Processo 1157416-05.2023.8.26.0100
Pedido de Providências – Petição intermediária – Antonio Roberto Machado Suguiyama – (…) Tabelionato de Protesto de Letras e Títulos – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para determinar o cancelamento do protesto da Certidão de Dívida Ativa protocolada sob n. 3263-10/10/2023, título n.8012205697965 (fl.09), às expensas do (…) Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital. O delegatário fica orientado sobre a necessidade de constante orientação e adequada fiscalização da atuação de seus funcionários para garantia de atendimento às normas que orientam a prestação do serviço delegado, justamente com vistas a evitar novas falhas como a analisada neste feito. Comunique-se o resultado à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e à E. CGJ, servindo a presente decisão como ofício. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: A.R.M.S. (OAB (…)/SP), L.F.C.S. (OAB (…)/SP)
Íntegra da decisão:
SENTENÇA
Processo Digital nº: 1157416-05.2023.8.26.0100
Classe – Assunto Pedido de Providências – Petição intermediária
Requerente: Antonio Roberto Machado Suguiyama
Requerido: (…)Tabelionato de Protesto de Letras e Títulos
Prioridade Idoso
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad
Vistos.
Trata-se de pedido de providências instaurado em virtude de reclamação formulada por Antônio Roberto Machado Suguiyama contra o (…) Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital. A pretensão é de cancelamento de protesto sob alegação de inobservância das formalidades legalmente exigidas.
A parte sustenta que, em 16/10/2023, a serventia extrajudicial em questão protestou título em seu desfavor; que, na correspondência enviada para notificação, não se informou o número do apartamento, de modo que a correspondência não foi entregue; que a indicação de endereço incompleto impediu quitação da dívida anteriormente à efetivação do protesto; que tomou ciência do protesto no momento em que buscava financiamento bancário para a realização de cirurgia agendada para novembro, ocasião em que o crédito foi negado devido ao protesto, o que gerou angústias morais que poderiam ter sido evitadas se o cartório tivesse informado corretamente o seu endereço, já que cumprimento da obrigação fiscal antes do protesto teria sido possível; que a obrigação já foi regularizada junto à Receita Federal. Assim, requer a correção do ato falho e irregular, com cancelamento do protesto e de todos os emolumentos e taxas cobrados pelo protesto.
Documentos vieram às fls.05/33.
O pedido de tutela de urgência foi afastado (fl.34).
O Tabelião prestou esclarecimentos às fls. 38/44, informando que o protesto se refere a certidão da dívida ativa que representa débito de Imposto de Renda da pessoa física contraído pelo reclamante em face da Receita Federal do Brasil; que a intimação identifica adequadamente o reclamante e foi enviada ao seu endereço real; que é obrigação do contribuinte informar seu endereço à Receita Federal; que o reclamante já havia sido notificado anteriormente pela Receita Federal, conforme extrato de inscrição da dívida ativa (fl.06); que, ao se qualificar perante o serviço de protesto para requerer cópias da certidão da dívida protestada, o próprio reclamante omitiu o número do seu apartamento, declarando apenas o número do prédio (fl.08); que a intimação por edital não é só medida justificável, mas de rigor, porque o protesto da mesma dívida foi indevidamente obstado em quatro oportunidades devido à falta de intimação pessoal (fl.06); que o reclamante somente parcelou a dívida fiscal após o protesto.
O Tabelião esclareceu, ainda, a distinção entre as certidões de dívida ativa emitidas pelo Poder Público e os demais títulos de crédito de emissão privada, pois a dúvida no endereço do devedor recomenda a qualificação negativa dos títulos de crédito, ao passo que o mesmo não pode ocorrer com as certidões de dívida ativa; que, nos títulos de emissão privada, a identificação do endereço do devedor incumbe ao credor, enquanto, nas certidões de dívida ativa emitidas pelo Poder Público, a identificação do endereço incumbe ao próprio contribuinte (obrigação tributária acessória, nos termos do artigo 127 do CTN c.c. artigo 27, I, do RIR). Assim, em se tratando de certidão de dívida ativa e havendo imprecisão no endereço por omissão do próprio devedor, a intimação deve se dar pela via editalícia.
