1ªVRP/SP: Carta de Arrematação. Princípio da Continuidade ou do Trato Sucessivo e Trato Contínuo.

Processo 1056908-90.2019.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1056908-90.2019.8.26.0100

Processo 1056908-90.2019.8.26.0100 – Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR –

Dúvida – Cancelamento de Hipoteca – Luiz Pedroso dos Santos – Vistos. Trata-se de dúvida inversa suscitada por Luiz Pedroso dos Santos em face do Oficial do 3º Registro de Imóveis da Capital, tendo em vista a negativa em se proceder ao registro da carta de arrematação extraída do processo nº 0012996-56.2008.28.26.0100, que tramitou perante o MMº Juízo da 20ª Vara Cível da Capital, ajuizada pelo Edifício e Condomínio Brás IX em face de Paulo Jorge Arruda Mitoso, na qualidade de compromissário comprador sem título registrado, referente ao imóvel objeto da matrícula nº 126.270. O óbice registrário refere-se à violação ao princípio da continuidade registrária, tendo em vista que o executado não é proprietário do imóvel, não havendo prova de que Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo – COHAB, atual titular de domínio, tenha sido intimada nos mencionados autos. Insurge-se o suscitante acerca do óbice registrário sob o argumento de que a COHAB não outorgou escritura definitiva ao compromissário e tendo em vista que não houve o pagamento foi proposta ação de cobrança sem sucesso, contudo, por se tratar de débitos condominiais, que constituem obrigação propter rem, o imóvel respondeu pelas dívidas e, levado a leilão judicial, foi arrematado pelo suscitante. Juntou documentos às fls.74/107. O Ministéri Público opinou pela procedência da dúvida (fls.119/122). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Preliminarmente, cumpre destacar que os títulos judiciais não estão isentos de qualificação, positiva ou negativa, para ingresso no fólio real, como já está pacificado pelo Egrégio Conselho Superior da Magistratura. Nesse sentido a decisão do Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível 464-6/9, São José do Rio Preto): “Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal, o exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”. Sendo assim, fica claro que não basta a existência de título proveniente de órgão jurisdicional para autorizar automaticamente o ingresso no registro tabular. Feitas estas considerações, passo a análise do mérito. Importante destacar o entendimento de Francisco Eduardo Loureiro, em Código Civil Comentado: “O princípio da continuidade, também chamado trato sucessivo e trato contínuo, está previsto nos arts. 195 e 237 da Lei n. 6.105/73. Expressa a regra que ninguém pode dispor de direitos que não tem, ou de direitos de qualidade e quantidade diversa dos quais é titular. Diz que, em relação a cada imóvel, deve haver uma cadeia de titulares, à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Não se encontram sujeitos a tal princípio os títulos que expressam modos originários de aquisição da propriedade, como a usucapião e a desapropriação”. Sobre o tema merece ser citado Narciso Orlandi, para quem: ” No sistema que adota o princípio da continuidade, os registros têm de observar um encadeamento subjetivo. Os atos praticados têm de ter, numa das partes, a pessoa cujo nome já consta do registro. A pessoa que transmite um direito tem de constar do registro como titular desse direito, valendo para o registro o que vale para validade dos negócios” (Retificação do Registro de Imóveis, Editora Oliveira Mendes, p. 56). Portanto, o título que se pretende registrar deve estar em conformidade com o inscrito na matrícula, caso contrário traria insegurança jurídica ao Registro de Imóveis. Na presente hipótese, conforme verifica-se da matrícula de fls.105/106, a titular de domínio é a COHAB, a qual não figurou no pólo passivo da ação, que originou a arrematação do imóvel em questão, logo, em consonância com o princípio da continuidade devem primeiro ser registrados os títulos que levaram Paulo Jorge a adquirir o domínio, para posteriormente ter ingresso a carta de arrematação. Assim deve haver um encadeamento entre os registros na matrícula ou transcrição do imóvel, de modo que determinado direito só pode ser alienado