1VRP/SP: Registro de Imóveis. A requerente, que não é parte na execução, pretende a averbação da escritura pública declaratória de garantia com finalidade premonitória, o que não ser admitido.


  
 

Processo 1081393-18.2023.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Renata de Cassia Melin – Neste contexto, JULGO PROCEDENTE o pedido, mantendo os óbices. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: RENATA DE CASSIA MELIN (OAB 177368/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1081393-18.2023.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 5º Oficial de Registro de Imóveis

Suscitado: Renata de Cassia Melin

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de pedido de providências iniciado pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Renata de Cássia Melin em virtude de recusa de averbação de escritura pública declaratória com garantia na matrícula n. 74.682 daquela serventia (prenotação n. 379.204).

O Oficial informa que a parte interessada adquiriu outros imóveis da proprietária Solange Lamarca Luxo Martins, a qual é ré em ação de execução de título extrajudicial; que a parte, para assegurar a sua aquisição, busca o registro da oferta de outros imóveis em garantia do débito; que a averbação foi recusada porque a garantia oferecida ostenta caráter meramente pessoal; que o título não encontra guarida no Registro de Imóveis pois não foi especializado o direito real conferido em garantia; que o imóvel está gravado com cláusulas de incomunicabilidade, impenhorabilidade e inalienabilidade, as quais somente serão extintas com a morte dos doadores e usufrutuários; que resta pendente de regularização a situação civil e patrimonial de Solange em decorrência da notícia de seu divórcio; que o título não atende aos requisitos da averbação premonitória.

Documentos vieram às fls. 04/19.

Em manifestação dirigida ao Oficial (fls. 06/08), a parte alega que adquiriu da declarante os imóveis das matrículas n. 41.970, 41.971 e 91.972; que a declarante e vendedora é ré na execução de título extrajudicial de autos n. 0037745-94.2012.8.26.0001, que tramita perante a 6ª Vara Cível do Foro Regional 1, Santana; que, para segurança do negócio celebrado entre as partes, a vendedora lavrou a escritura pública apresentada à serventia extrajudicial, por meio da qual ofertou em garantia da execução, dentre outros, o imóvel da matrícula n. 74.682 do 5º RI da Capital; que pretende a averbação da escritura declaratória de garantia nos termos do artigo 828 do CPC. Nestes autos, porém, não houve impugnação (fl. 20).

O Ministério Público opinou pela improcedência do pedido (fls.24/25).

É o relatório.

Fundamento e decido.

De início, vale ressaltar que o Oficial dispõe de autonomia no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (art. 28 da Lei n. 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.

Esta conclusão se reforça pelo disposto no item 117 do Cap. XX das Normas de Serviço:

“Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

Vale esclarecer, ainda, que o título, escritura pública de fls. 04/05, confirma que a parte requerente adquiriu da proprietária-declarante, Solange Lamarca, frações ideias dos imóveis das matrículas n. 41.970, 41.971 e 91.972, sendo que, como a vendedora é ré na execução de autos n. 0037745-94.2012.8.26.0001, ofereceu a fração ideal do imóvel da matrícula n. 74.682 do 5º RI, dentre outros, em garantia do débito exigido judicialmente, justamente para segurança da alienação feita à requerente, a qual envolve outros imóveis.

Como a pretensão é de averbação da escritura de oferta da garantia em questão, o procedimento foi corretamente distribuído como pedido de providências.

No mérito, o pedido de providências é procedente. Vejamos os motivos.

De acordo com o artigo 828 do CPC, o exequente poderá obter certidão de que a execução foi admitida pelo juízo, com identificação das partes e do valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis.

Não basta, ademais, que o exequente envie a certidão à serventia extrajudicial competente: é essencial a apresentação de requerimento com indicação expressa da matrícula na qual deve ser realizada a averbação, em virtude da responsabilidade advinda do artigo 828, § 5º, do CPC, que não pode ser transferida ao Oficial (Parecer 266/2010 Processo CG 2009//126792)[1]:

“(…) Em consequência, somente o exequente poderá levar a certidão à averbação e deverá fazê-lo pessoalmente ou por intermédio de seu advogado, comprovando a providência com exibição da procuração, no original, ou por cópia autêntica, sem reconhecimento de firma, pois o ato é decorrente da atuação processual do procurador e se insere na regra do art. 38 do Código de Processo Civil (…)”.

Assim, somente a parte credora ou seu advogado podem pretender a averbação premonitória: se a averbação for manifestamente indevida por recair sobre mais bens do que os necessários à satisfação do crédito, cabe responsabilização civil.

