencioso, em que respeitados os princípios da ampla defesa e do contraditório, é que se poderá aferir qual o registro merece prevalecer e identificar a exata localização da área adquirida pelos recorrentes.

Nesse sentido, entre outros, foi o r. parecer apresentado pelo MM. Juiz Assessor, Dr. Luis Paulo Aliende Ribeiro, no Processo CG nº 2.596/99, com o seguinte teor:

“Pretendem os apelantes a reforma da decisão de primeiro grau, para que seja afastada a determinação administrativa de parcial cancelamento da transcrição nº 51.065 do 14º registro de imóveis da Capital, afirmando a prevalência deste registro sobre os demais com relação aos quais fora constatada sobreposição registrária.

Tal pretensão comporta provimento, não em razão da afirmada prevalência do registro que interessa aos recorrentes sobre os demais, mas em face da inadequação da via administrativa para a apreciação de questão relativa à sobreposição de registros originários de correntes filiatórias paralelas, e referentes a imóveis distintos e vizinhos, ambos com descrição original imprecisa, matéria para cuja solução se impõe a utilização da via jurisdicional.

Este o entendimento expresso pelo Colendo Conselho Superior da Magistratura no julgamento da Apelação Cível nº 4.094-0, da Comarca de São Vicente, Rel. Des. Nogueira Garcez, que demonstrou com eficiência quais as conseqüências da duplicidade de registros:

“A regra do art. 859 do Código Civil, autorizadora do princípio da presunção, não pode ser chamada por nenhum daqueles titulares dos registro duplos. A presunção de que o direito pertence àquele em cujo nome está registrado não pode conviver com o duplo registro.  Seria ilógico raciocinar com a presunção favorecendo, ao mesmo tempo, duas pessoas cujos direitos não podem coexistir. Em outras palavras, a presunção de veracidade do registro desaparece quando há duplicidade.

A conseqüência é a impossibilidade de prática de qualquer ato em qualquer das correntes filiatórias, até que, na via adequada, se decida pela prevalência de uma ou de outra”

(…)

No mesmo sentido o parecer do juiz Ricardo Henry Marques Dip, no Processo CG nº 65/86, publicado nas Decisões Administrativas da Corregedoria Geral da Justiça – 1986, ementa 75:

“Na espécie dos autos, indica-se maltrato ao princípio da continuidade, tipificando-se infringência imediata das normas registrárias, passíveis, assim, prima facie, de cancelamento por força da regra do art. 214, Lei 6.015/73.

Contradistinguem-se, no entanto, a ofensa à continuidade em única linha filiatória e a afronta ao trato sucessivo originário da duplicação de encadeamentos históricos de imóveis. A solução, por distintas as subespécies, merece também diferenciar-se. É tendencial o entendimento doutrinário no sentido de que a instalação de dupla linha filiatória para mesmos imóveis neutraliza a eficácia dos registros antagônicos (para o direito brasileiro, neutralização da presunção iuris tantum do art. 859, CC).

Nesse passo a lição de Martin Wolff: “Si una finca o una parcela está inscrita en dos lojas del registro (inscripción doble), la presunción del § 891 y la fé pública (§ 892 BGB) no se referirán a ninguna de las dos por separado, sino que ambas constituyen en conjunto ‘el registro imobiliario’, y, en aquello en que se contradigan, nadie puede invocar a su favor la inscripción que le favorezca” (Tratado de Derecho Civil, t. III, vol. I, § 37, I, n. 3).

No mesmo sentido de eficacização unitária do registro predial, ensina Hedemann: “Lo que decide es el conjunto del contenido del folio registral correspondiente. Nuestra vista no há de quedar prendida em una sola inscripción particular” (Derechos Reales, § 16, II, n. 4).

Assim Díez-Picazo: “…existiendo dos titulares registrales, ambos disponen en principio de los efectos protectores de la fe pública y, por consiguiente, dichos efectos se neutralizan” (Fundamentos del Derecho Civil Patrimonial, vol. II, § 43, n. 231).

Para o direito brasileiro, ensina Pontes de Miranda: “A contradição entre dois registros que têm fé pública resolve-se pela ineficácia no que se contradigam: nenhum dos que figuram como titulares pode invocar a seu favor o que lhes seja concernente, nem os terceiros podem opor a fé pública a quem haja confiado no registro de conteúdo contrário” (Tratado de Direito Privado, § 1.218, n. 4).

A prioridade no registro não se presta a viabilizar o caminho administrativo, em hipótese de duplicidade de encadeamentos históricos de imóveis, já por isso que não se interdita a retificação registrária no direito brasileiro (arg. dos arts. 212 e ss., Lei 6.015/73) – que pode alterar conteúdo de registro precedente –, bem como se há de evitar que, por meio não jurisdicional, se infirme constituição regular de usucapião secundum tabulas (art. 551, CC).”

Verifica-se, por fim, que não obstante possa se cogitar, em tese, da possibilidade da determinação administrativa de duplo bloqueio dos registros em que constatada a sobreposição, como requerido pelos recorrentes, tal medida, no presente caso, a exemplo do decidido no Processo CG nº 65/86, acima citado, não se mostra necessária nem conveniente.”

Acrescente-se que o pedido de bloqueio está prejudicado, ante a notícia trazida pelos próprios recorrentes no item 14 da petição inicial[5].

E como se não bastasse o quanto exposto, é certo que a questão referente à abertura de matrículas em duplicidade, com origem na transcrição nº 20.182 do 8º Cartório de Registro de Imóveis da Capital,  já foi objeto de decisões proferidas nos autos do Pedido de Providências que tramitou perante a Corregedoria Permanente do Registro de Imóveis de Barueri/SP (processo nº 0002895-36.2014.8.0068) e no do Pedido de Providências que tramitou perante a Corregedoria Permanente do Registro de Imóveis da Capital (processo nº 0035547-39.2016.8.26.0100), sendo em ambos os casos remetidas as partes às vias ordinárias. Não é cabível, pois, a reabertura de discussão da mesma matéria no presente feito.

A respeito, merece ser lembrado o seguinte precedente:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Pretensão de cancelamento de matrículas reputadas nulas – Coisa julgada administrativa configurada, tratando-se do terceiro expediente acerca do tema – Nulidades alegadas, ademais, que não estão cabalmente comprovadas e que envolvem assentos antigos – Inteligência do art. 214, da Lei de Registros Públicos – Questão a ser submetida às vias judiciais – Recurso não provido”[6].

Nesses termos, o parecer que submeto à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de negar provimento ao recurso administrativo.

Sub censura.

São Paulo, 16 de fevereiro de 2018.

STEFÂNIA COSTA AMORIM REQUENA
Juíza Assessora da Corregedoria

Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso administrativo.

Publique-se.

São Paulo, 21 de fevereiro de 2018.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO
Corregedor Geral da Justiça


[1] Fls. 454/455 e embargos de declaração julgados a fls. 468.
[2] Fls. 616/620.
[3] Fls. 637/640.
[4] Fls. 642.
[5] “14. Ressalta-se que a Transcrição 20.185 do documento 5, foi objeto de bloqueio por originado, várias matrículas sem comprovação locacional (sic) – fls. 12.
[6] CGJSP – Processo: 0010229-53.2016.8.26.0068. Autor(es) do Parecer: Tatiana Magosso. Corregedor: Manoel de Queiroz Pereira Calças. Data da Decisão: 11/08/2017. Data do Parecer: 08/08/2017.

Fonte: IRIB | 15/03/2018.

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