CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de inventário e partilha de bens – Sucessão testamentária – Cindibilidade do título – Excesso de quinhão na partilha com reposição pecuniária – Ausência de transmissão onerosa de bem imóvel – Inexistência de fato gerador do imposto de transmissão inter vivos – ITBI – Óbice afastado – Recurso provido.


  
 

Apelação Cível nº 1023035-86.2021.8.26.0114

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1023035-86.2021.8.26.0114
Comarca: CAMPINAS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1023035-86.2021.8.26.0114

Registro: 2022.0000408509

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1023035-86.2021.8.26.0114, da Comarca de Campinas, em que é apelante LAÍS BRAIDO, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE CAMPINAS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 23 de maio de 2022.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1023035-86.2021.8.26.0114

APELANTE: Laís Braido

APELADO: 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas

Interessado: KARINA ELISABETE MENEGHINI

VOTO Nº 38.686

Registro de Imóveis – Escritura pública de inventário e partilha de bens – Sucessão testamentária – Cindibilidade do título – Excesso de quinhão na partilha com reposição pecuniária – Ausência de transmissão onerosa de bem imóvel – Inexistência de fato gerador do imposto de transmissão inter vivos – ITBI – Óbice afastado – Recurso provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Laís Braido em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve a recusa ao registro da escritura pública de inventário e partilha de bens deixados por Laércio Fernando Mazon lavrada pelo 2º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de Mogi Mirim (fls. 260/263).

Afirma a apelante, em síntese, que recebeu, para cumprir disposição testamentária, na partilha dos bens deixados por seu pai, bens imóveis, cujo valor ficou aquém do seu quinhão de direito, o que levou seus irmãos, contemplados com quotas sociais que ultrapassaram os valores dos quinhões a que faziam jus, a lhe pagar o valor de R$ 580.567,00. O valor recebido representa apenas a parte que lhe cabia nas quotas sociais que foram atribuídas aos demais herdeiros.

Não houve, pois, transmissão ou cessão onerosa de bem imóvel a justificar a exigência de recolhimento do imposto de transmissão inter vivos – ITBI. Logo, o registro da escritura pública de inventário e partilha de bens na matrícula nº 149.384, do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, deve ser autorizado, observado que os imóveis objeto das matrículas nºs 149.441 e 149.343 foram conferidos a outrem na partilha de bens (fls. 285/294).

A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 335/339).

É o relatório.

O registro da escritura pública de inventário e partilha de bens foi negado pelo Oficial, que expediu nota de devolução com as seguintes exigências (fls. 78/79):

“O título foi qualificado negativamente pelo motivo a seguir exposto:

Os imóveis das matrículas nºs 149.441 e 149.343 acima mencionados, encontram-se registrados em nome de QUEIROZ GALVÃO PAULISTA 5 DESENVOLVIMENTO IMOBILIÁRIO LTDA.

O instrumento particular de promessa de compra e venda indicado na escritura pública apresentada da expectativa de aquisição do de cujus não foi apresentado, sendo necessário o prévio registro para que seja possível a partilha dos direitos objetivada, em atendimento ao princípio da continuidade registral estabelecida nos artigos nºs 195 e 237 da Lei Federal nº 6.015/73.

2. Deixou de apresentar guia de ITBI referente a diferença de quinhão paga pelos herdeiros à Lais Braido no valor de R$ 580.567,00 (art. 289 da Lei Federal nº 6.015/73).

Alternativamente, poderá ser apresentada certidão expedida pelo Município acerca de eventual isenção ou não incidência do imposto.”

De antemão, impende consignar que a pretensão de ingresso do título na tábua registral diz respeito tão somente ao imóvel objeto da matrícula nº 149.384, do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, o qual foi atribuído com exclusividade à herdeira Laís Braido, ora recorrente, na divisão do acervo patrimonial. Justificado, portanto, o seu desinteresse em voltar-se contra a exigência relativa aos imóveis objeto das matrículas nºs 149.441 e 149.343, do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas, conferidos à legatária na partilha de bens, de modo que afastada a alegação de dúvida prejudicada e autorizada a cindibilidade do título.

O princípio registral da parcelaridade ou cindibilidade do título significa a possibilidade de cisão do título apresentado a registro, de modo a aproveitar ou extrair determinados elementos aptos a ingressar de imediato no fólio real e desconsiderar outros cujo registro esteja obstado ou dependa de providências adicionais.

É sabido que, em algumas hipóteses, este Colendo Conselho Superior da Magistratura tem admitido a cindibilidade do título, o que vai ao encontro do atual modelo inscritivo, instituído pela Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, moldado em torno da figura da matrícula, passando, pois, o foco ao próprio imóvel e às mutações jurídicas por este suportadas.

Analisada a escritura pública de inventário e partilha de bens (fls. 09/28), verifica-se que o valor total dos bens inventariados (parte indisponível) atingiu o montante de R$ 9.508.335,00 e a cada um dos 05 herdeiros (filhos) devido o valor de R$ 1.901.667,00.

As quotas sociais no valor de R$ 8.187.235,00 ficaram para os filhos Thiago, Laercio, Raphael e André, recebendo cada um a quantidade correspondente a R$ 2.046.808,75, e os imóveis atribuídos à filha Laís totalizaram a quantia de R$ 1.321.100,00.

E assim foi feita a partilha para se ajustar aos termos do testamento.

O testador, além de dispor sobre a atribuição da herança e a outorga de legado, direcionou a partilha dos bens aos herdeiros (art. 2.014 do Código Civil), ditando que “as ações e quotas sociais das empresas ligadas direta ou indiretamente aos ramos imobiliário ou de transportes, ainda que por meio de “holding” sejam atribuídas igual e exclusivamente ao filhos Thiago Albjante Mazon, Laércio Fernando Mazon Filho, Raphael Albjejante Mazon e André Albejante Mazon, não integrando nenhum outro quinhão hereditário…” (fls. 106).

Ou seja, o testador deliberou que as quotas sociais integrariam os quinhões dos herdeiros Thiago, Laercio, Raphael e André, mas não o da herdeira Laís.

Excluídas as quotas sociais do quinhão da herdeira Laís, os demais bens do acervo hereditário não asseguraram a igualdade dos quinhões, daí o pagamento da quantia de R$ 580.567,00 feito pelos herdeiros Thiago, Laercio, Raphael e André à herdeira Laís.

E é justamente sobre esse valor que recaiu a exigência para o recolhimento do imposto de transmissão inter vivos – ITBI.

Mas não há como chancelar tal exigência registrária.

E isso porque a compensação pecuniária correspondeu ao valor das quotas sociais que deixaram de integrar o quinhão da herdeira para garantir-lhe o recebimento do que era, por lei, de seu direito, por força da sucessão hereditária.

E, como sabido, o imposto de transmissão inter vivos – ITBI pressupõe transmissão onerosa de bens imóveis (art. 156, II, da Constituição Federal), o que, à evidência, não se realizou no caso concreto, porquanto o que foi atribuído aos herdeiros acima de seus quinhões foram quotas sociais mediante reposição pecuniária.

Em suma, ausente o fato gerador do imposto de transmissão inter vivos – ITBI, não há como condicionar a inscrição do título ao recolhimento do tributo.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao apelo e julgo improcedente a dúvida, a fim de determinar o registro da escritura pública de inventário e partilha de bens na matrícula nº 149.384, do 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Campinas.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 04.10.2022 – SP)

Fonte: INR Publicação

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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