1ª VRP/SP: Uma escritura só se retifica por outra escritura

Processo 0034566-14.2010.8.26.0005

Retificação de Registro de Imóvel – Retificação de Nome – Espolio Rosa Campanella Cirillo – Pedido de providências – retificação de transcrição e retificação de escrituras públicas – uma escritura só se retifica por outra escritura – no caso, a retificação da transcrição é possível em decorrência de documentos que complementam a qualificação das partes – princípio da especialidade subjetiva – provimento parcial. CP 112

Vistos.

1. O ESPÓLIO DE ROSA CAMPANELLA CIRILLLO (ROSA), nestes autos representado por sua inventariante Sueli Aparecida Cirillo dos Santos, requereu providências (fls. 02-08).

1.1. A requerente pretende que sejam retificadas: (a) a transcrição 39.525, do 9º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (RI), para que conste a correta qualificação de MANUEL PAULO VAZ (MANUEL) e sua esposa ANTONIA AUGUSTA VAZ (ANTONIA); e (b) as escrituras públicas lavradas (b1) pelo 3º Tabelião de Notas de São Paulo, em 2 de fevereiro de 1967, livro 742, fls. 60, e (b2) pelo 12º Tabelião de Notas de São Paulo, em 21 de setembro de 1981, livro 967, fls. 196.

1.2. A peça inicial veio acompanhada de documentos (fls. 13-70).

1.3. O requerente está devidamente representado ad judicia (fls. 08-11).

2. Estes autos foram redistribuídos da 3ª Vara Cível do Foro Regional V – São Miguel Paulista, para esta 1ª Vara de Registros Públicos (fls. 88).

3. Houve a manifestação do 9º e 12º RI, que prestaram informações a fls. 97-98 e 107. 3.1. Segundo o 9º RI, MANUEL fora insuficientemente qualificado na transcrição 39.525 e os documentos até então acostados à inicial, pelo requerente, não são hábeis a complementar sua qualificação. Ademais, ressaltou que não houve nenhum erro na transposição de dados do título que deu origem à transcrição 39.525 e, nestes termos, não há que se falar na aplicação do artigo 213, I, ‘a’ da Lei 6.015/73. 3.2. O 9º RI juntou certidões de diversas outras transcrições imobiliárias (fls. 99-106) em que MANUEL é signatário e, da mesma forma que na transcrição 39.525, é qualificado precariamente.

4. Houve manifestação do requerente (fls. 112-114).

5. O 13º Tabelião de Notas (fls. 116) fez juntar certidões das escrituras públicas (fls. 117-120) referidas nas certidões imobiliárias apresentadas a fls. 99-106.

6. O Ministério Público deu parecer pelo indeferimento do pedido (fls. 129-131).

7. Houve nova manifestação do 9º RI (fls. 135). A serventia entendeu, até o presente momento, que a retificação não seria possível pela carência documental dos autos e por não ter havido erro na transposição de dados do título para a transcrição. Observou, no entanto, que a apresentação de documentação hábil poderia ensejar a retificação da qualificação de MANUEL e sua esposa.

8. Posteriormente vieram aos autos: (a) comprovantes de situação no cadastro de pessoas físicas, referentes a MANUEL e ANTONIA (fls. 143-144 e 160); (b) informação do Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt – IIRGD (fls. 159 e 181-182); (c) cópia da escritura de compra e venda lavrada em 02.02.1967, no livro 742, fls. 60, pelo 3º Tabelião de Notas de São Paulo (fls. 162-164); e (d) informação negativa do 13º Tabelião de Notas de São Paulo (fls. 166).

9. O 9º RI voltou a se manifestar (fls. 186). Em face da nova documentação juntada aos autos, a serventia entendeu ser possível a retificação da transcrição 39.525, para que MANUEL e sua esposa sejam qualificados de maneira mais completa.

10. O Ministério Público opinou pelo deferimento da retificação da transcrição 39.525 (fls. 187).

11. O requerente fez juntar certidão original de casamento entre MANOEL e ANTONIA (fls. 195).

12. O 13º Tabelião de Notas de São Paulo encaminhou, para fins de confronto de assinatura e elucidação do caso, cópia de uma escritura de venda e compra em que MANOEL é signatário (fls. 201).