ou transferido caso seu titular dele tenha disponibilidade, assim constatado no fólio registral, a evitar que qualquer pessoa transmita a terceiros mais direitos do que possui. No mais, é certo que os títulos originários não estão sujeitos ao princípio da continuidade por sua natureza constitutiva, pois nesta forma de aquisição da propriedade não há a transmissão de um sujeito para outro. Todavia, a matéria restou pacificada pelo Egrégio Conselho Superior da Magistratura, que reconheceu a arrematação como forma derivada de aquisição da propriedade: “REGISTRO DE IMÓVEIS – Carta de Arrematação Título judicial que não escapa à qualificação registral Forma derivada deaquisição de propriedade – Desqualificação por ofensa ao princípio da continuidade – Cancelamento objetivado, com a finalidade de possibilitar a inscrição do título, que não comporta exame na via administrativa – Dúvida julgada procedente Recurso não provido” (APELAÇÃO CÍVEL:1061979-44.2017.8.26.0100, DATA DE JULGAMENTO:23/04/2018 DATA DJ:23/05/2018, Rel: Des. RELATOR: Geraldo Francisco Pinheiro Franco). “REGISTRO DE IMÓVEIS CARTA DEARREMATAÇÃO FORMA DERIVADA DEAQUISIÇÃODA PROPRIEDADE EXECUTADA QUE NÃO FIGURA COMO PROPRIETÁRIA DO IMÓVEL NA RESPECTIVA MATRÍCULA AFRONTA AO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE RECURSO DESPROVIDO” (TJSP; Apelação 1047731-10.2016.8.26.0100; Relator: Des. Pereira Calças; Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro Central Cível – 1ª Vara de Registros Públicos; Data do Julgamento: 29/09/2017; Data de Registro: 16/10/2017) Como destaca o MMº Juiz de Direito Drº Josué Modesto Passos, “diz-se originária a aquisição que, em seu suporte fático, é independente da existência de um outro direito; derivada, a que pressupõe, em seu suporte fático, a existência do direito por adquirir. A inexistência de relação entre titulares, a distinção entre o conteúdo do direito anterior e o do direito adquirido originariamente, a extinção de restrições e limitações, tudo isso pode se passar, mas nada disso é da essência da aquisição originária” (PASSOS, Josué Modesto. A arrematação no registro de imóveis: continuidade do registro e natureza da aquisição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, pp. 111-112). E ainda, de acordo com a observação feita pelo mencionado magistrado, “a arrematação não pode ser considerada um fundamento autônomo do direito que o arrematante adquire. A arrematação é ato que se dá entre o Estado (o juízo) e o maior lançador (arrematante), e não entre o mais lançador (arrematante) e o executado; isso, porém, não exclui que se exija – como de fato se exige -, no suporte fático da arrematação (e, logo, no suporte fático da aquisição imobiliária fundada na arrematação), a existência do direito que, perdido para o executado, é então objeto de disposição em favor do arrematante. Ora, se essa existência do direito anterior está pressuposta e é exigida, então – quod erat demonstrandum – a aquisição é derivada (e não originária)” (op. cit., p. 118). Logo, na presente hipótese, não se tratando de aquisição originária, houve o rompimento do encadeamento sucessivo de titularidade, ferindo consequentemente o princípio da segurança jurídica que dos atos registrários se espera. Por fim, conforme observado pelo D. Promotor de Justiça, o instrumento juntado às fls.80/85, refere-se a compromisso de venda e compra, que não constitui título translativo da propriedade, logo, mesmo que registrado, o suscitante não poderia adquirir o domínio do bem, mas apenas os direitos do compromissário comprador. Diante do exposto, julgo procedente a dúvida inversa suscitada por Luiz Pedroso dos Santos, em face do Oficial do 3º Registro de Imóveis da Capital, e consequentemente mantenho o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: PRISCILA MARIA DE SOUZA MONTEIRO (OAB 331933/SP)

Fonte: DJe/SP de 24.07.2019

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


2ªVRP/SP: Não há providências a serem tomadas pelo Juízo Corregedor, ainda que as firmas fossem efetivamente falsas, porquanto não está no âmbito de atuação do Notário a análise profunda, técnica, dos sinais a ele apresentados (daí porque se diz que o reconhecimento é “por semelhança”).

