1VRP/SP: Registro de Imóveis. Divórcio Partilha de bens. Diante do regime adotado, separação de bens, é indevida a anotação do estabelecimento de condomínio “pro indiviso”.

Processo 1026053-26.2022.8.26.0100

Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Selma Van Tol – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para determinar a retificação da Averbação n.18 da matrícula n.7.730 e da Averbação n.6 da matrícula n.136.261, ambas do 15º RI, de modo a constar a condição de serem bens particulares, que não se comunicam com o patrimônio do ex-cônjuge, Luigi Carbone. Deste procedimento, não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe. P.R.I.C. – ADV: JORGE EUSTÁCIO DA SILVA FRIAS (OAB 32547/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1026053-26.2022.8.26.0100

Classe – Assunto Pedido de Providências – Registro de Imóveis

Requerente: Selma Van Tol

Requerido: 15º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de pedido de providências formulado por Selma Van Tol em face do Oficial do 15º Registro de Imóveis da Capital, visando retificação da Averbação n.18 da matrícula n.7.730 e da Averbação n.6 da Matrícula n.136.261, ambas daquela serventia.

A parte interessada alega que, ao proceder à averbação de seu divórcio nas matrículas indicadas, o Oficial fez inserir a informação de que os imóveis não haviam sido partilhados, permanecendo “em comum, na proporção de metade ideal ou 50% para cada um dos divorciandos”. Tal dado, porém, não constava da sentença de divórcio, pelo que deve ser corrigida. Esclarece, ainda, que se casou na Itália pelo regime da separação voluntária de bens e vive, desde então, naquele país, cuja legislação não prevê, para o regime de bens escolhido, a comunicabilidade do patrimônio adquirido na constância do casamento, notadamente em situação como a que se apresenta: os imóveis foram comprados em sub-rogação de outro recebido por herança materna, o que foi expressamente reconhecido pelo ex-cônjuge. Assim, defende a inaplicabilidade da súmula n.377 do STF e requer a anotação de que os bens pertencem exclusivamente a ela.

Documentos vieram às fls.13/54.

Constatada a ausência de prenotação válida, determinou-se a reapresentação do requerimento à serventia extrajudicial (fl.55).

Por entender que o novo título a ser prenotado seria a sentença, a parte requereu o prosseguimento independentemente de novo protocolo (fls.58/59).

O Oficial se manifestou às fls.64/67, alegando que as averbações reproduziram textualmente o requerimento objeto da prenotação n.947.966, sendo que novo requerimento não foi apresentado, conforme determinado à fl.55. Ainda assim, caso fosse apresentado, seria mantido o óbice apontado na primeira qualificação, quando exigida decisão judicial definindo a questão da comunicabilidade dos bens.

A parte interessada se manifestou às fls.72/74, explicando que os termos do requerimento que instruiu a reapresentação do título foram ditados a ela por escrevente da serventia extrajudicial e que somente transcreveu ditos termos para superar a exigência formulada, sem compreender a extensão jurídica da declaração de comunicação dos bens por não ter conhecimento técnico suficiente. Outrossim, ressalta que a comunicabilidade não constou na sentença que deu suporte às averbações.

O Ministério Público opinou pela procedência (fls.79/81).

Considerando a justificativa da parte interessada para não atender à determinação de fl.55 e por economia processual, foi concedido prazo complementar para reapresentação do requerimento à serventia extrajudicial (fls.83/84).

Com o atendimento, tanto o Oficial quanto o Ministério Público reiteraram suas manifestações anteriores (fls.86, 91/92 e 119).

É o relatório.

Fundamento e decido.

No mérito, o pedido de providências deve ser acolhido.

Vejamos os motivos.

O artigo 213, I, “a”, da Lei de Registros Públicos, autoriza que o Oficial retifique registro ou averbação a requerimento do interessado nos casos de “omissão ou erro cometido na transposição de qualquer elemento do título”.

No caso concreto, as averbações questionadas tomaram por base a sentença estrangeira de divórcio, que foi expedida pelo Tribunal de Imperia, na Itália, com tradução e transcrição no Registro Civil das Pessoas Naturais desta Comarca (fls.22/23, 28/29 e 30/45)

Verifica-se que a parte interessada se casou naquele país pelo regime convencional da separação de bens, segundo o qual, tanto na legislação italiana como na brasileira, presume-se afastada a comunicação entre os bens adquiridos na constância do casamento e o patrimônio conjugal, ressalvada a obrigação de ambos os cônjuges contribuírem com as despesas domésticas para a manutenção da família.

