Mandado de Segurança – ISSQN sobre serviços notariais – Pretensão de ser afastada a cobrança de ISSQN sobre valores outros que não o efetivo preço recebido pelo notário – Base de cálculo que deve ser o preço do serviço, com a dedução dos repasses determinados ao Estado e outros órgãos públicos, visto que são valores não pertencentes à delegatária – Tese assentada em incidente de inconstitucionalidade julgado pelo Órgão Especial – Precedentes do STJ e do TJSP – Decisão mantida – Recurso desprovido.


  
 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necessária nº 1030654-27.2019.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO e Recorrente JUÍZO EX OFFICIO, é apelado BENEDITO APARECIDO MORELLI.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 14ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores OCTAVIO MACHADO DE BARROS (Presidente sem voto), KLEBER LEYSER DE AQUINO E GERALDO XAVIER.

São Paulo, 14 de julho de 2020.

MÔNICA SERRANO

Relator

Assinatura Eletrônica

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA nº 1030654-27.2019.8.26.0053 – São Paulo

APELANTE: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO

RECORRENTE: JUÍZO EX OFFICIO

APELADO: BENEDITO APARECIDO MORELLI

INTERESSADO: SECRETÁRIO DE FINANÇAS DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

VOTO Nº 16915

MANDADO DE SEGURANÇA – ISSQN sobre serviços notariais – Pretensão de ser afastada a cobrança de ISSQN sobre valores outros que não o efetivo preço recebido pelo notário – Base de cálculo que deve ser o preço do serviço, com a dedução dos repasses determinados ao Estado e outros órgãos públicos, visto que são valores não pertencentes à delegatária – Tese assentada em incidente de inconstitucionalidade julgado pelo Órgão Especial – Precedentes do STJ e do TJSP – Decisão mantida – Recurso desprovido.

Trata-se de apelação interposta contra sentença que, em mandado de segurança, concedeu a ordem para “assegurar ao impetrante o direito de inexigibilidade da cobrança do ISSQN sobre os valores arrecadados a título de contribuição ao fundo especial de despesas do Ministério Público do Estado de São Paulo, e, do ISSQN pago pelo usuário a ser recolhido ao município de São Paulo-SP, determinando-se ao impetrado que se abstenha de se recusar a receber os RPS (recibo provisório de serviço), em bloco, via internet, tendo como base de cálculo, somente o preço do serviço.”.

Em sua apelação (fls. 150/157), o Município tão somente reproduziu, com alterações formais, a argumentação trazida na contestação de fls. 108/116, pelo que fica adotado o relatório da sentença neste ponto: “Prestadas as informações de estilo o impetrado, em prejudicial de mérito, alega o não cabimento de mandado de segurança contra lei em tese. No mérito, alega que são descabidas as alegações feitas. Quer, pois, a denegação da segurança.”.

Recurso tempestivo.

Contrarrazões às fls. 170/177.

É o relatório.

De proêmio, deve ser afastada a preliminar de impetração contra lei em tese, na medida em que o fato de o ato coator estar previsto em lei não afasta a lesão ou ameaça a direito do impetrante. Nesse sentido, o objetivo do writ, que restou devidamente demonstrado, é justamente impedir a violação do direito de recolhimento do ISSQN pelo efetivo preço recebido em decorrência do serviço prestado, o que não se insere na hipótese vedada pela Súmula nº 266 do STF.

No que tange à receita bruta como base de cálculo para os serviços de registros públicos, cartorários e notariais, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao julgar o incidente de inconstitucionalidade nº 022278-68.2009.8.26.0000, determinou que a base de cálculo do ISS deve ficar restrita à receita efetivamente auferida pelo delegatário dos serviços, excluídos os valores repassados a terceiros. É o que se verifica da ementa do julgado:

INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE – DÉCIMA QUINTA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO – AÇÃO DECLARATÓRIA – Incidência do ISS sobre os serviços de registros públicos, cartorários e notariais, a teor da Lei Complementar 116/03 e Lei Municipal 93/03 – Atividade privada – Receita bruta que não pode servir como a grandeza do elemento tributário quantitativo – Base de cálculo do ISS que deve ser, tão-somente, o valor auferido pelo oficial delegatário, dai estando excluídos, por óbvio, os demais encargos a ele não pertencentes – Artigo 236, caput, da Constituição Federal – Argüição acolhida, para conferir à Lei Complementar Municipal 93/03, do Município de Santa Fé do Sul, interpretação conforme a Constituição Federal – INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE PROCEDENTE. (TJSP; Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade Criminal 0222778-68.2009.8.26.0000; Relator (a): Xavier de Aquino; Órgão Julgador: Órgão Especial; Foro de Santa Fé do Sul – 2.VARA JUDICIAL E MENORES; Data do Julgamento: 26/05/2010; Data de Registro: 18/06/2010).

Em que pese se tratar de incidente de inconstitucionalidade não vinculante para os demais Municípios, a matéria é idêntica e já é assente o entendimento de que a base de cálculo não deve corresponder à receita bruta, devendo dela ser descontados os repasses.

Sobre tais repasses, verifica-se que a receita auferida pelos titulares de serviços de registros públicos e notariais no Estado de São Paulo é determinada pela Lei Estadual nº 11.331/2002, em seu artigo 19:

“Os emolumentos correspondem aos custos dos serviços notariais e de registro na seguinte conformidade:

I – relativamente aos atos de Notas, de Registro de Imóveis, de Registro de Títulos e Documentos e Registro Civil das Pessoas Jurídicas e de Protesto de Títulos e Outros Documentos de Dívidas:

a) 62,5% (sessenta e dois inteiros e meio por cento) são receitas dos notários e registradores;

b) 17,763160% (dezessete inteiros, setecentos e sessenta e três mil, cento e sessenta centésimos de milésimos percentuais) são receita do Estado, em decorrência do processamento da arrecadação e respectiva fiscalização;

c) 13,157894% (treze inteiros, cento e cinquenta e sete mil, oitocentos e noventa e quatro centésimos de milésimos percentuais) são contribuição à Carteira de Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça do Estado;

d) 3,289473% (três inteiros, duzentos e oitenta e nove mil, quatrocentos e setenta e três centésimos de milésimos percentuais) são destinados à compensação dos atos gratuitos do registro civil das pessoas naturais e à complementação da receita mínima das serventias deficitárias;

e) 3,289473% (três inteiros, duzentos e oitenta e nove mil, quatrocentos e setenta e três centésimos de milésimos percentuais) são destinados ao Fundo Especial de Despesa do Tribunal de Justiça, em decorrência da fiscalização dos serviços.

II – relativamente aos atos privativos do Registro Civil das Pessoas Naturais:

a) 83,3333% (oitenta e três inteiros, três mil e trezentos e trinta e três centésimos de milésimos percentuais) são receitas dos oficiais registradores;

b) 16,6667% (dezesseis inteiros, seis mil seiscentos e sessenta e sete centésimos de milésimos percentuais) são contribuição à Carteira de Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça do Estado”

Conforme se verifica na legislação acima, apenas uma parte dos emolumentos cobrados pelo Oficial de Registro constitui efetivamente sua receita, sendo repassadas outras parcelas dos emolumentos ao estado e demais órgãos públicos. Assim, conclui-se que o tributo em tela deve incidir apenas sobre o preço do serviço que efetivamente constitui fato gerador do ISS, e não sobre os emolumentos criados pelo Estado para efetivar a manutenção da Administração Pública.

Com efeito, descabido o singelo argumento de que todo o preço cobrado do tomador dos serviços notariais deve compor a base de cálculo do ISSQN, pois o objeto do tributo é justamente taxar o valor da atividade econômica subjacente, qual seja, o montante efetivamente recebido pelo prestador do serviço. Tal fato também afasta a analogia com os serviços de construção civil, uma vez que a lei exclui da base de cálculo do ISSQN valores que são recebidos pelo prestador, ou seja, que originariamente fariam parte do cálculo.

Do exposto, nega-se provimento ao recurso.

MÔNICA SERRANO

Relatora – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação / Remessa Necessária nº 1030654-27.2019.8.26.0053 – São Paulo – 14ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Mônica Serrano – DJ 16.07.2020

Fonte: INR Publicações

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