Processo 1097330-44.2018.8.26.0100

Espécie: PROCESSO
Número: 1097330-44.2018.8.26.0100

Processo 1097330-44.2018.8.26.0100 – Texto selecionado e originalmente divulgado pelo INR –

Pedido de Providências – Registro Civil das Pessoas Naturais – R.T.S.S.A. – P.S. e outros – Juiz(a) de Direito: Dr(a). Leticia Fraga Benitez VISTOS. Cuidam os autos de expediente instaurado em razão de comunicação encaminhada pelo ilustre Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do 29º Subdistrito – Santo Amaro, Capital, noticiando supostas falsidades em reconhecimentos de firma de Patrizia Sambo e Carlos Signorini Budahazi. O ilustre Titular do 29º Subdistrito manifestou-se às fls. 29, 54, 1488/1489, 1526/1527 e 1542/1547. O Senhor Interino do 5º Tabelionato de Notas da Capital prestou esclarecimentos às fls. 30/35, 62 e 1590/1591. Carreou-se aos autos o ofício advindo do Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt IIRGD, referindo dados qualificativos, bem como foto, de Carlos Signorini Budahazi (fls. 56/59), bem como do Núcleo de Cadastro da Superintendência Regional de São Paulo da Polícia Federal, indicando dados registrários de Patrizia Sambo (fls. 121/126 e 130/134). O Ministério Público acompanhou o feito, opinando pelo arquivamento dos autos (fls. 1580/1584). É o relatório. Decido. De início, reitero aos Senhores Interessados que esta Corregedoria Permanente, em sua atuação administrativa, possui, como sua atribuição precípua, a atividade correicional junto aos Cartórios de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelionatos de Notas desta Capital, verificando o cumprimento dos deveres e obrigações dos titulares de delegações afetas a esta 2ª Vara de Registros Públicos da Capital. Nesses termos, conforme bem apontado pela representante do Ministério Público, eventual nulidade de quaisquer dos atos analisados no presente feito, deve ser buscada na via judicial própria. Refeitos esses esclarecimentos, verifica-se, na espécie, a ocorrência de falsidade quanto aos reconhecimentos das firmas apostos às fls. 158/159, em nome de Patrizia Sambo, realizado perante o Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do 29º Subdistrito – Santo Amaro, Capital, e em nome de Carlos Signorini Budahazi, atribuído ao 5º Tabelionato de Notas da Capital. Relativamente ao reconhecimento da firma de PATRIZIA, copiado às fls. 158, relatou o Titular do Ofício que a assinatura timbrada não guarda semelhança com aquela aposta no cartão-padrão, apontando grave falha funcional por parte da escrevente que realizou o ato. Assim, após sindicância interna, apenou a preposta com trinta dias de suspensão com prejuízo dos vencimentos (fls. 1526/1527 e 1542/1547). No que tange ao reconhecimento da subscrição de CARLOS, de fls. 158/159, indicou o Interino do 5º Tabelionato de Notas da Capital que o ato não pertence ao seu Ofício, apontando eventual falsidade dos elementos que o compõem (fls. 1590/1591). Por outro lado, os reconhecimentos às fls. 147/148 e 497/498, embora questionados pelos interessados, não apresentam indícios de falsificações de seus elementos formadores, sendo, inclusive, as firmas reconhecidas, de fato, semelhantes às guardadas nas respectivas fichas-padrão, que já residiam abertas nas serventias, havendo sido efetuadas pelos próprios signatários (cf. Cartões de assinatura às fls. 04/06 e 31/32). Nesse sentido, cabe destacar o parecer da ilustre Promotora de Justiça: “Por outro lado, os reconhecimentos contestados, com exceção daquele realizado em nome de PATRÍCIA às fls. 158, apresentam padrão gráfico congruente com os respectivos cartões de assinatura, o que afasta qualquer irregularidade por parte dos Delegatários. Isso porque, nas palavras de Felipe Leonardo Rodrigues e Paulo Roberto Gaiger Ferreira, “o tabelião declara que a assinatura constante em um documento é semelhante a outra presente em uma ficha de assinaturas previamente depositada no tabelionato pela parte signatária” (Tabelionato de notas. Coleção cartórios. Coord. Christiano Cassetari. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 92). E se isso foi feito a contento, não há providências a serem tomadas por este d. Juízo, ainda que as firmas fossem efetivamente falsas, porquanto não está no âmbito de atuação do Notário a análise profunda, técnica, dos sinais a ele apresentados (daí porque se diz que o reconhecimento é “por semelhança”). (cf. Cota Ministerial às fls. 1580/1584, anterior à confirmação de que o reconhecimento da firma de CARLOS às fls. 158/159 é falsa). Bem assim, à luz do brevemente narrado, é possível concluir que apenas os reconhecimentos de firma de fls. 158/159 trataram-se de fraude, destacando-se que após sindicância interna, cuidou o Sr. Delegatário de apenar adequadamente a preposta com trinta dias de suspensão com prejuízo dos vencimentos (fls. 1526/1527 e 1542/1547). E, a preposta, como bem apontado pela I. Promotora de Justiça, atuou de maneira individual, solitária, sem possibilidade de controle pelo Tabelião, sendo que pelo tamanho da unidade e das características próprias do reconhecimento de firma, a prática do ato não estava no campo de observação do Delegatário. No mais, não há indícios convergindo no sentido de que as serventias correcionadas concorreram diretamente para a fraude perpetrada. No que tange aos outros atos apontados nos autos, não se vislumbra, a princípio, irregularidade, devendo, se o caso, a parte autora o  contestar nas via próprias. De qualquer modo, consigno ao Senhor Oficial e Tabelião do 29º Subdistrito para que se mantenha atento, de modo que ocorrências como a relatada, em referência ao reconhecimento de fls. 158/159, não voltem a ocorrer. Finalmente, não há previsão legal para cancelamento de cartões de assinatura regularmente preenchidos, tampouco de se proibir a prática do reconhecimento de firma por semelhança, uma vez que o interesse na prática do ato não é apenas de quem terá a assinatura reconhecida, mas de todos que com ele negociaram e que possuem instrumentos regularmente firmados, podendo eventual determinação neste sentido, ocasionar prejuízos à terceiros de boa-fé. Destarte, à míngua de medida correcional a ser instaurada, determino o arquivamento dos autos. Ciência ao Titular e Interino e ao Ministério Público. Comunique-se a decisão à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente sentença como ofício. P.I.C. – ADV: LEILA CASSEB BAHR (OAB 66837/SP)