Ademais, mesmo nos casos em que o regime da separação de bens é obrigatório, a atual orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça nos Embargos de Divergência nº1.623.858/MG é pela releitura da antiga súmula 377 do STF, com compreensão de que o esforço comum não pode ser presumido:

“EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. CASAMENTO CONTRAÍDO SOB CAUSA SUSPENSIVA. SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS (CC/1916, ART. 258, II; CC/2002, ART. 1.641, II). PARTILHA. BENS ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE. NECESSIDADE DE PROVA DO ESFORÇO COMUM. PRESSUPOSTO DA PRETENSÃO. MODERNA COMPREENSÃO DA SÚMULA 377/STF. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS.

1. Nos moldes do art. 1.641, II, do Código Civil de 2002, ao casamento contraído sob causa suspensiva, impõe-se o regime da separação obrigatória de bens.

2. No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição.

3. Releitura da antiga Súmula 377/STF (No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento), editada com o intuito de interpretar o art. 259 do CC/1916, ainda na época em que cabia à Suprema Corte decidir em última instância acerca da interpretação da legislação federal, mister que hoje cabe ao Superior Tribunal de Justiça.

4. Embargos de divergência conhecidos e providos, para dar provimento ao recurso especial” (EREsp 1623858/MG, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 23/05/2018, DJe 30/05/2018).

Por entender o Oficial que a matéria envolvia a comunicabilidade ou não dos imóveis, matéria que não foi resolvida na sentença, concluiu pela necessidade de decisão judicial sobre a questão (fl.46).

Visando superar o óbice, a parte reapresentou o título, incluindo declaração pessoal que não constou na sentença, sem compreender a implicação jurídica do ato (fls.68/71).

Assim, o Oficial, com a licença da parte apresentante e seguindo a nota que orienta a aplicação do item 9, “b”, 14, Cap.XX, das NSCGJ, anotou a ausência de partilha dos bens e o surgimento do condomínio “pro indiviso”.

Neste ponto, a anotação estaria correta se o regime de bens adotado no casamento não fosse o da separação convencional

Note-se que, quando há partilha definindo o domínio dos bens como consequência da alteração do estado das pessoas envolvidas, o título não deve ser averbado, mas registrado por força do número 25, inciso I, do artigo 167, da Lei n. 6.015/73.

Diante do regime da separação de bens, não há que se falar em comunicação patrimonial, ficando dispensada, portanto, menção expressa à partilha por ocasião do divórcio. Sendo exceção à regra legal, eventual partilha acordada é que deverá constar obrigatoriamente no título, justamente a fim de possibilitar registro.

Nesse contexto, diante do regime adotado, separação de bens, conclui-se que é indevida a anotação do estabelecimento de condomínio “pro indiviso”, o que se confirma porque tal dado não consta no título.

Aliás, visando afastar a possibilidade de confusão, com retrato da real situação do bem, é importante noticiar que o imóvel foi adquirido com capital exclusivo de Selma, ou seja, que se trata de bem particular, notadamente diante da manifestação expressa do ex-cônjuge no sentido de que não se considera prejudicado (fls.14 e 51).

Justamente porque há consenso entre o casal, a via jurisdicional é totalmente prescindível.

A retificação, portanto, é necessária. Neste sentido, Luiz Guilherme Loureiro observa:

“Em virtude do princípio da legitimidade ou da presunção de veracidade, o Registro deve refletir a verdade não só no que se refere ao titular do direito registrado, mas também quanto à natureza e ao conteúdo deste direito. Assim, qualquer inexatidão do assento deve ser retificada a fim de que reflita perfeitamente a realidade” (Registros Públicos – Teoria e Prática – 2ª ed. – Editora Método).

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para determinar a retificação da Averbação n.18 da matrícula n.7.730 e da Averbação n.6 da matrícula n.136.261, ambas do 15º RI, de modo a constar a condição de serem bens particulares, que não se comunicam com o patrimônio do ex-cônjuge, Luigi Carbone.

Deste procedimento, não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe.

P.R.I.C.

