Registro de Imóveis – Retificação de área – Metragem duplicada – Impugnação fundada no ajuizamento de ação de usucapião – Aumento de área que, per si, não configura óbice peremptório à pretensão de retificar – Exercício possessório que refoge ao âmbito da retificação – Ação de usucapião que, por si, não representa impeditivo à pretensão retificadora – Ausência, no caso concreto, de demonstração de que a retificação pretendida é intra muros


  
 

Número do processo: 1120962-02.2018.8.26.0100

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 143

Ano do parecer: 2021

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1120962-02.2018.8.26.0100

(143/2021-E)

Registro de Imóveis – Retificação de área – Metragem duplicada – Impugnação fundada no ajuizamento de ação de usucapião – Aumento de área que, per si, não configura óbice peremptório à pretensão de retificar – Exercício possessório que refoge ao âmbito da retificação – Ação de usucapião que, por si, não representa impeditivo à pretensão retificadora – Ausência, no caso concreto, de demonstração de que a retificação pretendida é intra muros – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Cuida-se de recurso interposto por PAULO ANTONIO SARMENTO GONDIM e outra em face da r. sentença de fl. 578/581 que julgou improcedente o pedido de retificação de área descrita na matrícula n.º 34.684 do 8º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital por entender se tratar de matéria conflituosa que refoge à questão registral, nos termos do §6º do art. 213 da Lei nº 6.015/73, remetendo os interessados às vias ordinárias.

Em suma, sustentam os recorrentes a possibilidade de suspensão do feito diante de questão de prejudicialidade externa; que o imóvel ocupado pela impugnante não se confunde com a área em questão; e que a suspensão do feito busca evitar o dispêndio de maiores gastos para ambas as partes.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça ofertou parecer, opinando pelo desprovimento do recurso (fl. 624/627).

Endereçado o recurso ao C. Conselho Superior da Magistratura, sobreveio decisão monocrática determinando a remessa dos autos à Corregedoria Geral da Justiça (fl. 629/630).

É o relatório.

Opino.

A hipótese versa sobre requerimento de retificação administrativa de registro imobiliário, fundado no art. 213, II, da Lei nº 6.015/1973, por intermédio do qual pretendem os recorrentes a retificação de área e perímetro do imóvel objeto da matrícula n.º 34.684 do 8º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital.

Indeferiu-se o requerimento em face da insurgência de Maria Rita Costa, autora da ação de usucapião n.º 0009395-61.2010.8.26.0100, em que pleiteia a declaração de domínio de parte do imóvel retificando (n.º 534 da Rua Jaboatão, Casa Verde).

O procedimento foi encaminhado ao MM. Juízo Corregedor Permanente, que julgou improcedente o pedido de providências (fl. 578/581).

Pois bem.

O imóvel da matrícula n.º 34.684, objeto do pedido de retificação, tem a seguinte descrição:

“Duas pequenas casas e seu respectivo terreno, situados à rua Jaboatão, nºs 534 e 536, antigos nºs 116-A e 118, no 23º Subdistrito-Casa Verde, medindo 10,00 m de frente; por 50,00 m em ambos os lados, da frente aos fundos onde tem a mesma largura da frente, encerrando a área de 500,00m?2;, confinando de um lado com o imóvel nº 524, de outro lado com o imóvel nº 542, ambos da Rua Jaboatão, e nos fundos com o imóvel nº 154 e 164 da Rua Lambari, sendo que anteriormente, confinava de um lado com Antônio de Jesus, de outro lado com Florêncio de Tal, e nos fundos com Herdeiros de Francisco Nicolau Baruel. Inscrito no Cadastro dos Contribuintes da Prefeitura Municipal sob nº 074.057.0081-0”.

De outro lado, no trabalho técnico apresentado para a pretendida retificação consta área total de 1.145,76 m²; (fl. 45/47).

Na retificação do registro o aumento de área não é, de per si, óbice peremptório à pretensão de retificar.