13. É o relatório, sem prejuízo das informações de fls. 188-189. Passo a fundamentar e decidir.

14. Primeiramente, discorro sobre a pretensão de retificação das escrituras públicas.

14.1. Escrituras são atos notariais que refletem fielmente a vontade dos outorgantes e outorgados. O tabelião limita-se exteriorizar a vontade das partes, representando o fato presenciado ou apreendido sem acrescentar quaisquer elementos axiológicos que não sejam manifestados pelos signatários. A escritura é o documento escrito, lavrado de acordo com a lei, representativo de um negócio jurídico, sendo, portanto, uma prova da manifestação da vontade de duas ou mais pessoas capazes. Uma escritura só pode ser retificada por outra escritura, lavrada pelas mesmas partes, porque o Estado, o Juiz ou o Tabelião não podem retificar a vontade alheia: “Escritura pública é ato notarial que reflete a vontade das partes na realização de negócio jurídico, observados os parâmetros fixados pela Lei e pelas Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça, reproduzindo, portanto, exatamente aquilo que outorgantes e outorgados declararam ao Escrivão ou ao Escrevente. Por esta razão – conforme entendimento sedimentado desta Corregedoria Geral – o juiz não pode substituir o notário ou uma das partes, retifícando escrituras que encerram tudo quanto se passou e declarou perante aquele oficial público” (Processo CG 2012/84853 – São Paulo).

14.2. Observe-se que o artigo 213 da Lei 6.015/73 lida apenas com a retificação de registros, não fazendo qualquer menção à retificação de escrituras, justamente pelos motivos acima expostos.

15. Neste cenário, há de ser indeferido o pedido de retificação das escrituras públicas lavradas (b1) pelo 3º Tabelião de Notas de São Paulo, em 2 de fevereiro de 1967, livro 742, fls. 60, e (b2) pelo 12º Tabelião de Notas de São Paulo, em 21 de setembro de 1981, livro 967, fls. 196.

16. Passo agora a discorrer sobre o pedido de retificação da transcrição 39.525 do 9º RI.

16.1. A Lei brasileira adota, em matéria registrária, o princípio da especialidade subjetiva (artigo 176 da lei 6.015/73). Assim sendo, busca a nossa legislação a mais completa qualificação das partes envolvidas em negócios que tratam de direitos reais sobre imóveis.

16.2. A documentação que chegou aos autos permite que MANUEL e ANTONIA tenham suas qualificações complementadas e assim deverá ser feito em nome do princípio da especialidade subjetiva e da segurança dos negócios que envolvem direitos reais sobre imóveis.

17. Do exposto: (a) defiro, em parte, o pedido de ESPÓLIO DE ROSA CAMPANELLA CIRILLLO, representada por sua inventariante Sueli Aparecida Cirillo dos Santos; (b) determino que seja averbada, na transcrição nº 39.525 do 9º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo, com base na documentação juntada a estes autos a fls. 143, 144, 181, 182 e 195, a retificação da qualificação de MANUEL PAULO VAZ e sua esposa ANTONIA AUGUSTA VAZ, que passa a ser: (b1) Manuel Paulo Vaz (que também assinava Manoel Paulo Vaz), filho de Domingos Antonio Vaz e Etelvina Augusta Martins, brasileiro naturalizado, bancário, nascido em 12 de fevereiro de 1907, portador da cédula de identidade RG SSP/SP n. 189.733 e inscrito no CPF/MF sob n. 003.415.508-25; e (b2) Antonia Augusta Vaz, filha de Felippe José dos Santos e Verônica do Patrocínio, portuguesa, nascida em 8 de fevereiro de 1910, inscrita no CPF/MF sob n. 163.285.398-19 (não consta RG de Antonia). Esta sentença serve como mandado (Portaria Conjunta n. 01/08 1ª e 2ª Vara de Registros Públicos). Desta sentença cabe recurso administrativo para a E. Corregedoria Geral de Justiça, no prazo de quinze dias (Cód. Judiciário, art. 246). Uma vez preclusa esta sentença, arquivem-se os autos, se não for requerido nada mais.