No caso concreto, porém, o que se vê é que a requerente, que não é parte na execução, pretende a averbação da escritura pública declaratória de garantia com finalidade premonitória, o que não ser admitido.

Não bastasse isso, vê-se que o título também não pode ser averbado já que não esclarece qual tipo de garantia real é instituído sobre o imóvel (fls. 04/05). O negócio documentado, portanto, carece de complementação para esclarecimento das vontades manifestadas, notadamente porque a garantia precisa ser aceita pela parte credora.

Ademais, como bem constatado pelo Oficial, o imóvel da matrícula n. 74.682 está gravado com cláusulas de incomunicabilidade, impenhorabilidade e inalienabilidade (Av. 04 fl. 13).

Na forma do artigo 1.420 do Código Civil, somente aquele que pode alienar poderá empenhar, hipotecar ou dar em anticrese, sendo que só os bens que se podem alienar poderão ser dados em penhor, anticrese ou hipoteca.

Por fim, verifica-se que, para acesso da escritura ao fólio real, também seria necessária averbação do divórcio da proprietária-declarante, observando-se a continuidade e a especialidade subjetiva.

De fato, o artigo 231 da Lei de Registros Públicos determina que, no preenchimento dos livros, sejam lançados “por ordem cronológica e em forma narrativa, os registros e averbações dos atos pertinentes ao imóvel matriculado”.

Garante-se, assim, concretude ao princípio da continuidade registral.

O artigo 237 do mesmo diploma também estipula que “não se fará registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro”.

No caso concreto, o Registro n. 3 da matrícula n. 74.682 do 5º RI da Capital indica que Solange recebeu sua fração ideal sobre o bem por doação, quando era casada pelo regime da comunhão parcial de bens com Carlos Luxo Martins (fl.12).

Entretanto, Solange se apresenta como divorciada na escritura levada a registro (fl.04), pelo que imprescindível a apresentação da certidão de casamento com averbação do divórcio para averbação prévia.

Neste contexto, JULGO PROCEDENTE o pedido, mantendo os óbices.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 26 de julho de 2023.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito

NOTA:

[1] Extrai-se do Parecer: “Outra questão a enfrentar é a que exige, para averbação da certidão, a identificação de quem a requer no Cartório de Registro de Imóveis. O § 4º do mencionado art. 615-A do Código de Processo Civil prevê dever indenizatório ao exequente que se vale abusivamente desse dispositivo. Em consequência, somente o exequente poderá levar a certidão à averbação e deverá fazê-lo pessoalmente ou por intermédio de seu advogado, comprovando a providência com exibição da procuração, no original, ou por cópia autêntica, sem reconhecimento de firma, pois o ato é decorrente da atuação processual do procurador e se insere na regra do art. 38 do Código de Processo Civil. E o mandato, com tal finalidade, não depende do reconhecimento de firma (Theotonio Negrão e José Roberto F. Gouvêa, em Comentários ao Código de Processo Civil e Legislação Processual em vigor, 42ª ed., 2010, n. 3a ao art. 38 do Código de Processo Civil). As certidões serão expedidas com simples identificação das partes, do valor da causa e de sua finalidade, únicos requisitos previstos no dispositivo legal e, portanto, aptos à averbação. Para identificação das partes é necessário que da certidão constem RG ou CPF, o que se revela suficiente. A certidão deve conter indicação de que foi expedida para fins do art. 615- A do CPC, ou que tem origem em determinação judicial, para que possa o registrador aferir sua fundamentação e legalidade. No momento da apresentação da certidão, haverá necessidade de requerimento expresso do interessado, com atendimento ao disposto nos itens 107 a 122.2 da Subseção III, Seção II, do Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça. O imóvel sobre o qual se pretende a constrição deve ser apontado pelo apresentante, que, se for o caso, poderá se valer do prévio pedido de busca para viabilizar a medida. A exigência não é requisito meramente formal. Destina-se a evitar que os abusos nas averbações sejam imputados ao Oficial, e não ao credor, a quem cabe identificar os bens a gravar e suportar as consequências de sua escolha (CPC, art. 615-A, § 4º). A alteração da Lei de Registros não se revela necessária, pois a averbação prevista no artigo ora em exame supera a omissão do art. 167, II, da Lei n. 6.015/73. Caso o bem imóvel sobre o qual venha a recair a averbação seja penhorado, prevalecerá a constrição, sem prejuízo da averbação ser preservada, para que seja possível aferir eventual fraude de execução”. (DJe de 28.07.2023 – SP)

Fonte: Diário da Justiça Eletrônico.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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