Apelação nº 1004185-35.2022.8.26.0506.


  
 

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1004185-35.2022.8.26.0506
Comarca: RIBEIRÃO PRETO

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1004185-35.2022.8.26.0506

Registro: 2023.0000373547

ACÓRDÃO– Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1004185-35.2022.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que são apelantes CANDIDA MARIA MACHADO COLUCCI, ESPOLIO DE MARIA HELENA MACHADO BECHELLE e MARINA APARECIDA DA COSTA DIAS, é apelada 2º OFICIAL DE REGISTROS DE IMÓVEIS DA COMARCA DE RIBEIRÃO PRETO.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 5 de maio de 2023.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1004185-35.2022.8.26.0506

APELANTES: Candida Maria Machado Colucci, Espolio de Maria Helena Machado Bechelle e Marina Aparecida da Costa Dias

APELADO: 2º Oficial de Registros de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto

VOTO Nº 38.979

Registro de imóveis – Dúvida – Negativa de registro de escritura pública de inventário e partilha – Imóveis que foram adquiridos a título oneroso e na vigência do código civil de 1916, por pessoa casada em regime de separação obrigatória de bens – Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal – Presunção de comunicação dos aquestos – Dúvida procedente – Apelação não provida.

Cuida-se de apelação interposta por Cândida Maria Machado Colucci, Marina Aparecida da Costa Dias e o Espólio de Maria Helena Machado Bechelli contra a r. sentença que manteve recusa a registro de escritura pública de inventário e partilha dos imóveis matriculados sob n.ºs 104.768 e 67.590, do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto, decidindo que os bens adquiridos na constância do casamento, na vigência do Código Civil de 1916, presumem-se de ambos, nos termos da Súmula 377 do C. Supremo Tribunal Federal.

Aduzem os apelantes, em suma, inexistir comprovação de esforço comum, devendo ser adotado o entendimento do Código Civil de 2002 pela não presunção de esforço comum. Alegam que a testadora, no bojo do testamento, declarou que se tratavam de bens reservados, inexistindo argumento a invalidar o testamento, que tem fé pública e deve ser cumprido. O imóvel matriculado sob o n.º 67.590, apesar de ter sido adquirido na constância do casamento, o foi exclusivamente pela falecida Maria Helena, que exercia profissão lucrativa.

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 384/387).

É o relatório.

Cuida-se de registro de escritura pública de inventário e partilha dos bens deixados por Maria Helena Machado Bechelli em que os imóveis matriculados sob nºs 104.768 e 67.590, do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto, foram atribuídos aos herdeiros legatários Cândida Maria Machado Colucci, José Machado Barbosa de Mello, Vera de Souza e Silva Machado e Silvia Machado de Rezende, nos termos do testamento público lavrado em 29/11/1988.

O pretendido registro foi obstado por meio da nota devolutiva de fls. 07/08 exarada nos seguintes termos:

“O título apresentado refere-se à escritura de inventário e partilha dos bens deixados por Maria Helena Machado Bechelli, em que os imóveis das matrículas nºs 104.768 e 67.590, desta serventia, foram atribuídos aos herdeiros legatários.

Ocorre que referidos imóveis foram adquiridos a título oneroso e na constância do casamento de Maria Helena e Luiz Marino Bechelli, casados sob o regime da separação obrigatória de bens desde 30/01/1982, sendo que tais aquisições ocorreram sob a égide da Súmula nº 377 do STF, segundo a qual “no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.

Observa-se inexistir nos títulos aquisitivos dos imóveis qualquer indicação expressa de que foram adquiridos com esforço exclusivo da inventariada Maria Helena Machado Bechelli, de modo a afastar a incidência dos dispositivos legais vigentes e da Súmula nº 377 do STF, razão pela qual os bens são de titularidade de ambos os cônjuges.

Acrescenta-se que Luiz Marino Bechelli faleceu em 16/08/2004, e até esta data não foi prenotado título referente ao inventário de seus bens, e no inventário de Maria Helena Machado Bechelli, falecida em 20/09/2020, também inexistente documento apto a comprovar a alegada aquisição exclusiva pela inventariada.

A nota de exigência e devolução formulada por esta serventia está fundamentada no posicionamento em vigor no Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, conforme claramente mencionado na r. decisão proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital, autos nº 1119149-32.2021.8.26.0100, na qual respalda-se o pedido de reconsideração apresentado.