P. R. I. C.

São Paulo,

Josué Modesto Passos.

JUIZ DE DIREITO

CP 112 – ADV: PAULO SERGIO FACHIN (OAB 177345/SP), LUCIANO HENRIQUE DA COSTA (OAB 279035/SP) (D.J.E. de 24.10.2013 – SP)

(…)

Fonte: DJE I 24/10/2013.

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1ª VRP/SP: Vendedor e compradores não qualificados na Escritura Pública. “Empréstimo” de dados da qualificação dos compradores de outros assentos. Impossibilidade de completar a qualificação do vendedor em decorrência de longo lapso temporal. Caso peculiar que permite a flexibilização do princípio da especialidade subjetivas em nome da razoabilidade. Registro Deferido.

Processo 0004945-70.2013.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Solomon Sigal – Lulu Luna Sigal – 5º OFICIAL DE REGISTRO DE IMOVEIS 

Dúvida inversa – escritura de venda e compra eivada de defeitos concernentes aos princípios da especialidade objetiva e subjetiva – saneamento de parte dos vícios – possibilidade de “empréstimo” de dados de qualificação dos compradores, localizados em outros assentos, para completar o registro que se pretende – impossibilidade de completar a qualificação do vendedor em decorrência de longo lapso temporal – caso peculiar que permite a flexibilização do princípio da especialidade subjetiva em nome da razoabilidade – soluções dadas pelo próprio registrador – precedentes do E. Conselho Superior da Magistratura – dúvida improcedente. CP 64

Vistos.

 1. SOLOMON SIGAL (SOLOMON) e LULU LUNA SIGAL (LULU) pediram providências, recebidas por este juízo como dúvida inversa.

1.1. Os requerentes aduzem (fls. 02-05) que compraram, de CONSTÂNCIO DA SILVEIRA NETTO (CONSTÂNCIO), o imóvel de transcrição nº 41.992, do 5º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (RI), por meio de escritura pública, lavrada em 20 de setembro de 1968, pelo 16 º Tabelião de Notas de São Paulo (fls. 56-57).

1.2. A escritura somente foi apresentada para registro em 11 de janeiro de 2012, ocasião em que se indeferiu registro (fls. 09) porquanto, dentre outras exigências menos expressivas, deveria ser retificada a metragem da área útil do imóvel, que era divergente na escritura e na transcrição nº 49.492, além de ser necessária a apresentação, em cópias autenticadas, de certificado de naturalização de LULU e RG e CPF de CONSTÂNCIO.

1.3. Para sanar as exigências do 5º RI, SOLOMON recorreu à 2ª Vara de Registros Públicos de São Paulo (fls. 10 – 13), solicitando mandado para que se procedesse à retificação da escritura com suprimento da assinatura das outras partes, e para que o 5º RI realizasse o registro, após a retificação, com o suprimento da exigência das cópias do RG e CPF de CONSTÂNCIO. Houve deferimento, em caráter excepcional, do pedido de retificação da escritura lavrada pelo 16º Tabelião de Notas de São Paulo (fls. 32-33). Houve também permissão para que fosse exarado “cumpra-se” do juiz corregedor permanente competente a ordenar ao 5º RI o registro do título (1ª Vara de Registros Públicos).

1.4. A escritura retificada (fls. 34 – 35) foi apresentada ao 5º RI, que novamente recusou registro (fls. 40). Embora sanada a exigência de correção da metragem do imóvel, entendeu ser necessária a apresentação de cópias autenticadas do RG e CPF de CONSTÂNCIO, do certificado de naturalização e RG de LULU, certidão de casamento e CRM de SOLOMON, além de aposição do “cumpra-se” do Juiz Corregedor Permanente da 1ª Vara de Registros Públicos.

2. Houve o encaminhamento dos autos da 2ª para a 1ª Vara de Registros Públicos (fls. 41).

3. O 5º RI esclareceu (fls. 44) que a apresentação da documentação dos requerentes e de CONSTÂNCIO encontra respaldo no artigo 176, parágrafo 1º, III, 2 da Lei 6.015/73. A aposição do “cumprase” é necessária, não somente pela determinação dada pela sentença do processo de retificação da escritura (fls. 32-33), mas também porque a 1ª Vara de Registros Públicos é a única competente para dirimir questões referentes ao registro de imóveis.