Fonte: DJe/SP de 24.07.2019

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.


Arrolamento de bens – I. Inépcia recursal. Não configuração. Razões que atacam os fundamentos da r. sentença. Cumprimento da exigência do artigo 1.010, incisos II e III, do Código de Processo Civil. Apelo conhecido – II. Plano de partilha. Homologação, com exclusão da participação sucessória da consorte supérstite. Irresignação da interessada. Acolhida imperativa, ainda que parcial – III. Cônjuges que se casaram sob o regime de separação obrigatória de bens, na forma do artigo 1.641, inciso II, do Código Civil. Reconhecimento de que a consorte do falecido por direito próprio decorrente do regime de bens tem direito à metade dos aquestos durante o período da sociedade conjugal. Inteligência da Súmula 377 do E. Supremo Tribunal Federal. Presunção decolaboração. Magistério doutrinário. Precedentes deste E. Tribunal – IV. Reconhecimento da meação da virago, atribuindo-lhe 50% (cinquenta por cento) do direito sobre o bem imóvel que compõe a sucessão, sem prejuízo da herança das descendentes ostentadas sobre a fração ideal restante, em metades iguais de 25% (vinte e cinco por cento). Retificação imperativa do plano de partilha apresentado, nesses termos – Sentença anulada – Apelo conhecido e parcialmente provido.

