CSM/SP: Registro de Imóveis – A indisponibilidade que grava o direito de propriedade de um dos condôminos impede a transmissão voluntária da totalidade da propriedade imobiliária – Sistema do título e do modo que implica no exame da situação jurídica da propriedade no momento da apresentação do título a registro – Impossibilidade de cindibilidade do título em virtude da unidade do negócio jurídico sobre único imóvel que não permite fracionamento – recurso não provido.


  
 

Apelação Cível nº 1001630-96.2019.8.26.0038

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1001630-96.2019.8.26.0038
Comarca: ARARAS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 1001630-96.2019.8.26.0038

Registro: 2019.0000936704

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001630-96.2019.8.26.0038, da Comarca de Araras, em que é apelante JOSÉ ANTONIO AVELAR, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMOVEIS E ANEXOS DE ARARAS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 1º de novembro de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1001630-96.2019.8.26.0038

Apelante: José Antonio Avelar

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Araras

VOTO Nº 37.940

Registro de Imóveis – A indisponibilidade que grava o direito de propriedade de um dos condôminos impede a transmissão voluntária da totalidade da propriedade imobiliária – Sistema do título e do modo que implica no exame da situação jurídica da propriedade no momento da apresentação do título a registro – Impossibilidade de cindibilidade do título em virtude da unidade do negócio jurídico sobre único imóvel que não permite fracionamento – recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta por José Antonio Avelar contra r. sentença que julgou improcedente a dúvida e manteve a recusa do registro de escritura pública ante a presença da indisponibilidade que recai sobre parcela do imóvel da titularidade de um dos condôminos e a impossibilidade de cindibilidade do título.

O apelante sustenta o cabimento do registro ou, sucessivamente, a cindibilidade do título com seu registro com relação aos condôminos quanto aos quais não recai ordem de indisponibilidade (a fls. 80/86).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 104/106).

É o relatório.

A indisponibilidade que grava os direitos de um dos condôminos impede o registro da escritura pública de compra e venda do imóvel por não haver disponibilidade do direito por força das ordens judicial e administrativa que impedem a transmissão voluntária do direito de propriedade.

O fato da escritura pública ser anterior à ordens de indisponibilidade é irrelevante para fins de registro imobiliário, pois o ordenamento jurídico pátrio, nos termos do artigo 1.245 do Código Civil, adotou o sistema do título e do modo, assim, a transmissão derivada da propriedade imóvel na hipótese ocorre com o registro do título e não com o aperfeiçoamento do contrato de compra e venda.

Desse modo, compete analisar a situação jurídica da propriedade a ser transmitida no momento da apresentação do título à registro.

Nessa linha, o seguinte precedente deste Conselho Superior da Magistratura:

REGISTRO DE IMÓVEIS. Escritura de Divisão e Extinção de Condomínio. Indisponibilidade decretada em ação de responsabilidade civil, em relação ao co-proprietário de parte. Registro que transforma a titularidade do domínio sobre parte ideal em parte certa e determinada. Necessidade de análise e decisão pelo Juízo que decretou a indisponibilidade. Correta a recusa pelo Oficial, o qual deve se restringir à análise dos requisitos formais e extrínsecos do título, em consonância com a situação registral. Recurso não provido (Apelação Cível n. 596-6/0, j. 09/11/2006, Relator Des. Gilberto Passos de Freitas).

É incabível a cindibilidade do título por não ser possível a divisão do negócio jurídico constante do título, o qual se refere a apenas um imóvel.

O contrato de compra e venda celebrado sob forma pública tratou da alienação da totalidade do imóvel e não apenas de partes ideais; a vontade das partes foi única sem lugar para o pretendido fracionamento.

Essa questão foi cuidadosamente tratada no voto convergente do Excelentíssimo Desembargador Artur Marques da Silva Filho, Presidente da Seção de Direito Privado à época, no julgamento da Apelação Cível nº 0027539-71.2014.8.26.0576, deste Conselho Superior da Magistratura, em 07.10.2015, como se observa do seguinte:

Ademais, como havia sido exposto em 27.1.2015, no julgamento da Apelação Cível 300543-41.2013.8.26.0601, deste E. Conselho, o princípio da cindibilidade implica o seguinte:

a) a cisão possível é a do título formal (= do instrumento), e não do título causal (= do fato jurídico que, levado ao registro de imóveis, dá causa à mutação jurídico-real);

b) a possibilidade de cisão decorre do princípio da unitariedade (ou unicidade) da matrícula (LRP/1973, art. 176, I); e

c) o título formal pode cindir-se em dois casos: ou quando um mesmo e único título formal disser respeito a mais de um imóvel; ou quando um mesmo e único título formal contiver dois ou mais fatos jurídicos relativos a um mesmo e único imóvel, contanto que esses fatos jurídicos não constituam uma unidade indissolúvel.

Portanto, não está abrangida pelo princípio da cindibilidade (ao menos como o tem entendido a jurisprudência deste E. Conselho) a permissão para que se separem, nos negócios jurídicos, as partes eficazes, e se desprezem as restantes. Essa “cisão” supõe que o oficial de registro de imóveis possa invocar e aplicar o Cód. Civil, art. 170 (verbis “Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.”). Ora, essa invocação e aplicação não são possíveis, porque dependem de uma ilação (= supor o que as partes haveriam querido, se tivessem previsto a nulidade ou a ineficácia) que extrapola os limites da qualificação registral, circunscrita ao que consta no título e no próprio registro.

Portanto, no caso destes autos, não cabe ao ofício de registro de imóveis nem à corregedoria permanente extirpar uma parte ineficaz da doação (= a fração ideal afetada por indisponibilidade) para fazer com que o restante do negócio jurídico seja passível de registro stricto sensu, mesmo que se invoque o princípio da cindibilidade, que não se aplica.

Em suma: a pretensão da apelante de registro stricto sensu não é viável. Essa impossibilidade não pode ser contornada sequer pela regra da cindibilidade (em seu sentido mais amplo), a qual, por falta de amparo legal, em verdade não pode ser aplicada para desprezar, nos negócios jurídicos, as partes que sejam inválidas ou ineficazes, somente para permitir uma inscrição lato sensu.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator.

Fonte: INR Publicações

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