4. O Ministério Público entendeu (fls. 46) que o caso é simplesmente de aposição do “cumpra-se”, não havendo outras questões para análise, motivo pelo qual opinou pelo deferimento do pedido.

5. O pedido de providências foi recepcionado como dúvida inversa (fls. 48) e a via original do título que se pretende registrar foi juntada aos autos (fls. 51-52).

6. O 5º RI manifestou-se novamente (fls. 54-55). Informou que, devido à recepção como dúvida inversa, o título foi prenotado sob nº 269.063. Ademais, declarou sua posição no sentido de flexibilizar as exigências referentes à qualificação das partes no instrumento que se pretende registrar e apresentou soluções para o caso.

7. Em nova manifestação (fls. 72-73), o Ministério Público entendeu que, em face das soluções apresentadas pelo 5º RI, o título pode ingressar em tábua registral.

8. É o relatório. Passo a fundamentar e decidir.

9. Os requerentes pretendem registrar escritura em que a qualificação dos signatários é incompleta nos termos da atual legislação registrária (artigo 176, §1º, III, 2, Lei 6.015/73).

10. Analisando de maneira severa, o título jamais poderia ingressar em fólio real com os defeitos que apresenta. No entanto, o próprio registrador apresentou soluções (fls. 54-55) que resolvem o impasse ou dão aplicação mais adequada ao princípio da especialidade subjetiva.

11.1. Pesquisando em outros assentos da mesma serventia, o 5º RI localizou dados que completam a qualificação de SOLOMON e LULU. Nestes casos, é possível o “empréstimo” desses dados para completar a qualificação do casal no registro que se pretende. Há precedentes do E. Conselho Superior da Magistratura neste sentido (v. Apel. Civ. 77.859-0/8 – Bragança Paulista, j. 02.08.2001 – Rel. Luís de Macedo).

11.2. Com relação à qualificação insuficiente do vendedor CONSTÂNCIO, razoável é a solução dada pelo 5º RI, no sentido de inexigir seus dados (RG e CPF). Segundo alegado, o alienante não estabelece contato há mais de quarenta e cinco anos e não se sabe sua localização. Prima-se aqui pela razoabilidade, em detrimento de aplicação por demais rigorosa do princípio da especialidade subjetiva, evitando-se que os compradores sejam forçados a ingressar com dispendiosa ação de usucapião para obterem o mesmo resultado prático do registro do título. Cumpre esclarecer que esse raciocínio só é possível pela extrema peculiaridade da situação e não deve servir como norte para todos os casos em que haja deficiência na qualificação das partes, em negócios que envolvam propriedade imobiliária (v. Apel. Civ. 0039080-79.2011.8.26.0100 – São Paulo, j. 20.09.2012 – Rel. José Renato Nalini)

12. Nestes termos, levando em consideração principalmente as soluções dadas pelo registrador, não há óbices para ingresso do título em fólio real.

13. Do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada inversamente por SOLOMON SIGAL e LULU LUNA SIGAL (prenotação nº 269.063). Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Desta sentença cabe apelação, com efeito suspensivo e devolutivo, para o E. Conselho Superior da Magistratura, no prazo de quinze dias. Uma vez preclusa esta sentença, cumpra-se a Lei 6.015/73, artigo 203, II, e arquivem-se os autos, se não for requerido mais nada.

P.R.I.C.

São Paulo,

Josué Modesto Passos.

JUIZ DE DIREITO

CP 64 – ADV: SEBASTIÃO FERREIRA GONÇALVES (OAB 195468/SP), ADEMIR POLLIS (OAB 183997/SP) (D.J.E. de 24.10.2013 – SP)

(…)

Fonte: DJE I 24/10/2013.

