1VRP/SP: Embora a Lei Estadual n.11.331/02 determine a utilização de parâmetros semelhantes, a base de cálculo dos emolumentos não se confunde com a base de cálculo dos impostos (ITBI ou ITCMD).

Processo 1122615-63.2023.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Conditoris Participações Ltda – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida e mantenho a exigência (fl. 77). Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: BENCE PAL DEAK (OAB 95409/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1122615-63.2023.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Impetrante: Conditoris Participações Ltda

Impetrado: Primeiro Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de mandado de segurança impetrado por Conditoris Participações Ltda contra ato do Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital (aplicação da lei e da tabela de emolumentos para registro dos títulos prenotados perante aquela serventia sob n.427.771 e 427.774).

A parte alega que recebeu, por doação, o imóvel da matrícula n.65.668, sendo o negócio avaliado em R$11.482.088,00, com recolhimento do ITCMD na época da lavratura da escritura; que houve exigência de custas no valor de R$63.282,25, calculado sobre o valor venal de referência, que é de R$26.346.207,00; que o valor postulado é indevido, porque já foi considerada ilegal a utilização do valor venal de referência como base de cálculo de custas e emolumentos (Tema 1.113 do STJ): a base de cálculo deve ser o valor do negócio; que a jurisprudência do TJSP reconheceu a inconstitucionalidade dos artigos 7º-A e 7º-B da Lei Municipal n.14.255/2006 na Arguição de Inconstitucionalidade n.0056693-19.2014.8.26.0000; que a utilização do valor venal de referência como base de cálculo de custas e emolumentos deve ser afastada, conforme orientação jurisprudencial; que não é aplicável o instituto da atualização previsto na EC 113/21.

Documentos vieram às fls.11/66.

O feito foi recebido como dúvida e, constatado o decurso do prazo de validade da prenotação, determinou-se a reapresentação do título à serventia extrajudicial (fls.67/69).

Com o atendimento, o Oficial se manifestou às fls.76/79, confirmando a reapresentação do título sob prenotação n.438.293, bem como sua aptidão para registro. No mérito, sustentou a regularidade da aplicação do valor venal de referência nos termos do artigo 7º da Lei n.11.331/02 e do artigo 16, parágrafo único, item 2, do Decreto n.46.655/05 (princípio tempus regit actum). Juntou documentos às fls.80/116.

O Ministério Público opinou pela procedência (fls.120/122).

É o relatório.

Fundamento e decido.

No mérito, a dúvida é procedente. Vejamos os motivos.

Sabe-se que vigora, para os registradores, ordem de controle rigoroso do recolhimento do imposto por ocasião do registro do título, sob pena de responsabilidade pessoal (art. 289 da Lei n. 6.015/73; art. 134, VI, do CTN e art. 30, XI, da Lei n. 8.935/1994).

Os emolumentos, por sua vez, têm por fato gerador a prestação de serviços públicos notariais e de registro previstos no artigo 236 da Constituição Federal e são regulados pela Lei Estadual n. 11.331/02, a qual estipula tabela própria para cobrança.

Para fins de enquadramento na referida tabela, a lei determina a apuração do custo efetivo do serviço prestado, estabelecendo os seguintes parâmetros:

“Art. 7º – O valor da base de cálculo a ser considerado para fins de enquadramento nas tabelas de que trata o artigo 4º, relativamente aos atos classificados na alínea “b” do inciso III do artigo 5º, ambos desta lei, será determinado pelos parâmetros a seguir, prevalecendo o que for maior:

I – preço ou valor econômico da transação ou do negócio jurídico declarado pelas partes;

II – valor tributário do imóvel, estabelecido no último lançamento efetuado pela Prefeitura Municipal, para efeito de cobrança de imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, ou o valor da avaliação do imóvel rural aceito pelo órgão federal competente, considerando o valor da terra nua, as acessões e as benfeitorias;

III – base de cálculo utilizada para o recolhimento do imposto de transmissão “inter vivos” de bens imóveis”.

Conforme discriminado pelo Oficial à fl.78, o maior valor apurado foi aquele utilizado como base de cálculo para recolhimento do imposto de transmissão inter vivos de imóveis.

Por se tratar de doação, foi utilizada a base de cálculo do ITCMD.

O Regulamento do ITCMD aprovado pelo Decreto n.46.655/02, assim dispõe:

“Artigo 16 – O valor da base de cálculo, no caso de bem imóvel ou direito a ele relativo será (Lei 10.705/00, art. 13):

I – em se tratando de:

a) urbano, não inferior ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU;

Parágrafo único – Poderá ser adotado, em se tratando de imóvel:

(…)

2 – urbano, o valor venal de referência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI divulgado ou utilizado pelo município, vigente à data da ocorrência do fato gerador, nos termos da respectiva legislação, desde que não inferior ao valor referido na alínea “a” do inciso I, sem prejuízo da instauração de procedimento administrativo de arbitramento da base de cálculo, se for o caso”.

