CSM/SP: Registro de Imóveis – Carta de adjudicação – Alienação forçada – Indisponibilidade dos bens da executada desprovida de força para obstaculizar a alienação forçada do bem imóvel e seu respectivo registro – Apelação a que se dá provimento, afastado o óbice registral e reformada a sentença.

Apelação nº 0004027-07.2019.8.26.0278

Espécie: APELAÇÃO

Número: 0004027-07.2019.8.26.0278

Comarca: ITAQUAQUECETUBA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 0004027-07.2019.8.26.0278

Registro: 2022.0000724000

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0004027-07.2019.8.26.0278, da Comarca de Itaquaquecetuba, em que são apelantes MARIA APARECIDA CAIRES LIMA e IRENE CAIRES LIMA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE ITAQUAQUECETUBA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 1º de setembro de 2022.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 0004027-07.2019.8.26.0278

APELANTES: Maria Aparecida Caires Lima e Irene Caires Lima

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Itaquaquecetuba

VOTO Nº 38.787

Registro de Imóveis – Carta de adjudicação – Alienação forçada – Indisponibilidade dos bens da executada desprovida de força para obstaculizar a alienação forçada do bem imóvel e seu respectivo registro – Apelação a que se dá provimento, afastado o óbice registral e reformada a sentença.

Trata-se de apelação interposta por Maria Aparecida Caires Lima Irene Caires Lima contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca de Itaquaquecetuba, que manteve a recusa do registro da carta de adjudicação extraída dos autos da ação de rescisão contratual cumulada com perdas e danos em que figuraram como partes Maria Aparecida Caires Lima e Irene Caires Lima, autoras, e Imobiliária Santa Tereza S.A., ré, em fase de cumprimento da sentença (processo n.º 0001825-87.2001.8.26.0278/01), tendo por objeto fração ideal do terreno matriculado sob n.º 6.865, da referida serventia extrajudicial, vinculada à futura unidade autônoma constituída pelo apartamento n.º 32, do bloco n.º 18, do empreendimento denominado Condomínio Solar (fls. 78/80).

Alegaram as recorrentes, em síntese, que o óbice ao ingresso do título no fólio real não se sustenta, pois a indisponibilidade decretada contra a executada (averbação n.º 35, na matrícula n.º 6.865) não impede a alienação forçada do bem. Por isso, pugnaram pelo registro da carta de adjudicação (fls. 84/96).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 141/143).

É o relatório.

Apresentada a registro a carta de adjudicação expedida nos autos do processo n.º 0001825-87.2001.8.26.0278, que tramitou perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Itaquaquecetuba, figurando como partes Maria Aparecida Caires Lima e Irene Caires Lima (exequentes) e Imobiliária Santa Tereza S.A. (executada), o Oficial de Registro de Imóveis desqualificou o título, emitindo nota devolutiva com o seguinte teor (fls. 11/12):

“No tocante ao ITBI, a guia foi apresentada nesta ocasião e a questão restou superada.

Contudo, quanto a indisponibilidade, entendemos que a exigência deve prevalecer. Isto porque, embora a ação verse sobre rescisão contratual com perdas e danos, a transmissão, na verdade, decorre de alienação voluntária celebrada entre a IMOBILIÁRIA SANTA TEREZA S/A (cujos bens estão indisponíveis) e as autoras, por força do instrumento de compromisso de venda e compra, datado de 17/12/1996. No presente caso, como se vê, o negócio inicial previa a transmissão voluntária do bem entre as partes, não sendo possível afastar a indisponibilidade neste caso.”

Sobre as ordens de indisponibilidade, o item 413, do Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, dispõe:

“413. As indisponibilidades averbadas nos termos do Provimento CG. 13/2012 e CNJ nº 39/2014 e na forma do § 1º, do art. 53, da Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991, não impedem a inscrição de constrições judiciais, assim como não impedem o registro da alienação judicial do imóvel desde que a alienação seja oriunda do juízo que determinou a indisponibilidade, ou a que distribuído o inquérito civil público e a posterior ação desse decorrente, ou que consignado no título judicial a prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução.”

