1VRP/SP: Registro de Imóveis. Há necessária de anuência do credor fiduciário na escritura pública de divórcio consensual.


  
 

Processo 1162493-92.2023.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Maria Lúcia Coronado – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada para manter o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.I.C. – ADV: LUCIANA DOMENICONI NERY FELIX DA SILVA (OAB 166564/SP), LUCIANA DOMENICONI NERY FELIX DA SILVA (OAB 166564/SP)

Íntegra da decisão: –

SENTENÇA

Processo nº: 1162493-92.2023.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: Décimo Cartório de Registro de Imóveis

Suscitado: Ramiro Sanchez Palma e outro

Juíza de Direito: Dra. Renata Pinto Lima Zanetta

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Ramiro Sanchez Palma e Maria Lúcia Coronado, diante de negativa de registro de escritura pública de divórcio consensual com partilha de bens lavrada pelo 19º Tabelião de Notas da Capital, a qual teve por objeto o imóvel da matrícula nº 132.767 daquela serventia.

O Oficial informa que o imóvel objeto da matrícula 132.767 acha-se alienado fiduciariamente ao Banco do Brasil S/A e que a negativa foi motivada na exigência formulada em relação à necessária anuência do credor fiduciário. Aduz que para o registro da partilha dos direitos de fiduciante ora pretendido, a escritura deverá ser rerratificada para constar a anuência do credor fiduciário ou este deverá comparecer anuindo por termo em apartado.

Sustenta que o fato de ter ocorrido partilha igualitária entre os ex-cônjuges não afasta a exigência de anuência do credor fiduciário.

Em manifestação dirigida ao Oficial (fls. 10/13), a parte suscitada defende que não há que se falar em anuência do credor fiduciário, uma vez que a responsabilidade pelo pagamento do financiamento imobiliário que recai sobre o imóvel permanece inalterada, atingindo tanto Ramiro quanto Maria Lúcia, sem qualquer prejuízo à entidade bancária. Não apresentou impugnação, porém, em juízo (fls. 35).

O Ministério Público opinou pela manutenção do óbice (fls. 38/40).

É o relatório.

FUNDAMENTO e DECIDO.

De início, é importante ressaltar que o Registrador dispõe de autonomia e independência no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (artigo 28 da Lei nº 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.

De fato, no sistema registral, vigora o princípio da legalidade estrita, pelo qual somente se admite o ingresso de título que atenda aos ditames legais.

Em outras palavras, o Oficial, quando da qualificação registral, perfaz exame dos elementos extrínsecos do título à luz dos princípios e normas do sistema jurídico (aspectos formais), devendo obstar o ingresso daqueles que não se atenham aos limites da lei.

É o que se extrai do item 117 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça (NSCGJ): “Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

No mérito, a dúvida é procedente, pelos seguintes motivos.

Da leitura dos autos, constata-se que os suscitados pretendem ingresso no fólio real de um título consistente em escritura pública de divórcio consensual com partilha de bens (fls. 14/24). Em referida escritura pública, constou a partilha em partes iguais (50%) a cada um dos ex-cônjuges dos direitos de aquisição do imóvel objeto da matrícula nº 132.767 do 10º Registro de Imóveis da Capital, o qual havia sido alienado fiduciariamente ao Banco do Brasil S/A, conforme Registro nº 07 da respectiva matrícula (fls. 08 e 18/21).

Porém, não houve anuência expressa do credor fiduciário.

A Lei nº 9.514/97, ao tratar da transmissão dos direitos que recaem sobre o imóvel alienado fiduciariamente, estabelece a obrigatoriedade de intervenção do credor fiduciário, assim como o item 232, Cap. XX, das NSCGJ, confira-se:

Art. 29. O fiduciante, com anuência expressa do fiduciário, poderá transmitir os direitos de que seja titular sobre o imóvel objeto da alienação fiduciária em garantia, assumindo o adquirente as respectivas obrigações.

232. O devedor fiduciante, com anuência expressa do credor fiduciário, poderá transmitir seu direito real de aquisição sobre o imóvel objeto da alienação fiduciária em garantia, assumindo o cessionário adquirente as respectivas obrigações, na condição de novo devedor fiduciante.

Não resta dúvida, portanto, que, para regularização da divisão dos direitos dos fiduciantes perante o fólio real, haverá necessidade de complementação do título, com a anuência expressa da credora fiduciária (instituição financeira) na forma da lei e, também, em respeito ao princípio da continuidade registral.

Neste sentido, confira-se os seguintes julgados envolvendo casos análogos:

REGISTRO DE IMÓVEIS – Carta de Sentença – Partilha de Bens – Dúvida procedente – Necessidade de correção do plano de partilha para constar a partilha dos direitos aquisitivos dos fiduciantes e não a partilha do imóvel propriamente dito – Indispensabilidade da anuência do credor fiduciário, na forma do art. 29 da Lei 9.514/97 – Carta de sentença que deve ser aditada porque o plano de partilha se encontra incompleto – Apelação não provida (CSM Apelação n. 1036558-52.8.26.0100 Des. Pinheiro Franco j. 28.03.2018).

Registro de Imóveis – Carta de sentença – Partilha de bem objeto de alienação fiduciária em garantia – Resignação parcial Recurso não conhecido – Análise das exigências a fim de orientar futura prenotação – Necessidade de constar no título a porcentagem do bem atribuída a cada um dos ex-companheiros – Descabimento – Atribuição de quinhões que decorre do título judicial – Anuência da credora fiduciária para a transferência do contrato de alienação fiduciária em garantia – Necessidade Inteligência do artigo 29 da Lei nº 9.514/97 e do item 238 do Capítulo XX das Normas de Serviço (CGJ Processo n. 0011989-18.8.26.0291 Des. Pereira Calças j. 20.04.2016).

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada para manter o óbice registrário.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo.

P.I.C.

São Paulo, 11 de janeiro de 2024.

Renata Pinto Lima Zanetta

Juíza de Direito (DJe de 15.01.2024 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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