Vale notar que, embora a Lei Estadual n.11.331/02 determine a utilização de parâmetros semelhantes, a base de cálculo dos emolumentos não se confunde com a base de cálculo dos impostos (ITBI ou ITCMD).

As normas estaduais apenas indicam o critério fixado na legislação municipal (valor venal de referência) como parâmetro para o enquadramento das hipóteses de incidência dos emolumentos, conforme tabela escalonada, que estabelece valores fixos para faixas progressivas, variantes conforme o preço do imóvel.

Esse foi o entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 3.887, no qual a corte superior, ao analisar referido regramento, concluiu que o parâmetro fixado não provoca a identidade vedada pelo artigo 145, §2º, da CF, ou seja, a base de cálculo dos emolumentos não se confunde com a dos impostos.

Não estamos diante, portanto, da hipótese regrada pelo STJ (Tema Repetitivo 1113), que é a mesma tratada no Incidente de Inconstitucionalidade, no qual o órgão especial do Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu a impossibilidade de se utilizar o valor venal de referência como base de cálculo do ITBI, com a seguinte ementa (destaque nosso):

“INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE – Artigo 7º da Lei nº 11.154, de 30 de dezembro de 1991, com a redação dada pelas Leis nºs 14.125, de 29 de dezembro de 2005, e 14.256, de 29 de dezembro de 2006, todas do Município de São Paulo, que estabelece o valor pelo qual o bem ou direito é negociado à vista, em condições normais de mercado, como a base de cálculo do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) Acórdão que, a despeito de não manifestar de forma expressa, implicitamente também questionou as disposições dos artigos 7º-A, 7º-B e 12 da mesma legislação municipal Valor venal atribuído ao imóvel para apuração do ITBI que não se confunde necessariamente com aquele utilizado para lançamento do IPTU Precedentes do STJ Previsão contida no aludido artigo 7º que, nessa linha, não representa afronta ao princípio da legalidade, haja vista que, como regra, a apuração do imposto deve ser feita com base no valor do negócio jurídico realizado, tendo em consideração as declarações prestadas pelo próprio contribuinte, o que, em princípio, espelharia o “real valor de mercado do imóvel” “Valor venal de referência”, todavia, que deve servir ao Município apenas como parâmetro de verificação da compatibilidade do preço declarado de venda, não podendo se prestar para a prévia fixação da base de cálculo do ITBI Impossibilidade, outrossim, de se impor ao sujeito passivo do imposto, desde logo, a adoção da tabela realizada pelo Município Imposto municipal em causa que está sujeito ao lançamento por homologação, cabendo ao próprio contribuinte antecipar o recolhimento Arbitramento administrativo que é providência excepcional, da qual o Município somente pode lançar mão na hipótese de ser constatada a incorreção ou falsidade na documentação comprobatória do negócio jurídico tributável Providência que, de toda sorte, depende sempre da prévia instauração do pertinente procedimento administrativo, na forma do artigo 148 do Código Tributário Nacional, sob pena de restar caracterizado o lançamento de ofício da exação, ao qual o ITBI não se submete Artigos 7º-A e 7º-B que, nesse passo,subvertem o procedimento estabelecido na legislação complementar tributária, em afronta ao princípio da legalidade estrita, inserido no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal Inadmissibilidade, ainda, de se exigir o recolhimento antecipado do tributo, nos moldes estabelecidos no artigo 12 da Lei Municipal nº 11.154/91, por representar violação ao preceito do artigo 156, inciso II, da Constituição Federal Registro imobiliário que é constitutivo da propriedade, não tendo efeito meramente regularizador e publicitário, razão pela qual deve ser tomado como fato gerador do ITBI Regime constitucional da substituição tributária, previsto no artigo 150, § 7º, da Constituição Federal, que nem tem lugar na espécie, haja vista que não se cuida de norma que autoriza a antecipação da exigibilidade do imposto de forma irrestrita Arguição acolhida para o fim de pronunciar a inconstitucionalidade dos artigos 7º-A, 7º-B e 12, da Lei nº 11.154/91, do Município de São Paulo” (TJSP; Incidente De Arguição de Inconstitucionalidade Cível 0056693-19.2014.8.26.0000; Relator (a): Paulo Dimas Mascaretti; Órgão Julgador: Órgão Especial; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 12ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 25/03/2015; Data de Registro: 23/04/2015).

Em havendo, assim, previsão legal de exação para a hipótese aqui tratada, não cabe ao Oficial de Registro nem a este juízo administrativo entender pelo afastamento da lei tributária.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida e mantenho a exigência (fl. 77).

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 29 de setembro de 2023.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito (DJe de 03.10.2023 – SP)

Fonte: Diário da Justiça Eletrônico.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.