CSM/SP: Registro de imóveis – Escritura Pública de sobrepartilha – Alteração judicial de regime de bens cumulada com partilha – Alteração de ponto que restou decidido judicialmente – Bem que restou arrolado judicialmente como comum ao casal e, por meio de ato notarial, qualificado como exclusivo do varão – Apelação não provida.


  
 

Cuida-se de apelação interposta por WAGNER GODOY ROCHA contra a r. sentença (fls. 51/53) que julgou procedente a dúvida e manteve a recusa do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Americana, em registrar a escritura pública de sobrepartilha lavrada em 07 de dezembro de 2021, perante o 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da mesma Comarca, relativa ao imóvel matriculado sob o nº. 373.485.

Alega o recorrente, em suma, que a ação de alteração de regime de bens tramitou regularmente, realizando-se a partilha de bens. No decorrer da referida ação houve a aquisição de bem comum que, por um lapso, não constou da partilha, realizando-se, então, a sobrepartilha extrajudicial. O pretendido registro é viável, inexistente proibição legal para a realização de sobrepartilha extrajudicial decorrente de processo de alteração de regime de bens.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso (fls. 80/82).

É o relatório.

Cuida-se de registro de escritura pública de sobrepartilha, lavrada em 07 de dezembro de 2021, perante o 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de Americana, relativa ao imóvel matriculado sob o nº. 373.485 no Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da mesma Comarca.

O registro foi obstado sob o fundamento da falta de previsão legal que possibilite a sobrepartilha extrajudicial de bem não submetido ao processo judicial de alteração de regime matrimonial cumulado com partilha de bens.

Suscitada, a dúvida foi julgada procedente, nos termos da r. sentença de fls. 51/53, ora recorrida.

Inicialmente, recorde-se que, nos termos do item 117 do Capítulo XX, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, “Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

Como se sabe, a Lei nº 11.441/07 introduziu em nosso ordenamento jurídico o inventário, a partilha, a separação consensual e o divórcio consensual por via administrativa.

Trata-se de faculdade concedida às partes e não obrigação, de modo que, em qualquer caso, afigura-se possível a opção pela via judicial.

No que tange à alteração de regime de bens, dispõe o art. 1.639, § 2º do Código Civil que:

“Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.

§ 2º É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros”.

Daí decorre, pois, que não há previsão legal para procedimento administrativo extrajudicial de alteração de regime de bens, apenas para processo judicial.

Contudo, diversamente do pontuado pelo Senhor Oficial Registrador, não se vislumbra, a priori, impedimento legal para que eventual sobrepartilha decorrente de alteração judicial de regime de bens ocorra extrajudicialmente.

Vale lembrar que a sobrepartilha constitui uma nova partilha dos bens que, por algum motivo, não foram partilhados anteriormente.

Ocorre que, no caso telado, o que se vê não é apenas a sobrepartilha extrajudicial de bem que não constou do acervo anteriormente partilhado. Há expressa alteração de ponto que já restou decidido judicialmente nos autos do processo de alteração de regime de bens cumulado com partilha de bens.

Explico.

Analisando, pelo SAJ, a exordial da ação de alteração de regime de bens, ajuizada consensualmente pelo recorrente e sua esposa Aline Fernanda Simões Rocha (autos do processo n.º 1006949-05.2019.8.26.0019), verifica-se que foi partilhado, porquanto arrolado como comum, o bem matriculado sob o n.º 114.758 do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Americana.

Oportuno consignar que, também da peça inicial de referida ação judicial, constou que as partes se casaram em 13 de abril de 2013 e conviviam em união estável desde 2010.

Do título ora levado a registro constou que foi sobrepartilhado o imóvel matriculado sob o n.º 128.262 do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Americana, cabendo ao recorrente a integralidade do bem. Em razão do excesso de meação, contudo, o apelante repôs onerosamente à esposa Aline a diferença recebida a maior de R$ 195.739,53, representada pelo imóvel objeto da matrícula n.º 114.758 do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Americana, “de propriedade exclusiva do outorgante/outorgado Wagner, cuja escritura de dação em pagamento será lavrada em momento oportuno futuro”.

Ora, o imóvel objeto da matrícula n.º 114.758, do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Americana, foi arrolado como comum e partilhado na ação judicial, cabendo a esposa do recorrente a sua integralidade. Agora, por meio de escritura pública, aduz-se ser o mesmo bem particular “dando-o em pagamento” à esposa em razão do excesso de meação.

Daí a inviabilidade do registro pretendido.

In casu, uma vez escolhida a via judicial e ultimados os seus termos, os pontos decididos não mais poderão ser modificados, revistos ou “redecididos” na esfera extrajudicial como pretendido pela parte, o que somente poderá se dar judicialmente.

Não se trata apenas de nova partilha de bem que não compôs o acervo comum da partilha inaugural, como quer fazer crer o apelante. Novamente, há modificação do que restou decidido judicialmente com alteração da qualificação do bem, deixando de compor o acervo patrimonial comum do casal para ingressar no patrimônio exclusivo do varão.

Assim, ainda que por motivo diverso, a dúvida é, pois, procedente, restando obstado o registro almejado.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 23.10.2023 – SP)

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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