1VRP/SP: Registro de Imóveis. Formal de Partilha. Partilha desigual. ITBI exigível.

Processo 1040864-88.2022.8.26.0100

Dúvida – Averbação ou registro de sentença na matrícula do imóvel – Osmar Rocha de Souza – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada para manter o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: PEDRO GOMES DOS SANTOS JUNIOR (OAB 410950/SP) (Acervo INR – DJe de 07.06.2022 – SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1040864-88.2022.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Averbação ou registro de sentença na matrícula do imóvel

Requerente: Osmar Rocha de Souza

Requerido: Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital do Estado de São Paulo

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de ação de obrigação de fazer movida por Osmar Rocha de Souza contra o Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital em razão da negativa em se proceder ao registro de formal de partilha expedido pelo juízo da 11ª Vara da Família e Sucessões do Foro Central da Comarca de São Paulo (ação de divórcio litigioso, processo de autos n. 1003052-46.2021.8.26.0100), o qual envolve o imóvel da matrícula n. 209.809 daquela serventia.

O óbice registrário decorre da necessidade de se submeter a partilha previamente à análise do fisco estadual, com apresentação, se o caso, de guia e comprovante de pagamento do imposto de transmissão, bem como da respectiva declaração e certidão de homologação (fl. 20).

A parte sustenta que foi casada com Lígia Barbosa de Mello Souza; que, por ocasião do divórcio, foram partilhados de forma amigável os bens adquiridos na constância do casamento; que, diante da divisão igualitária dos bens, não há hipótese de incidência do ITCMD; que devem ser considerados os valores dos bens e direitos que couberam a cada um dos consortes em relação ao valor total do patrimônio partilhado, com respeito ao patrimônio particular de cada um; que, independentemente da forma como os bens foram divididos, não há excesso de meação (por doação) se os valores partilhados foram iguais; que não há que se falar em manifestação do fisco, uma vez que houve provimento jurisdicional homologando a partilha; que há necessidade de tutela de urgência para registro do título, uma vez que o imóvel foi negociado.

Documentos vieram às fls. 13/32.

O feito foi recebido como dúvida (inversa), sem tutela de urgência. Pelo decurso do trintídio legal da última prenotação, determinou-se a reapresentação do título (fl. 33/34).

A parte suscitada manifestou-se pelo recebimento do pedido como dúvida diante da impugnação de todas as exigências formuladas (fls. 38/42). Juntou documentos às fls. 43/46.

Com o atendimento, o Oficial manifestou-se às fls. 48/50, informando que a partilha dos bens do casal deve ser submetida ao fisco estadual para verificação acerca da incidência do ITCMD (Decreto n. 46.655/02); que, se for o caso, devem ser exibidos guia e comprovante de pagamento, bem como declaração do ITCMD e certidão de homologação a ser expedida pela Fazenda Estadual (Portaria CAT n. 89/2020); que incumbe ao fisco a verificação do valor atribuído aos bens, com definição de partilha igualitária ou não; que há imposição legal ao Oficial de fiscalização do recolhimento do imposto (arts. 30, XI, e 31, V, Lei 8.935/94).

Documentos vieram às fls. 51/120.

O Ministério Público opinou pela manutenção do óbice (fls. 124/127).

É o relatório.

Fundamento e Decido.

No mérito, a dúvida é procedente. Vejamos os motivos.

De início, vale destacar que os títulos judiciais não estão isentos de qualificação para ingresso no fólio real.

O Egrégio Conselho Superior da Magistratura já decidiu que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n. 413-6/7).

Neste sentido, também a Ap. Cível nº 464-6/9, de São José do Rio Preto:

“Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal. O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”.

E, ainda:

“REGISTRO PÚBLICO – ATUAÇÃO DO TITULAR – CARTA DE ADJUDICAÇÃO – DÚVIDA LEVANTADA – CRIME DE DESOBEDIÊNCIA – IMPROPRIEDADE MANIFESTA.

O cumprimento do dever imposto pela Lei de Registros Públicos, cogitando-se de deficiência de carta de adjudicação e levantando-se dúvida perante o juízo de direito da vara competente, longe fica de configurar ato passível de enquadramento no artigo 330 do Código Penal – crime de desobediência – pouco importando o acolhimento, sob o ângulo judicial, do que suscitado” (STF, HC 85911 / MG – MINAS GERAIS, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, j. 25/10/2005, Primeira Turma).

Sendo assim, não há dúvidas de que a origem judicial não basta para garantir ingresso automático dos títulos no fólio real, cabendo ao oficial qualificá-los conforme os princípios e as regras que regem a atividade registral.