São Paulo, 07 de junho de 2022.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito (DJe de 09.06.2022 – SP)

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo

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1VRP/SP: Registro de Imóveis. O bem objeto de alienação fiduciária não encontra-se no patrimônio do devedor até quitação da dívida firmada entre as partes. Assim, mostra-se equivocado impedir a consolidação da propriedade outrora resolúvel em definitivo em favor do credor sob o argumento de existir ordem de indisponibilidade.

Processo 1036402-88.2022.8.26.0100

Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Dialogo Engenharia e Construtora Ltda – – Itanguá Empreendimentos Imobiliários Ltda – Diante do exposto, JULGO PREJUDICADO o pedido no que diz respeito à continuidade do procedimento de execução da garantia de alienação fiduciária, já que reconhecida a ausência de qualquer óbice para tanto, e IMPROCEDENTE o pedido de cancelamento das ordens de indisponibilidade averbadas na matrícula n. 122.315. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: CARLA DIAN XAVIER MONTEIRO (OAB 150339/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1036402-88.2022.8.26.0100

Classe – Assunto Pedido de Providências – Registro de Imóveis

Requerente: Dialogo Engenharia e Construtora Ltda e outro

Requerido: 10º Oficial de Registro de Imóveis

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelas empresas Diálogo Engenharia e Construtora Ltda e Itanguá Empreendimentos Imobiliários Ltda em face do Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, objetivando o cancelamento das indisponibilidades averbadas sob n. 08, 09, 10 e 11 na matrícula n. 122.315 daquela serventia, com continuidade do procedimento extrajudicial de execução da alienação fiduciária referente ao imóvel ali descrito.

A parte requerente alega que firmou com Priscila Savaglia Salatino Feix escritura pública de compra e venda do apartamento n. 52, localizado no 5º pavimento do Residencial Lumina (rua Brentano, n. 401, Lapa, São Paulo), com pacto adjeto de alienação fiduciária em garantia, conforme registro efetivado em 23/12/2009 na matrícula n. 122.315 (R-4); que, diante do inadimplemento, requereu a intimação da devedora para pagamento das prestações (Lei n. 9.514/97); que, não localizada pessoalmente a fiduciante, socorreu-se da via judicial a fim de notificá-la; que, neste entretempo, o procedimento se encerrou pelo decurso de prazo (prenotação n. 546.816); que, em 05/11/2021, apresentou novo pedido de intimação da devedora, o qual foi devolvido com a exigência de manifestação acerca das averbações n. 08, 09 e 10, que retratam a indisponibilidade dos bens da devedora Priscila Savaglia (prenotação n.562.121).

Sustenta, ainda, que as indisponibilidades não podem impedir a execução da garantia; que a adquirente é titular de direito aquisitivo de propriedade em suspensão, que só se aperfeiçoará se o débito for pago e a alienação fiduciária extinta; que as indisponibilidades foram averbadas após dez anos do registro da escritura e não poderiam gerar efeitos em relação ao imóvel alienado fiduciariamente, uma vez que não pertence à fiduciante (compradora); que aplicáveis, por analogia, as disposições que regem a impenhorabilidade do bem de família, por permitirem a penhora quando o débito cobrado decorre de impostos, de despesas de condomínio e do saldo devedor da compra do próprio bem (artigo 3º, II e IV, Lei n. 8.099/90); que a indisponibilidade poderia recair sobre o saldo positivo devido à devedora após leilão (artigo 27, §4º, da Lei n. 9.514/97); que a manutenção das indisponibilidades e a negativa de consolidação da propriedade concederia aos terceiros credores um direito maior do que aquele que a devedora possui sobre o imóvel, o que representa enriquecimento sem causa e fraude contra credores; que a alienação fiduciária foi constituída por ato jurídico perfeito, não podendo ser alcançada ou inviabilizada por atos posteriores; que não desconhece o decidido pela E. CGJ no processo n.2005/00167424 (para averbação da consolidação da propriedade se faria necessário o levantamento das constrições); que referido entendimento não enfrentou todas as questões trazidas nestes autos; que a indisponibilidade acaba por impedir o exercício de direitos do proprietário sobre o imóvel, causando grande prejuízo, ainda que se considere que a indisponibilidade não recai sobre o bem, mas sobre os direitos do devedor, conforme precedente desta Vara de Registros Públicos (processo de autos n.1117050-60.2019.8.26.0100). Pretende, assim, o cancelamento das averbações e a continuidade do procedimento de execução da alienação fiduciária (artigos 26 e seguintes da Lei n.9.514/97).