Arrolamento de bens – I. Inépcia recursal. Não configuração. Razões que atacam os fundamentos da r. sentença. Cumprimento da exigência do artigo 1.010, incisos II e III, do Código de Processo Civil. Apelo conhecido – II. Plano de partilha. Homologação, com exclusão da participação sucessória da consorte supérstite. Irresignação da interessada. Acolhida imperativa, ainda que parcial – III. Cônjuges que se casaram sob o regime de separação obrigatória de bens, na forma do artigo 1.641, inciso II, do Código Civil. Reconhecimento de que a consorte do falecido por direito próprio decorrente do regime de bens tem direito à metade dos aquestos durante o período da sociedade conjugal. Inteligência da Súmula 377 do E. Supremo Tribunal Federal. Presunção decolaboração. Magistério doutrinário. Precedentes deste E. Tribunal – IV. Reconhecimento da meação da virago, atribuindo-lhe 50% (cinquenta por cento) do direito sobre o bem imóvel que compõe a sucessão, sem prejuízo da herança das descendentes ostentadas sobre a fração ideal restante, em metades iguais de 25% (vinte e cinco por cento). Retificação imperativa do plano de partilha apresentado, nesses termos – Sentença anulada – Apelo conhecido e parcialmente provido. (Nota da Redação INR: ementa oficial)


ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1004621-24.2018.8.26.0218, da Comarca de Guararapes, em que é apelante DURVALINA TAVARES CÂMARA, são apelados CLÉA FEREIRA SOARES e WANESSA DA SILVA FERREIRA OLIVEIRA.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Conheceram e deram provimento parcial ao apelo. V.U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores DONEGÁ MORANDINI (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA E VIVIANI NICOLAU.

São Paulo, 19 de julho de 2019.

Donegá Morandini

Relator

Assinatura Eletrônica

3ª Câmara de Direito Privado

Apelação Cível nº 1004621-24.2018.8.26.0218

Comarca: Guararapes

Apelantes: Durvalina Tavares Câmara

Apeladas: Cléa Ferreira Soares e outra

Interessado: João Quirino Ferreira (Espólio)

Voto nº 44.599

ARROLAMENTO DE BENS.

I. Inépcia recursal. Não configuração. Razões que atacam os fundamentos da r. sentença. Cumprimento da exigência do artigo 1.010, incisos II e III, do Código de Processo Civil. Apelo conhecido.

II. Plano de partilha. Homologação, com exclusão da participação sucessória da consorte supérstite. Irresignação da interessada. Acolhida imperativa, ainda que parcial.

III. Cônjuges que se casaram sob o regime de separação obrigatória de bens, na forma do artigo 1.641, inciso II, do Código Civil. Reconhecimento de que a consorte do falecido por direito próprio decorrente do regime de bens tem direito à metade dos aquestos durante o período da sociedade conjugal. Inteligência da Súmula 377 do E. Supremo Tribunal Federal. Presunção decolaboração. Magistério doutrinário. Precedentes deste E. Tribunal.

IV. Reconhecimento da meação da virago, atribuindo-lhe 50% (cinquenta por cento) do direito sobre o bem imóvel que compõe a sucessão, sem prejuízo da herança das descendentes ostentadas sobre a fração ideal restante, em metades iguais de 25% (vinte e cinco por cento). Retificação imperativa do plano de partilha apresentado, nesses termos.

SENTENÇA ANULADA. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Trata-se de arrolamento de bens no bojo do qual o plano de partilha foi HOMOLOGADO pela r. sentença de fls. 57/58, da lavra do MM. Juiz de Direito Mateus Moreira Siketo e de relatório adotado, estabelecendo o quinhão de 50% (cinquenta por cento) para a filha do falecido, CLEA, e o quinhão de 50% (cinquenta por cento) para sua neta, WANESSA.

Recorre a consorte supérstite DURVALINA.

