CSM/SP: Registro de imóveis – Título judicial – Sentença de adjudicação compulsória, com força de mandado – Empresa proprietária tabular do imóvel – Exigência de informação do Nº do CNPJ da titular do domínio – Dado inexistente – Impossibilidade de cumprimento da exigência pelos interessados no registro – Mitigação do princípio da especialidade subjetiva – Dúvida improcedente – Recurso provido


  
 

Apelação Cível nº 1008096-79.2021.8.26.0477

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1008096-79.2021.8.26.0477
Comarca: PRAIA GRANDE

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1008096-79.2021.8.26.0477

Registro: 2023.0000918149

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1008096-79.2021.8.26.0477, da Comarca de Praia Grande, em que são apelantes JOÃO ROBERTO DE CARVALHO NICOLETTI, PRISCILA AMORIM DE CARVALHO NICOLETTI e ALEXANDRE CORREIA NICOLETTI, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE PRAIA GRANDE.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 19 de outubro de 2023.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1008096-79.2021.8.26.0477

APELANTES: João Roberto de Carvalho Nicoletti, Priscila Amorim de Carvalho Nicoletti e Alexandre Correia Nicoletti

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Praia Grande

VOTO Nº 39.159

Registro de imóveis – Título judicial – Sentença de adjudicação compulsória, com força de mandado – Empresa proprietária tabular do imóvel – Exigência de informação do Nº do CNPJ da titular do domínio – Dado inexistente – Impossibilidade de cumprimento da exigência pelos interessados no registro – Mitigação do princípio da especialidade subjetiva – Dúvida improcedente – Recurso provido.

Trata-se de apelação interposta por João Roberto de Carvalho Nicoletti, Alexandre Correia Nicoletti e Priscila Amorim de Carvalho Nicoletti contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas da Comarca de Praia Grande, que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve a recusa do registro de sentença, com força de mandado, extraída dos autos de ação de adjudicação compulsória, processo nº 1009614-41.2020.8.26.0477, que tramitou na 3ª Vara Cível da Comarca de Praia Grande (fls. 256/257), referente ao imóvel da transcrição nº 39.163, do 3º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Santos (fls. 138/139).

Afirmaram os apelantes, em síntese, que não têm como cumprir a exigência registrária, pois a proprietária tabular do imóvel não possui inscrição no CNPJ/MF, conforme demonstram as cópias dos atos arquivados na JUCESP e a pesquisa realizada na REDESIM.

Aduziram que o princípio da especialidade subjetiva deve ser mitigado e, por conseguinte, autorizado o ingresso do título no fólio real (fls. 260/266).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 296/299).

É o relatório.

O acesso do título judicial à tábua registral acabou obstado devido à deficitária qualificação daquele que figura como proprietário do imóvel na transcrição nº 39.163, do 3º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Santos.

A nota devolutiva descreve duas exigências, mas apenas uma delas foi mantida por ocasião da suscitação da dúvida (fls. 164):

“1) Para procedermos o pretendido registro, o interessado deverá apresentar o documento expedido pela Secretaria da Receita Federal do Brasil constando o número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda (CNPJ/MF) de Construções Gesiva Limitada (artigo 176, §1º, inciso III, item 2, alínea ‘b’, da Lei Federal nº 6.015/73, item 62, capítulo XX, das Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, artigos 7º, 13 e 14 do provimento nº 39/2014, e Provimento 61/2017, ambos do Conselho Nacional de Justiça, princípio ‘tempus regit actum’ – artigo 1.246 do Código Civil, Apelação Cível nº 1003970-04.2018.8.26.0505, da Comarca de Ribeirão Pires-SP)”.

Os recorrentes apresentaram a registro a sentença judicial, com força de mandado, extraída da ação de adjudicação compulsória que moveram contra Construções Gesiva Ltda., a proprietária tabular do imóvel tratado nos autos.

E afirmam que a empresa proprietária do bem não possuía CNPJ, até porque não existia regulação a respeito deste cadastro ao tempo em que foi constituída, como demonstram por meio dos documentos obtidos na JUCESP e pela resposta negativa à consulta feita na REDESIM, para obtenção de informações sobre os dados do CNPJ, de sorte que pugnaram pela relativização do princípio da especialidade subjetiva.