Documentos vieram às fls. 09/131.

O feito foi recebido como pedido de providências tendo em vista o seu objeto. Ademais, constatado o decurso do trintídio legal da última prenotação, determinou-se a reapresentação do requerimento à serventia extrajudicial (fl. 132).

Com o atendimento, o Oficial se manifestou às fls. 138/139, informando que as averbações de indisponibilidade dos bens da devedora na matrícula do imóvel não impedem o prosseguimento da execução da garantia nem a consolidação da propriedade em nome das credoras fiduciárias (artigos 26 e seguintes da Lei n. 9.514/97 e processo de autos n.1106718-63.2021.8.26.0100); que a devolução do requerimento de intimação da devedora se deu apenas para que fosse apresentada declaração de que as credoras estavam cientes da existência das indisponibilidades averbadas; que o óbice foi sanado com a distribuição deste feito. Documentos foram produzidos às fls. 140/213 e 215/216.

O Ministério Público opinou pela parcial procedência, já que eventual cancelamento deve advir da autoridade que decretou a indisponibilidade (fls. 220/222).

É o relatório.

Fundamento e decido.

De início, vale ressaltar que o registrador dispõe de autonomia no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (art. 28 da Lei n. 8.935/94), o que não caracteriza falha funcional.

Verifica-se, porém, que o Oficial do 10º RI alterou o posicionamento adotado quando da qualificação, reconhecendo que a existência de averbações de indisponibilidade dos bens da devedora não constitui óbice ao regular procedimento da execução da garantia de alienação fiduciária.

De fato, por recaírem as indisponibilidades tão somente sobre os direitos que a devedora possui sobre o bem alienado fiduciariamente, prescindível a manifestação das credoras fiduciárias como condição ao exercício do direito que detêm sobre o imóvel.

Note-se que o entendimento atual da E. Corregedoria Geral da Justiça mencionado pela parte interessada foi exarado em parecer que manteve decisão deste próprio juízo, a qual permitiu a averbação de consolidação da propriedade de imóvel em favor da credora fiduciária em virtude do inadimplemento a despeito da existência de averbação de indisponibilidade contra a devedora fiduciante (Recurso Administrativo n. 1117050-60.2019.8.26.0100 – Parecer CG 128/2020-E).

Note-se que o entendimento atual da E. Corregedoria Geral da Justiça mencionado pela parte interessada foi exarado em parecer que manteve decisão deste próprio juízo, a qual permitiu a averbação de consolidação da propriedade de imóvel em favor da credora fiduciária em virtude do inadimplemento a despeito da existência de averbação de indisponibilidade contra a devedora fiduciante (Recurso Administrativo n. 1117050-60.2019.8.26.0100 – Parecer CG 128/2020-E).

Não há, de fato, como a indisponibilidade recair sobre o próprio bem se o fiduciário ainda não possui a propriedade plena, de modo que incabível que tal restrição se estenda ao credor fiduciário e até mesmo aos demais credores que buscam no patrimônio do devedor a satisfação de suas obrigações. Entendimento contrário, no sentido de que a indisponibilidade na matrícula obsta a consolidação da propriedade, vai de encontro ao conceito do próprio instituto da alienação fiduciária.

A decisão foi mantida no parecer mencionado, de lavra do Juiz Assessor da Corregedoria Alberto Gentil de Almeida Pedroso, com aprovação pelo então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador Ricardo Anafe, em solução diversa ao que até então vinha sendo adotado (destaques nossos):

“Entretanto, adentrando na análise do modelo idealizado pela Lei n.° 9.514/97 para alienação fiduciária, não parece existir óbice algum ao ato de consolidação da propriedade em favor do credor, desde que observado o procedimento legal pois a indisponibilidade não atinge especificamente o bem imóvel objeto do contrato, mas os direitos reservados ao devedor.

(…) O bem objeto de alienação fiduciária não encontra-se no patrimônio do devedor até quitação da dívida firmada entre as partes.

Assim, mostra-se equivocado impedir a consolidação da propriedade outrora resolúvel em definitivo em favor do credor sob o argumento de existir ordem de indisponibilidade.