Referido dispositivo determina que as indisponibilidades averbadas só não impedem a inscrição de constrições judiciais e o registro da alienação judicial do bem, desde que a alienação seja oriunda do juízo que determinou a indisponibilidade ou se foi consignado no título judicial a prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução.

No caso, ao tempo da apresentação do título a registro, a única ordem de indisponibilidade de bens averbada na matrícula nº 6.865 (averbação nº 35) era a ordenada pelo Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública de São Bernardo do Campo, no processo n.º 1506310462016 (fls. 156/197).

A adjudicação, por sua vez, ocorreu no processo n.º 0001825-87.2001.8.26.0278, que tramitou perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Itaquaquecetuba (fls. 70/73).

E não há dúvidas de que se tratou de alienação forçada, uma vez que, na fase de cumprimento da sentença que decretou o desfazimento do contrato e impôs a restituição de alguns valores, após a avaliação do bem, o pedido de adjudicação formulado pelas exequentes foi deferido, com a consequente lavratura do auto e expedição da carta (fls. 70/73 e 230/233).

O fato de o bem imóvel adjudicado ser o mesmo compromissado à venda e cujo fim do vínculo contratual foi determinado judicialmente não confere voluntariedade à alienação concretizada.

A adjudicação consiste em “ato executivo de transferência forçada de bens, razão pela qual não fica impedida pela indisponibilidade cautelar, que se refere à disposição voluntária do bem.” (REsp 1493067/RJ, DJe 24/03/2017).

No mesmo sentido:

“REGISTRO DE IMÓVEIS Prévia anotação de indisponibilidade de bem imóvel Registro de carta de adjudicação Possibilidade Alienação forçada Precedentes do Conselho Superior da Magistratura Recurso provido.” (CSMSP Apelação Cível n.º 0006122-61.2016.8.26.0198, Relator Desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, j. 20/07/2017)

E a prescindibilidade de previsão expressa no título da prevalência da alienação forçada em relação à restrição patrimonial oriunda de outro Juízo já foi reconhecida por este Egrégio Conselho Superior da Magistratura:

“REGISTRO DE IMÓVEIS Dúvida Carta de Adjudicação Ordem de indisponibilidade emanada de Juízo diverso daquele em que arrematado o imóvel Provimento 39/14 do CNJ, que, em seu artigo 16, permite o registro, ainda que faça alusão à menção, na carta de arrematação, de “prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo” Prescindibilidade de previsão expressa Prevalência ínsita à própria expedição da carta de arrematação Entendimento pacífico e reiterado deste Conselho Superior da Magistratura Precedentes das Câmaras de Direito Privado e de Direito Público deste E. TJSP, bem como do C. STJ – Dúvida improcedente Recurso provido.” (CSMSP Apelação Cível n.º 1011373-65.2016.8.26.0320, Relator Desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, j. 05/12/2017)

Em suma, o óbice deve ser afastado, para que se proceda ao registro stricto sensu da carta de adjudicação.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação para reformar a r. sentença e afastar o óbice, deferindo o registro stricto sensu pretendido.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator. (DJe de 26.10.2022 – SP)

Fonte:  INR Publicações

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CSM/SP: Registro de imóveis – Dúvida julgada procedente – Formal de partilha – Suposta ofensa ao princípio da especialidade objetiva não configurada – Imóvel que sofreu pequeno desfalque – Partilha do todo remanescente – Possibilidade de verificação da disponibilidade quantitativa e qualitativa – Óbice afastado – Apelação provida.

Apelação nº 1000378-61.2022.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1000378-61.2022.8.26.0100

Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1000378-61.2022.8.26.0100

Registro: 2022.0000723997

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000378-61.2022.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante MARIA SUELI CONTI MISITI, é apelado 8º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 1º de setembro de 2022.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1000378-61.2022.8.26.0100

APELANTE: Maria Sueli Conti Misiti

APELADO: 8º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO Nº 38.781

Registro de imóveis – Dúvida julgada procedente – Formal de partilha – Suposta ofensa ao princípio da especialidade objetiva não configurada – Imóvel que sofreu pequeno desfalque – Partilha do todo remanescente – Possibilidade de verificação da disponibilidade quantitativa e qualitativa – Óbice afastado – Apelação provida.