É o que esta Corregedoria Geral da Justiça já teve a recente ocasião de reafirmar:

“…tenha-se que não há limites objetivos previstos na para eventual aumento de área por conta da realização da retificação imobiliária, desde que respeitados os limites geodésicos do imóvel em questão. É que os arts. 212 e 213, da Lei nº 6.015/1973, não estabelecem limites objetivos para a retificação do registro, considerando-se sua função de garantir que este espelha a realidade de fato do imóvel” (Recurso administrativo 1002561-48.2019.8.26.0152, j. 23.1.2020, DJe 30.1.2020, cad. 1 – adm., p. 13; cf. também Rec. Adm. 1011754-07.2019.8.26.0405, j. 16.4.2020, DJe 13.5.2020, cad. 1 – adm., p. 12).

E, de resto, a lição é antiga:

“É curial para a segurança do sistema de registro de propriedade imobiliária evitar que a retificação com aumento de área enseje aquisição irregular. Daí o entendimento de que somente a retificação intra muros – nos limites do título causal – é legítima. E ‘retificação intra muros não é retificação de imóvel murado em todo seu perímetro, mas sim retificação interna (não externa), ou seja, dentro das divisas tituladas e, por isso, nas forças do próprio título de domínio (não além das forças do título)’ (Processo CG nº 141/2006). Porém, não há relação necessária entre aumento nominal da área e transcendência do título: superfície maior, a priori, não implica retificação extra muros. Nesse sentido jurisprudência em matéria de registro imobiliário” (STJ, REsp 716.489-MT, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 8.4.08; TJSP, Ap. Cível nº 344.045-4/9- 00, 2ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Ariovaldo Santini Teodoro, j. 21.9.4; Ap. Cível nº 103.853-4/8-00, 2ª Câmara de Direito Privado, Des. Cezar Peluso, j. 13.2.01). (CGJSP, Processo 67033/2011, j. 23.8.2011).

Se o critério fundamental a se observar, portanto, não é o incremento ou a redução da superfície do imóvel, o que se deve verificar, no caso concreto, é a correspondência entre o que agora apura no curso da retificação e uma situação jurídica que, subsistindo no plano do direito material (= no plano da causa para a aquisição do direito real), ainda está mal descrita nos assentos do ofício de registro de imóveis.

Como se diz no jargão do direito registral imobiliário, essa verificação é feita ao se examinar se a retificação ocorre intra muros, quer dizer, se o imóvel está “(1) precisamente localizado, não havendo dúvidas a este respeito, assim, como (2) identificado(s) seu(s) titular(es), (3) delimitado seus contornos, com a fixação de limites e divisas que (4) preservem, sem desfalque, os imóveis confrontantes e confinantes” (Salles e Salles, loc. cit., p. 450-451).

Tampouco parece representar impedimento à retificação o trâmite de ação de usucapião, por si, observando-se que a questão possessória refoge ao âmbito da retificação e, em eventual procedência da demanda, far-se-ia o desfalque da matrícula retificanda com posterior nova retificação, a fim de fixar o real contorno perimetral remanescente do todo atingido.

Daí porque não há razão para a suspensão do pleito até solução da ação de usucapião ajuizada pela impugnante.

Ocorre que, a despeito do acima consignado, in casu, não se consegue aferir, a partir da documentação encartada à pretendida retificação, ser a mesma intra muros.

Ou seja, não há concreta demonstração de que o registro em questão comporta a área apresentada na planta e no memorial descritivo sem se sobrepor aos registros de imóveis confrontantes.

A expressão intra muros não se relaciona com o exercício possessório, mas diz respeito aos limites tabulares dos confrontantes e vias públicas com que faz divisa.

No caso concreto, a partir do trabalho técnico constante dos autos não se pode afirmar que a retificação será intra muros, não havendo como se afastar, de plano, a coincidência dos imóveis ou a ocorrência de sobreposição de áreas.

Ante o exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de negar provimento ao recurso.

Sub censura.

São Paulo, 11 de maio de 2021.

Leticia Fraga Benitez

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Vistos. Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. São Paulo, 18 de maio de 2021. (a) RICARDO ANAFE, Corregedor Geral da Justiça – ADV: LUCIANA RIBEIRO ARO, OAB/SP 132.996, MAURÍCIO SANTIAGO MARQUES DOS SANTOS, OAB/SP nº  340.524 e BRUNO FERNANDES FULLE, OAB/SP nº 246.238.

Diário da Justiça Eletrônico de 30.08.2021

Decisão reproduzida na página 082 do Classificador II – 2021

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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