Em reforço, vale trazer à baila posição atual da Jurisprudência sobre o não alcance das ordens judiciais de constrição de bens contra o executado (devedor) em relação as propriedades resolúveis oriundas de alienação fiduciária em favor dos credores fiduciários:

Agravo de Instrumento – Decisão que indeferiu o levantamento de indisponibilidade sobre bem imóvel alienado fiduciariamente – Impossibilidade – Alienação fiduciária anterior à citação do devedor na ação civil pública, bem como, à determinação de indisponibilidade – Ausência de comprovação da má-fé – Constrição que deve recair sobre os direitos derivados da alienação fiduciária – Decisão reformada – Recurso provido. (TJSP, Agravo de Instrumento nº 2033445-14.2019.8.26.0000, Comarca: Ubatuba, Agravante: BANCO TRICURY S.A. Agravado: MUNICÍPIO DE UBATUBA, Rel: Drº Jefferson Moreira de Carvalho)”.

A mesma lógica se aplica ao caso concreto.

Isso porque a fiduciante, Priscila Savaglia Salatino Feix, contra quem recaem as ordens de indisponibilidade (fls. 211/212), não detém a propriedade plena do imóvel em conformidade com o que dispõe a Lei n. 9.514/97 (que instituiu e regulamentou a alienação fiduciária de coisa imóvel). As restrições, assim, não atingem especificamente o bem imóvel objeto do contrato, mas os direitos reservados a ela.

As ordens de indisponibilidade, em consequência, não podem se estender às credoras fiduciárias (Diálogo Engenharia e Construção Ltda e Itanguá Empreendimentos Imobiliários Ltda – R.4 – fls. 209/210), o que afasta qualquer prejuízo a elas, que poderão consolidar a propriedade em seu favor em caso de inadimplemento.

As restrições produzirão efeitos apenas para a devedora fiduciária, a qual não poderá transferir seus direitos nem eventual propriedade que venha a adquirir no caso de eventual extinção da garantia enquanto perdurarem as ordens de indisponibilidade.

Neste contexto, não resta dúvida de que desnecessária era a emissão de nota de devolução para ciência da parte credora sobre a existência de tais gravames.

Como houve reconhecimento da possibilidade de continuidade do procedimento de execução da garantia pelo Oficial, o pedido fica prejudicado nesta parte.

No que diz respeito à pretensão de cancelamento das averbações n. 08, 09, 10 e 11 da matrícula n. 122.315, as quais tratam da indisponibilidade dos bens de Priscila Savaglia Salatino Feix, a conclusão é outra.

Tais indisponibilidades foram averbadas em decorrência de ordens efetivadas por meio da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens CNIB, destinada a recepcionar comunicações de indisponibilidade de bens imóveis não individualizados (Provimento CNJ n. 39/2014).

Verifica-se, ainda, que as três primeiras averbações se deram em cumprimento de ordem expedida pelo Grupo Auxiliar de Execução e Pesquisa Patrimonial- GAEPP (TRT da 2ª Região) e a última pelo juízo da 63ª Vara do Trabalho de São Paulo (respectivamente autos n. 00015643020155020059, 10021781020175020039, 10010434120175020013 e 10011088020175020063 – fls. 211/212).

Ocorre que o cancelamento das averbações deve ser determinado pelo juízo de onde partiram as ordens de indisponibilidade.

Este juízo administrativo, como se sabe, não pode rever ordem de outro juízo.

Neste sentido:

“Pedido de providências – Pedido de declaração de nulidade da averbação de penhora/indisponibilidade de direitos e da averbação da consolidação da propriedade em favor do credor fiduciário do imóvel objeto dos autos – Atos de inscrição impugnados que apenas refletiram cumprimento de ordens judiciais recebidas – Judicialização das discussões que impede a revisão administrativa dos atos registrários – Recurso desprovido” (CGJ Recurso Administrativo n. 1048666-74.2021.8.26.0100 j. 14.03.2022 Corregedor Geral da Justiça Des. Fernando Antonio Torres Garcia).

Em outros termos, as credoras devem recorrer ao juízo de onde advieram as ordens de indisponibilidade para alcançar cancelamento, com posterior averbação na matrícula.