O Tabelião informou, por fim, que a falta de indicação do número do apartamento no endereço fornecido obstava de forma ilegítima o procedimento de protesto da certidão de dívida ativa; que há fortes indícios de que o reclamante somente indicou o número do apartamento após a lavratura do assento notarial; que o Tabelião não pode agir de ofício e não pode ser confundido com o credor, que é o único responsável pelos dados fornecidos (artigo 5º, parágrafo único, da Lei n.9.492/97); que não houve violação do artigo 14, §2º, da Lei n.9.492/97, porque era obrigação do reclamante manter endereço completo perante a Receita Federal do Brasil, o que ele descumpria; que a certidão protestada encontra-se perfeita e acabada, ostentando todos os elementos exigidos por lei. Juntou documentos às fls. 45/57.
Intimada, a parte reclamante se manifestou sobre as informações do Tabelião, aduzindo que forneceu seu endereço completo para a Receita Federal; que não pode adivinhar quando será intimada; que o pedido de certidão de protesto foi veiculado por terceiro; que somente agora tomou conhecimento do protesto; que o Tabelião tenta transferir sua responsabilidade (fls. 61/63). Juntou documentos às fls.64/72.
O Ministério Público não identificou falta funcional e opinou pelo arquivamento (fls. 76/77).
É o relatório.
Fundamento e decido.
Considerando os elementos já presentes nos autos, entendo possível julgamento.
No mérito, o pedido é procedente. Vejamos os motivos.
A qualificação de títulos e documentos de dívida apresentados para protesto envolve apenas o exame dos caracteres formais.
Assim, quando preenchidos os requisitos legais, o Tabelião não pode se recusar a realizar os atos próprios da função pública que foi confiada a ele.
No caso concreto, como o título estava formalmente em ordem, o Tabelião prosseguiu com a intimação postal, a qual restou frustrada por insuficiência do endereço fornecido, pois não constava o número do apartamento do destinatário (fl. 07). Em seguida, realizou intimação por edital.
No entanto, ainda que o contribuinte tenha responsabilidade sobre as informações declaradas à Receita Federal e que os dados fornecidos para protesto sejam de responsabilidade exclusiva do apresentante (artigo 5º, parágrafo único, da Lei n.9.492/97), a intimação do devedor por meio de edital foi precipitada e não observou rigorosamente o preconizado pelas Normas de Serviço Extrajudicial da Corregedoria de Justiça de São Paulo (Seção VI do Capítulo XV):
“44. A intimação ao devedor ou ao sacado será expedida pelo Tabelião para o endereço inicialmente fornecido pelo apresentante do título ou documento de dívida, mesmo se localizado em Comarca diversa da circunscrição territorial do tabelionato, considerando-se cumprida quando comprovada sua entrega naquele endereço ou, à vista do previsto no item 51 deste Capítulo, no que for encontrado.
44.1. A remessa da intimação poderá ser feita através de portador do próprio tabelião, ou por qualquer outro meio, desde que o recebimento fique assegurado e comprovado através de protocolo, aviso de recepção (A.R.) ou documento equivalente.
44.2. A intimação também pode ser expedida por telegrama, transmitido à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT), com observação do item 45 deste Capítulo, considerando-se cumprida com a confirmação de entrega no endereço do destinatário, da qual conste a data, a hora e o nome da pessoa que recebeu o telegrama.
(…)
51.Antes da expedição do edital, devem ser buscados meios de localização do devedor existentes em suas bases de dados, ou em bases públicas de acesso disponível, incluída a que for mantida pela CENPROT – Central de Serviços Compartilhados dos Tabeliães de Protesto mediante autorização por norma específica.
51.1 A intimação será feita por edital se o endereço obtido não pertencer à competência territorial do tabelião, ou de uma das Comarcas agrupadas na forma da Resolução nº 93/1995 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e da Lei Estadual nº 3.369/1982, sem prejuízo da expedição da comunicação prevista no art. 3º, item 5º, do Provimento nº 87/2019 da Corregedoria Nacional de Justiça.