Trata-se de apelação interposta por Maria Sueli Conti Misiti contra a r. sentença que julgou procedente a dúvida suscitada, em razão da recusa do registro de formal de partilha e respectivo aditamento, expedidos nos autos do Processo nº 2000005-20.1979.8.26.0003 da 1ª Vara da Família e Sucessões do Foro Regional III Jabaquara, Comarca da Capital, referentes à partilha do remanescente do imóvel objeto da transcrição nº 105.768 do 8º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo/SP (fls. 236/240).

Alega a apelante, em síntese, que o formal de partilha foi aditado e que, diante da exatidão das medidas constantes da transcrição nº 105.768 e da área destacada, a área remanescente está devidamente descrita, totalizando 276,80m². Aduz que não há risco de sobreposição de áreas, sendo desnecessária a retificação exigida pelo Oficial de Registro.

Afirma que, na matrícula aberta para a área destacada anteriormente, as medidas são exatas, com perfeita identificação das metragens perimetrais e confrontações do imóvel. Sustenta que, por se tratar de imóvel urbano, com averbação de construção, localização, nome do logradouro e numeração da edificação, não se faz necessário constar a informação do lado da quadra em que se encontra o imóvel e a distância métrica até a esquina, como consignado na sentença recorrida. Por fim, ressalta que a planta do setor técnico da Prefeitura, em que apurada a divergência de metragem apontada como óbice ao registro pelo registrador, não pode prevalecer em detrimento das medidas constantes do registro imobiliário (fls. 246/254).

A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 275/277).

É o relatório.

O registro do formal de partilha foi negado pelo Oficial, que expediu nota de devolução nos seguintes termos (fls. 201/202):

“Conforme averbação nº 2 da transcrição acima, foi transmitida parte do imóvel com a área de 123,20m² e matriculada sob nº 5.483, desta Serventia. Diante disso, se faz necessária a apuração do remanescente do imóvel, por procedimento próprio previsto no artigo 213 da Lei de Registros Públicos (…), possibilitando, assim, a abertura de matrícula do terreno, cujo ato impõe uma descrição tabular capaz de afastar os riscos de sobreposição, total ou parcial, e que contenha lastro geográfico possibilitador da efetiva identificação do bem (exigência dos artigos 176, I, II, 3, “b” e 225 da Lei de Registros Públicos nº 6.015/73).”

Desde logo, importa lembrar que a origem judicial do título não o torna imune à qualificação registral, que segue as regras vigentes ao tempo em que a inscrição (lato sensu) foi rogada (princípio tempus regit actum).

A despeito dos bem lançados fundamentos, a r. sentença recorrida tem de ser reformada para que, afastado o óbice apontado pelo Oficial de Registro de Imóveis, seja deferido o registro stricto sensu do formal de partilha, como rogado.

Para o direito registrário, não basta que o imóvel objeto de inscrição seja determinado; é preciso que seja especializado, ou seja, que seja descrito:

“Primeiramente, observe-se que especializar, para o sistema registral, não é o mesmo que determinar o ente individuado (trate-se aqui de pessoas, fatos ou coisas). Com efeito, é de todo possível determinar sem especializar: pode dizer-se que um dado imóvel se designe ‘Fazenda Carlos de Laet’; outro, ‘Chácara Imperador Felipe II’; e esses imóveis poderão estar determinados para o registro, suposto que sociologicamente se reconheçam de modo notório (com notoriedade quoad se). E, no entanto, podem não ter, no registro, medidas de contorno, indicação de superfície, lugar ubi, parâmetros referenciais, figura, etc. Ou seja, estão determinados, mas não estão especializados.

Determinar é identificar; já especializar é individualizar de maneira característica, visando a distinguir, demarcar, estremar o ente individual […].

Todavia, se impossível é definir o ente individual, já o mesmo não se passa com sua descrição. E descrevê-lo é exatamente indicar algo singular dentro de sua especialidade, enunciar aquilo que o torna indivíduo no âmbito da espécie, ou seja, aquilo que lhe dá uma natureza concreta indivídua” (Ricardo Dip, Registro de Imóveis (princípios), tomo II, Descalvado: Primvs, 2018, p. 9-10, n. 240, grifos do autor).