Em outras palavras, o Oficial, quando da qualificação, perfaz exame dos elementos extrínsecos do título à luz dos princípios e normas do sistema jurídico (aspectos formais), devendo obstar o ingresso daqueles que não se atenham aos limites da lei.

Esta conclusão se reforça pelo fato de que vigora, para os registradores, ordem de controle rigoroso do recolhimento do imposto por ocasião do registro do título, sob pena de responsabilidade pessoal (artigo 289 da Lei n. 6.015/73; artigo 134, VI, do CTN e artigo 30, XI, da Lei 8.935/1994), bem como pelo disposto pelo item 117 do Cap. XX das Normas de Serviço:

“Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

No que tange ao ITCMD, a Lei Estadual n. 10.705/2000 (artigos 8º, I, e 25), bem como o Decreto Estadual n. 46.655/2002 que a regulamenta (artigo 48), também estabelecem atribuições ao oficial registrador neste mesmo sentido:

“Artigo 8º – Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:

I – o tabelião, escrivão e demais serventuários de ofício, em relação aos atos tributáveis praticados por eles ou perante eles, em razão de seu ofício;

(…)

Artigo 25 – Não serão lavrados, registrados ou averbados pelo tabelião, escrivão e oficial de Registro de Imóveis, atos e termos de seu cargo, sem a prova do pagamento do imposto.

(…)

Artigo 48 – Não serão lavrados, registrados ou averbados pelo tabelião, escrivão e oficial de Registro de Imóveis, atos e termos de seu cargo, sem a prova do recolhimento do imposto ou do reconhecimento de isenção ou não incidência, quando for o caso (Lei 10.705/00, art. 25)”.

No caso concreto, verifica-se que a partilha realizada em razão do divórcio cuidou de quatro imóveis pertencentes ao casal, ao lado de outros bens, de modo que o seu conjunto foi partilhado de modo igualitário, uma vez considerados os valores indicados (itens 1 a 6, fl. 23).

Todavia, ao considerarmos somente os bens imóveis, verifica-se partilha desigual: o imóvel localizado na rua Ouvidor Peleja, n. 543, apto. 163, Saúde, São Paulo, valor de R$850.000,00, bem como 23,474% do imóvel localizado na rua França Pinto, 832, apto. 104, Vila Mariana, São Paulo, valor de R$900.000,00, o que corresponde a R$211.266,00, foram atribuídos à parte suscitada, totalizando R$1.061.266,00.

Por outro lado, coube à mulher o correspondente a 76,526% do último imóvel referido, valor de R$688.734,00, bem como o imóvel localizado na rua Juritis, 665, Parque das Araucárias, Distrito de Monte Verde, Camanducaia, Minas Gerais, valor de R$350.000,00, e o lote 49-B, da quadra C, do loteamento Parque das Araucárias, Distrito de Monte Verde, Camanducaia, Minas Gerais, valor de R$100.000,00, o que totaliza R$1.138.734,00.

Constata-se, assim, a existência de partilha desigual (excesso de meação em favor da mulher), que receberá tratamento tributário próprio conforme haja ou não reposição onerosa.

Essa reposição onerosa é a compensação financeira feita com patrimônio próprio do cônjuge beneficiado àquele prejudicado na partilha.

Note-se que se, na divisão, um dos cônjuges adquire onerosamente a meação do outro sobre determinado imóvel, configura-se o fato gerador do ITBI, que é a transmissão inter vivos a qualquer título por ato oneroso de bem imóvel. Se não houver compensação financeira, considera-se doada essa parte desproporcional, pelo que incide ITCMD.

Assim, para ingresso do título no fólio real, impõe-se prévia declaração à Secretaria da Fazenda Estadual, a quem incumbe a fiscalização do recolhimento do ITCMD (base de cálculo utilizada e homologação), com comprovação do recolhimento eventualmente devido (artigos 2º, II, §5º, e 11, §2º, da Lei Estadual n. 10.705/00, e artigos 8º e 26, do Decreto Estadual n. 46.655/02):

“Artigo 2º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:(…)

II – por doação. (…)

§ 5º – Estão compreendidos na incidência do imposto os bens que, na divisão de patrimônio comum, na partilha ou adjudicação, forem atribuídos a um dos cônjuges, a um dos conviventes, ou a qualquer herdeiro, acima da respectiva meação ou quinhão.

(…)

Artigo 11 – Não concordando a Fazenda com valor declarado ou atribuído a bem ou direito do espólio, instaurar-se-á o respectivo procedimento administrativo de arbitramento da base de cálculo, para fins de lançamento e notificação do contribuinte, que poderá impugnálo.

(…)

§ 2º – As disposições deste artigo aplicam-se, no que couber, às demais partilhas ou divisões de bens sujeitas a processo judicial das quais resultem atos tributáveis”.