Em conformidade com as razões de fls. 62/67, busca o provimento do recurso para que seja reformada a r. sentença, reconhecendo-se seu direito sucessório sobre o acervo de JOÃO, refazendo-se a partilha na proporção de 1/3 (um terço) para cada uma das herdeiras. Argumenta, em síntese, que “sendo a apelante esposa do falecido à época do óbito, deve ser reconhecida sua condição de herdeira, nos termos do artigo 1.829 do Código Civil, com sua inclusão na partilha do imóvel” (fl. 65).

O recurso foi processado e respondido (fls. 73/92).

É O RELATÓRIO.

2. De saída, à vista da norma do artigo 99, § 2º, do Código de Processo Civil e não havendo indícios a contrariar a hipossuficiência declarada, deferem-se à apelante os benefícios da gratuidade processual.

No mais, as razões recursais atacam frontalmente a r. sentença, impugnando a compreensão central manifesta para homologação do formal de partilha apresentado pelas herdeiras do de cujus.

Nessa medida, e reconhecendo a aplicabilidade restrita das hipóteses de rejeição da peça recursal com base no artigo 1.010, incisos II e

III, do Código de Processo Civil, de rigor o conhecimento do recurso.

Não se pode deixar de apontar, ainda, que o importante efeito translativo trazido pela interposição recursal, nos termos do artigo 1.013, § 2º, do Código de Processo Civil. A propósito, destaca-se a doutrina de MARINONI et al: “Independentemente de efetiva impugnação pela parte, restam submetidas ao tribunal, em face do efeito translativo, as questões conhecíveis de ofício (…), ‘todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado’ (art. 1.013, § 1º, CPC) vale dizer, ainda que o magistrado tenha se omitido em apreciá-las em sentença, nada obstante suscitadas e discutidas pelas partes no processo, e todos os fundamentos arguidos pelas partes no primeiro grau de jurisdição que podem servir para solução do caso levado a juízo (art.1.013, § 2º, CPC, STJ; 2ª Turma, REsp 556.025/RS, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 27.02.2007, DJ 16.03.2007, p. 332)” (Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 944).

Superada a questão prefacial, no mérito, o recurso comporta parcial guarida, respeitado o entendimento do Douto Magistrado.

Trata-se de procedimento de inventário dos bens deixados pelo Sr. JOÃO QUIRINO FERREIRA, falecido em 27 de outubro de 2008 (fl. 13).

Diante do acervo hereditário composto por um único bem imóvel, adquirido em fevereiro de 2007 (fls. 16/20) insiste a apelante, ainda que com conclusão diversa da impugnação inicial, que, sendo “esposa do falecido à época do óbito, deve ser reconhecida sua condição de herdeira, nos termos do artigo 1.829 do Código Civil, com sua inclusão na partilha do imóvel” (fl. 65).

Razão lhe assiste, mas em parte.

Da leitura dos autos, vê-se que, em 29 de dezembro de 2004, o titular do espólio se casou com a apelante.

Adotaram, contrariamente à compreensão do i. Magistrado, o regime de separação obrigatória de bens, na medida em que, à época, o varão tinha mais de sessenta anos de idade, fato que atraiu a incidência da hipótese do artigo 1.641, inciso II, do Código Civil em sua redação originária, antes da mudança legislativa promovida pela Lei nº 12.344/10. Inclusive, frise-se, a adoção do regime de separação convencional, aparte de violar regra cogente, exigiria confecção de pacto antenupcial (artigo 1.640, parágrafo único, CC).

Desta feita, por direito próprio e em decorrência das regras patrimoniais do direito de família ou seja, em virtude da relação conjugal, com pré-existência da sucessão a apelante é titular de metade de todos os aquestos do período, como o imóvel de matrícula colacionada às fls. 16/20, pois adquirido em fevereiro de 2007. Prevalece, sem maiores delongas, o entendimento assente na Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, que dispõe: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.