O meio técnico de fazer essa descrição é o apontado pelas normas vigentes, em especial pela Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, art. 176, § 1º, II, 3, e §§ 3º a 5º e 13, e 225. Confira-se, em particular:

“Art. 176. […]

§ 1º A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas:

I – cada imóvel terá matrícula própria, que será aberta por ocasião do primeiro registro a ser feito na vigência desta Lei;

II – são requisitos da matrícula:

[…]

3) a identificação do imóvel, que será feita com indicação:

[…]

b – se urbano, de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral, se houver.”

Isso vem explicitado pelas Normas dos Serviços Extrajudiciais, Capítulo XX, itens 10.1, 10.1.1, 10.3, 54.3, 54.5, 56 c, 57 a 60, 63 a 67, 69 e 70. Dentre essas orientações, vale destacar:

“57. A identificação e caracterização do imóvel compreendem:

I se urbano:

a) a localização e nome do logradouro para o qual faz frente;

b) o número, quando se tratar de prédio; ou, sendo terreno, se fica do lado par ou ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima; ou número do lote e da quadra, se houver;

c) a designação cadastral, se houver.

[…]

IV as confrontações, inadmitidas expressões genéricas, tais como

“com quem de direito”, ou “com sucessores” de determinadas pessoas, que devem ser excluídas, se existentes no registro de origem, indicando-se preferencialmente os imóveis confinantes e seus respectivos registros.

V a área do imóvel.”

No caso concreto, mister anotar que, na transcrição nº 105.768 do 8º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, o imóvel identificado como lote 48 da quadra 8-B da Vila Monte Alegre, está assim descrito: “Um terreno medindo 10,00m de frente para a Rua Mauricio de Lacerda, por 40,00m da frente aos fundos de ambos os lados, tendo nos fundos a largura da frente, encerrando a área total de 400,00m², confinando de ambos os lados e fundos com Anníbal de Barros Fagundes e outros ou sucessores.” E segundo as AV-1 e AV-2, ficou constando, respectivamente, que “no terreno objeto da presente transcrição, o adquirente construiu um prédio residencial na frente e mais um nos fundos, que recebeu o nº 656, da Rua Mauricio de Lacerda” e que foi “transferida parte com a área de 123,20m², através da matrícula 5.483, de 23/06/1976, desta Serventia” (fls. 185/187).

Para o registro da referida alienação de parte da área objeto da transcrição nº 105.768 foi aberta a matrícula nº 5.483 junto à referida serventia predial, com descrição algo precária, é verdade, mas, ainda assim, com menção ao logradouro em que localizado o imóvel, número e designação cadastral, bem como às confrontações e ao cálculo de sua área: “Uma casa e seu respectivo terreno, situados à Rua Mauricio de Lacerda nº 656, medindo o terreno, que é constituído de (…) parte do lote 48 da quadra 8-B, da Vila Monte Alegre, no 42º Subdistrito-Jabaquara, medindo o terreno 8,00ms. de frente, por 15,40ms., mais ou menos da frente aos fundos em ambos os lados, tendo nos fundos a mesma largura da frente, encerrando a área total aproximada de 123,20ms2., confinando de um lado com Annibal de Barros Fagundes e outros, e do outro lado e fundos com os proprietários. Inscrito no cadastro dos contribuintes da Prefeitura Municipal sob nº 047.163.0060” (fls. 189/196).

Não se contesta que, considerado o atual estado da técnica e as exigências atuais da doutrina jurídica e do tráfego imobiliário, a descrição do imóvel na matrícula aberta deveria ser melhorada.

Entretanto, fato é que a partilha pode ser registrada, pois incidiu sobre todo o remanescente da área da transcrição nº 105.768, que foi tratado como corpo certo, sem possibilidade de erro quanto ao imóvel.

Veja-se que a área total objeto da transcrição nº 105.768 perfazia 400m², o que ensejou a abertura da matrícula nº 5.483 corresponde a uma área de, como consta do assento, aproximadamente 123,20m². No título apresentado a registro, o imóvel partilhado tem área de 276,80m² (fls. 227), ou seja, corresponde exatamente à área remanescente da transcrição nº 105.768 que, cumpre ressaltar, trazia perfeita identificação do imóvel.