“Artigo 8.º – Tratando-se de transmissões ocorridas na esfera judicial, as hipóteses previstas nas alíneas “a”, “b” e “c” do inciso I e “a” do inciso II do artigo 6º também ficam condicionadas ao seu reconhecimento pela Secretaria da Fazenda, que será realizado no âmbito dos procedimentos relativos à declaração, previstos nos artigos 21 e 26, observados os prazos e demais condições ali estabelecidas.

(…)

Artigo 26 – Na hipótese de doação realizada no âmbito judicial, independentemente da obrigatoriedade da sua inclusão na declaração prevista no artigo anterior, o contribuinte, no prazo de 15 (quinze) dias a contar do trânsito em julgado da sentença, fica obrigado a apresentar declaração, na forma e para fins indicados nos artigos 21 a 23, que deverá reproduzir todos os dados constantes da partilha, instruída com a guia comprobatória do recolhimento do imposto”.

Vale observar que não se questiona a competência do juízo do divórcio para partilhar os bens comuns por sentença, como na espécie (fls. 26/27).

Como vimos, a questão em debate neste âmbito administrativo é outra e envolve a necessidade de avaliação da transmissão operada com a partilha pelo fisco, recolhendo-se tributo, se o caso, para ingresso do título no fólio real, notadamente à vista do regramento referido acima, que é respaldado pela jurisprudência:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente – Carta de sentença extraída de ação de partilha decorrente de divórcio – Partilha que indica os bens atribuídos à mulher e os seus respectivos valores, sem, contudo, especificar os que couberam ao marido – Transação para a partilha que, na forma como realizada, faz presumir a existência de transmissão por ato “inter vivos” – Necessidade de comprovação da declaração e do recolhimento do Imposto de Transmissão, ou de demonstração de sua isenção – Recurso não provido” (CSM – Apelação n. 1005693-44.2018.8.26.0445 – Rel. Pinheiro Franco – j. 26.11.2019).

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente – Carta de sentença extraída de ação de divórcio consensual – Exigência consistente na apresentação da anuência da Fazenda do Estado com a declaração e o recolhimento do Imposto de Transmissão ‘Causa Mortis’ e de Doação de Quaisquer Bens e Direitos – ITCMD – Carta de sentença que somente foi instruída com o protocolo da declaração do ITCMD e com as guias de recolhimento, o que impossibilita a análise da alegação de que foi adotada base de cálculo superior aos valores venais dos imóveis transmitidos – Recurso não provido” (CSM – Apelação n. 1018134-43.2019.8.26.0309 – Rel. Des. Ricardo Anafe – j.18.06.2020).

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada para manter o óbice registrário.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 03 de junho de 2022.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juíza de Direito (DJe de 07.06.2022 – SP)

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo

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STF afasta incidência do IR sobre pensões alimentícias decorrentes do direito de família

Em sessão virtual, maioria do Plenário entendeu que os valores não constituem acréscimo patrimonial e que a incidência do imposto consistiria em bitributação.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) afastou a incidência do Imposto de Renda (IR) sobre valores decorrentes do direito de família recebidos a título de alimentos ou de pensões alimentícias. A decisão se deu, na sessão virtual finalizada em 3/6, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5422, ajuizada pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), nos termos do voto do relator, ministro Dias Toffoli.

Direito de família

Inicialmente, o ministro explicou que a discussão se limitou a alimentos e pensões alimentícias estabelecidas com base no direito de família, pois o IBDFAM, ao formular suas razões, não apresentou fundamentos de inconstitucionalidade da incidência do imposto sobre outras realidades.

Entrada de valores

No exame do mérito, Toffoli observou que a jurisprudência do STF e a doutrina jurídica, ao tratar do artigo 153, inciso III, do texto constitucional (que prevê a competência da União para instituir o imposto), entendem que a materialidade do tributo está necessariamente vinculada à existência de acréscimo patrimonial. Ocorre que alimentos ou pensão alimentícia oriunda do direito de família não são renda nem provento de qualquer natureza do credor dos alimentos, mas simplesmente montantes retirados dos rendimentos recebidos pelo pagador (alimentante) para serem dados ao beneficiário. “O recebimento desses valores representa tão somente uma entrada de valores”, apontou.

Bitributação

O relator também considerou que o devedor dos alimentos ou da pensão alimentícia, ao receber a renda ou o provento (acréscimos patrimoniais) sujeitos ao IR, retira disso parcela para pagar a obrigação. Assim, a legislação questionada provoca a ocorrência de bitributação camuflada e sem justificação legítima, violando o texto constitucional.

