1ª VRP/SP: O artigo 234 da Lei nº 6.404/76, que se refere apenas às certidões das juntas comerciais sem qualquer ressalva quanto às oriundas do registro civil das pessoas jurídicas, não pode ser aplicado por analogia a fim de dispensar a escritura pública para os atos de transmissão dos imóveis da sociedade incorporada para a incorporadora.Incide, assim, o art. 108, do Código Civil.


  
 

Processo 1001717-94.2018.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1001717-94.2018.8.26.0100

Processo 1001717-94.2018.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – Sanprev – Santander Associação de Previdência e outro – Vistos.Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 13º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de SANPREV Santander Associação de Previdência, em face dos óbices levantados para o ingresso de título de seu interesse. Relata o Oficial que foi apresentada para registro documentação que relata a transferência de gestão de planos de benefícios previdenciários da SANPREV para BANESPREV, que acarretava a transferência de ativos de uma entidade para outra, inclusive imóveis. No requerimento, alegou a suscitada que os bens integram o patrimônio afetado à garantia das reservas matemáticas, fundos e provisões, que representam as obrigações atinentes aos planos de benefícios que a “Banesprev” passou a gerir. Esclarece o Oficial, ainda, que na presente hipótese, é indispensável o instrumento de transmissão, legalmente formalizado, acompanhado de prova do recolhimento do imposto de transmissão ou documento que comprove sua imunidade. Juntou documentos a fls. 8/317.A suscitada apresentou impugnação (fls. 318/337). Aduz que a natureza do negócio enquadra-se nas regras da incorporação de imóveis, devendo assim ser aplicado por analogia o artigo 234 da Lei nº 6.404/76.O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls. 341/344).É o relatório.Passo a fundamentar e a decidir.Com razão o D. Oficial e a D Promotoria de Justiça.Preliminarmente cumpre destacar que se submetem os títulos levados a registro ao rigor do princípio da legalidade.A Lei nº 6.015/73 determina, em seu art. 221, que:Art. 221 – Somente são admitidos a registro:I – escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros;II – escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e testemunhas, com as firmas reconhecidas, dispensado o reconhecimento quando se tratar de atos praticados por entidades vinculadas ao Sistema Financeiro de Habitação;III – atos autênticos de países estrangeiros, com força de instrumento público, legalizados e traduzidos na forma da lei, e registrados no cartório de Registro de Títulos e Documentos, assim como sentenças proferidas por tribunais estrangeiros após homologação pelo Supremo Tribunal Federal;IV – cartas de sentença, formais de partilha, certidões e mandados extraídos de autos de processo.Segundo Flauzilino Araújo dos Santos, o princípio da legalidade norteia o comportamento do Registrador, que deve permitir o acesso ao álbum registral apenas dos títulos juridicamente válidos para esse fim e que reúnam os requisitos legais para sua registrabilidade e a conseqüente interdição provisória daqueles que carecem de aditamentos ou retificações e definitiva, daqueles que possuem defeitos insanáveis. Essa subordinação a pautas legais previamente fixadas para manifestação de condutas que criem, modifiquem ou extingam situações juridicamente postas, não é exclusiva da temática registral, mas resulta da própria aspiração humana por estabilidade, confiança, paz e certeza de que todo o comportamento para obtenção de um resultado regulamentado para a hipótese terá a legalidade como filtro, vetor e limite. Verifico que os títulos que se pretende registrar (dentre eles o Termo de Rescisão do Convênio de Adesão e Transferência de Gerenciamento do Plano de Benefícios I) são atípicos, pois configuram meramente a transferência de carteira de planos de previdência e consequentemente de todos os ativos a ela relacionados, e não incorporação de imóveis, prevista no artigo 227 da Lei nº 6.404/76, como quer fazer crer a suscitada.Conforme exposto pela própria interessada, a operação realizada entre as sociedades não é típica, configurando negócio jurídico que apenas por analogia se enquadraria na regra prevista no artigo 234 da Lei nº 6.404/76.Ora, raciocinar por analogia significa julgar pela semelhança dos fatos, ou seja, o mesmo que aplicar a norma existente no ordenamento jurídico a um caso não previsto na norma jurídica, desde que eles guardem semelhanças reais. A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, em seu art. 4º, prevê o uso da analogia como um meio de integração do direito, desde que o caso em concreto obedeça alguns requisitos tais quais: – inexistência de dispositivo legal prevendo ou disciplinando a hipótese do caso concreto. – semelhança entre o caso concreto e a situação não regulada. – identidade de fundamentos lógico/jurídico no ponto comum às duas situações.Todavia, no regime dos registros públicos impera a legalidade estrita, de sorte que não se admite a utilização de dispositivos legais por analogia, mormente os de exceção.Disso decorre que o artigo 234 da Lei nº 6.404/76, que se refere apenas às certidões das juntas comerciais sem qualquer ressalva quanto às oriundas do registro civil das pessoas jurídicas, não pode ser aplicado por analogia a fim de dispensar a escritura pública para os atos de transmissão dos imóveis da sociedade incorporada para a incorporadora.Incide, assim, o art. 108, do Código Civil, em sua plenitude:”Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.”Portanto, para o registro dos documentos que dispõem sobre a transferência de carteira de planos de previdência, gerando consequentemente a transferência de todos os ativos garantidores, inclusive bens imóveis, é imprescindível a elaboração de escritura pública, elencando todos os direitos e obrigações das partes envolvidas.Nestes termos:”REGISTRO DE IMÓVEIS Extinção de sociedade impossibilidade de transferência de bens imóveis por instrumento particular ante a falta da prova de valor inferior a trinta salários mínimos não aplicação do disposto no art. 64 da Lei n. 8.934/94 para além da hipótese de transferência de bens dos sócios à sociedade Recurso não provido” (Ap. n. 0001644-10.2010.8.26.026, j. 28/07/2011, Rel. Des. Maurício Vidigal).”Registro de Imóveis Dúvida julgada procedente – Negativa de acesso ao registro de instrumento particular de distrato social de pessoa jurídica, com transferência de bens imóveis da sociedade para os sócios Inviável o registro à luz do disposto no art. 134, II, § 6º, do Código Civil de 1916 e no art. 108 do novo Código Civil Indispensabilidade da transferência dos bens por intermédio de escritura pública Não incidência, no caso, da norma do art. 64 da Lei n° 8.934/1994 Recurso não provido” (Ap. Civ. n. 491-6/1, j. 11/05/2006, Rel. Des. Gilberto Passos de Freitas).Como dito no artigo 221 da Lei nº 6.015/73, somente os casos expressamente previstos têm ingresso para registro. Assim, em se tratando de título não previsto em lei, a recusa é de ser mantida, por ofensa ao princípio da legalidade.Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 13º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de SANPREV Santander Associação de Previdência e mantenho o óbice registrário. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.Oportunamente, arquivem-se os autos.P.R.I.C. – ADV: JULIANO NICOLAU DE CASTRO (OAB 292121/SP), MARCO ANTONIO BEVILAQUA (OAB 139333/SP) (DJe de 19.03.2018 – SP)

Fonte: DJE/SP | 19/03/2018.

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Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

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