Frente à compreensão consolidada, é totalmente irrelevante, para fins de partilha, a prova da cooperação material ou econômica da virago para a constituição do patrimônio aludido, dado que há presunção de colaboração, que se dá nos diversos níveis da vida, como o afetivo, o econômico, o social, etc.

A propósito, cristalina é a lição de MARIA BERENICE DIAS: “a restrição à autonomia da vontade, não admitindo sequer a comunhão de bens adquiridos durante a vida em comum, levou o STF a editar a Súmula 377. Eis a justificativa do enunciado: a interpretação exata da súmula é no sentido de que, no regime da separação legal, os aquestos se comunicam pelo simples fato de terem sido adquiridos na constância do casamento, não importando se resultaram, ou não se esforço comum. (…) Considerando que a convivência leva à presunção do esforço comum na aquisição de bens, determinou a adoção do regime da comunhão parcial para impedir o locupletamento ilícito de um dos consortes em detrimento do outro” (Curso de direito das famílias. 10ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 331).

Nesse sentido, reforça VENOSA, “a ideia, todavia, é de que, mesmo se casando sob o regime da separação, durante o casamento estabelece-se uma sociedade de fato entre os esposos, e os bens são adquiridos pelo esforço comum” (Direito civil: direito de família. 13ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 342).

Em casos semelhantes, vem decidindo esta Câmara: “UNIÃO ESTÁVEL. Ação de reconhecimento e dissolução de união estável c.c. partilha de bens, alimentos e indenização por danos morais. Insurgência contra sentença de parcial procedência que apenas reconheceu a união estável entre as partes no período de 19/12/1997 a 19/08/2011. Ausência de prova de que o réu estivesse separado de fato da então esposa desde 1995. Impossibilidade de se reconhecer a união estável quando não estiver provada a separação de fato ou de direito do parceiro casado. Precedente do STJ. Companheiro sexagenário. Separação obrigatória de bens. Art. 258, § único, II do CC de 1916. Autora que tem direito a metade dos bens adquiridos durante a união. Aplicação da Súmula nº 377 do STF. Inexigibilidade de prova do esforço comum para fins de partilha. Presunção de colaboração de ambos os conviventes para a aquisição do patrimônio comum. Precedentes. Autora que não comprovou sua efetiva necessidade na prestação alimentícia. Ausência de prova da prática de ilícito civil por parte do réu. Dever de indenizar não comprovado. Sentença reformada em parte. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO” (Apelação Cível nº 1002233-87.2014.8.26.0704, Rel. Alexandre Marcondes, j. 12.02.2019). E também: “Apelação. Inventário. Partilha de bens. Falecida que era casada com o apelado pelo regime da separação obrigatória de bens. Incidência do art. 258, II do Código Civil de 1916. Aplicação da Súmula 377 do STF. Comunicam-se os bens adquiridos na constância do casamento, presumindo-se esforço comum. Bem em questão adquirido através de sub-rogação de bem particular. Elevam-se os honorários advocatícios para 3.100,00 (§ 11 do art. 85 do Código de Processo Civil), observada as regras da gratuidade judiciária. Decisão mantida. RECURSO IMPROVIDO” (Apelação Cível nº 1008392-15.2017.8.26.0066, Rel. Beretta da Silveira, j. 19.10.2018).

Em suma, caberá a retificação do plano de partilha apresentado para que conste que, por direito próprio em decorrência do patrimônio especial constituído pela entidade conjugal, metade do bem deve ser atribuído à virago sobrevivente, cabendo a outra metade, em frações iguais de 25% (vinte e cinco por cento), às herdeiras CLÉA e WANESSA, filha e neta do de cujus, respectivamente.

3. Diante de todo o exposto, de rigor que se anule a r. sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para retificação do plano de partilha apresentado, segundo os fundamentos delineados.

CONHECE-SE E DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.

Donegá Morandini

Relator – – /

Dados do processo:

TJSP – Apelação Cível nº 1004621-24.2018.8.26.0218 – Guararapes – 3ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Donegá Morandini – DJ 23.07.2019

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook e/ou assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito.