CSM|SP: Escritura pública de doação – Desqualificação – Ausência de dados qualificativos dos doadores, quais sejam, certidão de casamento atualizada e CPF/MF – Imprescindibilidade da apresentação de certidão de casamento, em respeito ao princípio da continuidade registral – Desnecessidade de obtenção do CPF/MF, não constando haver dúvida quanto à identificação dos doadores, tendo em vista o disposto no art. 176, § 2º, da Lei de Registros Públicos – Dúvida procedente – Recurso não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1002800-60.2016.8.26.0539, da Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo, em que são partes é apelante ELOIZA LORENZETTI SERRANO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE SANTA CRUZ DO RIO PARDO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP E SALLES ABREU.

São Paulo, 19 de dezembro de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação n.º 1002800-60.2016.8.26.0539

Apelante: Eloiza Lorenzetti Serrano

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo

VOTO N.º 29.871

Escritura pública de doação – Desqualificação – Ausência de dados qualificativos dos doadores, quais sejam, certidão de casamento atualizada e CPF/MF – Imprescindibilidade da apresentação de certidão de casamento, em respeito ao princípio da continuidade registral – Desnecessidade de obtenção do CPF/MF, não constando haver dúvida quanto à identificação dos doadores, tendo em vista o disposto no art. 176, § 2º, da Lei de Registros Públicos – Dúvida procedente – Recurso não provido.

Cuida-se de recurso de apelação tirado de sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São José do Rio Pardo, a teor de que seria imprescindível a exibição da certidão de casamento atualizada, a fim de se conhecer o regime de bens do casal doador e, ainda, necessária a prévia inscrição dos doadores no Cadastro de Pessoa Física do Ministério da Fazenda.

Alega, em síntese, que os doadores Plácido e Emma Lorenzetti, já falecidos, nasceram e se casaram na Itália, não havendo informes que permitam obter a certidão de casamento. Acrescentam que consta das certidões de óbito que os doadores não deixaram bens. Argumentam, ainda, que o mesmo Registro de Imóveis permitiu o ingresso registral da escritura pública de doação agora recusada em outra matrícula ali mantida e que não há qualquer prejuízo a terceiros, tratando-se de situação já consolidada a posse da recorrente.

A Procuradoria Geral da Justiça propôs o não provimento do recurso.

É o relatório.

O dissenso versa sobre a registrabilidade da escritura de doação de fls. 04/18, por meio da qual Plácido Lorenzetti, que também era conhecido por Enrico Plácido Lorenzetti, e Emma Lorenzetti, também conhecida por Emma Mezanotte Lorenzetti, casados, doaram o imóvel transcrito sob número 12.130 (atual matrícula n.º 14.580) a diversos herdeiros, dentro os quais, o pai da recorrente, Romualdo Henrique Lorenzetti.

O Registrador, na nota de devolução de fls. 20, solicitou: 1) apresentação da certidão de casamento atualizada de Enrico Plácido Lorenzetti e Emma Mezzanotti Lorenzetti; 2) documento de inscrição dos doadores no CPF/MF.

A primeira exigência do Oficial é intransponível.

Com efeito, da matrícula do imóvel, consta que apenas Plácido Lorenzetti é titular de domínio. Dessa forma, para que seja respeitado o princípio da continuidade, imprescindível a prévia averbação do casamento de Plácido Lorenzetti com a outra doadora, Emma Mezzanotti Lorenzetti. Sem tal providência, não é possível conhecer o regime de bens do casamento e não haveria como se registrar escritura de doação de imóvel em que um dos doadores não figura como titular de domínio.

Não se trata de formalidade infundada, uma vez que é necessário haver segurança jurídica de que a doadora é, efetivamente, a titular dominial do bem doado. Nada obstaria, a título de exemplo, que o doador houvesse sido casado, em primeiras núpcias, sob regime de comunhão universal de bens, com terceira pessoa que não anuiu com a doação. Somente a compatibilidade da titularidade dominial com aqueles que figuram como doadores na escritura pública obstaria dúvida relevante quanto à regularidade da doação e respeitaria a continuidade registral.

As dificuldades inerentes à obtenção do documento não podem servir de motivo para sua dispensa.

Tampouco a consolidação da posse fato que pode servir de fundamento para aquisição originária da propriedade justifica menor cautela quanto à obediência aos princípios registrais.

O mesmo se diga quanto ao registro anterior da mesma escritura pública de doação, ocorrido no ano de 1985, na matrícula n.º 10.918 (fls. 35), do mesmo Registro de Imóveis: um equívoco não autoriza outro.

Em apenas um ponto a nota de devolução não prospera, o que não é suficiente, de qualquer modo, para a improcedência da dúvida: a exigência de números de CPF. Cediço que o princípio da especialidade objetiva não pode ser considerado um fim em si mesmo, sob pena de negar o que pretende proteger, que é a segurança jurídica.

Por essas razões, o C. Conselho Superior da Magistratura tem admitido, em hipóteses excepcionais, a mitigação da especialidade subjetiva:

REGISTRO DE IMÓVEIS – Carta de adjudicação – Promitente vendedor falecido – CPF/MF inexistente – Exigência afastada – Impossibilidade de cumprimento pela apresentante – Princípio da segurança jurídica – Princípio da razoabilidade – Dúvida improcedente – Recurso provido. (Apelação n° 0039080-79.2011.8.26.0100, CSM, rel. Des. José Renato Nalini, 20/09/2012).

“(…) Assim, para não sacrificar a segurança jurídica e a publicidade, é de rigor flexibilizar, in concreto, a severidade do princípio da especialidade subjetiva, dispensado a informação sobre o número do CPF/MF de Henri Marie Octave Sannejouand, cujo número de inscrição do Registro Geral é, de mais a mais, conhecido e consta da matrícula do imóvel (RG n.º 75.149 – mod. 19 – fls. 07), em sintonia com a carta de arrematação (fls. 23). A especialidade subjetiva, se, na hipótese, valorada com excessivo rigor, levará, em desprestígio da razoabilidade, até porque a exigência não pode ser satisfeita pela interessada, ao enfraquecimento do princípio da segurança jurídica, o que é um contrassenso. Com a exigência, o que se perde, confrontado com o ganho, tem maior importância, de sorte a justificar a reforma da sentença: a garantia registaria é instrumento, não finalidade em si, preordenando-se a abrigar valores cuja consistência jurídica supera o formalismo (…)”.

Assim, embora as qualificações das partes no título não estejam perfeitas, o registrador não afirmou não haver elementos suficientes a eliminar qualquer dúvida quanto às pessoas que figuram como titulares de domínio e doadores.

É preciso observar que a escritura foi lavrada em 1964, época em que não havia o rigor legal de hoje quanto à precisão da qualificação das partes, o que explica o motivo das omissões levantadas pelo registrador quanto aos cadastros mantidos junto à Receita Federal.

Ciente da falta de precisão de dados qualificativos antes da vigência da Lei de Registros Públicos, o legislador, ao editar a norma vigente, previu a regra de transição disposta no § 2º do art. 176:

§ 2º Para a matrícula e registro das escrituras e partilhas, lavradas ou homologadas na vigência do Decreto nº 4.857, de 9 de novembro de 1939, não serão observadas as exigências deste artigo, devendo tais atos obedecer ao disposto na legislação anterior .

Diante deste cenário, especialmente por não constar que haja dúvidas quanto à identidade das pessoas, apenas nesse ponto não devem prevalecer as exigências, ressalvada dúvida concreta quanto à identidade dos titulares de domínio e cedentes.

Isto posto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 07.05.2018 – SP)

Fonte: 26º Tabelionato de Notas | 17/05/2018.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


CSM|SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Cessão da incorporação imobiliária e transmissão da propriedade do imóvel ao cessionário – Contrato particular de compra e venda de dois apartamentos celebrado entre o apelante e o incorporador original que também era o anterior proprietário do imóvel

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1001867-89.2017.8.26.0624, da Comarca de Tatuí, em que são partes é apelante FÁBIO DUARTE, é apelado OFICIAL DO SERVIÇO DE REGISTRO DE IMOVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE TATUI.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U. Mantiveram a procedência da dúvida e negaram provimento à apelação interposta no Processo nº 1001867-89.2017.8.26.0264, bem como determinaram o desapensamento dos autos nº 1001738-84.2017.8.26.0624, com observações, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 28 de março de 2018.

PINHEIRO FRANCO

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação nº 1001867-89.2017.8.26.0624

Apelante: Fábio Duarte

Apelado: Oficial do Serviço de Registro de Imoveis e Anexos da Comarca de Tatui

VOTO Nº 37.322

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Cessão da incorporação imobiliária e transmissão da propriedade do imóvel ao cessionário – Contrato particular de compra e venda de dois apartamentos celebrado entre o apelante e o incorporador original que também era o anterior proprietário do imóvel – Recusa do novo incorporador em ratificar o contrato – Princípio da continuidade – Cessão dos direitos e deveres decorrentes da incorporação que não autoriza, por si só, o registro de contrato celebrado com quem não é mais proprietário do imóvel – Procedimento administrativo reunido com o procedimento de dúvida visando a declaração da nulidade do registro do contrato de compra e venda e de alienação fiduciária realizado com violação da prioridade decorrente da ordem cronológica do protocolo – Pretensão, ainda, de bloqueio de matrículas – Existência de anterior prenotação de contrato de compromisso de compra e venda apresentado pelo apelante – Competência da Corregedoria Geral da Justiça para apreciação do recurso interposto contra decisão que indeferiu cancelamento administrativo de registro, uma vez que o cancelamento se faz por ato de averbação – Disciplinar – Reclamação contra procedimento de Oficial de Registro de Imóveis que não observou prioridade decorrente da ordem cronológica de protocolos de títulos representativos de direitos reais contraditório – Competência da Corregedor Geral da Justiça – Apelação provida em parte, com determinação consistente no desapensamento dos autos e remessa do Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624 à Corregedoria Geral da Justiça.

1. Trata-se de apelação interposta por Fábio Duarte contra r. sentença que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Tatuí e manteve a recusa oposta ao registro de contrato particular de compromisso de compra e venda dos apartamentos nºs 121 e 172 do “Residencial Life Tatuí”, que são objeto, respectivamente, das matrículas nºs 91.881 e 91.902 (fls. 97/102).

O apelante alega, em suma, que o contrato de compromisso de compra e venda dos apartamentos, quitado, recebeu a prenotação nº 253.605, de 18 de novembro de 2016, e teve qualificação negativa mediante exigência de alteração da figura do vendedor em razão da cessão da incorporação realizada pela incorporadora original. Afirmou que contratou a compra dos imóveis de “Residencial Life Tatuí Spe Ltda.”, estando a incorporação registrada na matrícula nº 74.211. Asseverou que a cessão da incorporação em favor de “PW5 Incorporadora e Participação Ltda.” transferiu à cessionária todos os direitos e obrigações relacionados à incorporação imobiliária, razão pela qual não há obstáculo para o registro do contrato de compromisso de compra e venda celebrado com a incorporadora original. Ademais, a cessão da incorporação teve como condição a manutenção de todos os contratos de alienação de frações ideais celebrados pelo cedente. Esclareceu que contratou a compra dos imóveis em 10 de novembro de 2014 e que a cessão da incorporação ocorreu 23 de fevereiro de 2015, sub-rogando-se a adquirente em todas as obrigações da cedente. Além disso, quanto ao apartamento objeto da matrícula nº 91.881 do Registro de Imóveis de Tatuí, durante a vigência do prazo da prenotação nº 253.605 foi promovido o registro de outro título consistente em contrato de compra e venda outorgada pela atual incorporadora em favor de terceiro, e de alienação fiduciária ao Banco Bradesco S.A., sendo esse registro nulo por violação da prioridade que assegurava o direito de registro, em primeiro lugar, à compra e venda que celebrou com a incorporadora original.

2. Ainda, Fábio Duarte interpôs recurso administrativo contra r. decisão prolatada no Processo nº 100173884.2017.8.26.0624, em apenso, que indeferiu pedidos de bloqueio de matrícula, cancelamento de registro e aplicação de sanção disciplinar de perda de delegação contra o Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Tatuí alegando, em suma, que em 18 de novembro de 2016 promoveu a prenotação, sob nº 253.605, de instrumentos particulares de compromisso de compra e venda relativos aos apartamentos nºs 121 e 172 do “Edifício Residencial Life Tatuí”, objeto das matrículas 91.881 e 91.902, que foram comprados em 10 de novembro de 2014 na fase de incorporação imobiliária. Afirmou que o registro foi negado mediante exigência de aditamento do contrato para o cessionário da incorporadora original passe a figurar como vendedora dos apartamentos, sendo a exigência incorreta para a cessão da incorporação transmitiu à nova incorporadora todos os deveres e obrigações relativos aos contratos celebrados anteriormente. Em razão disso, em 06 de dezembro de 2016 requereu a suscitação de dúvida que, porém, não foi apresentada pelo Oficial de Registro de Imóveis. Ademais, no curso do prazo de validade da prenotação nº 253.605 foi promovido o registro de outro contrato de compra e venda e alienação fiduciária relativo ao imóvel objeto da matrícula nº 91.811, celebrado em 24 de janeiro de 2017, sendo esse registro nulo em razão da violação da prioridade existente em favor do título protocolado em primeiro lugar. Diante do ocorrido, requereu o bloqueio das matrículas, o cancelamento dos registros feitos com violação da prioridade, e a apuração da responsabilidade disciplinar do Oficial de Registro com aplicação da pena de perda da delegação.

3. A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento dos recursos de apelação e administrativo.

Os processos foram reunidos para julgamento conjunto dos recursos, na forma da r. decisão de fls. 151.

É o relatório.

4. Compete ao Colendo Conselho Superior da Magistratura o julgamento das dúvidas suscitadas pelos Oficiais de Registros Públicos, na forma do artigo 64, VI, do Decreto-lei Complementar Estadual nº 03/69 e do artigo 16, IV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

O procedimento de dúvida é pertinente quando o ato colimado é suscetível de registro em sentido estrito.

Ocorre que o Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624 tem por objeto o bloqueio de matrículas e o cancelamento administrativo de atos de registro (R.2) e averbação (Av.3) praticados na matrícula nº 91.881 do Registro de Imóveis de Tatuí (fls. 01/10 e 19/20 dos autos em apenso).

E todos os atos pretendidos, consistentes em cancelamento e bloqueio, são praticados por meio de averbação.

Portanto, cabe à Corregedoria Geral da Justiça o julgamento do recurso administrativo interposto no Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624, assim como a adoção de providências visando a apuração de responsabilidade do Sr. Oficial de Registro para eventual imposição de sanção disciplinar.

Em razão disso passo a analisar, separadamente, a apelação interposta no procedimento de dúvida (Processo nº 1001867-89.2017.8.26.0624), com posterior determinação de medidas visando possibilitar o oportuno julgamento, pela Corregedoria Geral da Justiça, do recurso administrativo interposto no Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624.

5. Conforme a certidão de fls. 19/29 do Processo nº 1001867-89.2017.8.26.0624, o imóvel objeto da matrícula nº 74.211 do Registro de Imóveis de Tatuí foi de propriedade da empresa “Residencial Life Tatuí SPE Ltda.” que nele promoveu incorporação imobiliária registrada em 29 de agosto de 2011 (fls. 20).

Posteriormente, mediante escritura registrada em 23 de fevereiro de 2015, a proprietária vendeu o imóvel e cedeu a incorporação para a empresa “PW5 Incorporadora e Participação Ltda.” (fls. 27), atualmente denominada “PW5 Incorporação e Participação Ltda” (fls. 31), que instituiu o condomínio edilício por registro realizado em 15 de abril de 2016 (fls. 29).

A certidão da matrícula nº 74.211 não contém registro, realizado na fase da incorporação imobiliária, de venda ou constituição de direito real sobre as frações ideais a que corresponderiam as futuras unidades autônomas, ressalvada a alienação fiduciária em garantia em favor de “Opinião S.A.” que anuiu com a cessão da incorporação e com a transmissão da propriedade resolúvel e da posse direita do imóvel incorporado à “PW5 Incorporadora e Construtora Ltda.”.

Segundo a certidão de fls. 19/21, o apartamento 121 do “Condomínio Residencial Life Tatuí”, objeto da matrícula nº 91.881, foi vendido pela proprietária “PW5 Incorporadora e Participação Ltda.” para a empresa “GIM Negócios e Empreendimentos Imobiliários Ltda. EPP”, com constituição de alienação fiduciária em garantia em favor de “Bradesco Administradora de Consórcios Ltda.”.

O apartamento 172 do “Condomínio residencial Life Tatuí”, objeto da matrícula nº 91.902, continua de propriedade, agora plena, de “PW5 Incorporadora e Participação Ltda.” (fls. 22).

Portanto, a empresa “Residencial Life Tatuí SPE Ltda.” deteve, simultaneamente, as qualidades de proprietária e de incorporadora do imóvel objeto da matrícula 74.211, e posteriormente transferiu para a empresa “PW5 Incorporadora e Participação Ltda.” A propriedade e os direitos relativos à incorporação imobiliária.

Desse modo, tanto o imóvel que recebeu a incorporação imobiliária como as unidades autônomas posteriormente construídas passaram a ser de propriedade de “PW5 Incorporação e Participação Ltda.” que é a atual denominação de “PW5 Incorporadora e Participação Ltda.” (fls. 31).

Na forma do art. 1.245, e seu parágrafo 1º, ambos do Código Civil a transmissão da propriedade por ato “inter vivos” somente ocorre com o registro do título translativo no Registro de Imóveis, continuando o alienante a ser proprietário, para todos os efeitos, até que isso ocorra.

Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

§ 2º Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel“.

Logo, o registro do título translativo é requisito para a constituição do domínio em favor do adquirente, assim como o registro do contrato de compromisso de compra e venda o é para a constituição de direito real em favor de compromissário comprador de imóvel.

Entretanto, o apelante não promoveu o registro do contrato de compromisso de compra e venda em data anterior ao registro da venda do imóvel incorporado para a empresa “PW5 Incorporação e Participação Ltda.”, razão pela qual não se tornou titular de direito real, ou seja, de direito oponível “erga omnes”.

A inexistência de direito real de propriedade ou de compromissário comprador, decorrente da falta de registro de compra e venda ou de compromisso de compra e venda anterior à transmissão da propriedade do imóvel para “PW5 Incorporação e Participação Ltda.”, teve como efeito a desnecessidade de apresentação das anuências de eventuais pretendentes à aquisição das futuras unidades autônomas para que se promovesse a cessão da incorporação.

Assim porque os contratos de alienação, enquanto não forem registrados, somente geram direitos obrigacionais entre as partes que os celebraram, não podendo sua existência ser oposta em relação a terceiros pela ausência da publicidade decorrente da falta de registro.

Por isso, a falta da anuência de titular de direito meramente obrigacional não impedia o registro da cessão da incorporação imobiliária e da venda do imóvel ao novo incorporador.

Com a transmissão da propriedade do imóvel para a empresa “PW5 Incorporação e Participação Ltda.” deixou de haver continuidade para o registro de contratos de alienação, ou compromisso de compra e venda, celebrados com a incorporadora original, “Residencial Life Tatuí SPE Ltda.”.

Isso porque a continuidade, “in casu”, diz respeito ao domínio do imóvel, e não aos direitos da incorporação.

Em outros termos, a alegada sub-rogação nos deveres da anterior incorporadora não autoriza, por si só, o registro de contratos de venda e de compromisso de compra e venda celebrados com quem deixou de ser proprietária do imóvel.

Situação diversa existiria se a incorporadora não fosse proprietária do imóvel incorporado (art. 31, “b”, da Lei nº 4.591/64), o que, porém, não ocorre neste caso concreto.

Consequentemente, não sendo o contrato de compromisso de compra e venda celebrado pelo apelante com a atual titular do domínio, não há continuidade que é requisito essencial ao seu registro, pois como esclarece Afrânio de Carvalho:

O princípio da continuidade, que se apóia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente” (Registro de Imóveis, 4ª edição, 1998, Forense, pág. 253).

Em decorrência, deverá o apelante promover o aditamento, ou retificação, do contrato de compromisso de compra e venda para que a atual proprietária do imóvel passe a constar como transmitente do direito que se pretende registrar, requisito que não é suprido pela cessão da incorporação promovida pela anterior proprietária do imóvel incorporado.

Disso decorre a procedência da dúvida, com manutenção da recusa do registro do contrato de compromisso de compra e venda apresentado pelo apelante.

6. No que tange à reclamação formulada por Fábio Duarte (Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624), falta a este Colendo Conselho Superior da Magistratura competência para a apreciação do recurso administrativo, pois, como anteriormente esclarecido, diz respeito ao cancelamento e bloqueio que, se forem determinados, serão objeto de averbações.

Por esse motivo, impõe-se o desapensamento dos autos, com remessa do Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624 à Corregedoria Geral da Justiça para o oportuno julgamento do recurso administrativo que nele foi interposto.

Anoto, desde logo, para afastar eventuais questionamentos, que nenhum outro título ingressará na matrícula nº 91.881 do Registro de Imóveis de Tatuí enquanto os efeitos da prenotação nº 253.605 estiverem vigentes, sendo que as consequências decorrentes da procedência da dúvida serão apreciados no Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624.

7. Por fim, as medidas para apuração de responsabilidade disciplinar decorrente da não observação da prioridade para registro serão, de igual modo, apreciadas no Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624, pois de competência da Corregedoria Geral da Justiça.

8. Ante o exposto, mantenho a procedência da dúvida e nego provimento à apelação interposta no Processo nº 1001867-89.2017.8.26.0264.

Determino a extração de cópias de fls. 01/39, 46/57, 60/71, 97/102 (sentença), 110/126, 137/138, 147/149, 151 e 156 do Processo nº 1001867-89.2017.8.26.0624, com sua juntada no Processo nº 1001738-84.2017.8.26.0624 que, ainda, deverá ser instruído com cópia do acórdão prolatado no presente feito, abrindo-se, após, nova conclusão ao Corregedor Geral da Justiça.

PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 07.05.2018 – SP)

Fonte: 26º Tabelionato de Notas | 17/05/2018.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


CSM/SP: Registro de imóveis – Dúvida Inversa – Carta de sentença – Servidão administrativa – Princípio da especialidade – Impossibilidade de identificar a servidão dentro da área dos imóveis atingidos, em razão da descrição deficiente – Dúvida procedente – Recurso desprovido.

Apelação nº 1005787-86.2017.8.26.0037

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1005787-86.2017.8.26.0037
Comarca: ARARAQUARA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1005787-86.2017.8.26.0037

Registro: 2018.0000187364

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1005787-86.2017.8.26.0037, da Comarca de Araraquara, em que são partes é apelante INTERLIGAÇAO ELETRICA DO MADEIRA S/A, é apelado 2ª OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE ARARAQUARA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 16 de março de 2018.

PINHEIRO FRANCO

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação nº 1005787-86.2017.8.26.0037

Apelante: Interligaçao Eletrica do Madeira S/A

Apelado: 2ª Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Araraquara

VOTO Nº 37.307

Registro de imóveis – Dúvida Inversa – Carta de sentença – Servidão administrativa – Princípio da especialidade – Impossibilidade de identificar a servidão dentro da área dos imóveis atingidos, em razão da descrição deficiente – Dúvida procedente – Recurso desprovido.

Trata-se de apelação interposta por INTERLIGAÇÃO ELÉTRICA DO MADEIRA S.A. contra r. sentença que, no julgamento de dúvida inversa, manteve a negativa de registro de carta de sentença de servidão administrativa, acolhendo as razões trazidas pelo Sr. Oficial do 2° Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas de Araraquara quanto à necessidade de prévia retificação das matrículas atingidas pela servidão.

A apelante sustenta que o georreferenciamento, conforme §§ 3º e 4º art. 176 da Lei n° 6.015/1973, somente é obrigatório em caso de transferência de titularidade e quando há alteração dos limites do imóvel, o que não é o caso da servidão administrativa.

Ademais, seria impossível a obtenção das assinaturas do proprietário nos mapas e memoriais, bem como assinatura dos confrontantes, já que se trata de servidão constituída judicialmente.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Tratando-se de dúvida inversa prenotada e impugnando a integralidade da nota devolutiva, conheço do recurso.

No mérito, o recurso não comporta provimento.

A recorrente é concessionária de serviço público de transmissão de energia elétrica e lhe coube a construção, operação e manutenção do empreendimento elétrico denominado de Linha de Transmissão Coletora Porto Velho Araraquara 2, cujo traçado passou pelos Estados de Rondônia, Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais e São Paulo.

Não evoluindo as tentativas de formalização da faixa de servidão pela via administrativa, a recorrente, na forma do Decreto-Lei n.º 3.365/41, obteve sentença judicial favorável para a constituição de servidão administrativa na área da matrícula n° 6.886 da referida serventia imobiliária (autos n° 0007916-61.2011.8.26.0037), com expedição da judiciosa carta de sentença.

O título, contudo, obteve qualificação negativa perante o 2º Ofício de Registro de Imóveis de Araraquara, conforme nota de devolução nº 12.335/2017 (fls.163).

A qualificação registral imobiliária é expressão do exame registral, após apresentação do título original.

Ela é feita pelo Oficial Registrador, com verdadeira natureza de tutela preventiva de conflitos (órgão pacificador de conflitos).

Por essas razões, a qualificação deve observar todos os princípios e regras aplicáveis, sejam legais, sejam administrativas.

Como é sabido, os títulos judiciais também não escapam ao crivo da qualificação registral, [1] de modo que o registrador, longe de questionar o conteúdo da decisão e tampouco o seu mérito, deverá examinar se estão atendidos os princípios registrais pertinentes ao caso, para seu perfeito ingresso no fólio real.

Trata-se, assim, de análise formal, restrita aos requisitos extrínsecos do título.

E, de fato, não seria possível o ingresso do título, à míngua de descrição suficiente da área e dos limites dos imóveis, sem a indicação de marcos seguros que permitam identificar a sua correta base geodésica, sob pena de ofensa ao princípio da especialidade objetiva.

A questão não é nova; são diversos os precedentes deste Eg. Conselho Superior da Magistratura sobre a matéria, no sentido de que o registro da servidão administrativa se submete a todos os princípios informadores dos registros públicos.

A servidão administrativa proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava o prédio serviente, que pertence a proprietário diverso, com força de limitação administrativa. Uma vez registrada, grava o direito real em favor de seu titular, no caso, a Administração Pública ou suas concessionárias.

E não se pode admitir a constituição de um direito real sem a necessária certeza sobre a amarração da área objeto da servidão à base territorial sobre a qual está sendo implantada. [2]

É verdade que as servidões administrativas não têm natureza similar à da desapropriação, como modo de aquisição de domínio; entretanto, de outro enfoque, traduzem gravame e limitam o exercício da propriedade, com natureza pública, instituído sobre imóvel alheio [3].

Não se pode falar em mitigação da especialidade objetiva para atos de registro constitutivo de um novo direito real, sob pena de ofensa a todos os princípios de segurança jurídica e publicidade afetos ao serviço de registro imobiliário. [4]

Embora sustente o apelante, decisão anterior proferida por outro Juízo então responsável pela Corregedoria Permanente, ou mesmo a existência de outra nota devolutiva com exigência não feita anteriormente não obstam a nova análise feita pela r. sentença recorrida, especialmente face à inexistência de coisa julgada administrativa nesta hipótese.

Ademais, não há óbice que impossibilite, de forma absoluta, que a apelante promova a retificação das matrículas, na condição de interessada no registro da servidão, uma vez que, na impossibilidade de assinatura de titulares de domínio ou confrontantes, serão feitas as regulares notificações, na forma do art. 213 e parágrafos da Lei n° 6.015/73.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator


Notas:

[1] Apelações CSM n° 1006009-07.2016.8.26.0161 e 0001652-41.2015.8.26.0547.

[2] Ver Apelação CSM n° 1003805-88.2015.8.26.0269.

[3] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 145.

[4] CSM, Apelações nº 122-6/9, 456-6/2, 454-6/3 e 666-6/0 e 0001620-50.2014 e 1001809-55.2015. (DJe de 07.05.2018 – SP)

Fonte: INR Publicações.

____

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.