Em outras palavras, a expressão “mais ou menos” utilizada para referência da metragem da frente aos fundos do imóvel objeto da matrícula nº 5.483 não é suficiente para impedir o ingresso do título que tem por objeto a área total remanescente na transcrição nº 105.768. Nem mesmo a falta de indicação do lado par ou ímpar do logradouro em que localizado o imóvel, bem como da distância métrica até a edificação ou esquina mais próxima é suficiente para a recusa do registro postulado, pois na matrícula aberta para a área destacada há menção ao nome do logradouro e número da edificação, assim como de sua designação cadastral, o que o torna perfeitamente identificável.

Ademais, a divergência dos dados cadastrais municipais relativos à testada do imóvel não afasta a presunção de veracidade do conteúdo do assento imobiliário.

Em suma, a despeito das imprecisões da descrição da área destacada, fato é que o desmembramento havido, sendo pequeno e único, ainda permite concluir que subsiste disponibilidade quantitativa e qualitativa na transcrição.

A bem ver, a solução contrária, isto é, o indeferimento da inscrição, nessas circunstâncias específicas, não só negaria eficácia à transcrição (que é válida e produz efeitos até que se desfaça, nos termos da Lei nº 6.015/1973, art. 252), como dificultaria, ainda mais, o seu aperfeiçoamento (neste caso, por negar que os herdeiros obtenham a disponibilidade de seu direito). Logo, deve-se afastar a exigência e proceder ao pretendido registro stricto sensu de partilha, relativo ao imóvel objeto da transcrição nº 105.768, como rogado.

Cabe salientar que a descrição do imóvel, tal como consta da transcrição (e, agora, do formal de partilha), não foi em nada inovada, o que poderá ser feito no futuro, mediante apuração de remanescente, sem prejuízo atual para a segurança jurídica.

Nesse sentido, já ficou decidido que:

“REGISTRO DE IMÓVEIS Dúvida Sucessão causa mortis Título notarial Escritura pública de inventário e partilha Óbices relativos à especialidade objetiva de dois imóveis distintos Imóvel que sofreu pequeno desfalque, sem que, entretanto, se tenha feito impossível a verificação de disponibilidade quantitativa e qualitativa Inexistência de inovação na descrição do imóvel desfalcado Prédio tratado como corpo certo, o que permite o registro da partilha Outro imóvel que, entretanto, tem área superior a cem hectares e tem de receber descrição por coordenadas georreferenciadas Exigência de georreferenciamento que também se aplica às transmissões a causa de morte Precedente Exigência mantida quanto a esse segundo imóvel Apelação a que se dá parcial provimento” (TJSP; Apelação Cível nº 1000032-10.2020.8.26.0059; Rel. DES. RICARDO ANAFE (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro de Bananal – Vara Única; Data do Julgamento: 17/09/2021; Data de Registro: 04/10/2021).

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao apelo para, afastado o óbice registral, julgar improcedente a dúvida e permitir o registro do título.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator. (DJe de 26.10.2022 – SP)

Fonte:  INR Publicações

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SM/SP: Registro de imóveis – Dúvida – Título judicial – Arrematação em execução forçada – Fração ideal – Georreferenciamento que já era obrigatório para o todo do imóvel – Registro da transmissão coativa parcial que, todavia, não depende da inserção de descrição georreferenciada – Inteligência dos §§ 3º-5º do artigo 176 da lei nº 6.015/1973, do inciso II do § 2º do decreto nº 4.449/2002, e do item 10.1 do cap. XX do tomo II das NSCGJ – Apelação a que se dá provimento para reformar a r. sentença e afastar o óbice.

Apelação nº 1001285-94.2019.8.26.0438

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1001285-94.2019.8.26.0438

Comarca: PENÁPOLIS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1001285-94.2019.8.26.0438

Registro: 2022.0000712591

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001285-94.2019.8.26.0438, da Comarca de Penápolis, em que é apelante DOMINGOS CLEMENTE GUERREIRO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE PENÁPOLIS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento à apelação para, afastado o óbice, deferir a lavratura do registro stricto sensu, como rogado, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 25 de agosto de 2022.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1001285-94.2019.8.26.0438

APELANTE: Domingos Clemente Guerreiro

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Penápolis

VOTO Nº 38.776

Registro de imóveis – Dúvida – Título judicial – Arrematação em execução forçada – Fração ideal – Georreferenciamento que já era obrigatório para o todo do imóvel – Registro da transmissão coativa parcial que, todavia, não depende da inserção de descrição georreferenciada – Inteligência dos §§ 3º-5º do artigo 176 da lei nº 6.015/1973, do inciso II do § 2º do decreto nº 4.449/2002, e do item 10.1 do cap. XX do tomo II das NSCGJ – Apelação a que se dá provimento para reformar a r. sentença e afastar o óbice.