Portanto, considerando que os imóveis foram adquiridos de forma onerosa, sem indicação de se tratarem de bens exclusivos; considerando que tais aquisições estão devidamente registradas nas matrículas respectivas e produziram seus regulares efeitos; e considerando o entendimento exposto na Súmula 377 do STF, os imóveis das matrículas nº 67.590 e nº 104.768 pertencem a Maria Helena Machado Bechelli e Luiz Marino Bechelli.

De qualquer forma, se houve documento hábil a comprovar que os imóveis acima referidos são exclusivos de Maria Helena Machado Bechelli, pede-se apresentá-los para a devida qualificação registrária.”

Suscitada a dúvida, foi julgada procedente, nos termos da r. sentença de fls. 318/325, ora recorrida.

O recurso não comporta provimento. Maria Helena Machado Bechelli e Luiz Marino Bechelli casaram-se em 30/01/1982 sob o regime da separação obrigatória de bens.

Os bens imóveis matriculados sob n.ºs 104.768 (fls. 30/31) e 67.590 (fls 10/29) no 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto foram adquiridos a título oneroso e na constância do casamento de Maria Helena e Luiz Marino, em 02/06/1988 e 04/09/1996, respectivamente, na vigência do Código Civil de 1916, portanto.

Conforme a Súmula nº 377, do Supremo Tribunal Federal, os bens adquiridos a título oneroso na constância do casamento celebrado pelo regime da separação legal de bens são presumidos como de propriedade comum dos cônjuges, pois também é presumida a existência de esforço comum para a aquisição.

O registro do título aquisitivo faz presumir a propriedade (art. 1.425 e seguintes, do Código Civil) e produz todos os efeitos legais enquanto não for cancelado, ainda que por outro modo se prove que o título foi desfeito, anulado, extinto ou rescindido (art. 252 da Lei n.º 6.015/73).

Portanto, as matrículas mencionadas indicam que Maria Helena adquiriu os imóveis telados quando era casada pelo regime da separação obrigatória de bens com Luiz Marino, fato ocorrido na vigência do Código Civil de 1916.

Não há qualquer menção ou indicação expressa nos títulos aquisitivos dos bens matriculados sob os n.ºs 67.590 e 104.768, de que ambos tenham sido adquiridos com exclusividade por Maria Helena.

E o afastamento da presunção de esforço comum não pode se dar pela declaração unilateral contida no testamento público como pretendido pelos apelantes.

Não se desconhece a releitura conferida pelo C. Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que não se presume o esforço comum. Contudo, in casu, considerando as datas do casamento e da aquisição dos bens imóveis, ocorridas na vigência do Código Civil de 1916, há de prevalecer o entendimento da Súmula nº 377, do Supremo Tribunal Federal, presumindo-se o esforço comum.

A negativa do registro encontra respaldo na jurisprudência deste Egrégio Conselho Superior da Magistratura, como a seguir:

“Registro de Imóveis – Proprietária casada no regime da separação obrigatória de bens – Bem adquirido na constância da união – Cônjuges falecidos – Escritura de inventário da falecida esposa por meio da qual a totalidade do imóvel é partilhada – Impossibilidade de registro – Aplicabilidade da Súmula 377 do STF – Comunhão que se presume – Necessidade de prévia inscrição do formal de partilha extraído do inventário do falecido marido, no qual sua parte no imóvel será dividida – Alegação de prescrição da ação de sonegados – Matéria estranha ao procedimento de dúvida – Apelação desprovida.” (CSMSP – Apelação Cível: 1027173-17.2016.8.26.0100, Des. Rel. MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS).

Assim, em observância ao princípio da continuidade, correta a exigência formulada pela Registradora de apresentação do título revisto ou documento hábil à comprovação de que os imóveis mencionados tenham sido adquiridos com exclusividade por Maria Helena (artigos 195 e 237 da Lei n.º 6.015/73).

Frise-se, por fim, que a suposta ausência de prejuízo a terceiros é irrelevante. A desqualificação decorre de uma análise formal do título, de modo que a existência ou não de prejudicados é matéria estranha à análise feita pelo Oficial ou pela Corregedoria, Geral ou Permanente.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao apelo, mantida a recusa do registro.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator. (Acervo INR – DJe de 30.06.2023 – SP)

Fonte: Diário da Justiça Eletrônico.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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