CSM/SP: Registro de imóveis – Escritura pública de venda e compra – Mulher que adquiriu a parte ideal do imóvel pertencente ao seu marido – Bem anteriormente havido em condomínio pelos cônjuges, casados sob o regime da separação obrigatória de bens – Não incidência, no caso concreto, da presunção de comunhão decorrente da súmula n.º 377 do E. Supremo Tribunal Federal – Possibilidade de venda e compra entre cônjuges quanto aos bens particulares (art. 499 do Código Civil) – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida e autorizar o registro do título.


  
 

Apelação nº 1001990-49.2021.8.26.0462

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1001990-49.2021.8.26.0462

Comarca: POÁ

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1001990-49.2021.8.26.0462

Registro: 2022.0000723999

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001990-49.2021.8.26.0462, da Comarca de Poá, em que é apelante ZILDA DE ALMEIDA RODRIGUES FERREIRA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE POÁ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 1º de setembro de 2022.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1001990-49.2021.8.26.0462

APELANTE: Zilda de Almeida Rodrigues Ferreira

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Poá

VOTO Nº 38.784

Registro de imóveis – Escritura pública de venda e compra – Mulher que adquiriu a parte ideal do imóvel pertencente ao seu marido – Bem anteriormente havido em condomínio pelos cônjuges, casados sob o regime da separação obrigatória de bens – Não incidência, no caso concreto, da presunção de comunhão decorrente da súmula n.º 377 do E. Supremo Tribunal Federal – Possibilidade de venda e compra entre cônjuges quanto aos bens particulares (art. 499 do Código Civil) – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida e autorizar o registro do título.

Trata-se de apelação interposta por Zilda de Almeida Rodrigues Ferreira contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Poá, que manteve a recusa ao registro da escritura de venda e compra celebrada por Firmino Rodrigues Ferreira (vendedor) e Zilda de Almeida Rodrigues Ferreira (compradora), marido e mulher, de parte ideal (50%) do bem imóvel matriculado sob n.º 61.334 da referida serventia extrajudicial.

Alega a recorrente, em síntese, que adquiriu o bem imóvel de forma onerosa, juntamente com seu marido, de modo que não há qualquer impedimento à venda concretizada (a venda da parte ideal pertencente ao marido à mulher), porquanto, diversamente do sustentado pelo Registrador, a aquisição imobiliária se deu em regime de condomínio, não de mancomunhão.

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 83/87).

É o relatório.

Apresentado o título – escritura de venda e compra celebrada por Firmino Rodrigues Ferreira (vendedor) e Zilda de Almeida Rodrigues Ferreira (compradora), marido e mulher, de parte ideal (50%) do bem imóvel matriculado sob n.º 61.334, adquirido onerosamente pelos cônjuges casados pelo regime da separação obrigatória de bens, recebendo qualificação negativa, o Registrador consignou as seguintes razões (nota de devolução – Protocolo n.º 221292 acostada às fls. 23/24):

“Conforme dispõe a Súmula 377 do STF, ‘no regime da separação legal de bens, comunicam-se os bens adquiridos na constância do casamento’, e, conforme dispõe o art. 499 do CCB ‘É lícita a compra e venda entre cônjuges, com relação a bens excluídos da comunhão’.

Diante do exposto, a escritura em apreço, a qual FIRMINO RODRIGUES FERREIRA transmite sua metade ideal no referido imóvel à cônjuge ZILDA DE ALMEIDA RODRIGUES FERREIRA, não é passível de registro, uma vez que, nos termos da referida Súmula, o bem adquirido na constância do casamento fez parte da comunhão”.

Inconformada com a exigência, a apresentante pugnou pela suscitação da dúvida.

E razão deve ser dada à apelante.

Analisada a certidão da matrícula imobiliária n.º 61.334, acostada a fls. 25/27, importa transcrever o seguinte registro:

“R.3/61.334: – Pela mesma escritura mencionada na AV. 2, as proprietárias CALIL EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, e GEORGE’S EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, já qualificadas, TRANSMITIRAM por venda feita a ZILDA DE ALMEIDA RODRIGUES FERREIRA, comerciante, e seu marido FIRMINO RODRIGUES FERREIRA, empresário, brasileiros, casados sob o regime da separação obrigatória de bens, na vigência da Lei n.º 6.515/77, nos termos do artigo 258, Parágrafo Único, inciso I, do Código Civil Brasileiro, RG nºs 13.876.000-7-SSP/SP e 20.526.488-8-SSP/SP, CPF/MF nºs 978.477.126-49 e 064.855.318-31, residentes e domiciliados neste Município de Poá-SP, na Rua Deputado Castro de Carvalho, nº 135, apto. 141, Vila Júlia, o imóvel objeto desta matrícula, pelo preço de R$117.201,68. Valor Venal 2006: R$60.601,67. O título objetivado foi prenotado sob nº 131.341, em 26/05/2006″.

A partir do registro imobiliário transcrito, verificase, de forma clara, que Firmino Rodrigues Ferreira e Zilda de Almeida Rodrigues Ferreira, casados sob o regime da separação obrigatória de bens, decidiram, juntos, comprar o referido imóvel.

Logo, há condomínio entre o casal que adquiriu o bem imóvel, constando seus nomes como adquirentes, presumindo-se que a cada um pertence a fração de 50% do imóvel adquirido.

E aplicadas as disposições do instituto do condomínio, cada um dos cônjuges pode alienar ou gravar seus direitos, observando a preferência do outro, ou requerer a extinção por ação de divisão ou alienação judicial (art. 1.314 do Código Civil).

A venda concretizada – marido vendeu à mulher a sua parte ideal correspondente a 50% do imóvel – só reafirma a condição de coproprietários dos cônjuges.

Reconhecido, então, que o bem foi adquirido em condomínio, a despeito do regime de casamento vigente – separação obrigatória de bens – e da Súmula nº 377, do E. Supremo Tribunal Federal (“No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”), cuja presunção não é absoluta e cede à situação analisada, quanto a este bem, não há comunhão e, por conseguinte, a parte ideal adquirida por cada um dos cônjuges se enquadra como um bem particular.

Como bem particular, não há impedimento legal à compra e venda entre cônjuges (art. 499 do Código Civil).

O art. 499, do Código Civil, dispõe:

“Art. 499. É lícita a compra e venda entre cônjuges, com relação aos bens excluídos da comunhão”.

A venda de bens particulares entre os cônjuges é permitida, na medida em que sobre estes o consorte não tem direitos meatórios, o que, como visto, é justamente a hipótese em testilha, de modo que o óbice registrário deve ser afastado.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao apelo, a fim de julgar improcedente a dúvida e autorizar o registro da escritura de venda e compra.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator. (DJe de 04.11.2022 – SP)

Fonte:  INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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