Diante do exposto, JULGO PREJUDICADO o pedido no que diz respeito à continuidade do procedimento de execução da garantia de alienação fiduciária, já que reconhecida a ausência de qualquer óbice para tanto, e IMPROCEDENTE o pedido de cancelamento das ordens de indisponibilidade averbadas na matrícula n. 122.315.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 07 de junho de 2022.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juíza de Direito (DJe de 09.06.2022 – SP)

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo

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Registro de Imóveis – Retificação de área – Metragem duplicada – Impugnação fundada no ajuizamento de ação de usucapião – Aumento de área que, per si, não configura óbice peremptório à pretensão de retificar – Exercício possessório que refoge ao âmbito da retificação – Ação de usucapião que, por si, não representa impeditivo à pretensão retificadora – Ausência, no caso concreto, de demonstração de que a retificação pretendida é intra muros

Número do processo: 1120962-02.2018.8.26.0100

Ano do processo: 2018

Número do parecer: 143

Ano do parecer: 2021

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1120962-02.2018.8.26.0100

(143/2021-E)

Registro de Imóveis – Retificação de área – Metragem duplicada – Impugnação fundada no ajuizamento de ação de usucapião – Aumento de área que, per si, não configura óbice peremptório à pretensão de retificar – Exercício possessório que refoge ao âmbito da retificação – Ação de usucapião que, por si, não representa impeditivo à pretensão retificadora – Ausência, no caso concreto, de demonstração de que a retificação pretendida é intra muros – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Cuida-se de recurso interposto por PAULO ANTONIO SARMENTO GONDIM e outra em face da r. sentença de fl. 578/581 que julgou improcedente o pedido de retificação de área descrita na matrícula n.º 34.684 do 8º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital por entender se tratar de matéria conflituosa que refoge à questão registral, nos termos do §6º do art. 213 da Lei nº 6.015/73, remetendo os interessados às vias ordinárias.

Em suma, sustentam os recorrentes a possibilidade de suspensão do feito diante de questão de prejudicialidade externa; que o imóvel ocupado pela impugnante não se confunde com a área em questão; e que a suspensão do feito busca evitar o dispêndio de maiores gastos para ambas as partes.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça ofertou parecer, opinando pelo desprovimento do recurso (fl. 624/627).

Endereçado o recurso ao C. Conselho Superior da Magistratura, sobreveio decisão monocrática determinando a remessa dos autos à Corregedoria Geral da Justiça (fl. 629/630).

É o relatório.

Opino.

A hipótese versa sobre requerimento de retificação administrativa de registro imobiliário, fundado no art. 213, II, da Lei nº 6.015/1973, por intermédio do qual pretendem os recorrentes a retificação de área e perímetro do imóvel objeto da matrícula n.º 34.684 do 8º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital.

Indeferiu-se o requerimento em face da insurgência de Maria Rita Costa, autora da ação de usucapião n.º 0009395-61.2010.8.26.0100, em que pleiteia a declaração de domínio de parte do imóvel retificando (n.º 534 da Rua Jaboatão, Casa Verde).

O procedimento foi encaminhado ao MM. Juízo Corregedor Permanente, que julgou improcedente o pedido de providências (fl. 578/581).

Pois bem.

O imóvel da matrícula n.º 34.684, objeto do pedido de retificação, tem a seguinte descrição:

“Duas pequenas casas e seu respectivo terreno, situados à rua Jaboatão, nºs 534 e 536, antigos nºs 116-A e 118, no 23º Subdistrito-Casa Verde, medindo 10,00 m de frente; por 50,00 m em ambos os lados, da frente aos fundos onde tem a mesma largura da frente, encerrando a área de 500,00m?2;, confinando de um lado com o imóvel nº 524, de outro lado com o imóvel nº 542, ambos da Rua Jaboatão, e nos fundos com o imóvel nº 154 e 164 da Rua Lambari, sendo que anteriormente, confinava de um lado com Antônio de Jesus, de outro lado com Florêncio de Tal, e nos fundos com Herdeiros de Francisco Nicolau Baruel. Inscrito no Cadastro dos Contribuintes da Prefeitura Municipal sob nº 074.057.0081-0”.

De outro lado, no trabalho técnico apresentado para a pretendida retificação consta área total de 1.145,76 m²; (fl. 45/47).

Na retificação do registro o aumento de área não é, de per si, óbice peremptório à pretensão de retificar.