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CSM|SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de aditamento e ratificação de hipoteca – Aumento do crédito garantido

CSM|SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de aditamento e ratificação de hipoteca – Aumento do crédito garantido – Contratação de nova hipoteca – Especialização – Requisito de validade do direito real de garantia – Ato sujeito a registro em sentido estrito – Situação não se amolda às hipóteses excepcionais submetidas à averbação – Emolumentos – Redução descabida – Dúvida procedente – Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO N° 0011994-89.2012.8.26.0362, da Comarca de Moji Guaçu, em que é apelanteMINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado KIMERA VEÍCULOS LTDA.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “DERAM PROVIMENTO AO RECURSO PARA, AO REFORMAR A R. SENTENÇA, JULGAR A DÚVIDAPROCEDENTE, V.U.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a) , que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), GONZAGA FRANCESCHINI, WALTER DE ALMEIDA GUILHERME, SILVEIRA PAULILO, SAMUEL JÚNIOR E TRISTÃO RIBEIRO.

São Paulo, 23 de agosto de 2013.

JOSÉ RENATO NALINI
Corregedor Geral da Justiça e Relator

VOTO N° 21.289
REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura pública de aditamento e ratificação de hipoteca – Aumento do crédito garantido – Contratação de nova hipoteca – Especialização – Requisito de validade do direito real de garantia – Ato sujeito a registro em sentido estrito – Situação não se amolda às hipóteses excepcionais submetidas à averbação – Emolumentos – Redução descabida – Dúvida procedente – Recurso provido.

O Ministério Público do Estado de São Paulo, uma vez inconformado com a sentença que julgou improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Mogi Guaçu/SP (fls. 41/43), interpôs recurso de apelação, com o argumento de que a escritura pública apresentada ao Registrador representa outro negócio jurídico, diante do aumento do crédito hipotecário, a exigir, portanto, para a constituição da hipoteca, novo registro (fls. 47/51).

Ao responder o recurso, depois do recebimento da apelação no duplo efeito, a interessada ponderou a inocorrência de novação, pois concluído apenas um aditamento, com elevação do valor do imóvel dado em hipoteca na escritura primitiva, e, assim, ao pretender a confirmação da sentença impugnada, descartou a necessidade de constituição de nova hipoteca e, ademais, discordou dos emolumentos exigidos (fls. 56/59).

Encaminhados os autos ao Conselho Superior da Magistratura (fls. 60/62), abriu-se vista à Procuradoria Geral de Justiça, que propôs o provimento do recurso (fls. 64/66).

É o relatório.

A escritura pública de aditamento e ratificação de hipoteca lavrada no dia 15 de março de 2012 no 2.° Tabelionato de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Mogi Guaçu/SP, então apresentada ao Oficial do Registro de Imóveis e Anexos da mesma Comarca, não se limitou a alterar o valor inicialmente ajustado do bem imóvel hipotecado.

Não se restringiu, realmente, a modificar o valor que, atualizado, “será a base para arrematações, adjudicações e remições”, com dispensa da prévia avaliação (artigo 1.484 do CC), porquanto também afetou o valor do crédito garantido, das obrigações garantidas pela hipoteca, que passou de R$ 1.500.000,00 (r. 02 da matrícula n.° 42.315 – fls. 27/28) para R$ 2.850.000,00 (fls. 25/26).

É o que se extrai da cláusula segunda da avença:

… 2) – Desejando as partes por esta escritura e na melhor forma de direitoalterar o limite do crédito e aumentar o valor da garantia hipotecária para R$ 2.850.000,00 (dois milhões, oitocentos e cinquenta mil reais), portanto, atribuindo ao imóvel, nos termos do artigo 1.484 do Código Civil, o valor de R$ 2.850.000,00 (dois milhões, oitocentos e cinquenta mil reais);…
Fica claro, inclusive, que a repactuação do valor do imóvel hipotecado é determinada pela mudança do valor das obrigações garantidas, enfim, aperfeiçoou-se, inegavelmente, um novo negócio jurídico.

O contrato, valorada a especialização da hipoteca, nitidamente modificada em relação à primitiva, com a alteração do valor do crédito (artigo 1.424, I, do CC), traduz, induvidosamente, a finalidade dirigida à constituição de novo direito real de garantia, ainda dependente do registro da escritura pública.

Ora, o princípio da especialização, contemplando a identificação do crédito garantido, é da essência da hipoteca como direito real de garantia, motivo pelo qual a modificação promovida, independentemente da denominação atribuída à escritura pública, revela a conclusão de novo negócio jurídico, de outro contrato de hipoteca, a exigir, para seu surgimento e sua validade como direito real, o registro (stricto sensu) do título.