52. Em caso de recusa no recebimento da intimação, o fato será certificado, expedindo-se edital.
53. A intimação será feita por edital se a pessoa indicada para aceitar ou pagar for desconhecida, sua localização incerta ou ignorada, ou quando, na forma do item 44, for tentada a intimação no seu endereço.
53.1. Considera-se frustrada a intimação por meio postal quando o aviso de recepção (A.R.) não for devolvido pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT) no prazo de quinze dias úteis, contado da remessa da primeira (cf. item 47 e subitem 47.1. deste Capítulo) intimação (…)”.
As regras do novo Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça – Foro Extrajudicial (CNN/CN/CNJ-Extra), que regulamenta os serviços notariais e de registro, também são neste mesmo sentido:
“Art. 134. Antes da expedição do edital para intimação do devedor, o tabelião poderá buscar outros endereços em sua base de dados, nos endereços em que outros tabeliães realizaram a intimação, desde que na mesma base da sua competência territorial, ou nos endereços eletrônicos, a serem compartilhados por meio da CENPROT, bem como nos endereços constantes de bases de natureza jurídica pública e de acesso livre e disponível ao tabelião.
Parágrafo único. A CENPROT deverá compartilhar entre os tabeliães os endereços em que foi possível a realização da intimação de devedores, acompanhado do CNPJ ou CPF do intimado, bem como da data de efetivação (…)”.
As normas de regência (especiais), portanto, autorizam a intimação por edital quando a localização da pessoa indicada for incerta ou ignorada, mas somente após a utilização de meios alternativos para seu encontro (item 51, Seção VI do Capítulo XV, NSCGJ, e artigo 134 do CNN/CN/CNJ-Extra), o que poderia ter revelado o dado faltante.
A intimação por edital seria possível no caso de as pesquisas que deveriam ter sido realizadas não fornecessem dados novos, mas não há informação de que essa diligência tenha sido adotada.
O pedido, em consequência, deve ser acolhido.
No que diz respeito à falha configurada, considerando que a responsabilidade principal sobre os dados para protesto é do apresentante e como se trata da primeira ocorrência envolvendo o delegatário, que assumiu a serventia em 05 de outubro deste ano (fl.47), não vislumbro providência a ser tomada no âmbito disciplinar.
Suficiente será orientação sobre a obrigação de fiscalização sobre os prepostos submetidos à sua supervisão para garantia de atendimento às normas que orientam a prestação do serviço delegado.
A esse respeito, a jurisprudência da E. Corregedoria Geral da Justiça:
“Preambularmente, cumpre observar que a orientação trilhada por esta Egrégia Corregedoria Geral da Justiça tem sido a da possibilidade de responsabilização do Sr. Oficial, por ato de seus prepostos. Frise-se que não se está a tratar de responsabilidade objetiva do Tabelião. Cuida-se, em verdade, de responsabilidade subjetiva, escorada na omissão do dever de fiscalização dos funcionários contratados” (Processo CGSP n. 1112899-56.2016.8.26.0100; São Paulo; j. 11/08/2017; Rel. Manoel de Queiroz Pereira Calças).
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para determinar o cancelamento do protesto da Certidão de Dívida Ativa protocolada sob n. 3263-10/10/2023, título n.8012205697965 (fl.09), às expensas do (…) Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital. O delegatário fica orientado sobre a necessidade de constante orientação e adequada fiscalização da atuação de seus funcionários para garantia de atendimento às normas que orientam a prestação do serviço delegado, justamente com vistas a evitar novas falhas como a analisada neste feito.
Comunique-se o resultado à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e à E. CGJ, servindo a presente decisão como ofício.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.
Oportunamente, ao arquivo.
P.R.I.C.
São Paulo, 06 de dezembro de 2023.
Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad
Juíza de Direito (DJe de 11.12.2023 – SP)
Fonte: DJE/SP
Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!
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