Pois bem.

Como sabido, a norma vigente ao tempo da apresentação do título a registro (tempus regit actum) é a que deve ser observada, sendo obrigatória a inscrição da pessoa jurídica de direito público ou de direito privado no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ), em conformidade com a Instrução Normativa RFB nº 2.119, de 06 de dezembro de 2022, e das que lhe antecederam; artigo 176, §1º, III, item 2, alínea ‘b’, da Lei Federal nº 6.015/73 (que mencionava o antigo Cadastro Geral de Contribuintes – CGC); e item 62, do Capítulo XX, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, daí o óbice oposto ao registro para que seja informado e comprovado o respectivo número de inscrição.

Mas, no caso concreto, a exigência registrária deve ser afastada, porquanto os apelantes demonstraram que a empresa proprietária do imóvel se registrou na JUCESP em 1953, tendo como último ato lá inscrito uma alteração contratual datada de novembro de 1955, quando não existia número de CNPJ, posto que o cadastro foi criado a partir da Instrução Normativa SRF 27/1998, o qual veio a substituir o Cadastro Geral de Contribuintes, que, por sua vez, foi instituído em pela Lei nº 4.503/1964.

Nestas condições, impossível impor aos recorrentes o fornecimento de número de CNPJ relativamente à proprietária tabular.

Frise-se que na transcrição do imóvel consta o endereço da proprietária tabular, que é o mesmo existente na JUCESP, a demonstrar que se trata da mesma pessoa jurídica que figurou no polo passivo da ação de adjudicação compulsória.

Este Colendo Conselho Superior da Magistratura já se pronunciou sobre a mitigação do princípio da especialidade subjetiva em caso semelhante:

“REGISTRO DE IMÓVEIS  Carta de adjudicação – Promitente vendedor falecido  CPF/MF inexistente  Exigência afastada  Impossibilidade de cumprimento pelo apresentante  Princípio da segurança jurídica  Princípio da razoabilidade – Dúvida improcedente  Recurso provido.” (Apelação n° 0039080-79.2011.8.26.0100, CSM, Rel. DES. JOSÉ RENATO NALINI, 20/09/2012).

Relevante destacar o seguinte trecho do v. acórdão:

“(…) Assim, para não sacrificar a segurança jurídica e a publicidade, é de rigor flexibilizar, in concreto, a severidade do princípio da especialidade subjetiva, dispensado a informação sobre o número do CPF/MF de Henri Marie Octave Sannejouand, cujo número de inscrição do Registro Geral é, de mais a mais, conhecido e consta da matrícula do imóvel (RG n.º 75.149 – mod. 19 – fls. 07), em sintonia com a carta de arrematação (fls. 23). A especialidade subjetiva, se, na hipótese, valorada com excessivo rigor, levará, em desprestígio da razoabilidade, até porque a exigência não pode ser satisfeita pela interessada, ao enfraquecimento do princípio da segurança jurídica, o que é um contrassenso. Com a exigência, o que se perde, confrontado com o ganho, tem maior importância, de sorte a justificar a reforma da sentença: a garantia registaria é instrumento, não finalidade em si, preordenando-se a abrigar valores cuja consistência jurídica supera o formalismo (…)”.

De se notar que o Registrador, por ocasião da dúvida, aduziu que necessitava do número do CNPJ para realizar consulta quanto às ordens de indisponibilidade de bens na Central Nacional de Indisponibilidade de Bens, “conforme estabelecem os artigos 7º, 13 e 14, do provimento nº 39, de 25 de julho de 2014, do Conselho Nacional de Justiça, e os itens 411 e 412, do Capítulo XX, das Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo”.

No entanto, eventual impossibilidade de consulta às ordens de indisponibilidade de bens por dados diversos do CNPJ não pode constituir óbice ao registro do título judicial se o princípio da especialidade subjetiva está atendido, como ocorre no presente caso.

Em suma, diante da suficiência de elementos aptos à identificação do proprietário tabular, de rigor a mitigação do princípio da especialidade subjetiva, afastando-se, pois, o óbice registrário.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação, para julgar improcedente a dúvida.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 24.01.2024 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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