Trabalhadora vítima de racismo e presa com fita crepe será indenizada em R$ 180 mil


  
 

O Tribunal Regional do Trabalho – TRT da 15ª Região condenou uma empresa a indenizar por danos morais em R$ 180 mil uma trabalhadora vítima de racismo e humilhação. Dentre os atos gravíssimos sofridos, a mulher teve o braço preso com uma fita crepe ao de superiores ao ser acusada de “fujona”. A desembargadora Luciane Storel manteve a condenação, mas diminuiu a indenização que inicialmente era de R$ 620 mil.

De acordo com os autos, a mulher alegou ter sofrido ofensas ligadas ao racismo e punição por atraso e falta injustificada. Durante o processo, testemunhas foram ouvidas e confirmaram os fatos. Uma delas afirmou que a autora da ação teria recebido “parabéns” no Dia da Consciência Negra.

Em outro caso relatado, a funcionária foi presa a outros supervisores com o uso de uma fita crepe nos punhos, para mostrar a todos os funcionários como tratar um empregado “fujão”. Isso teria acontecido um dia após ela sair mais cedo, e foi presenciado por várias pessoas.

Em primeiro grau, além dos casos acima, também foi citada a carga de emoção demonstrada pela trabalhadora durante o depoimento, que corrobora a constatação da dor e do sofrimento que os fatos lhe causaram. A indenização foi fixada em R$ 620 mil.

No TRT, a desembargadora Luciane Storel destacou que os fatos narrados são gravíssimos e denotam discriminação racial. Em relação ao valor da indenização, a magistrada entendeu que o montante fixado inicialmente deveria ser minorado, considerando casos semelhantes julgados pelo TRT. Assim, o valor foi reduzido para R$ 180 mil.

Especialista analisa a decisão

Elisa Cruz, defensora pública e membro da Comissão de Diversidade Racial e Etnia do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, destaca que a decisão vai de acordo com a Constituição e a nossa jurisprudência.

“A Constituição, em primeiro lugar, porque o art. 4º, VIII, traz como um dos objetivos da República o repúdio ao racismo. A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, a proteção aos direitos da personalidade no Código Civil e a Lei 7.716/1989 também são leis importantes para o combate aos trabalhadores, racismo e proteção a pessoas em vulnerabilidade”, detalha.

Ela enfatiza que a decisão é importante por demonstrar o compromisso do Poder Judiciário contra práticas racistas, que são proibidas pela Constituição, e, em alguma medida, repara os danos materiais e morais sofridos pela mulher. Mas há ressalvas.

“Apesar disso, é uma pena que só haja notícia de decisão em processo individual, porque a existência dessa situação traz a pergunta sobre a existência de práticas cotidianas de racismo institucionalizado nessa empresa e que deveriam ser objeto de apuração coletiva pelas instituições com legitimidade”, afirma.

Combate ao racismo

A defensora pública destaca que o combate ao racismo parte da possibilidade de falarmos sobre o tema e também de nos entendermos como parte de uma sociedade racista, uma vez que se trata de um modo de reprodução social, político e econômico que organizou a sociedade brasileira e nossas leis.

“Carregamos uma forma de ver e interpretar o mundo que trazessa herança. Ao entender o nosso passado e a sua contribuição na manutenção de atitudes racistas, precisamos ser antirracistas”, diz citando a filósofa, feminista negra, escritora e acadêmica brasileira Djamira Ribeiro.

E ser antirracista, primeiramente, significa colaborar: “Uma forma eficaz é denunciar os racismos quando ocorrem e ser solidário às pessoas que são vítimas. Deixo aqui como sugestão o livro da Djamila Ribeiro chamado ‘Pequeno Manual Antirracista’”, indica.

132 anos da Lei Áurea

No último dia 13 de maio, a Lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil, completou 132 anos. Estabelecida de forma gradual, a lei foi um marco importante na história do país através do esforço de negros, negras, políticos e organizações sociais, que realizaram movimentos e buscaram os seus direitos, como lembra Elisa Cruz.

“A data é símbolo dessa luta, mas a história que conduz à aprovação da lei e a organização posterior para tentar igualdade para as pessoas negras não podem ser esquecidos”, destaca.

A defensora também destaca que apesar dos 132 anos da abolição da escravatura, a reparação ainda não foi perfeitamente realizada no Brasil. Para que isso aconteça, é preciso enfrentar os efeitos de o país ter sido organizado com a inferiorização das pessoas negras.

“O trabalho de dar visibilidade às condições de vida das pessoas negras, como tem feito o IBDFAM, é essencial para aprofundar as conquistas”, destaca.

Campanha contra termos racistas

A Rede Globo, em parceria com o Fundo de População das Nações Unidas – UNFPA, começou uma campanha que discute a necessidade de eliminar expressões racistas do vocabulário popular. Rastros ainda sentidos na sociedade atual, como a discriminação e iniquidades.

Elisa Cruz enfatiza que esse tipo de campanha é necessária, pois a linguagem carrega traços de cultura e, em relação a pessoas negras, várias expressões têm sido utilizadas de forma discriminatória.

“Isso é bem explorado pelo jornalista Laurentino Gomes no livro ‘Escravidão – Do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares’. Por exemplo, ‘serviço de preto’, ‘não sou suas negas’, ‘cabelo ruim’ são formas de diminuir o valor intrínseco à pessoa negra. Campanhas como essa devem ser estimuladas e divulgadas como instrumento de avanço no combate ao racismo”, finaliza.

Fonte: IBDFAM

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias

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