Toffoli reforçou que submeter os valores recebidos a esse título ao IR representa nova incidência do mesmo tributo sobre a mesma realidade, isto é, sobre parcela que integrou o recebimento de renda ou de proventos pelo alimentante. “Essa situação não ocorre com outros contribuintes”, frisou.

Dedução

Ainda de acordo com o relator, a Lei 9.250/1995, ao permitir a dedução dos valores pagos a título de pensão alimentícia na base de cálculo mensal do imposto devido pelo alimentante, não afasta esse entendimento. “No caso, o alimentante, e não a pessoa alimentada, é o beneficiário da dedução”, frisou.

O voto do relator foi seguido pelos ministros Luiz Fux (presidente do STF), Ricardo Lewandowski, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e André Mendonça e pelas ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.

Resultado

Por maioria, o Plenário deu interpretação conforme a Constituição Federal ao artigo 3º, parágrafo 1º, da Lei 7.713/1988, aos artigos 4º e 46 do Anexo do Decreto 9.580/2018 e aos artigos 3º, caput e parágrafos 1º e 4º, do Decreto-lei 1.301/1973, que preveem a incidência de IR nas obrigações alimentares.

Os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Nunes Marques ficaram parcialmente vencidos. Para eles, as pensões devem ser somadas aos valores do responsável legal, aplicando-se a tabela progressiva do IR para cada dependente, ressalvada a possibilidade de o alimentando declarar individualmente o Imposto de Renda.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

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Bem de família pode ser penhorado por dívida de contrato de empreitada global para construção do imóvel

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que se admite a penhora do bem de família para saldar o débito originado de contrato de empreitada global celebrado para a construção do próprio imóvel.

A discussão surgiu na cobrança de dívida originada de contrato firmado para a construção do imóvel de residência dos devedores. O tribunal de segunda instância autorizou a penhora, entendendo que o caso se enquadra na exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no artigo 3º, II, da Lei 8.009/1990 (dívida relacionada ao financiamento).

Os devedores alegaram que, sendo exceção à proteção legal da moradia, o dispositivo deveria ser interpretado restritivamente, alcançando apenas o titular do crédito decorrente do financiamento, ou seja, o agente financeiro. Isso excluiria o empreiteiro que fez a obra e ficou de receber diretamente do proprietário.

Proteção especial do bem de família não é absoluta

Relatora do processo no STJ, a ministra Nancy Andrighi lembrou que o bem de família recebe especial proteção do ordenamento jurídico. No entanto, ela observou que a impenhorabilidade não é absoluta, de forma que a própria lei estabeleceu diversas exceções a essa proteção – entre elas, a hipótese em que a ação é movida para cobrança de dívida decorrente de financiamento para construção ou compra de imóvel.

A magistrada destacou que as hipóteses de exceção, por restringirem a ampla proteção conferida ao imóvel familiar, devem ser interpretadas de forma restritiva, conforme entendimento já firmado pela Terceira e pela Quarta Turma do STJ.

“Não significa, todavia, que o julgador, no exercício de interpretação do texto, fica restrito à letra da lei. Ao interpretar a norma, incumbe ao intérprete identificar a mens legis, isto é, o que o legislador desejaria se estivesse vivenciando a situação analisada”, afirmou.

Legislador se preocupou em evitar deturpação do objetivo da Lei 8.009/1990

No caso analisado, a relatora ponderou que há a peculiaridade de ser a dívida relativa a contrato de empreitada global, segundo o qual o empreiteiro se obriga a construir a obra e a fornecer os materiais.

Nancy Andrighi salientou que o STJ já se manifestou no sentido de que a exceção do artigo 3º, II, da Lei 8.009/1990 se aplica à dívida oriunda do contrato de compra e venda do imóvel e à contraída para aquisição do terreno onde o devedor edificou, com recursos próprios, a casa que serve de residência da família.

Além disso, citou precedente em que a Quarta Turma, ao enfrentar questão semelhante (REsp 1.221.372), entendeu que a palavra “financiamento”, inserida no inciso II do artigo 3º da Lei 8.009/1990, não restringiu a impenhorabilidade às situações de compra ou construção com recursos de agentes financiadores.

“É nítida a preocupação do legislador no sentido de impedir a deturpação do benefício legal, vindo a ser utilizado como artifício para viabilizar aquisição, melhoramento, uso, gozo e/ou disposição do bem de família sem nenhuma contrapartida, à custa de terceiros”, declarou a ministra.

“Portanto, a dívida relativa a contrato de empreitada global, porque viabiliza a construção do imóvel, está abrangida pela exceção prevista no artigo 3º, II, da Lei nº 8.009/1990”, concluiu.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

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