É o que esta Corregedoria Geral da Justiça já teve a recente ocasião de reafirmar:

“…tenha-se que não há limites objetivos previstos na para eventual aumento de área por conta da realização da retificação imobiliária, desde que respeitados os limites geodésicos do imóvel em questão. É que os arts. 212 e 213, da Lei nº 6.015/1973, não estabelecem limites objetivos para a retificação do registro, considerando-se sua função de garantir que este espelha a realidade de fato do imóvel” (Recurso administrativo 1002561-48.2019.8.26.0152, j. 23.1.2020, DJe 30.1.2020, cad. 1 – adm., p. 13; cf. também Rec. Adm. 1011754-07.2019.8.26.0405, j. 16.4.2020, DJe 13.5.2020, cad. 1 – adm., p. 12).

E, de resto, a lição é antiga:

“É curial para a segurança do sistema de registro de propriedade imobiliária evitar que a retificação com aumento de área enseje aquisição irregular. Daí o entendimento de que somente a retificação intra muros – nos limites do título causal – é legítima. E ‘retificação intra muros não é retificação de imóvel murado em todo seu perímetro, mas sim retificação interna (não externa), ou seja, dentro das divisas tituladas e, por isso, nas forças do próprio título de domínio (não além das forças do título)’ (Processo CG nº 141/2006). Porém, não há relação necessária entre aumento nominal da área e transcendência do título: superfície maior, a priori, não implica retificação extra muros. Nesse sentido jurisprudência em matéria de registro imobiliário” (STJ, REsp 716.489-MT, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 8.4.08; TJSP, Ap. Cível nº 344.045-4/9- 00, 2ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Ariovaldo Santini Teodoro, j. 21.9.4; Ap. Cível nº 103.853-4/8-00, 2ª Câmara de Direito Privado, Des. Cezar Peluso, j. 13.2.01). (CGJSP, Processo 67033/2011, j. 23.8.2011).

Se o critério fundamental a se observar, portanto, não é o incremento ou a redução da superfície do imóvel, o que se deve verificar, no caso concreto, é a correspondência entre o que agora apura no curso da retificação e uma situação jurídica que, subsistindo no plano do direito material (= no plano da causa para a aquisição do direito real), ainda está mal descrita nos assentos do ofício de registro de imóveis.

Como se diz no jargão do direito registral imobiliário, essa verificação é feita ao se examinar se a retificação ocorre intra muros, quer dizer, se o imóvel está “(1) precisamente localizado, não havendo dúvidas a este respeito, assim, como (2) identificado(s) seu(s) titular(es), (3) delimitado seus contornos, com a fixação de limites e divisas que (4) preservem, sem desfalque, os imóveis confrontantes e confinantes” (Salles e Salles, loc. cit., p. 450-451).

Tampouco parece representar impedimento à retificação o trâmite de ação de usucapião, por si, observando-se que a questão possessória refoge ao âmbito da retificação e, em eventual procedência da demanda, far-se-ia o desfalque da matrícula retificanda com posterior nova retificação, a fim de fixar o real contorno perimetral remanescente do todo atingido.

Daí porque não há razão para a suspensão do pleito até solução da ação de usucapião ajuizada pela impugnante.

Ocorre que, a despeito do acima consignado, in casu, não se consegue aferir, a partir da documentação encartada à pretendida retificação, ser a mesma intra muros.

Ou seja, não há concreta demonstração de que o registro em questão comporta a área apresentada na planta e no memorial descritivo sem se sobrepor aos registros de imóveis confrontantes.

A expressão intra muros não se relaciona com o exercício possessório, mas diz respeito aos limites tabulares dos confrontantes e vias públicas com que faz divisa.

No caso concreto, a partir do trabalho técnico constante dos autos não se pode afirmar que a retificação será intra muros, não havendo como se afastar, de plano, a coincidência dos imóveis ou a ocorrência de sobreposição de áreas.

Ante o exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de negar provimento ao recurso.

Sub censura.

São Paulo, 11 de maio de 2021.

Leticia Fraga Benitez

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Vistos. Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. São Paulo, 18 de maio de 2021. (a) RICARDO ANAFE, Corregedor Geral da Justiça – ADV: LUCIANA RIBEIRO ARO, OAB/SP 132.996, MAURÍCIO SANTIAGO MARQUES DOS SANTOS, OAB/SP nº  340.524 e BRUNO FERNANDES FULLE, OAB/SP nº 246.238.

Diário da Justiça Eletrônico de 30.08.2021

Decisão reproduzida na página 082 do Classificador II – 2021

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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