Cuida-se de apelação, impropriamente chamada de recurso inominado (fls. 159/162) interposta por Domingos Clemente Guerreiro contra r. sentença (fls. 156/157) pela qual o MM. Juiz de Direito da Vara do Juizado Especial Cível e Criminal de Penápolis, Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos dessa Comarca, manteve óbice ao registro stricto sensu de arrematação, em execução forçada, de fração ideal (i. e., cinco por cento fls. 19/21, 29, 43 e 63/67) do imóvel da matrícula nº 45.110, do dito cartório (fls. 04/07; protocolo nº 185.853 fls. 08).

A r. sentença (fls. 156/157) decidiu que o registro stricto sensu, se feito como rogado, não ofenderia o princípio do trato consecutivo (continuidade), porque na execução haveria sido desconsiderada a personalidade da pessoa jurídica devedora, de modo que teria sido atingido, também, o patrimônio dos donos do imóvel arrematado (note-se, na r. decisão, um pequeno lapso neste ponto, ao inverter-se a posição da sociedade e das pessoas físicas no processo e na matrícula); além disso, não se haveria de exigir o trânsito em julgado da arrematação, já que esse ato processual é perfeito, acabado e irretratável tanto que assinado o auto, ainda que se julguem procedentes os embargos do executado ou ação autônoma destinada a desfazê-la (Cód. de Proc. Civil, art. 903, § 4º). No entanto, concluiu o MM. Juízo a quo que seria necessário fazer vir a descrição georreferenciada do imóvel (pois, tratando-se de área superior a cem hectares, o prazo a tanto já se haveria escoado) e que, sem isso, a dúvida seria mesmo procedente.

O interessado recorreu desse último óbice (fls. 159/162), sustentando que a área objeto da arrematação não excede de 5% do total e, dessa sorte, lhe seria impossível providenciar o georreferenciamento do imóvel todo, seja pelo dispêndio financeiro, seja pela resistência do proprietário; além disso, a providência do georreferenciamento não seria compulsória em caso de transferência coativa, como é o caso da arrematação em execução forçada.

A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo não provimento da apelação (fls. 177/180 e 215).

Inicialmente levados à Corregedoria Geral da Justiça, os autos foram redistribuídos para este C. Conselho Superior da Magistratura (fls. 182/183 e 184).

É o relatório.

De início, saliente-se que se cuida (como já foi ressaltado) de dúvida e de recurso de apelação, uma vez que a inscrição colimada é registro em sentido estrito (artigos 198, 203, II, e 296, da Lei nº 6.015, 31 de dezembro de 1973). De qualquer forma, o erro de nominação não prejudica em nada o processamento do apelo, pois foi respeitado o prazo legal para interposição, de resto idêntico para essa espécie e para o recurso inominado (artigo 202 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, artigo 1003, § 5º, do Código de Processo Civil, e artigo 246 do Código Judiciário de São Paulo).

Ainda em proêmio, cabe ressaltar que se controverte, aqui, sobre título de origem judicial o qual também se submete à qualificação registral, conquanto essa esteja limitada a recair, em tal caso, sobre (a) a competência judiciária, (b) a congruência entre o título formal e o material apresentados ao ofício de registro, (c) os obstáculos registrais e (d) as formalidades documentárias (cf. Ricardo Dip, Registros sobre Registros, n. 455, e item 117 do Capítulo XX do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça – NSCGJ). Está pacificado, inclusive, que a qualificação negativa não caracteriza desobediência nem descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n. 413-6/7; Apel. Cív. n. 0003968-52.2014.8.26.0453; Apel. Cív. n. 0005176-34.2019.8.26.0344; e Apel. Cív. n. 1001015-36.2019.8.26.0223).

