CSM/SP: Registro de imóveis – Escritura pública de doação – Título formalmente hígido, ainda que deficitária a indicação do grau de parentesco entre doadores e donatários – Inexistência de assinatura a rogo – Óbices afastados – Apelação a que se dá provimento para permitir o registro pretendido.


  
 

Apelação nº 1000654-34.2021.8.26.0648

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1000654-34.2021.8.26.0648

Comarca: URUPÊS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação nº 1000654-34.2021.8.26.0648

Registro: 2023.0000320661

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1000654-34.2021.8.26.0648, da Comarca de Urupês, em que é apelante VANDER CRISTIANO LISBOA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE URUPÊS.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL) E WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO).

São Paulo, 13 de abril de 2023.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1000654-34.2021.8.26.0648

APELANTE: Vander Cristiano Lisboa

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Urupês

VOTO Nº 38.957

Registro de imóveis – Escritura pública de doação – Título formalmente hígido, ainda que deficitária a indicação do grau de parentesco entre doadores e donatários – Inexistência de assinatura a rogo – Óbices afastados – Apelação a que se dá provimento para permitir o registro pretendido.

Trata-se de apelação interposta por Vander Cristiano Lisboa contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Urupês, que manteve a recusa do registro da escritura pública de doação referente ao imóvel objeto da matrícula nº 3.999 da referida serventia extrajudicial (fls. 110/112).

Alega o recorrente, em síntese, que a única exigência mantida para obstar o ingresso da escritura pública de doação no álbum imobiliário não se justifica frente aos documentos apresentados que comprovaram o grau de parentesco entre os doadores e os donatários. Por isso, afastado o óbice remanescente, o registro do título deve ser autorizado (fls. 128/130).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 144/147).

É o relatório.

Apresentada a registro a escritura pública de doação, o Oficial de Registro de Imóveis desqualificou o título, remanescendo os seguintes óbices ao seu ingresso na tábua registral (nota de devolução nº 15.634 fls. 13/15):

“1. Em relação aos dados e informações referentes às condições de parentesco entre os doadores e donatários:

1.1. Constou que o primeiro nomeado/donatário (Vander Cristiano Lisboa) é filho, irmão e tio dos doadores, entretanto não foi indicada a(s) condição(ões) [grau(s)] de parentesco que cada qual(is) ostenta(m) em relação a ele, ou seja, qual(is) do(s) doador(es) é(são) pai/mãe, irmão(ãos) e sobrinho(s), sendo necessário esclarecer e regularizar.

1.2. Constou que o segundo nomeado/donatário (Cézar Augusto Lisboa) é neto, filho, sobrinho e primo dos doadores, entretanto não foi indicada a(s) condição(ões) [grau(s)] de parentesco que cada qual(is) ostenta(m) em relação a ele, ou seja, qual(is) do(s) doador(es) é(são) avô/avó, pai/mãe, tio(s) e primo(s), sendo necessário esclarecer e regularizar.

(…)

3. O(No) respectivo encerramento, não constam dados e informações referentes à identificação e assinatura de pessoa que assina à rogo (a pedido) do doador Joaquim da Silva Lisboa (ainda que colhida a assinatura e impressão digital dele com caráter ad cautelam), sendo necessário esclarecer e regularizar, em conformidade com o disposto no Art. 215, §2º, do Código Civil e no(s) Item(ns) / subitem(ns) 28 e 28.2, do Capítulo XIII e 45, letra “f”, do Capítulo XVI, das NSCGJ Tomo II, Provimento CGJ nº.58/1989 e alterações posteriores.”

Estabelece o item 45, em sua letra j, do Capítulo XVI, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça:

“45. A escritura pública, salvo quando exigidos por lei outros requisitos, deve conter:

(…)

j) na escritura de doação, o grau de parentesco entre os doadores e os donatários;”

Por sua vez, a escritura pública de doação está redigida da seguinte forma (fls. 16/25):

“DOAÇÃO: Que, declarando eles doadores possuir outros bens e meios necessários às suas subsistências, pela presente escritura e nos melhores termos de direito, de livres e espontâneas vontades, sem qualquer induzimento, sugestão, coação, dolo, malícia ou influência de quem quer que seja, vêm DOAR, como de fato doado têm aos outorgados donatários, a parte ideal de 15/16 avos do descrito e caracterizado imóvel, na proporção equivalente a 7/16 avos ao primeiro nomeado que, ostenta parentesco de filho, irmão e tio dos doadores; e, na proporção equivalente a 8/16 ao segundo que ostenta parentesco de neto, filho, sobrinho e primo dos doadores” (grifei).

Apesar de o título fazer referência ao parentesco, a forma como está redigido e a quantidade de doadores (em número de 8) não permitem identificar quem seria o pai, o irmão e o sobrinho do donatário Vander Cristiano Lisboa, por exemplo.

Mas, ainda assim, é possível o pretendido registro.

Com efeito, não se discute e está evidente, pois consta do texto explícito das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, que as escrituras públicas de doação têm de mencionar, se houver, o grau de parentesco entre os figurantes. Aqui, porém, é preciso discernir: a regra administrativa, porque não tem que ver com nenhum requisito de validade ou eficácia do negócio jurídico, tem natureza meramente diretiva (isto é, orientar o notário para que seja o mais explícito possível nesse ponto, a fim de prevenir ou dirimir incertezas futuras), mas não preceptiva (não significa nenhuma razão de direito para que negue higidez e efeitos ao contrato).

Ou seja, o título está formalmente hígido para acessar o fólio real.

De outra parte, o doador Joaquim da Silva Lisboa assinou o documento e a colheita da sua impressão digital foi uma cautela adotada no momento da lavratura do ato para conferir maior segurança jurídica, como explicado (fls. 16/25 e 67).

O fato é que houve a assinatura do outorgante doador, de modo que não se justifica a exigência posta pelo Registrador para o cumprimento dos itens 28, do Capítulo XIII, e 45, f, do Capítulo XVI, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, uma vez que não se tratou de assinatura a rogo, como bem reconhecido pelo MM. Juiz Corregedor Permanente.

Em suma, afastados os óbices, o ingresso do título se impõe.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação, a fim de julgar improcedente a dúvida e determinar o registro da escritura pública de doação.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça

Relator. (DJe de 21.06.2023 – SP)

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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