Nessa trilha, aliás, o ensinamento de Caio Mario da Silva Pereira:

Além da observância dos requisitos objetivo e subjetivo que foram estudados no parágrafo anterior, a validade da hipoteca na sua função específica de direito real de garantia está na dependência da apuração de condições de forma, que dizem respeito a três momentos significativos na sua vida: o título ou instrumento gerador;especialização; inscrição no registro. …[1] (grifei)

Ao comentarem a regra do artigo 1.424 do CC e, particularmente, o princípio da especialização, Gustavo Tepedino, Heloisa Helena Barboza e Maria Celina Bodin de Moraes abordam a questão com precisão:

A especialidade atende à necessidade de segurança do sistema de crédito e, por isso, constitui-se em requisito formal de validade dosdireitos reais de garantia. Sem as formalidades legais, os contratos de penhor, hipoteca e anticrese, válidos como acordo de vontade entre partes, não configuram direitos reais e, portanto, consideram-se, como tais, ineficazes. Nessa perspectiva, os procedimentos formais afiguram-se, a um só tempo, requisito essencial de validade (dos direitos reais) e de eficácia perante terceiros (dos acordos de vontade subjacentes). [2] 

Por isso, a dúvida, nada obstante a r. sentença proferida pelo i. MM Juiz Corregedor Permanente, é procedente: com efeito, o título apresentado é passível de registro em sentido estrito, não de averbação.

Excepcionada as situações tratadas no artigo 167, II, 15, da Lei n.° 6.015/1973 [3], e nos artigos 58, do Decreto-Lei n.° 167/67[4], e 50, do Decreto- Lei n.° 413/69 [5] – que servem para confirmar a regra -, o título versando sobre ratificação de hipoteca é suscetível de registro, se pactuada a elevação do crédito garantido: a novação, in concreto, com constituição de nova hipoteca, é manifesta.[6]

Por conseguinte, a recorrida, ao impugnar, ainda, os emolumentos, também não tem razão quando pretende excluir, da base de cálculo, a expressão monetária antes utilizada para definição dos emolumentos cobrados por ocasião do registro da primeira hipoteca, porquanto, insista-se, configurada a convenção de novo direito real de garantia.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso para, ao reformar a r. sentença, julgar a dúvida procedente.

JOSÉ RENATO NALINI
Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Instituições de Direito Civil: direitos reais. Revista e atualizada por Carlos Edison do Rego Monteiro Filho. 20.a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 323. v. IV.

[2] Código Civil interpretado conforme a Constituição da República. Rio de Janeiro: Renovar, 2011. p. 860. v. III.

[3] Artigo 167. No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos: (…);
II – a averbação: (…);
15) da rerratificação do contrato de mútuo com pacto adjeto de hipoteca em favor de entidade integrante do Sistema Financeiro da Habitação, ainda que importando elevação da dívida, desde que mantidas as mesmas partes e que inexista outra hipoteca registrada em favor de terceiros; (…). 

[4] Artigo 58. Em caso de mais de um financiamento, sendo os mesmos, o emitente da cédula, o credor e os bens apenhados, poderá estender-se aos financiamentos subsequentes o penhor originariamente constituído, mediante menção da extensão nas cédulas posteriores, reputando-se um só penhor com cédulas rurais distintas.
§ 1º. A extensão será apenas averbada à margem da inscrição anterior e não impede que sejam vinculados outros bens à garantia.

[5] Artigo 50. Em caso de mais de um financiamento, sendo os mesmos o credor e emitente da cédula, o credor e os bens onerados, poderá estender-se aos financiamentos subsequentes o vínculo originariamente constituído mediante referência à extensão nas cédulas posteriores, reputando-se uma só garantia com cédulas industriais distintas.
§ 1º. A extensão será averbada à margem da inscrição anterior e não impede que sejam vinculados outros bens à garantia. (…).

[6] Cf. Ademar Fioranelli. Direito Registral Imobiliário. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 2001. p. 336/341. 

Fonte: Blog do 26 – DJE I 21/10/2013.

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