Quando ao fundo da matéria, o problema está posto porque o imóvel rural em questão (cf. cópia da matrícula nº 45.110, posta a fls. 04/07) conta mais de 270 hectares (fls. 04) e, portanto, a sua descrição já devia estar dada segundo o padrão ditado pelos §§ 3º-5º do artigo 176 da Lei nº 6.015/1973 e pelo inciso V do artigo 10 do Decreto nº 4.449/2002. Isso, porém, não se fez, e a especialidade objetiva do assento ainda não atende aos requisitos do georreferenciamento brasileiro, e foi também por essa razão que o Oficial adiou a inscrição e suscitou a dúvida (fls. 15).

Em que pese ao zelo mostrado durante a qualificação registral, é certo, contudo, que a arrematação abrangeu somente uma fração ideal do imóvel (fls. 33, 35 e 43/51), espécie à qual, como explicita o Decreto nº 4.449/2002, art. 10, § 2º, não se aplica a restrição à alienação.

A razão por trás da ressalva trazida pelo § 2º do art. 10 do Decreto nº 4.449/2002 é clara.

Conquanto seja muito ampla a dicção do § 4º do art. 176 da Lei nº 6.015/1973 (verbis “em qualquer situação de transferência de imóvel rural”), está patente que lex dixit magis quam voluit, a lei disse mais do que quis. O fato da matrícula ainda não trazer descrição georreferenciada não quer dizer, de nenhuma forma, que ela tenha perdido a sua eficácia: não existe, portanto, nenhuma incerteza sobre a existência e os característicos do prédio.

Assim, considerando-se, de um lado, que houve alienação coativa de mera fração ideal, e, de outro, que o registro existente é eficaz, conclui-se que impor ao adquirente o ônus de providenciar a retificação do todo, enquanto ele próprio não se dispuser a fazer um desmembramento, impedindo-se o registro stricto sensu, é praticamente tornar o imóvel inalienável mediante execução judicial, com prejuízo para credores e para a própria dignidade da Justiça e a interpretação da lei não pode conduzir a conclusões absurdas.

O item 10.1 do Cap. XX do Tomo II das NSCGJ seguindo, como é natural, a letra da Lei de Registros Públicos , realmente parece impor o georreferenciamento na situação analisada.

Todavia, aqui também vale o que se disse acerca do próprio texto legal: assim como fazem os §§ 3º-5º do art. 176 da Lei nº 6.015/1973, o dito item 10.1 traz apenas a disposição geral sobre o tema, o que não exclui, em interpretação lógica, a conclusão que aqui se apresenta, ou seja, a de que a falta de georreferenciamento, mesmo depois de escoado o prazo legal, não impede o registro em sentido estrito da alienação coativa de uma fração ideal, com o que se reafirma a eficácia do assento e se impede uma situação de clandestinidade, sem, entretanto, afastar-se a necessidade de melhor descrição tabular, conforme o padrão brasileiro de georreferenciamento, se e quando houver alienação voluntária ou desmembramento da área arrematada.

Por outras palavras, a r. sentença tem de ser reformada para que, afastado o óbice ligado ao georreferenciamento, seja, excepcionalmente, lavrada a inscrição rogada (alienação coativa, isto é, arrematação de fração ideal de um imóvel não georreferenciado).

Nesse sentido já decidiu este C. Conselho Superior da Magistratura:

“Registro de Imóveis Dúvida Título judicial Arrematação Execução forçada Fração ideal Falta de georreferenciamento, que já é obrigatório para imóvel em questão Alienação coativa parcial para cujo registro não se pode exigir, entretanto, a inserção das coordenadas georreferenciadas Inteligência dos §§ 3º-5º da Lei n. 6.015/1973, do inciso II do § 2º do Decreto n. 4.449/2002, e do item 10.1 do Cap. XX do Tomo II das NSCGJ Apelação a que se dá provimento para reformar a r. sentença e afastar o óbice.” (Apel. Cív. 1002000-92.2021.8.26.0624, Rel. Des. Ricardo Mair Anafe, j. 02.12.2021).

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação para, afastado o óbice, deferir a lavratura do registro stricto sensu, como rogado.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator. (DJe de 26.10.2022 – SP)

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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